TODAS AS 140 MÚSICAS DO NEW ORDER, DA PIOR À MELHOR

Marco Antonio Barbosa
Telhado de Vidro
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33 min readOct 3, 2018
A formação clássica: da esquerda, Morris, Hook, Gillian & Barney

No Lollapalooza 2014, estava tudo certo: eu veria o show do Arcade Fire. A banda canadense faria o encerramento do festival, com um set baseado no então recente álbum Reflektor. Eu já tinha traçado todo o roteiro do dia, para não perder tempo com os (compridos) deslocamentos dentro do autódromo de Interlagos. Passei toda a tarde repetindo a mim mesmo: o show vai ser legal, o disco novo é bom, tá todo mundo elogiando, vai ser massa.

Na hora H, eu desisti do Arcade Fire e fui ver mais um show do New Order. Mais um show do New Order, que se apresentava em outro palco, justo na hora do AF. Sabia que estava fazendo um mau negócio. Mas o Arcade Fire é “apenas” uma boa banda. O New Order é parte da minha vida. Entre meus grupos favoritos, é de longe o que durou — vem durando — mais tempo. O que mais tempo esteve ao meu lado, nos bons e nos maus momentos. O que, analisando os últimos 30 anos, mais me deu alegrias, pelo período mais prolongado. A banda me acompanha desde 1987, o ano em que comecei a ouvir suas músicas na Fluminense FM e em que comprei minha hoje surrada cópia do álbum Low-Life. Como troca-los por um Arcade Fire qualquer?

Minhas quatro cópias de Brotherhood. Vinis: à esquerda, a edição brasileira (com a capa adulterada) e a edição inglesa. CDs: à esquerda, a versão Collector’s Edition dupla, e a edição nacional simples. Obcecado, eu?

Na geração britânica que fez a transição do punk para a multiplicidade de gêneros que floresceu na sequência, o New Order é o nome crucial, o Zelig que testemunhou cada movimento da história. É difícil apontar uma banda do período que tenha uma discografia tão consistente e prestigiada e ao mesmo tempo tão popular. Egressos do Joy Division (o grupo que, junto ao PiL, personifica a essência da passagem do punk ao pós-punk), Barney Sumner, Peter Hook e Stephen Morris não apenas “deram a volta por cima” após o suicídio do vocalista Ian Curtis. No New Order, com a ajuda de Gillian Gilbert (teclados e guitarra), os três expandiram as fronteiras do uso da tecnologia no rock, tornaram-se acessíveis sem se render à obviedade e mantiveram o ethos pós-punk/indie mesmo em seus momentos mais populistas. Foram influência fundamental para o synthpop oitentista, para a geração Madchester e para todo o cenário da dance music das décadas seguintes. E 38 anos depois, acumulam uma penca de hits: canções ousadas e inovadoras, que foram se transformando em legítimos clássicos do pop.

Este ranking com toda a obra do grupo foi inspirado pela recente leitura de Substance: Inside New Order, o livro de memórias de Peter Hook que documenta seus anos com a banda. Reavaliei os discos à luz da narrativa apresentada pelo baixista, que sustenta a seguinte tese: entre 1980 e 1989, o NO progredia artisticamente graças a um método de trabalho tenso, mas democrático. A banda se separou pouco depois do lançamento de Technique; quando se reuniu para gravar Republic, o quarteto passou a ser liderado de facto por Barney, apesar do inconformismo de Hook. Depois de passarem boa parte da década de 1990 cada um no seu canto, voltaram à ativa em 1998 e o vocalista continuou a dar as cartas (sempre sob protestos do baixista). Gravaram mais dois álbuns nesse esquema e afinal, em 2006, Hook deixou a formação, que se dissolveu pela segunda vez. O New Order Mk III, sem o baixista, retomaria os trabalhos em 2011. Claro que o ponto de vista de Hook é parcial. Mas também não dá pra discordar que o melhor da produção do grupo foi feito até 1989.

A lista a seguir inclui todas as músicas lançadas oficialmente pelo New Order, em discos próprios ou coletâneas com outros artistas. Foi elaborada a partir da base de dados do site New Order Online, desta outra lista aqui e de consultas ao livro de Hook. Versões ao vivo só foram consideradas quando não existiam gravações de estúdio para comparação. Existem algumas — poucas — faixas não oficiais circulando por aí na internet ou em piratas; essas não foram consideradas no ranking. Também não entrou “Haystack”, canção de Kevin Hewick lançada em 1980, na qual a banda faz o instrumental e que é creditada a “Kevin Hewick & New Order”.

