Kazuma Kiryu é o parça que você precisa conhecer

O protagonista de Yakuza é aquele amigão do peito

Ives Aguiar
Telejogo
6 min readOct 9, 2017

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Foi no ano de 2015 em que o conceito de parça popularizado pelo jogador canário com alegria nas pernas, Neymar da Silva Santos Júnior, atingiu níveis estratosféricos de glória.

O termo que é comumente utilizado para indicar aquele indivíduo possuinte de um grau de amizade mais elevado, um parceiro, caiu nas graças do povo brasileiro. Desde então, a ideia abraçada pelo povo vem logo junto ao bramido eufórico do “eh tois”, todos unidos em uma enorme resenha monstra.

É possível contar em uma única mão aqueles merecedores do título de parça nas em mídias que consumimos, desde literatura até a diversão da garotada que são os video games.

Isso porque além de faltarem boas histórias em jogos digitais, a escassez de personagens bem construídos e carismáticos é bem preocupante. Os tempos estão mudando felizmente, surgindo visões artísticas únicas de criadores independentes.

Um dos maiores expoentes de um ótimo enredo, personagens, jogabilidade e talvez sirva como palanque para demonstrar o quão parça alguém pode ser, é a série Yakuza, principalmente o remake do primeiro título: Yakuza Kiwami.

Não é uma produção feita de maneira independente, mas brota de uma época aonde a criatividade na indústria de games ainda reinava nas grandes empresas, nesse caso a SEGA.

Sinto que Kiwami é a concretização da visão do criador e produtor lendário, Toshihiro Nagoshi ( Virtua Racing, Daytona USA, SpikeOut) já que o título original era tecnicamente limitado. Tudo exigia uma tela de loading, atravessar pela cidade exigia bastante paciência, o combate era maçante por se limitar a poucos golpes e não existiam muitas atividades para ocupar o seu tempo entre as missões principais.

A nova versão apara as arestas, colocando mais vida e substância na narrativa que acompanha Kazuma Kiryu, o coletor de débito da família Dojima, em uma jornada para provar sua inocência.

Pertencer a uma organização criminosa é visto como um traço de sua personalidade, é taxado como bandido pelos cidadãos de Kamurucho mas isso nunca é empurrado para quem joga, como um rótulo. Muito pelo contrário, o que Yakuza nos mostra é que os nossos atos são importantes independentes de nossas escolhas, sejam elas profissionais ou não.

Membros da Yamaguchi-gumi, maior organização da Yakuza hoje em dia/Fonte: JEREMY SUTTON-HIBBERT / GETTY IMAGES

Aqueles que estão dentro das hierarquias da Yakuza, se chamam de ninkyō dantai, organizações formadas por cavalheiros, enquanto a polícia e a imprensa japonesa preferem o termo bōryokudan, um grupo violento. É tudo uma questão de perspectiva, já que esses grupos são considerados semi-legítimos uma vez em que a prática de serviços ilícitos não é exercida por todos, existindo casos onde já prestaram auxílio durante os terremotos de Tōhoku em 2011, por exemplo.

Por isso que se o seu trabalho é apenas para recolher débito, isso não o enquadra necessariamente como um meliante. Claro que em algumas ocasiões o uso de força se demonstra necessária e falando em video game, tudo é pretexto para encher uma galera de porrada.

Kiryu abraça o seu ofício mas em nenhum momento deturpa sua personalidade ou carisma. A narrativa principal nos mostra alguém que não está preparado para exercer o papel de uma figura paterna no qual é jogado em seu colo mas não o ignora, fazendo o possível para seguir em frente.

Rodeando essa trama, Kiwami adiciona pequenas sub-histórias para não só injetar vida ao distrito de Kamurocho mas acrescentar uma camada de personalidade ao protagonista. Com isso, ele acaba virando uma espécie de vigilante porradeiro com dez anos de experiência na máfia japonesa nas costas.

Essas pequenas vinhetas são diversas, mostrando que pode ser ingênuo ao ser enganado por um vidente, ou ter que sair na mão com quem tentou embebedar ele para roubar dinheiro ou ir atrás de alguém que foi comer em um restaurante e saiu sem pagar ou ficar de boa enquanto escuta a história de vida de uma mulher que vende caixas de fósforos na rua.

