Consumo Mediado Por Dispositivos Digitais

Guaracy Carlos da Silveira
Strategic Powerhouse
6 min readSep 20, 2017

A grande chance do consumidor ou mais uma forma de manipulação?

Imagem Ilustrativa. Fonte Pexels.

O vasto campo de estudos chamado de Comportamento do Consumidor, busca, grosso modo, compreender quando, como, porquê e onde as pessoas decidem comprar um produto ou não. É alimentado por teorias dos campos da psicologia, sociologia, antropologia social e economia entre outros, e serve como base teórica para o marketing e para a comunicação publicitária.

É relativo consenso entre os que são desta área que toda relação de consumo é marcada por uma desigualdade entre as partes, conceito este inclusive, que norteou a criação do código de defesa do consumidor. Especificamente o artigo quarto tipifica a vulnerabilidade do consumidor.

A vulnerabilidade é compreendia num sentido de desigualdade de informação, onde o fornecedor é a parte mais forte por dispor de muitas informações. A título de exemplo imagine que você está numa feira de venda de carros usados, as únicas informações que possui acerca do carro que lhe interessou são as que consegue constatar pessoalmente (olhando o motor, lataria, etc.) e que o vendedor está disposto a lhe dar (geralmente o discurso é: a dona deste carro era uma velinha que raramente o usava, tirando-o da garagem só nos fins de semana). Neste caso o dono do carro, sabe o seu real histórico, batias, amassos, consertos mal feitos, peças de segunda mão, etc., e decide se quer ou não compartilhar tais informações com você.

O Código de Defesa do consumidor tentar mitigar este desequilíbrio determinando obrigações de informar por parte do fornecedor, como por exemplo se o produto é danoso a saúde, se está sendo ofertado de forma verdadeira , aponta responsabilidades no caso de defeitos, determina práticas comerciais idôneas (publicidade enganosa e abusiva), etc.

Consumo Mediado Por Dispositivos Digitais. Fonte: pexels.

Consumo Mediado Por Dispositivos Digitais

Pela primeira vez na história, esta diferença de forças no tocante a informação está mudando, e a balança pode pender para o consumidor. A nova realidade que se desenha dá poderes sem iguais para o consumidor quanto a pesquisa de preços, ofertas, produtos, localidades e avaliação de outros consumidores.

Se antes o consumidor tinha de se preparar municiando-se com o máximo de informações antes da compra, agora ele consegue faze-lo realtime através de sites como Buscapé e Bondfaro onde compara ofertas, descontos e produtos alternativos, melhorando sua negociação, e grande parte das vezes, “quebrando as pernas” de vendedores embromões.

Neste sentido a capacidade do consumidor de manifestar sua insatisfação (ou indignação) também aumentou exponencialmente, sendo que em alguns setores a resposta do fornecedor por canais digitais costuma ser mais rápida e eficaz do que presencialmente, neste sentido Facebook e Twitter tornaram-se aliados do consumo.

A imensa disponibilidade de informação possibilitou o surgimento de curadores e organizadores de conteúdo que fazem uso de dados públicos, ou processam dados privados, consolidando informações e disponibilizando-as na forma de plataforma. Experiências de consumo ruins, ou fornecedores que estão no limite da lei, são facilmente identificados por ferramentas como o PROTESTE e Reclame Aqui. Até mesmo a máquina governamental (entendida como um fornecedor de serviços) pode ser alvo de escrutínio por meio de portais como o Transparência Brasil.

Neste cenário desenha-se uma nova realidade de oportunidades únicas para o consumidor onde alimentado por informações teria o poder de fazer as melhores e mais rentáveis escolhas. Mas nem tudo são flores.

Consumo Rastreado. Fonte Pexels.

Consumo Rastreado

A contrapartida negativa do consumidor mediado por dispositivos digitais é a possibilidade sem precedentes de rastreamento de hábitos de consumo. A premissa básica de qualquer vendedor é a de que quanto o mais o conheço, melhor minhas chances de vender para você. Em um ambiente onde navega-se, conversa-se e paga-se por celular, o mercado tem uma montanha de dados sem precedentes acerca de nosso comportamento.

Neste contexto, o Big Data parece estar atuando contra o consumidor, gerando a possibilidade de se varrer uma imensa quantidade de dados, que vão desde hábitos de navegação e detalhamento de histórico de compras que podem ser cruzados com as informações geradas pelos dispositivos de geolocalização dos celulares, informando qual o dispositivo e sistema você usa, quanto tempo permanece no ponto de venda, para onde se deslocou e até com quem foi. Criando mapas de consumo de acuidade sem precedentes. Permitindo a criação de ofertas sob medida realtime.

O que os consumidores não percebem é que em grande parte das vezes, seus comportamentos tendem a ser rotineiros e quando agrupados com o de outros consumidores constituem-se tendências. Esta varredura já está em prática, sem que nos demos conta. Já reparou que muitas vezes o Waze sabe que você irá se deslocar de onde está para sua casa (baseado no seu histórico) e o Uber sugere o endereço de onde você está pensando em ir?

Na verdade já há uma ampla gama de estudos e artigos documentado esta capacidade de acompanhamento e previsão de comportamento baseado em dados, sendo que alguns são até assustadores. Como por exemplo o fato de Facebook possuir um algorítimo que consegue prever quando um casal irá se separar, ou a Amazon possui um software preditivo tão poderoso que consegue deduzir suas compras ANTES de você faze-las, ou o caso do varejista Target que sabe sobre a gravidez de suas clientes antes que estas façam compras. Alguns casos beiram a ficção distópica, como a pulseira MyMagic da Disney que permite o mapeamento completo do passeio e compra dos usuários do parque.

Consumo Digital. Fonte Pexels.

No fim das Contas Isto Tudo é Bom ou Ruim?

A melhor resposta que posso dar é: depende de você. A revolução digital veio para ficar, e neste sentido o consumo mediado por dispositivos digitais é um fato. O que cada consumidor precisará definir é o seu papel nesta história.

O consumo deve deixar de ser uma ação passiva, e neste sentido somos obrigados a nos mexer, buscar alternativa, comparações, informações. Isto cansa e dá trabalho, mas quando bem utilizado evita uma montanha de dores de cabeça.

Tenha conhecimento do valor de suas informações, é necessário que o consumidor passe a exigir uma contrapartida por elas. Pense em cada cookie que você deixou ser instalado em sua máquina ou cada cadastro que preencheu que teve de dar seu endereço, CPF, e-mail e etc. A medida que o consumidor compreende que suas informações tem valor, passa a cuidar melhor da forma como dispõe destas.

A lição final é que continua não existindo Almoço Grátis. Tudo tem um preço. Quanto mais informado e articulado o consumidor digital, mas condições ele tem de sair de seu estado de vulnerabilidade.

P.S. Sugiro que você separe alguns minutos e leia aquele texto que você sempre aceitou sem prestar atenção acerca das política de privacidade do Facebook e do Whatsapp, especialmente no tocante aos seus dados que estes compartilham. Creio que você não vai ficar muito satisfeito com o que vai descobrir.

A Planners Group — Strategic Powerhouse é uma empresa voltada para o assessoramento em planejamento de marketing e comunicação. Nossos textos buscam esclarecer assuntos correlacioandos.

Se tiver interesse entre em contato conosco: negocios@plannersgroup.com.br

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Guaracy Carlos da Silveira
Strategic Powerhouse

Doutor em Educação, Artes e Historia da Cultura no Mackenzie, Doutorando em Design na Anhembi Morumbi. Publicitário, Professor, e Gammer.