Ted Mosby, Arquiteto — Episódio I

Beatriz Moreira
TEDx ISTAlameda
Published in
5 min readMar 29, 2018

Escrito por Beatriz Moreira e Inês Mataloto

O leitor mais atento recordar-se-há de que, há algumas semanas, tivemos o prazer de receber os finalistas do Speaker Contest 2018 pessoalmente para efetuar a seleção dos vencedores.

Houve vários momentos marcantes nesse dia, e muitos deles poderiam inspirar histórias e artigos como o que aqui temos. Contudo, decidimos hoje falar acerca dum momento particular, que terá passado despercebido à grande maioria dos presentes. Retornemos, então, ao dia em que recebemos os concorrentes. Lá estavam cinco membros da nossa equipa dispostos numa mesa, com ar austero (e sonolento), para cumprir o seu papel de júri. De cada vez que um concorrente novo chegava, e antes de iniciar a sua apresentação, os júris apresentavam-se. E eis que surge a questão curiosa. Todos os membros do júri e restantes membros da equipa se apresentavam seguindo uma de duas estruturas específica: nome — idade — curso ou apenas nome — curso. Esta estrutura é evolutiva, adaptando-se à passagem do tempo e, eventualmente, culminando em nome — profissão. O leitor recordar-se-à da celebrada eficácia de “Ted Mosby, Arquiteto”. Uma fórmula que, aparentemente, não falha.

Este artigo vai ser legen — wait for it — dary

Após várias apresentações seguindo este molde pré-fabricado, chegou-se à seguinte consideração — “Não é um bocadinho triste que nos apresentemos dizendo apenas aquilo que estudamos?”. Embora isto seja, de todos os fatores do molde, o único que controlamos — dado que o nosso nome e idade são variáveis que não dependem de nós — será a coisa mais importante acerca de nós que temos a apontar a um perfeito estranho? Por outro lado, quando decidimos investir em alternativas a esta estrutura, não chegámos a nenhuma ideia, e antes que déssemos por isso, a estrutura endémica nome — curso havia voltado à carga.

Representação fiel da nossa reação ao molde pré-fabricado

Afinal, mesmo quando nos é dada a oportunidade de falar livremente sobre nós próprios, a pessoa que indubitavelmente melhor conhecemos, temos a tendência de recorrer a uma fórmula genérica, e algo oca. Todos gelamos de terror quando chegamos à parte mais temida das entrevistas de trabalho. Parece-nos até que o entrevistador fala em câmara-lenta, abrindo e fechando lentamente a boca enquanto pronuncia “Fala-me um pouco mais sobre ti”. Pânico. Suores frios.

Como não podia deixar de ser, este problema apresenta ramificações filosóficas (até porque, por esta altura, o amigo leitor já está acostumado ao elevado nível de sabedoria celebrado neste blog). O que é que faz de nós, nós? Como é que podemos ilustrar com palavras aquilo que somos, e que nos torna únicos? Pior ainda, será que todos temos o nível de auto-conhecimento necessário para responder a essa pergunta?

Talvez a pergunta-mestra exija que recuemos um pouco mais. Para percebermos qual o tipo de resposta que podemos dar, abracemos a metafísica: Porque é que tenho de me apresentar?

Tipicamente, as apresentações visam humanizar as conversações, servindo de veículo para que o interlocutor apresentado deixe de ser um estranho absoluto e passe a ter um rótulo — por mais impessoal e vazio de significado que este seja. Não raramente, as apresentações colocam os dois lados de uma conversação em igualdade de circunstâncias, na medida em que todos os envolvidos dão e recebem os mesmos tipos e quantidade de informação. É de notar que o modelo das apresentações é tipicamente ancorado pelo primeiro sujeito que se apresenta — se eu disser o meu nome, idade e cor favorita, é muito provável que aqueles que se apresentarem em seguida destapem o pano que cobre exatamente os mesmos parâmetros da sua individualidade. Assim, as apresentações simples vão um bocadinho além da falta de imaginação, demarcando-se como uma estratégia de defesa pessoal. Não sei quanto ao leitor, mas as autoras deste artigo sentem-se extremamente desconfortáveis quando mantêm conversas com estranhos absolutos por mais de 3 minutos, e desconfiam amplamente daqueles que não partilham nada sobre si no decorrer de um diálogo. É verdade que o facto de o nosso interlocutor se apresentar como “Pedro, estudante de Matemática Aplicada” não invalida que o mesmo seja na verdade um “André, assassino em série”, mas há qualquer coisa de reconfortante para os alarmes das estranhas em cada colheita de informação sobre a identidade alheia.

Quando as apresentações antecedem uma oportunidade em potência, como no caso das entrevistas de emprego, há uma nuance que perturba a estratégia primitiva de defesa: precisamos de nos destacar. O desafio que se coloca é, portanto, encontrar um equilíbrio entre a partilha e a segurança que possa ser concretizado de forma rápida, sintética e atractiva. Neste sentido, uma receita simples e pouco pessoal não se apresenta como a melhor estratégia. Limitar aquilo que cada um é a um conjunto de características gerais é rápido, sintético, mas nada atractivo — e a oportunidade é rapidamente dissipada entre as brechas da nossa muralha defensiva.

Se o leitor precisar de um exemplo mais prático da fragilidade do modelo de apresentações standard, imaginemos que a pessoa X se apresenta como estudante do curso Y. Se voltarmos a referenciar a pessoa X, talvez nos lembremos imediatamente que ela é do curso Y; mas se referenciarmos o curso Y, talvez não nos lembraremos inequivocamente da pessoa X. Se nos queremos destacar e expor algumas das nossas características, que as usemos de forma a que sejam indubitavelmente associadas à nossa personalidade. Assim, talvez seja boa ideia partilhar os pequenos detalhes que, não nos revelando, nos distinguem, porque, sejamos sinceros, nós somos o conjunto das nossas vivências e, numa entrevista de emprego, ninguém quer realmente saber a história da nossa vida.

O momento em que arriscaste tudo

Qual o vosso prato favorito e o prato que não suportam? Qual a vossa palavra favorita? A vossa maior crush? O vosso maior orgulho ou a maior vergonha da vossa vida? A alcunha vergonhosa da adolescência? Partilha aquela curva da vida que deu acidente e resultou numa história cómica. Partilha o dia em que vivenciaste algo tão bonito que choraste de alegria. Ou partilha aquele dia em que ficaste tão triste que podias jurar que estavas no ponto em que a angústia encontra a dor física.

Podes sempre inventar um título, porque não?

Como somos adeptas da filosofia de “Talk the talk, walk the walk”, expusemos estas mesmíssimas questões aos membros da nossa equipa, e pedimos-lhes que lhes respondessem com a maior sinceridade possível. Após alguma insistência por parte das autoras, e alguma boa vontade (queremos acreditar que, no fundo, se tratou de boa vontade) por parte dos inquiridos, apresentamos neste artigo os nosso colegas segundo a fórmula que consideramos de destaque.

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Beatriz Moreira
TEDx ISTAlameda

I’m a Gryffindor with what I believe is a great sense of humour. I automaticallly like a movie or song more if it’s old. I love dogs and swimming pools.