Ainda é preciso fazer outra ressalva: poucos artistas contam com uma lista tão extensa de versões alternativas de suas obras como o quarteto de Manchester. Quase todos os singles são acompanhados por um caminhão de remixes, edits e dubs. O paroxismo dessa prática é a edição em vinil de Music Complete, mais recente trabalho do grupo, que traz versões estendidas para todas as 11 faixas do disco original. Além disso, a banda tinha, nos anos 1980 e 90, o costume de regravar do zero seus hits: “Ceremony”, “Confusion”, “Blue Monday”, “Temptation”, “True Faith”, “Run” e “1963” são algumas das músicas que passaram pelo tratamento. Exceto quando discriminado especificamente no texto, as versões analisadas foram as gravações originais, em LP ou single.

(Ah, sim: o show do Lolla 2014 — o terceiro deles que vi — foi bem meia-boca. Eu já sabia que seria.)

140. “Rocking Carol” — Canção natalina (!) registrada para um flexidisc lançado no Natal de 1982. Nada além de uma curiosidade, provavelmente feita para testar os sintetizadores recém-adquiridos pela banda na época.

139. “Ode to Joy” — (Per)versão bisonha da “Ode à Alegria”, incluída no mesmo flexidisc que trazia “Rocking Carol”. O vocoder dá um tom ominoso e nada natalino à reinterpretação.

138. “Sputnik” — Tema instrumental curto composto para a trilha do filme Salvation. Notável pelo emprego da percussão “humana” que acompanha as climáticas texturas de sintetizador.

137. “Theme “— Também conhecida como “Be Music Theme” ou “Homage a la MGM”, esta música zoada, quase punk, é mais uma raridade. Só apareceu em coletâneas da Factory que hoje estão fora de catálogo.

136. “Vicious Circle” — O New Order influenciou os produtores de dance music que despontaram a partir da metade dos anos 1980. Estes, por sua vez, influenciaram o New Order de 1993. Esse deve ser o “círculo vicioso” ao qual o título alude.

135. “Salvation Theme” — Simples e repetitiva, é outra faixa composta para o longa Salvation. O que “salva” a música é a marcante linha de baixo.

134. “Chemical” — Em Technique, o New Order capturou no flagra o espírito e a sonoridade das raves e reinterpretou todo o cenário a seu modo, com sucesso. Quatro anos depois, ao lançar Republic, o quarteto já estava alguns passos atrás dos demais competidores. Isso fica claro nesta faixa — um som “moderno” para a época, que hoje mais parece uma sobra do Technotronic.

133. “Spooky” — Mais fraco dos singles extraídos de Republic. Os únicos elementos característicos são a voz de Barney e algumas esparsas intervenções de Hook. Tirante isso, é apenas pop eletrônico genérico dos early 90’s.

132. “Such a Good Thing” — Apesar de ser sido gravada em 2001, esta aqui parece uma sobra dos tempos de Brotherhood. Acabou enterrada no lado B de uma das várias reedições do single “World in Motion”.

131. “Young Offender” — Farofa pura, uma das passagens mais irrelevantes de Republic.

130. “The Happy One” — Este instrumental simplório e fofinho poderia ter se transformado em uma canção de verdade com um pouco mais de esforço. Não fosse pela linha de baixo, pareceria com uma demo pré-programada de Casiotone. Foi lançado exclusivamente em uma coletânea francesa, “quebrado” em vários trechinhos; a versão integral é encontrável via Soulseek.

129. “Academic” — Com o passar dos anos, o método de trabalho do NO mudou. Se na década de 1980 as composições surgiam a partir de experimentos sonoros conjuntos, na produção mais recente eles tomaram o caminho inverso: primeiro escrevem letra e melodia, quase sempre a cargo de Barney, depois pensam no arranjo. Esta faixa de Music Complete é um exemplo do approach mais conservador.

128. “Jetstream”— Mais uma de Waiting for the Sirens’ Call na qual a banda, sob as ordens de Barney, trocou seu som característico por uma modernidade descartável. A participação de Ana Matronic (cantora do Scissor Sisters) é só um truque barato que torna a música ainda mais impessoal.

127. “I’ve Got a Feeling” — Em 2013, o grupo lançou Lost Sirens, disco que reunia sobras das gravações de Waiting for the Sirens’ Call. Esta faixa, um britpop bem genericão, é a mais burocrática do lote e merecia ficar mesmo na gaveta.

