Como criar uma comunidade de tecnologia

Beatriz Oliveira
SysAdminas
7 min readJul 16, 2023

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Participar da criação de uma comunidade de tecnologia foi, sem dúvida, uma das melhores coisas que fiz nos últimos anos. No entanto, muitas coisas que aprendi foram descobertas apenas quando precisava delas. Por isso, gostaria de compartilhar alguns aprendizados que tive ao ajudar a criar e organizar a Comunidade SysAdminas nos últimos 4 anos.

Por que criar essa comunidade?

Antes de criar uma comunidade, é importante avaliar se faz sentido, pois pode já existir outros grupos com o mesmo propósito. Portanto, recomendo verificar a possibilidade de se juntar a eles para começar a contribuir e também para fortalecer as comunidades já existentes. Muitas comunidades estão sempre precisando de pessoas voluntárias para diversas tarefas.

Não estou dizendo que você não deve criar uma comunidade se existirem outras sobre o mesmo tema, mas gostaria de trazer essa alternativa principalmente para quem ainda não tem experiência em comunidades. Antes de participar da criação da SysAdminas, apoiei por anos a PHP Women BR e a WoMakersCode, e isso foi essencial para meu aprendizado nesses grupos e também para conhecer pessoas importantes para minha carreira.

Além disso, é importante ter em mente que criar uma comunidade do zero envolve dedicação, planejamento e tempo. Você será responsável por criar e manter um espaço para pessoas se desenvolverem. Portanto, é importantíssimo buscar formas de tornar esse grupo um lugar ativo e seguro para todas as pessoas que o buscarem.

A criação da SysAdminas fazia muito sentido, pois no Brasil, havia poucas comunidades voltadas para infraestrutura de TI, já que o grande foco das comunidades já existentes sempre foi em desenvolvimento de software. A escassez de mulheres nessa área também foi um fator importante que levamos em consideração. A nossa ideia ao criar a comunidade era mostrar exemplos, reunir mulheres que já atuavam na área e, ao mesmo tempo, ser uma rede de apoio para quem estava iniciando em busca de capacitação e empregabilidade.

Defina as atividades do grupo

Há vários meios de gerar conteúdo, por isso é importante escolher o que faz sentido para o seu grupo. No caso da SysAdminas, começamos como um blog no Medium e, em seguida, passamos a realizar workshops e meetups, mantendo também o blog.

Hoje, além disso, também realizamos lives, mentorias, revisões de currículo e oferecemos bolsas de estudos focadas em certificações técnicas de tecnologia. Tudo isso foi construído ao longo de quatro anos, por isso, minha recomendação é que você comece pequeno e vá evoluindo aos poucos, pois cada método possui sua complexidade, e você só vai descobrindo isso com o tempo.

Se você deseja conhecer mais alguns métodos de contribuição, recomendo que leia o artigo “Dicas para contribuir em comunidades: principais meios e estratégias”, escrito por mim, onde detalho mais sobre isso.

Defina o seu público alvo

Ao criar a SysAdminas, definimos que nosso foco seriam mulheres que têm interesse na área de infraestrutura de TI. Para tornar isso realidade, buscamos constantemente trazer mulheres referências nessa área para ensinar em nossas iniciativas e deixamos claro quando as ações que realizamos são afirmativas para esse público. Nós também contamos com o apoio de homens aliados que entendem a importância da causa e nos ajudam de diversas formas ao longo desse período.

Toda comunidade tem um público alvo e você não só pode como deve definir o seu, seja com foco em algum recorte minoritário ou até mesmo em alguma tecnologia específica.

Entenda que ninguém faz nada sozinho

Comunidade é sobre trabalho coletivo. Tudo é feito por pessoas e para pessoas. Por isso, sugiro que, quando você tomar a iniciativa de criar uma comunidade, convide outras pessoas para apoiá-lo de alguma forma, seja para participar com você da criação ou até mesmo com ideias, conselhos e direcionamentos.

É importante evitar criar hierarquias no grupo. Claro, vale a pena ter líderes que coordenem e direcionem as ações, mas isso deve ser usado apenas para fins de organização no dia a dia e não para mostrar que algumas pessoas mandam mais que outras no grupo.

Também é importante evitar criar panelinhas. Pode parecer mais fácil deixar apenas pessoas próximas participarem do grupo, mas isso não é ideal. Por isso, abra espaço para diversas pessoas integrarem o time. Para facilitar isso, você pode, por exemplo, abrir um formulário de inscrições de voluntários efetivos ou pontuais, pedindo que quem se interessar se inscreva e diga como e quando quer apoiar. Você pode buscar pessoas que se voluntariem para palestrar sobre um tema ou que queiram ajudar na organização da comunidade.

Deixe que as pessoas que estão se voluntariando se sintam confortáveis para contribuir com o que desejarem. Nem sempre elas terão experiência prévia, e isso é perfeitamente normal. O trabalho em comunidade existe justamente para que as pessoas possam se desenvolver e aprender juntas. Ao longo desses anos, venho aprendendo várias coisas que simplesmente não sabia, como gerenciamento de redes sociais, gestão de eventos online e presenciais, criação de conteúdo técnico e falar em público. Todas essas habilidades foram adquiridas com o tempo e a prática, mesmo sem saber fazer nada disso inicialmente.

