O que fazer com os homens assediadores?

Tainá Muhringer Tokitaka
tainamt
Published in
5 min readJun 7, 2018
Gerda Taro

Nas últimas semanas, em uma porcentagem maior do que é costumeira, casos de assédio de homens próximos chegaram até mim. Me perguntei: o que fazer com os homens que não são nomes de Hollywood, e sim, que são nossos amigos, irmãos, colegas de trabalho?

Nós os banimos? Os punimos? Como alguém que não acredita numa lógica punitivista para nada na vida, eu, genuinamente perdida, me pergunto o que fazer.

Talvez a pergunta seja equivocada e o que devíamos verdadeiramente questionar é: por que homens abusam? Ou: como impedir que homens continuem a abusar? Mas, seja lá qual a questão que seja levantada, tudo volta, para mim, pro fato de que existem homens abusadores. E eles não são exceção. Não são monstros isolados. Eles são a norma. São nossos amigos, companheiros, pessoas com quem pegamos ônibus, metrô, com quem dividimos grande parte de nosso dia. O que fazer?

Lembro de uma fala do Paris Texas, quando a personagem da Nastassja Kinski tá no telefone e ouve a voz do ex-marido. Demora a reconhecê-la, e, quando finalmente reconhece, diz: “all men has your voice”. All men.

Há uma masculinidade tóxica. A violência contra a mulher é estrutural. A violência contra mulheres é cometida por homens. Na maioria das vezes, conhecidos de nós. O que fazer? Para acabar com a violência contra a mulher, é preciso adereçar a masculinidade tóxica e a existência de homens assediadores enquanto dado endêmico. All men.

Ok. Mas… Como seguir a partir daí?

Tenho mais questões do que respostas. Tenho mais dúvidas do que certeza. E tenho cada dia menos paciência e energia.

Isolar e punir não me parece solucionar nada. Pelo contrário. Um homem vai preso porque bateu, ou cometeu feminicídio. Esse mesmo homem vai para uma cadeia que é estruturada a partir de uma lógica machista. Ele passa por condições subumanas, totalmente isolado da sociedade. Ao sair, o que mudou? Cadeia e reabilitação não cabem na mesma frase. Cadeia não é solução. Para nada. Para ninguém.

Vemos projetos que ainda caminham a passos lentos, que focam na reabilitação de homens que cometeram violência contra a mulher e foram autuados pela lei Maria da Penha. (tem um mini doc da Paula Sacchetta sobre o assunto que pode ser visualizado aqui).

Para além daí, como seguir? Não apenas para homens que cometeram violências e foram acionados judicialmente. Mas para aqueles tantos outros que cometeram violências e, por mil questões de uma sociedade misógina que pune mulheres que ousam falar, continuam suas vidas sem nem pensar no que ocorreu. Ou aqueles que cometem assédios que ficam naquela zona cinzenta, que nos fazem pensar: “foi assédio mesmo? Tô exagerando? Ai, acho que estou ficando louca”. Não está, não estamos.

Numa conversa com um amigo, ele falou da importância das mulheres sentarem e conversarem com os homens. Mas essa lógica também me parece cruel. A responsabilidade cabe a nós, mulheres? Temos nós que nos preocupar em educar os homens? Afinal, é essa nossa vocação, não? Ser mães, não apenas de nossos filhos, mas também de todos os homens. Que triste sina.

Concordo: alguém precisa conversar com os homens. E estamos, tantas de nós, conversando. Gritando nas ruas, pedindo em coro para que parem. Mas e os homens, estão escutando?

Par além de um coro coletivo feminista que ganha com força as ruas, temos, com a graça das Deusas, mulheres que se dispõe a falar com os homens, a ensinarem o caminho da desconstrução. Por elas, sou só admiração. Mas de novo, a responsabilidade é nossa?

E os homens, estão dispostos a refletir? Estão dispostos a falar do assunto com seus amigos? A fazer mudanças estruturais? A parar de nos assediar? De nos matar?

Homens, vocês estão dispostos a parar de ver o feminismo como uma ameaça a vocês e a seus privilégios? A entrarem no debate e se sentirem incomodados e ainda assim, ficarem quietos e escutarem?

Como disse, tenho dúvidas e poucas respostas.

Penso em criarmos homens de forma igualitária. Em criarmos crianças que não precisem responder a uma lógica machista, que não sejam embedadas desde seus primeiros dias em uma masculinidade tóxica que vem amarrada numa fitinha azul e é pendurada em cima do berço assim que um menino nasce. Que não tenham que responder a uma heterossexualidade normativa. Que respeitem mulheres.

Para as futuras gerações, tenho esperanças sinceras.

E para nós?

Enquanto esperamos que não sejamos mortas ou estupradas ou assediadas ou banidas de nossos trabalhos por relatarmos casos de assédio, tenhamos um pensamento positivo. Ou algo assim.

Homens. Escutem.

Escutem de verdade.

Escute mulheres. Somos seres pensantes e não precisamos ser ensinadas sobre o feminismo. Não por vocês.

Pensem. Os assediadores não são os outros. São vocês. E a partir daí, como vocês agem? Como o comportamento de vocês nos afeta? Como mudar?

Entendam-se como parte da estrutura.

Se desconstruam, mesmo com dor. Estejam abertos ao incômodo. A, para variar, falar menos e escutar mais.

Quebrem a brotheiragem. Escutem as mulheres antes de partirem com tanta ansiedade pra defesa de seus amigos.

Não queiram ganhar a toda hora. A discussão e pautada por nós.

E, para mim, o que talvez seja o mais importante: não esperem ser ensinados.

Nós, mulheres (ou pelo menos eu) não queremos gastar nossas energias ensinando cada um de vocês. Estamos ocupadas nos fortalecendo, nos apoiando, criando redes que nos salvam diariamente. Vivendo nossas vidas, para nós, por nós.

Vocês sabem, a informação está aí. Vocês estão buscando-a, ou para vocês, isso é papo de mulher?

Quantas mulheres vocês leem?

Quantas mulheres vocês assistem na TV ou no cinema?

Quantas vocês veem como influenciadoras e verdadeiras fontes de informação?

Quantos dos intelectuais que vocês admiram são mulheres?

Para quem estiver disposto a mudar, recomendo o Canal da Renata Corrêa, o “Como Não ser Um Machista Babaca”. Ela dá a letra. O alfabeto inteiro. Escutem.

Busquem saber mais sobre Djamila Ribeiro.

Leiam o medium da Hell Ravani.

O Canal da Nátaly Neri.

Leiam Rebecca Solnit.

Escutem a Chimamanda.

A lista de mulheres que eu admiro é gigante e não se esgota por aí. Mas, sinceramente? Antes de qualquer coisa, escutem as mulheres em volta de vocês.

E quanto a pergunta inicial: o que fazer com os homens assediadores?

Na verdade, a pergunta me parece outra. O que fazer com os homens?

Quem aí sabe?

Homens, enquanto discutimos, vocês escutam?

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