126. “Special” — Esta canção soava moderníssima em 1993. Hoje, com seu loop de bateria e seu baixo sintetizado no lugar de Hook, evidencia como boa parte de Republic envelheceu mal. A letra parecia uma carta de despedida de Barney para os outros três (“Stop saying that you’re calling time / Look at your life before you start on mine / I’m not the kind of person that you need / I’m sick of trying / I mean that it’s over”). Os quatro só voltariam a se reunir em 1998.

125. “Tutti Frutti” — Para compensar a voz cansada de Barney, a banda convocou Elly Jackson, do La Roux, para os backings. Não é o suficiente para resgatar este pouco imaginativo synthpop da vala comum.

124. “Liar” — Peter Hook afirmou que considera Republic “um disco do Electronic, e não do New Order”. Talvez esta faixa seja o exemplo mais óbvio do que ele queria dizer.

123. “I Told You So” — Sofre do mesmo mal de várias faixas de Get Ready: instrumental interessante casado a uma melodia vocal que não vai a lugar algum. A levada saltitante lembra um pouco o Ace of Base (!) e o backing feminino soa deslocado.

122. “Restless” — Apesar do título, não se trata de uma canção inquieta. Pelo contrário: é um roquinho bem acomodado da fase mais recente, que tenta recuperar a sonoridade vintage ao clonar o estilo do baixo de Hook.

121. “Close Range” — Outra das várias canções pouco inspiradas de Get Ready.

120. “Exit” — Instrumental curtinho da trilha de Control. Mera curiosidade.

119. “Stray Dog” — Um dos heróis do grupo desde os tempos do Joy Division, Iggy Pop é o vocalista convidado nesta aqui. Sua participação — declamada, não cantada — sai pela culatra. Sem a voz de Barney, não sobra coisa alguma que identifique a canção como uma obra do New Order.

118. “Times Change” — Barney colaborou com Neil Tennant, dos Pet Shop Boys, em seu projeto paralelo Electronic. Deve ter passado tempo demais com o cara. De influenciador, passou a ser o influenciado. Como explicar de outra forma o vocal (falado, bem ao estilo de Tennant) desta canção de Republic?

117. “The Game” — Faixa mediana do mais recente disco de estúdio. Começa 100% eletrônica e ganha um pique extra quando as guitarras entram.

116. “People on the High Line” — O mais intrigante nesta canção fraquinha de Music Complete é o resgate da influência da house farofa do começo dos anos 1990: um beat saltitante e um pianão sapeca, que remete aos tempos de Republic.

115. “Vicious Streak” — Delicada e pouco memorável faixa eletrônica de Get Ready.

114. “Hellbent” — Lançada em 2011 na coletânea Total, acabou incluída também em Lost Sirens. Não chega a se destacar na produção recente do grupo.

113. “Plastic” — Aceno tardio ao synthpop de outrora, incluído em Music Complete. Mais uma vez, os backing femininos no refrão soam deslocados.

112. “Turn the Heater On” —Relatos dão conta de que esta canção de Keith Hudson era uma das favoritas de Ian Curtis. Registrada em uma sessão para a BBC Radio 1, a versão transforma o reggae macio da gravação original em um dub espectral. Barney soa desafinado e hesitante.

111. “Singularity” — Espécie de cruzamento de goth-rock com dance music. Não dá muita liga.

110. “I’ll Stay with You” — Tentativa explícita de recuperar o pique da época de Brotherhood. Funcionaria melhor com uma melodia mais inspirada.

109. “Working Overtime” — Estranha tentativa de fazer um rockão num estilo meio Britpop… com uns 10 anos de atraso. A empolgação soa verdadeira, ao menos.

108. “Too Late” — Uma das faixas perdidas da época de transição (1982–83), sobreviveu apenas em um registro de uma sessão gravada para a BBC. Um tanto desajeitada, ainda assim tem seu charme tosco.

107. “Who’s Joe?” — Introdução, arranjo e harmonia interessantes atrapalhados por um refrão maçante. Soa preguiçosa, como quase todo o repertório de Waiting for the Sirens’ Call.

106. “Unlearn this Hatred” — “Two steps forward, one step back”, canta Barney. O passo atrás é evidente na melodia vocal, que lembra algumas das coisas que a banda fez nos anos 80.

105. “Shake it Up” — Animadinha (até demais para o meu gosto), esta faixa de Lost Sirens buscar atualizar o estilo dançante da fase Technique.

104. “Get Out”— Composição instrumental da trilha sonora de Control. Não por acaso, remete ao Joy Division; o piano quebra o clima tenebroso.

