UX Writing e a comunicação não-violenta: 5 exemplos fundamentais

Karine Lima
Sympla Design
Published in
6 min readFeb 12, 2020
Mão segurando um objeto que parece uma arma mas que, na verdade, é um microfone apontado para frente.

Ao contrário do que muitos profissionais ainda pensam, UX Writing não é capricho de empresas poderosas muito menos um dom da escrita que determinado profissional aparenta ter. UX Writing é sobre saber comunicar-se da melhor forma, não falando bonito mas falando com objetividade, não provocando ruído, mas fazendo sentido, otimizando o tempo do usuário com o produto ou serviço.

Bruno Rodrigues, referência no assunto e autor de Em busca de boas práticas de UX Writing, sempre reforça: Não precisa gostar de escrever para ser UX Writer. O objetivo aqui não é prolongar textos difíceis nem poéticos, mas reduzir linhas desnecessárias, enxugar conteúdo mantendo-se compreensível, cortar palavras de enfeite, traduzir a semântica do contexto para a linguagem do usuário e sintetizar, sem perder o sentido.

Se as “palavras têm poder”, no universo da escrita para UX elas são fatais para melhorar ou piorar a experiência do usuário, consideráveis para atrair ou repelir público, e imprescindíveis para aproximar ou distanciar o valor do seu negócio com os objetivos do seu usuário. Dessa forma, como usar as palavras certas da melhor forma, logo na primeira impressão? Como conseguir se expressar bem respeitando o curto (e precioso) tempo do usuário? Como fazer-se compreensível em uma tela de poucas polegadas?

Sugestão: começar a praticar a comunicação não-violenta.

Mas, o que é a comunicação não-violenta?

No livro Comunicação Não-Violenta (CNV), Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais, escrito pelo psicólogo americano Marshall B. Rosenberg, a CNV é definida como “uma forma de comunicação que nos leva a nos entregarmos de coração” que “se baseia em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a capacidade de continuarmos humanos, mesmo em condições adversas”.

Durante o processo de CNV, são trabalhados quatro componentes:

  1. observação — observar sem julgar;
  2. sentimento — identificar sensações relacionadas à observação;
  3. necessidades — reconhecer necessidades relacionadas ao sentimento;
  4. pedido — formular ações concretas sobre o que de fato pedimos.

Por meio desses quatro componentes, é essencial “expressar-se honestamente” e “receber com empatia”. Não por coincidência, mas por estudos antropológicos e comportamentais, essas também são premissas básicas para a construção de bons diálogos em UX Writing.

Assim, fazendo correlações entre passagens do livro e exemplos de aplicação na comunicação em UX, é possível estabelecer 5 práticas que podem direcionar os muitos cenários que envolvem a escrita para app/web, sejam em telas de boas-vindas, formulários de preenchimento, CTAs (click to action), notificações e etc.

“A CNV nos ajuda a nos ligarmos uns aos outros e a nós mesmos, possibilitando que nossa compaixão natural floresça. Ela nos guia no processo de reformular a maneira pela qual nos expressamos e escutamos os outros, mediante a concentração em quatro áreas: o que observamos, o que sentimos, do que necessitamos, e o que pedimos para enriquecer nossa vida. (…) No mundo inteiro, utiliza-se a CNV para mediar disputas e conflitos em todos os níveis.”

(Do fundo do coração — o cerne da comunicação não-violenta — Marshall B.Rosenberg)

5 EXEMPLOS DE COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA PARA UMA ESTRATÉGIA DE UX WRITING

1) “Nunca conseguimos forçar as pessoas a fazer nada”

CNV e UX Writing: Imagem de comparação de exemplo a ser evitado e exemplo sugerido para melhor experiência do usuário.
EXEMPLO EVITE USAR: Para seguir com o que? Por que isso é obrigatório?

Fuja de frases impositivas (é obrigatório que você concorde com os termos), autoritárias (para ganhar benefícios, você deve pagar a assinatura do plano) e de qualquer conteúdo em tom de ameaça (se você não preencher o formulário em 5 minutos você perderá todos dados registrados). Usuários não têm que fazer nada e nem farão, a não ser que sintam-se confortáveis e convencidos a optar por determinada ação. Assim, uma ação desejada só é alcançada quando explica as razões de forma clara (é recomendável, sugerimos, aconselhamos), e compreende que o usuário talvez possa não optar por ela.

2) “Podemos substituir uma linguagem que implique falta de escolha por outra que reconheça a possibilidade de escolha.”

