Revista Tamarina - Redação
Revista Tamarina
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5 min readMar 3, 2021

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Hoje, iremos conversar com Márcio Benjamim, escritor e roteirista, autor de Maldito Sertão, Fome e Agouro.

Márcio Benjamim. Foto de Eliezer Neto.

É um prazer tê-lo aqui conosco. Podemos começar com uma apresentação? Fale-nos um pouco sobre você.

Eu me chamo Márcio Benjamin, sou escritor nordestino, gay e aspirante a roteirista (risos).

De onde ou como surgiu esse interesse pelo terror? Como foi a transição entre ler e ouvir histórias, ou causos, na linguagem mais popular, e passar a propriamente escrever sobre essa temática?

Olhe, eu sou um grande fã do terror e cultura popular desde sempre. Eu tive a honra e o prazer de ter sido neto de uma avó muito mentirosa que me contava altas histórias, que sempre aconteciam ou na casa dela ou próximo, basicamente a essência dos causos escritos por mim hoje. Se bem que na época ainda não havia essa consistência acerca do terror nacional, e daí que vem essa necessidade da representatividade.

Como é o seu processo criativo?

O meu processo criativo é profundamente caótico (risos). Eu trabalho com pedaços de frases, de histórias, meias sem par, camisa furada, arroz sem carne. É daí que surgem as minhas histórias, elas vem do que o povo diz, elas tentam falar da forma que a gente escuta nas feiras, nos cabarés, nos botecos, nas ruas escuras, no calor das estradas do sertão, dos sítios, dos cemitérios…(risos)

Como você vê o cenário literário de horror/, ou ainda, de fantasia brasileiro?

Em profunda ebulição, graças a Baphomet! Acho que apesar dos pesadelos que estamos vivendo com esse absurdo dessa pandemia em um país sem rumo, o mercado está em pleno vapor em todos os seus âmbitos, desde figuras tarimbadas já como César Bravo ou André Vianco, mas também tem uma galera nova incrível como Oscar Nestarez, Cristiano Aguiar, Vitor Abdala, Verena Cavalcante, Paula Febbe, Camila Inojosa, João Paulo Parísio, Rômulo César Melo, André Balaio, Frederico Toscano, Roberto Beltrão, Jaime Azevedo, dentre outros inúmeros incríveis. Eu acho que momentos assim, em verdade, estimulam a criação de histórias que nos levam a fugir da realidade. Talvez esse seja o verdadeiro objetivo do fantástico.

Uma das mais interessantes características da literatura é a constante ressignificação. Podemos sempre atualizar contextos, de forma que a linguagem nunca se esgote. Em seus livros, você abordou tanto o folclore como eventos reais, aos quais deu o seu toque ficcional. Para onde pretende ainda estender esse escopo? Sobre quais fontes ainda pretende desdobrar seu trabalho?

Eita, mulesta! Essa nem eu sei. Acho que eu ando é de olhos e ouvidos abertos pra receber o que essas histórias tenham pra me contar. Principalmente agora em relação ao audiovisual! Fiquem de olho (risos).

Márcio Benjamim com Maldito Sertão em mãos.

Eu trabalho com pedaços de frases, de histórias, meias sem par, camisa furada, arroz sem carne. É daí que surgem as minhas histórias, elas vem do que o povo diz”

Recentemente, um jornal literário conhecido, publicou um artigo que discutia sobre os elementos xenofóbicos, puritanos e racistas do escritor de horror americano H. P. Lovecraft. Isso não é novidade no meio literário. Temos casos, inclusive, de autores “considerados” nacional e internacionalmente, apoiadores de fascistas, etc. Diante dos debates latentes e cada vez mais (necessários) e crescentes, como você se posiciona com relação a essa problemática — entre autor e obra? Há ou deveria haver “cancelamento literário”? (aliás, termo também crescente nas redes sociais)

Acho que pode ser bem mais produtivo se você fazer justamente o contrário, sabe? Conhecer a obra, identificar os pontos absurdos e confrontá-los, discuti-los, saber do que se trata. Simplesmente apagar, queimar autores junto com os livros acho bastante improdutivo e perigoso a longo prazo, tendo em vista a possível perda de controle desse procedimento.

“Maldito sertão”, livro de contos lançado em 2012, foi adaptado para HQ. Durante o processo, como foi a sua participação durante a adaptação? (interferiu no enredo, nas cenas, sugeriu algo)

A intervenção foi literalmente nenhuma, deixei os desenhistas super à vontade para criar da forma que preferissem, até porque confiei muito na equipe e acho que adaptar, como diria Marçal Aquino, é trair!

Quais escritores/obras exercem maior influência no seu trabalho?

Uma ruma! Uma mistura muito doida de Cortázar, Stephen King, Marina Colasanti, Gabo, dentre outros!

Vi em outras entrevistas, assim como nas redes sociais, que você é o autor nordestino da Darkside Books, (importante editora, exclusiva do gênero fantasia/horror) no sentindo de ser o único. Como se deu ou se dá essa relação?

Na verdade falava sim, mas depois descobri que não sou (risos) Temos também o querido baiano Paulo Raviere! Assim, aproveito para corrigir, sou um dos braços nordestinos, mas posso me intitular que sou o representante nordestino gay, o que hoje é sempre importante ressaltar, diante de tantos atos que ainda se expressam pela xenofobia e homofobia, incutida em falas e atitudes. Pelo que me disseram, a minha forma de escrever foi determinante para a escolha e fico muito feliz pois essa é justamente a minha batalha. A luta por esse olhar honesto e confiável por meio dessa forma de escrever como quem fala.

Além de escritor, você é roteirista de web séries. Comente um pouco sobre essa aproximação com o audiovisual. Está produzindo algo agora? Aproveito para estender a pergunta ao campo literário: está com algum livro em mente ou já em processo?

Acho que estamos sempre metidos em projetos (risos). Estou em processo de desenvolvimento da versão em roteiro para longa metragem do meu romance Fome, a partir de um projeto aprovado pela Lei Aldir Blanc é que terá supervisão da grande atriz e roteirista potiguar Alice Carvalho, bem como finalizou-se um roteiro de audiovisual, dessa vez não de terror, que será filmado ainda esse ano, do qual não posso falar muito no momento, mas aguardem carta que está bastante divertido. Estamos também desenvolvendo uma websérie de humor sobre a busca de nosso lugar no mundo. Sobre os livros, esse ano lançaremos a quatro mãos (César Bravo, Verena Cavalcante e Marco de Castro) o meu primeiro livro pela DarkSide o qual terá como tema a comunicação com o além, e é claro que falei de botijas! Lá pelo próximo ano lançaremos meu romance solo ainda com base no sertão e seus malassombros (risos). Em 2021 pretendo ainda lançar de forma independente a continuação do meu livro Fome, o romance Romaria, aprovado na Lei Djalma Maranhão. Atenção empresas potiguares que pagam ISS, vamos dar uma força à cultura local, vocês só vão sair ganhando!

Onde encontrar seus livros?

Todos os meus livros estão disponíveis gratuitamente no Kindle Unlimited, inclusive a versão em inglês do Maldito Sertão (Cursed Badlands) e os físicos comigo, através do insta @oterrordemarciobenjamin, com frete e autógrafo grátis para todos os lugares do Brasil!

Deixe-nos algumas palavras finais.

Agradeço demais a esse convite maravilhoso e deixo o convite para conhecerem e divulgarem o mercado de terror nacional, que anda assustadoramente maravilhoso! Um abraço bem apertado!

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