Crie a sua identidade e um espaço seguro

Eu sei que pode parecer óbvio criar páginas nas redes sociais hoje em dia, mas quando começamos as atividades da SysAdminas, só tínhamos um blog no Medium, criado em 2018, e nada mais. Somente em 2020 é que começamos a criar uma identidade para o grupo: definimos um logotipo, criamos um website e páginas no Instagram, Twitter e LinkedIn.

Antes de termos as redes sociais da SysAdminas, eu e Valesca divulgávamos nossas iniciativas através das nossas próprias páginas no Instagram e LinkedIn. Não vou mentir, esse modelo funcionou por praticamente um ano, mas chegou um momento em que percebemos que seria melhor que a comunidade tivesse sua própria identidade. Por isso, minha dica para quem está começando é: crie uma identidade para o grupo. A presença nas redes sociais ajuda muito a alcançar pessoas em vários lugares. Você não precisa produzir vários posts por semana nessas redes sociais, apenas tenha um lugar centralizado para divulgar suas iniciativas e eventos, que já é ótimo. Entretanto, se no seu grupo houver pessoas para manter uma frequência de postagens com conteúdos técnicos relacionados ao seu nicho, também tenho certeza de que funcionará bem.

Além de criar sua marca, um item muito importante é um código de conduta. Nele, você deixará explícito o conjunto de regras que devem ser adotadas por todas as pessoas que participarem do grupo, incluindo as pessoas voluntárias e as participantes das iniciativas que você organizar. Publique seu código de conduta e deixe-o em evidência em todas as iniciativas que você fizer.

Mais do que publicar um código de conduta, é necessário colocá-lo em prática. Por isso, se o código de conduta da sua comunidade diz que comportamentos discriminatórios e constrangedores não são tolerados, será necessário que você tome as providências necessárias caso algo assim ocorra. Não deixe que o código de conduta seja somente algo decorativo. Busque todos os meios necessários para fazer com que seu grupo seja seguro e inclusivo para todas as pessoas.

Busque apoio de outras organizações

Durante esses 6 anos em comunidade, produzi várias iniciativas tanto presenciais quanto online com a ajuda de diversas pessoas e organizações, incluindo empresas e faculdades. Porém, gostaria de enfatizar que, embora algumas atividades online possam ser realizadas independentemente, as iniciativas presenciais muitas vezes dependem do apoio de empresas e instituições que possam fornecer espaços e recursos como coffee break, por exemplo.

Algumas empresas de tecnologia têm o hábito de receber comunidades para realizar meetups. Nos últimos anos, utilizei auditórios, laboratórios e salas de várias empresas em Brasília e São Paulo para realizar meetups e oficinas das comunidades das quais faço parte. Para isso, é necessário ter uma rede de contatos que possa ajudar a abrir portas para esses eventos. Portanto, é importante exercitar o networking e pedir ajuda para pessoas que trabalham nesses locais.

Se você precisa de um espaço para realizar um evento, pode ser útil publicar um pedido de ajuda no LinkedIn ou Twitter, pedindo indicações de empresas que oferecem esse tipo de apoio para eventos da comunidade. Além disso, é interessante conhecer onde os meetups da sua região costumam acontecer. Conecte-se com esses grupos e veja como as pessoas organizadoras criam esses eventos.

Ao entrar em contato com uma empresa para solicitar apoio para a sua comunidade, é importante ter um material de apresentação pronto. Na SysAdminas, temos um media kit disponível em nosso site, no qual descrevemos o tipo de apoio que buscamos e o que podemos oferecer em troca para as empresas. Por exemplo, podemos buscar apoio para hospedar nossos meetups presenciais, brindes e coffee break, e, em troca, podemos oferecer a divulgação desse apoio nas redes sociais ou até mesmo a divulgação de vagas da empresa para a nossa comunidade.

Mensure o seu impacto

Como já mencionei anteriormente, o trabalho em comunidade é voluntário e, para mim em particular, é parte do meu salário emocional, algo que faço com prazer e que me motiva a continuar na área de tecnologia. No entanto, demorei a entender a importância de medir todo o meu esforço e, por isso, gostaria de destacar a importância desse aspecto.

Recomendo que você busque controlar e medir de alguma forma as atividades que a sua comunidade realiza. Algumas métricas interessantes incluem a quantidade de eventos produzidos, a quantidade de artigos escritos no blog, a quantidade de seguidores nas redes sociais e a quantidade de pessoas que participaram dos seus eventos. Também colete feedbacks das pessoas que participam das suas iniciativas, pois eles sempre podem servir como exemplos reais do impacto do seu grupo.

Para consolidar essas métricas, pode ser interessante criar um relatório de impacto ao final de cada ano. De novo, são métricas simples, mas que podem ajudá-lo a conhecer melhor o seu público, o seu trabalho e o seu impacto no mundo. Não se preocupe em ter grandes números, mas foque em fazer o seu melhor e mensurar o impacto do seu grupo. Essas informações podem ser usadas, por exemplo, para atrair mais apoiadores, sejam empresas ou indivíduos, e também podem servir como referência para aplicar em premiações, por exemplo.

Por fim, esses são os meus principais insights para quem deseja se aventurar na criação de uma comunidade de tecnologia. Se tiver alguma dúvida ou quiser compartilhar alguma contribuição, não hesite em deixar seus comentários neste post.

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Beatriz Oliveira
SysAdminas

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