103. “MTO” — B-side produzido na época de Technique, talvez seja o mais perto que eles chegaram de fazer uma faixa 100% acid house.

102. “Someone Like You” — Aqui a banda se arrisca em uma modernização do som mais cru do começo de carreira, com um resultado esquizofrênico. A longa introdução é bem interessante, em clima de pós-punk eletrônico. Entretanto, assim que Barney começa a cantar, o negócio começa a ficar estranho… quando chega o refrão, aditivado por backing vocais femininos fazendo “uh-uh-uuuuh”, aí desanda tudo mesmo.

101. “Californian Grass” — O mais interessante nesta lesada faixa lançada em 2013 é ouvir Barney cantando em um registro mais grave que o habitual.

100. “Rock the Shack” — Rock (dã) incluído em Get Ready, que ganha graça extra com a participação de Bobby Gillespie. Tem um longo solo de guitarra (longo pros padrões da banda, né) encharcado de wah-wah, uma raridade.

99. “Morning Night and Day” — Apesar da empolgante levada eletrônica, sofre do mesmo mal que acomete boa parte da obra da banda neste século: tem uma estrutura previsível e pouco imaginativa.

98. “Recoil” — Uma das surpresas de Lost Sirens. Investe em uma sonoridade quase toda “humana”, com um arranjo sutil e esparso. Barney canta com vontade.

97. “Nothing but a Fool” — Momento interessante de Music Complete. Interrompe a sequência de arranjos eletrônicos genéricos com uma sonoridade mais acústica e boas alternâncias de clima.

96. “Sabotage” — Não chega a ser uma obra-prima, mas é melhor que várias faixas de Get Ready. No entanto, acabou relegada ao status de lado B do single de “60 Miles an Hour”.

95. “Sugarcane”— Uma das que se salvam em Lost Sirens. A letra é besta, mas a melodia é bacaninha.

94. “Hypnosis” — Adequadamente hipnótico tema instrumental da trilha sonora de Control.

93. “Hey Now What You Doing” — Bem típica do som que a banda aperfeiçoou a partir de Get Ready, é uma das mais genéricas do álbum Waiting for the Sirens’ Call: “certinha” demais, com um refrão mediano e solinhos de guitarra idem, tudo em seu lugar.

92. “Skullcrusher” — Melhor instrumental composto pela banda para o filme Salvation, traz uma sonoridade pós-punk, conduzida de forma cavalar pelo baixo de Hook, e proeminentes guitarras distorcidas.

91. “Dracula’s Castle” — Nesta aqui, também de Waiting for the Sirens’ Call, a banda ao menos passa a impressão de estar se esforçando. A letra é um besteirol, compensado por uma melodia redonda. Os timbres eletrônicos remetem aos bons tempos e, vejam só, dá pra ouvir o baixo de Hook aqui e ali.

90. “World in Motion” — O único single da banda a atingir o número 1 da parada inglesa. Por ironia, também foi o último lançamento do NO pela Factory (FAC 293). Concebida como tema da seleção inglesa de futebol para a Copa do Mundo de 1990, a faixa foi creditada como “England New Order”, por conta da participação de jogadores do escrete britânico (John Barnes, Paul Gascoigne e outros). Musicalmente, é uma progressão do lado mais eletrônico de Technique só que bem mais farofada, com forte influência da ítalo-house.

89. “Transmission” — Uma das músicas do Joy Division que a banda passou a tocar com frequência a partir de 1999. Uma versão bem fiel consta do álbum Live at Bestival 2012, com direito a uns tropeços na letra.

88. “Isolation” — A partir do fim dos anos 1990, este clássico do Joy Division passou a frequentar os setlists do New Order. O novo arranjo, mais cadenciado e de clima menos claustrofóbico que o original, foi eternizado no álbum In Session. Ainda há uma versão ao vivo no disco Live at Bestival 2012, já sem Hook.

87. “New Dawn Fades” — O New Order regravou esta canção do Joy Division para a trilha do filme Control. A versão soa bem mais convencional que a original, sem os truques atmosféricos da produção de Martin Hannett. Nos vocais, o convidado Moby se esforça — talvez um pouco demais — para incorporar o fantasma de Ian.

86.“Love Will Tear Us Apart” — Dois álbuns ao vivo (Live at the London Troxy e Live at Bestival 2012) trazem versões do maior hit do Joy Division. Assim como nas outras recriações, o tom é de reverência… se descontarmos os incongruentes “COME ON!” berrados por Barney.

