Por um “New Deal” Sustentável

Por Jefferson Castro

Eduardo Rodrigues
Sustineri
4 min readNov 22, 2017

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É notório que nos últimos anos as democracias neoliberais têm apresentado, globalmente, sintomas de esgotamento e degradação, transformando a sociedade em mera mercadoria através de políticas de precarização do trabalho e de privatização dos bens comuns. Ademais, elas têm estado em constante contradição em relação aos interesses privados e os públicos. Logo, este modelo de sociedade centrado nos interesses exclusivos do mercado, manifesta uma condição de universalização da pobreza, em contrapartida a uma minoria em constante estado de enriquecimento, que explora sem pudor a terra, o trabalho e o capital.

A consequência deste modelo é o contínuo aumento da desigualdade social, como já demonstrado pelo economista Thomas Piketty, em “O Capital no Século XXI”, no qual afirma que a parcela que representa os 50% mais pobres em patrimônio possui geralmente em torno de 5% da riqueza nacional dos países que habitam.

Para tentar reverter esse quadro, a ONU propõe um “New Deal” mundial, com o objetivo de limitar o poder do grande capital, que tem se mostrado como o único grande favorecido com o neoliberalismo.

Posto que os autores neoliberais de maior relevância como Hayek e Friedman sugeriam que o mercado fosse visto como um mecanismo eficaz para regular a extensão, propósito e alcance do governo e pregavam o fim das organizações coletivistas, porquanto, consideravam que inclusive os sindicatos eram tidos como um fator de desequilíbrio na economia, dado que a organização dos trabalhadores e a demanda por aumento salarial e de melhores condições de trabalho desestabilizavam, segundo eles, as condições estabelecidas de oferta e demanda do mercado.

O que nos leva a avaliar como se deu a atuação dos sindicatos durante o período do “New Deal”, que foi uma política implantada pelo governo do presidente americano Franklin Delano Roosevelt, com o objetivo de recuperar a economia americana da crise iniciada em 1929, tendo como cerne ideias do economista inglês John Maynard Keynes. Neste período os sindicatos cresceram tanto em quantidade de filiados quanto em poder. De modo que o número de membros triplicou entre 1933 e 1938, e depois quase voltou a dobrar por volta de 1947. O que foi essencial na criação de uma sociedade americana de classe média, já que possibilitou o aumento da renda dos americanos, através dos salários mais elevados, e reduziu a disparidade de renda entre trabalhadores que exerciam funções manuais.

Durante o “New Deal” a intervenção estatal foi fundamental para diminuir a desigualdade americana, ocorrida no final da década de 1940, o que se deu por conta do aumento dos impostos. Visto que, entre 1929 e 1955, a tributação federal média sobre os lucros empresariais subiu de menos de 14% para 45%. Enquanto que a alíquota máxima do imposto sobre heranças subiu de 20% para 77%. Por fim, a alíquota do imposto de renda foi de 24%, em 1920, para 79%, em meados da década de 1940. O resultado dessas mudanças fez com que a riqueza se tornasse menos concentrada, uma vez que o 0,1% mais rico possuía mais de 20% de toda riqueza nacional em 1929, mas apenas ao redor de 10% em meados da década de 1950. No entanto, hoje a alíquota de imposto de renda americana está em torno de 35% (KRUGMAN, 2010); sendo esse um dos fatores que contribuiu para a volta do aumento da desigualdade.

Considerando estes poucos dados apresentados é possível vislumbrar que um novo “New Deal”, tendo como premissa ideias keynesianas, tais como ter o Estado e seus corpos intermediários com um papel indutor e regulador; implantar um sistema fiscal progressivo, de sorte que as classes com maior propensão ao consumo sejam menos oneradas do que os que detêm maior fatia do capital, que, comumente, tem renda proveniente de atividades não decorrentes do trabalho, como também constatou Piketty; além disso, a necessidade de uma coordenação internacional acordada entre os países.

O proposto pela ONU para o “New Deal” global do século XXI vai de encontro com as ideias keynesianas. Entretanto, não devemos nos limitar as benesses auferidas com o “New Deal” de Roosvelt, pois o sucesso no passado leva comumente ao fracasso no futuro. Acredito, em vista disso, que o Estado deve ser forte e indutor de políticas que regulam e induzam o sistema econômico, que organizações sociais devam ser participativas e que seja imperativo o sistema de tributação progressiva, entre outras medidas propostas. Contudo, que ideias como a do economista francês Gaël Giraud, sacerdote e jesuíta, combatente das práticas do sistema financeiro e que colaborou com a elaboração da encíclica “Laudato Sí”, permeiem as políticas de desenvolvimento econômico, que os investimentos públicos e privados sejam voltados para um crescimento verde e redução da desigualdade social. De modo que transformem as cidades em ambientes sustentáveis, que abdiquemos da dependência dos combustíveis fósseis, que a agricultura não se defina por grandes propriedades rurais e uso extensivo de agrotóxicos. Assim, que as políticas sejam elaboradas com o intuito de mudarem esses paradigmas que arriscam a continuidade da vida de todos os seres que habitam o nosso planeta.

Bibliografia Consultada

BELLUZO, L. G.B. O capital e suas metamorfoses. Editora Unesp, São Paulo, 2013.

KRUGMAN. P. A consciência de um liberal. Rio de Janeiro, Record, 2010.

PIKETTY, T. O capital no século XXI. Ed. Intrínseca, Rio de Janeiro, 2014.

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Eduardo Rodrigues
Sustineri

Mestrando em Sustentabilidade pela PUC-Campinas, estuda Inovação Social em ONG’s e Negócios Sociais. Escreve às segundas na Sustineri.