CNV e UX Writing: Imagem de comparação de exemplo a ser evitado e exemplo sugerido para melhor experiência do usuário.
EXEMPLO EVITE USAR: O que o usuário tem permissão para fazer?

Ofereça a possibilidade de escolhas — mesmo que não seja uma escolha tão flexível. Comandos negativos (não utilize senhas iguais) soam melhores quando substituídos por frases positivas com alternativas de ações (você pode utilizar senhas diferentes e garantir mais segurança para sua conta). O usuário quer fazer parte e sentir-se dono de toda a experiência com a interface, e não da sensação de condicionamento de suas próprias escolhas.

3) “Formular pedidos em linguagem clara, positiva e de ações concretas revela o que realmente queremos.”

CNV e UX Writing: Imagem de comparação de exemplo a ser evitado e exemplo sugerido para melhor experiência do usuário.
EXEMPLO EVITE USAR: Semanticamente, "Não perca a oportunidade" = "não perca tempo"= "som de última geração"= "preço imperdível"= "preços imperdíveis". E o que é um pacote Golden? E um pacote Premium?

Há um certo romantismo sobre utilizar palavras difíceis ou elaborar ideias complexas para demonstrar seriedade. Mas complexidade vai na contramão de assertividade, e em uma tela de poucas polegadas, com um usuário bombardeado de informações diariamente, conseguir ser simples é o grande luxo. Ser simples, de fato, demonstra o compromisso com o tempo de cada indivíduo.

Por isso, já dizia John Maeda, “Simplicidade é subtrair o óbvio e adicionar o significativo”. Utilizar linguagem clara é ser transparente, ir direto ao ponto, sem rodeios, sem termos técnicos que apenas alguns vão entender, sem linguagem publicitária (imperdível, inédito, exclusivo), sem jargões e sem frases-feitas.

Escreva apenas aquilo que precisa ser dito.

4) “Uma linguagem vaga favorece a confusão interna.”

CNV e UX Writing: Imagem de comparação de exemplo a ser evitado e exemplo sugerido para melhor experiência do usuário.
EXEMPLO EVITE USAR: Será que todo mundo sabe o que é Deezer? Do que adianta ser 3 meses de graça se eu não enxergo valor na mensagem? Por que eu experimentaria agora?

A comunicação vaga abre brechas para má interpretação, para deduções, apologias equivocadas ou, no pior dos casos, para perda de tempo — já que não traz informação relevante para o usuário. Mais uma vez, valorize o tempo do seu leitor- ouvinte-consumidor. É obrigação do UX Writer oferecer conteúdo de qualidade, que direcione, explique, traga novidades, contextualize e/ou informe o usuário.

5) “Nosso objetivo é um relacionamento baseado na sinceridade e na empatia.”

CNV e UX Writing: Imagem de comparação de exemplo a ser evitado e exemplo sugerido para melhor experiência do usuário.
EXEMPLO EVITE USAR: Como vou tentar novamente se não sei o que deu de errado? Posso desistir?

Para começar, ERRO é uma palavra forte que necessariamente implica em erro cometido pelo usuário (lembra do errar é humano?). Ao substituir por FALHA, entende-se que possa haver falha do sistema, da conexão, do servidor ou do processamento, removendo a carga de culpa e de ansiedade do usuário.

Depois, expresse empatia com qualquer mal ocorrido. Mensagens indiferentes relativizam as percepções do usuário, fazendo com que ele se sinta incompreendido e frustrado com o atendimento, mesmo que seja sobre um bom produto ou serviço. E sem exageros (oh não, que pena, ops, infelizmente já são bons caminhos).

Por último, forneça alternativas, dê soluções, mostre o caminho. Se algo deu errado, como reverter? O que pode ser feito? Qual a melhor saída diante daquele problema/ situação? Preciso aguardar? Por quanto tempo?

CONCLUSÃO

Comunicar-se bem não é um dom.

É uma habilidade que necessita ser praticada e exige estudo, adaptação e atenção aos detalhes. A Comunicação Não-Violenta colabora como um caminho de partida para construirmos diálogos mais empáticos e respeitosos, mesmo quando falamos de públicos e contextos tão específicos.

Comunicar-se é saber se expressar mas é, principalmente, sobre uma constante descoberta e sabedoria em ouvir.

// Referências:

Comunicação não-violenta — Técnicas para aprimorar relacionamento pessoais e profissionais — Marshall B. Rosenberg

Em busca de boas práticas de UX Writing — Bruno Rodrigues

How to write good error messages — Saadia Minhas

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Karine Lima
Sympla Design

designer gráfico, designer de produto e content designer. esportista, hiperbólica e desmistificadora de breguices.