Inglória família numa noite de inverno
Os convidados estavam em suas cadeiras com as cabeças abaixadas pra facilitar o caminho da comida até a boca. Naquela mesa panelas de barro repletas de caldo quente, pratos de vidro com saladas e batata. Cheiro verde, pães e uma porção de milho verde.
“De jeito nenhum”, disse meu marido quando me levantei em frente à mesa de jantar. “Minha mãe está aqui”
“Esse é o ponto”, respondi.
Chamei a atenção dos convidados e quando segurei a toalha de mesa, a cacofonia se transformou num breve silêncio do fogo ardendo na lareira. Todos me encarando quando puxei com força.
“Por que você sempre arruína todos os jantares?”, minha sogra gritou.
A ideia não era arremessar os pratos e panelas a dois metros de todos, não. Após segundos tudo o que decorava a bela mesa estava no colo dos convidados, que agora gritavam e se envergonhavam pelo susto tomado.
“E agora como você espera que todos comam?”, meu marido disse enquanto a filha gorda da Duda catava os milhos cozidos do chão.
Um convidado jogou os guardanapos pra cima e se direcionou até a porta da sala, bufando pelos pés.
“Isso ficou muito feio”, disse ao passar para fora, apertando com força o braço da minha cunhada.
Sorte que meus irmãos não reclamaram e continuaram comendo. E na medida em que os convidados saíam, meu marido se desculpava por todo o transtorno. O máximo que pude fazer foi despejar sabonete nos tapetes pra apagar aquelas malditas manchas de caldo de feijão.
O truque de puxar a tolha da mesa sem que nada se mova me exige dizer quatro palavras mágicas. E talvez eu tenha invertido a ordem de duas delas.