85. “Brutal” — Composta para a trilha sonora de A Praia, a canção saiu em 2000. Foi a primeira faixa lançada pela banda depois da reunião. Com guitarras distorcidas em destaque, antecipava o som que a banda perseguiria em Get Ready.

84. “Vietnam” — Esta canção de Jimmy Cliff foi regravada para uma coletânea produzida pela ONG War Child, em prol das vítimas da guerra do Iraque. (Curioso: os dois únicos covers que o grupo gravou em estúdio são de artistas de reggae.) A letra, que fala de um soldado americano no Vietnam que escreve uma carta para casa, pode ter inspirado os versos de “Love Vigilantes”.

83. “Here To Stay” — Faixa produzida pelos Chemical Brothers para a trilha sonora de A Festa Nunca Termina, o filme sobre a Factory. O encontro entre os inovadores da eletrônica de duas gerações distintas é um tanto frustrante. O som é genérico (com o baixo soterrado na mixagem) e a melodia também. Mas o refrão é legal.

82. “Slow Jam” — Rock pesado com uma sonoridade distorcida e atípica e uma melodia pouco imaginativa. Pode ser compreendida como precursora do som que Barney faria na banda Bad Lieutenant.

81. “Sister Ray” — O famoso cover do cover: o JD tocava este clássico do Velvet Underground ao vivo, e o NO passou a toca-lo também nos anos 1980. Rolou até nos sets da primeira turnê no Brasil. Na versão gravada no álbum BBC Radio 1 Live in Concert. Barney improvisa 99,74% da letra. De onde ele tirou “Sister Ray says I love you”?!

80. “Run Wild” — Uma das poucas canções na história da banda a dar destaque ao violão. Uma das mais simpáticas de Get Ready.

79. “Superheated” — O arranjo synthpop genérico não chega a atrapalhar a simples e cativante melodia, a melhor de Music Complete. Conta com a participação de Brendon Flowers (The Killers).

78. “Ruined in a Day”— Uma bela canção que envelheceu meio mal, graças ao desespero da banda na época (1993) por soar “contemporânea”. O arranjo é decalcado do estilo do Soul II Soul e o baixo de Hook é trocado por um brochante synth bass. O clipe é engraçado.

77. “Mesh” — Lançada em 1981, antecipava as aventuras dançantes dos anos seguintes com uma batida quase disco (apesar da linha de baixo bem gótica). Última faixa deles produzida por Martin Hannett.

76. “Denial” — Um bom groove de guitarra — quase funkeado! — acompanha uma performance incansável de Morris. Era a época em que Barney ainda se esforçava para clonar o estilo de Ian.

76. “The Peter Saville Show Soundtrack” — Instrumental de 30 minutos de duração produzido em 2003 para acompanhar uma exposição de obras de Peter Saville, o designer da Factory. Melódico e atmosférico, o trabalho foi creditado ao New Order, apesar de só contar com a presença de Hook, Morris e Phil Cunningham. Lançado em uma edição limitada de 3.000 CDs, o disco hoje tem status de raridade.

75. “In A Lonely Place” — Saiu no lado B do single de “Ceremony” e, como o lado A, era uma música do Joy Division reciclada. Desolada, minimal e fúnebre, é o ponto mais dark da discografia da banda: um epitáfio metafórico para o finado Ian.

74. “Player in the League” — O B-side de “Here to Stay” é melhor que o lado A. Mostrava o grupo em forma, com uma melodia caprichada e bom equilíbrio entre guitarras e eletrônica. Merecia ser mais conhecida.

73. “Primitive Notion” — Uma faixa roots deslocada em Get Ready, com uma boa dobradinha entre Hook & Morris. Na letra, Barney manda um desafio aos que o acusavam de ser o “ditador” da banda (leia-se: Hook): “And I’d like to say to those who accuse me / Could you do it while you looked in my eye / If you hold on primitive notion / And if you think you’d like to try / You can drink this magic potion / And you can do it ’til the day that you the day that you die”.

72. “Atmosphere” — Duas versões (uma para a BBC, outra ao vivo em Reading, 1998) foram gravadas pelo New Order, ambas bem reverentes à original.

71. “Video 586” — Raridade dos primeiros anos, este instrumental de 22 minutos foi lançado em 1982 e resgatado como single em 1997. Mostra os primeiros experimentos eletrônicos que iriam desaguar em “Ultraviolence” e “Blue Monday”.

70. “Ecstasy” — Falta a esta faixa de Power, Corruption & Lies a inspiração do resto do álbum. O uso do vocoder sugere que a banda estava meio de brincadeira quando a gravou.

