Ms. 45 (Abel Ferrara — 1981)

Larissa Goya Pierry
Subvercine
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3 min readOct 1, 2018
  • Publicado originalmente no Tumblr em 05/02/2016

Ainda na retrospectiva de filmes “subversivos” que assisti em 2015, gostaria de tomar um tempo pra falar sobre essa pequena raridade da década de 80. “Ms 45″ foi dirigido pelo Abel Ferrara, um diretor consideravelmente famoso, e que, pelo menos pra mim, é sinônimo de filmes hardcore (vide: “O Rei de Nova York” e “Bad Lieutenant”).

Seus filmes com altas doses de sexo e violência (dois elementos que parecem andar de mãos dadas, curioso ou não?) são reminiscentes do cinema “exploitation”, cujo ápice foi na década de 70, bem como do subgênero “slasher”, que também deslanchou nessa mesma época.

Com “Ms. 45″ não é diferente. O filme conta a história de uma garota nova-iorquina, que trabalha como costureira em uma agência de moda, cuja vida é perfeitamente comum, não fosse pelo fato de que ela é muda. Em um determinado dia, ela é estuprada e agredida duas vezes, por dois homens diferentes, e essa experiência, de alguma forma, fazem com que ela saia num killing spree pela cidade, seu alvo sendo homens que tenham o mesmo perfil de abusador.

É claro, também tenho dúvidas em relação à classificação desse filme enquanto “subversivo”, sabendo o quanto o Abel Ferrara é polêmico e o quanto “Ms. 45″ herdou dos velhos “sexploitation” dos anos 70. O que fica em jogo é sempre a dimensão dual desse tipo de filme. Por um lado, trata da vingança de uma mulher contra os homens (que aqui, são TODOS mostrados como sexistas e/ou violentos), podendo ser visto como uma metáfora da libertação das mulheres através de suas próprias mãos, além do fato da personagem ser muda, o que carrega um poder simbólico bastante forte, né.

Por outro lado, devemos levar em conta: será que é possível um filme que trate verdadeiramente sobre a libertação sexual e mental de uma mulher ser dirigido por um homem? Além do fato de que, a história acaba caindo sob a categoria “rape and revenge”, que, historicamente, é um subgênero que explora um ato tão violento contra mulheres (é só lembrar de “I Spit on Your Grave” ou “Last House on the Left”)

Maaaaas, conjecturas à parte, o melhor é sempre assistir ao filme e chegar às próprias conclusões. Essas questões cruzaram minha mente enquanto o assistia, mas, no final, acabei me apaixonando pela cinematografia crua e a estética obscura do Abel Ferrara.

Além disso, a atuação da Zoë Lund é incrível, pois lembre-se, ela não pronunciou uma palavra sequer ao longo do filme, é pura expressão (pena que a carreira dela não foi longa, ela morreu de uma overdose de cocaína não muito depois disso — no pun intended).

Enfim, acredito que esse filme não é o melhor exemplo pra basear uma discussão política, mas, em minha opinião, ele acaba sendo subversivo por mostrar uma mulher encontrando sua voz (metáforas à parte), mesmo que esse caminho seja eventualmente destrutivo.

Vale ressaltar que, como esperado, no seu lançamento, o filme foi meio que destruído e ficou fadado à obscuridade, mas, felizmente pode ser resgatado e apreciado por pessoas que curtem um cinema singular (porque, mesmo, não consegui achar outro filme parecido com esse, desde então).

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Larissa Goya Pierry
Subvercine

Psicóloga. Feminista. Escrevo umas coisas por aí. Apaixonada por Cinema, Literatura, Música e pelas belas estranhezas da vida.