Não foram postas aqui apenas para encher linguiça, são vinte e cinco acontecimentos relevantes enquanto desenvolvimento narrativo. Foram construídas para dar credibilidade ao local e ao protagonista padrão de jogos de mundo aberto repleto de fetch quests.

O holofote não é posto em cima dele, é sempre visto como alguém alheio a situação sempre disposto à ajudar. Seria muito fácil encaixá-lo na mesma fórmula do anti-herói com um coração levemente mole, mas ele não é assim, é um cara firmeza que vai te socar sem pestanejar se você for escroto.

O parça é aquele cara sempre presente que não necessita de laços pré-estabelecidos para te dar aquela mãozinha. Atua como se fosse uma entidade, alguém que vai aceitar cuidar de uma garotinha apenas por ela ser filha de uma pessoa na qual tem muito apreço. Ele não vai ficar com raiva, reclamar, questionar ou ignorar a criança, vai fazer o possível para que fique segura.

Haruka, a criança em questão, serve como uma peça para humanizá-lo. Não que o propósito dela seja apenas para isso, tanto que está presente até o sexto jogo da série, mas está ali para causar uma certa confusão. Kiryu passou dez anos na prisão, muita coisa aconteceu exigindo uma adaptação ao sair e Haruka é fundamental para isso. Cuidar de uma criança, enquanto tenta reconhecer o seu próprio país só que mais desenvolvido tecnologicamente, não é uma tarefa fácil para quem resolve os problemas socando o pessoal.

Isso não é empecilho na verdade, Kiryu é bem resolvido com as suas escolhas. Não demonstra se arrepender de seu ofício, utiliza sua experiência como Yakuza para evitar que os outros se deem mal enquanto tenta ajudar a garotinha no que precisa.

No decorrer de Kiwami, sobre apresentados a um “amigo”: O capitão da família Shimano, Goro Majima. A relação entre os dois, mais aprofundada aqui do que o título original, é a clássica rivalidade entre dois parceiros com aquele leve toque do carisma nipônico. Além dos encontros na narrativa principal, ele vai constantemente aparecendo pelo mapa e te desafiando para lutar, já que acredita que é o único que pode matar Kiryu por causa do quão parças eles são.

só é parça de verdade quem recebe um mata leão dos amigo

Além dos laços entre os dois crescerem nesses encontros, a cada vitória é liberado para o jogador as habilidades do estilo de luta “Dragão de Dojima”, alcunha conhecida de Kiryu que contem os golpes clássicos da série. Embora o pretexto seja o mesmo, Majima querendo lutar apenas pela diversão, existe um esmero em desenvolver o relacionamento deles, mesmo que seja feito de maneira leve.

Colocando o Yakuza de 2005 em perspectiva, a narrativa foca os respeito mutuo entre dois veteranos da mafia japonesa. De um lado tem o gente fina boa praça quase chefe de família, enquanto do outro tem o maluco das ideia, porra louca sem noção. É o perfeito equilíbrio e com Kiwami, as missões do “Majima Everywhere” deixam aparente o conformismo do Dragão de Dojima a cerca da loucura de seu amigo em querer brigar até a morte. Os cenários engraçados, demonstrando a insanidade do mafioso de tapa olho, levam seu carisma aos céus enquanto ajudam na progressão do jogo.

É possível ignorar e até fugir disso, mas é bastante divertido ver até onde a loucura, amizade e o respeito vão. É nítido que o objetivo de Majima é ver o seu amigo de volta a forma antiga, retomar as habilidades que o deixaram conhecido nas ruas. Só quem é parça de verdade bate com taco de beisebol de ferro para ajudar na conquista pessoal.

Se fosse qualquer outro personagem, já teria desistido, partido para outra mas não o porradeiro mais gente fina de Kamurucho. Ele vai escutar uma criança explicar um jogo de cartas envolvendo mulheres seminuas vestidas de insetos até participar de uma luta clandestina escondida debaixo de um parque abandonado, por que ele tá aí para ajudar a galera.

Ele vai socar muita gente, se intrometer dando uma voadora de dois, mas não por que possui má índole, só quer ajudar. É o verdadeiro parça dos jogos digitais, até manda bem no karaokê.

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