69. “The Him” — Óbvio resquício dos tempos de Joy Division, retrabalhado com uma dose a mais de energia. Morris é o destaque.

68. “Chosen Time” — O momento mais dançante de Movement, já prenunciava (em sua linha de baixo) as ideias que dariam na gênese de “Blue Monday”.

67. “Ultraviolence” — Da mesma safra de “Blue Monday” e “586”, esta canção soava mais sombria, remanescente de Unknown Pleasures. Uma combinação de bateria humana tratada e percussão eletrônica dá impulso ao arranjo.

66. “Senses” — Joy Division + Giorgio Moroder. O quarteto tateava na fronteira entre o pós-punk e a eletrônica dançante, e no fim das contas o clima sombrio acabou sobressaindo.

65. “Vanishing Point” — Muito característica da fase Technique, é a menos memorável do disco. O que não quer dizer que seja ruim. O refrão é joia e o arranjo também.

64. “Turn” — Seu refrão é um dos melhores de Waiting for the Sirens’ Call. Problema é que, com os vocais mixados à frente, fica clara a banalidade da letra (“The days turned into months and years / I can’t forget that you were here / I feel your presence everywhere / In the corner over there”).

63. “Behind Closed Doors” — Lado B do single de “Crystal”. Insere um toque de mistério e sutileza no som mais convencional que a banda fazia na época, sem deixar de soar dançante. Outra que deveria ter sido incluída em Get Ready.

62. “ICB” — Esta canção de Movement é uma sobra dos tempos do Joy Division e isso fica evidente na batida tribal, na agressiva linha de baixo e no vocal grave e flat. Bizarros efeitos de sintetizador e ecos fantasmagóricos indicam que Martin Hannett passou um bom tempo marretando a faixa antes de se dar por satisfeito.

61. “Doubts Even Here” — Cantada por Hook, esta faixa é a mais funérea do primeiro álbum. A voz feminina no fim é de Gillian, lendo o Pai Nosso (em inglês, óbvio), complementando o crescendo apocalíptico da bateria. É uma das poucas músicas do NO na qual pode se ouvir a voz da tecladista.

60. “Avalanche”— Momento mais intrigante de Republic, o quase-instrumental fechava o álbum em uma nota tristonha. Soa bem melhor que as músicas “modernas” que dominam o disco.

59. “Truth”— Um dos pontos altos do disco de estreia. A banda ainda estava aprendendo a combinar a eletrônica com os instrumentos “humanos”; a batida eletrônica e os sintetizadores de timbre sinistro se fundem à massa de guitarras e ao vocal monótono, tudo entrecortado por uma igualmente sinistra melodia tocada à escaleta. “Sufocante” é uma boa descrição.

58. “Cries and Whispers” — Aqui, é como se o New Order reanimasse o cadáver do JD e o pusesse pra dançar. Barney ainda tinha vergonha de cantar pra fora, mas isso não atrapalha o resultado. Muita gente conhece-a, por engano, como “Mesh”; a culpa é da edição original de Substance em CD, que creditou a canção erradamente em sua capa.

57. “Shellshock” — Da coleção de singles lançados entre 1981 e 1987, compilada em Substance, este é o que considero mais fraco. Só em comparação com os outros, claro. Não deixa de ser um exemplo muito característico da força da banda em seu auge criativo — vintage New Order. O refrão é um dos mais assertivos da carreira do grupo.

56. “Dream Attack” — Uma faixa de Technique que poderia estar no lado A de Brotherhood. Encerrava o disco (e também a primeira fase da carreira do grupo) com uma bela e alongada coda instrumental.

55. “Best & Marsh” — Esta faixa foi criada para um programa de TV homônimo estrelado pelos jogadores de futebol George Best e Rodney Marsh. Seu caráter, digamos, “utilitário” é óbvio. Mesmo assim, o tema instrumental destila, de forma elegante, tudo de bom que o quarteto tinha a oferecer: uma bela melodia, uma batida dançante, o equilíbrio entre eletrônica e acústica.

54. “Turn My Way” — Uma das faixas mais legais de Get Ready. Fãzoca assumido, Billy Corgan dá uma canja de voz & guitarra. Em suas memórias, Hook conta que o líder dos Smashing Pumpkins registrou um longo e inspirado solo para fechar a canção… mas o engenheiro de som apagou a gravação. Corgan quase bateu no cara.

53. “We All Stand”— Momento mais soturno do segundo álbum, exibia influências de dub em sua ambiência esparsa e cheia de eco.

52. “World (The Price of Love)” — Para mim, esta faixa de Republic, lançada como single, representa o ponto em que o New Order perdeu de vez a vergonha de soar comercial. Sim, eles já tinham lançado canções abertamente pop antes, só que sempre com um toque idiossincrático, irônico. Depois de conhecer o topo das paradas com “True Faith”, “World in Motion” e o Electronic, Barney (que na época era quem dava as cartas) deve ter tomado gosto pela coisa. Ainda assim, é um das músicas mais memoráveis daquele período, com um refrão gloriosamente populista.

51. “Touched by the Hand of God” — Óbvia tentativa de seguir no molde sugerido por “True Faith”. Os stabs de sintetizador imitando cordas e os tecladinhos bem à la Miami bass soam muuuuuuito datados, de um modo que parece até engraçado hoje. O vídeo, por outro lado, é engraçado de propósito.

50.“Waiting For The Sirens’ Call” — Simples, evocativa do som mais orgânico da fase Brotherhood, tem uma linda melodia e uma daquelas linhas de baixo que definem o som do grupo (uma das últimas gravadas por Hook). Barney já afirmou que é sua música favorita do New Order.

49. “Everyone Everywhere” — Pequena pérola escondida entre as farofices de Republic. A canção resiste bem, mesmo sob os timbres típicos da época que soam um tanto antiquados hoje.

48. “Sunrise” — Rockão que encerrava o primeiro lado de Low-Life. Depois de uma intro sombria com teclados, Hook solta os cachorros no baixão de seis cordas e a turma vem toda atrás, com Barney se esgoelando de forma inédita até então.

47. “Lonesome Tonight” — Uma (gasp!) balada romântica cantada com palpável sinceridade, construída sobre meros dois acordes. Bem no meio do belo trecho instrumental que fecha a canção, Barney finge dar uma cusparada no microfone (mais ou menos aos 4:00).

46. “The Village” — A sombra de Ian não pairava mais sobre a banda, a mão de ferro de Martin Hannett na produção não pesava mais, e os caras estavam bem mais descontraídos e seguros. Essa saltitante canção de 1983 prosseguia no mesmo mood de “Temptation”, iluminando o lado A de Power, Corruption & Lies.

45. “Broken Promise” — Reciclagem descarada do riff de baixo de “Isolation”. É a faixa mais agressiva de Brotherhood, marcada por um tresloucado solo de Barney.

44. “Face Up” — O encerramento eufórico de Low-Life também remetia ao pique de “Temptation”. “Can you see your own dark face? / It’s dying in a lonely place”, canta Barney, num recado direto a quem questionava a guinada do quarteto rumo à luz.

43. “All Day Long” — Exemplo típico de uma fase (1986) na qual as canções eram longas de um modo natural, sem que parecessem esticadas desnecessariamente. Exuberantes timbres de sintetizador emprestam uma beleza quase sinfônica às passagens instrumentais; a letra, cantada de forma quase sussurrada, fala de abuso infantil e outras violências.

42. “Every Little Counts” — A mais delicada das canções da banda é também uma das mais zoadas. Barney começa a cantar e começa a rir, diante da bobajada na letra (“I think you are a pig / You should be in a zoo”). O tropeço foi parar no disco e deixou alguns fãs um tanto indignados. O encerramento é apoteótico, mais ainda para quem ouve a canção no vinil.

41. “This Time of Night” — Esta faixa de Low-Life não é um grande hit. Entretanto, sintetiza de forma cristalina o som que o NO fazia naquele período, com um equilíbrio exato entre melancolia (reforçada pela frágil interpretação vocal) e o apelo dançante.

40. “586”— Mais uma saída dos experimentos que gerariam “Blue Monday”. É composta na verdade de duas músicas, “586 Intro” (o instrumental que vai até 1:50) e a “586” propriamente dita. Um erro na prensagem original de Power, Corruption & Lies juntou as duas, o que nunca foi corrigido nas edições posteriores. Com estilo inimitável, a banda abraçava a dance music a seu modo, sem abandonar a idiossincrasia pós-punk.

39. “Weirdo” — Muito característica do som “rock” de Brotherhood, é uma das performances mais sólidas e diretas da carreira do grupo. Hook manda ver na coda instrumental.

38. “State of the Nation” — O mais perto que o NO chegou de fazer uma música de protesto: “Yes, it’s the state of the nation / That’s holding our salvation / Oh, the state of the nation / Is causing deprivation”. O elaborado arranjo não economiza no arsenal de synths e drum machines, reunidos metodicamente ao baixo e à guitarra.

37. “Fine Time” — Em Ibiza para (tentar) gravar as canções que comporiam Technique, o quarteto caiu de boca nas tentações do “verão do amor” de 1988: leia-se ecstasy & acid house. Uma noitada interminável que rendeu a faixa de abertura do disco, um aceno direto ao som das raves. A partir dali, a banda passaria a incorporar cada vez mais a influência da dance music feita naquele período, de forma nem sempre feliz (leia-se: boa parte de Republic).

36. “Thieves Like Us” — Seria a primeira canção sinceramente romântica feita pelo grupo? Decerto, até aquele momento (abril de 1984) Barney nunca tinha cantado de modo tão extrovertido, nem havia escrito uma letra tão direta. Lânguido, sem pressa, o arranjo é descortinado aos poucos: a precisa batida, o interplay entre o baixo sintetizado e a participação ao vivo de Hook, as camadas de teclados. Clássico.

35. “All The Way” — Faixa de Technique que remete ao estilo mais acústico e roqueiro de Brotherhood, ajudava no contraponto aos momentos eletrônicos.

34. “Krafty” — O futuro vai dizer, mas acredito que a música de trabalho de Waiting for the Sirens’ Call será lembrada como o último grande single do New Order. Uma melodia simples e animada, coroada por um refrão digno dos bons tempos de 1985–6, intervenções eletrônicas sutis e certeiras, o inimitável Hook ainda marcando presença… Nunca mais?

33. “Procession” — Excelente faixa de 1981 que, apesar de ter sido lançada como single, ficou obscura na discografia do grupo. (A gravação original de “Everything’s Gone Green” vinha no lado B; a música tornou-se um clássico apenas quando saiu em versão estendida.) Traz uma versão acelerada e mais “pra cima” do som burilado em Movement, com uma rara peculiaridade: Gillian faz backing vocals. É tão pouco conhecida que, quando a banda repassou toda sua produção para organizar a caixa Retro, em 2003, Barney alegou que não lembrava de tê-la gravado.

32. “Crystal” — O single que marcou a volta definitiva em 2001 foi uma escolha acertada: é uma das faixas mais fortes de Get Ready e ganhou status instantâneo de clássico. Uma daquelas gravações “com sangue nos olhos”, tornou-se obrigatória em todos os shows do grupo dali em diante.

32. “Murder” — Gravada nas mesmas sessões de Power, Corruption & Lies, esta instrumental recolocava a banda em modo pós-punk total. Bateria cavalar e guitarras agressivas não dão trégua, enquanto samples de diálogos de 2001 e Calígula (“Crows, crows, crows, I hate them! / Crawl across!”) ajudam a tornar o clima ainda mais opressivo.

31. “Round and Round” — Brilhante single de Technique. Mostrava como o grupo foi capaz de atualizar seu som, com um ouvido na evolução da tecnologia (foi composta e sequenciada em um Prophet 5, sintetizador moderníssimo da época) e outro nas tendências correntes da dance music. Mesmo hoje soa fresquinha, muito por conta da beleza da melodia.

30. “Guilty Partner” — Todo mundo lembra de Technique como o “disco acid house” do New Order, mas cinco das nove faixas do disco são essencialmente acústicas/roqueiras. Esta aqui é uma das melhores, com um vocal muito expressivo de Barney — melancólico nas estrofes, agressivo e rancoroso no refrão.

29. “Leave Me Alone” — Belíssima passagem do segundo álbum. É conduzida por uma guitarra serpenteante que introduz um vocal solene e melancólico, coerente com a letra triste (“For these last few days / Leave me alone”). Uma das favoritas de Peter Hook.

28. “Let’s Go” — Minha candidata ao posto de “o clássico do New Order que ninguém conhece”. Composta como um instrumental para a trilha do filme Salvation, ganhou uma versão com vocais que pode ser ouvida apenas no disco-bônus da caixa Retro. Cantada, poderia ter entrado em qualquer um dos discos da fase áurea do grupo; a instrumental permite apreciar com mais clareza o empolgante duelo entre baixo e guitarra.

27. “Love Less” — Delicada faixa acústica do lado A de Technique. A doçura infinita da melodia e do arranjo combina bem com o canto resignado de Barney, direcionado a uma pessoa ingrata (“I worked hard / To give you all the things that you need / And almost anything that you see / I spent a lifetime working on you /And you won’t even talk to me”). Seria um amor antigo? Algum companheiro de banda? Hmmmm…

26. “Confusion”— Marco importante na evolução da banda. Composta e produzida em parceria com Arthur Baker, a faixa mostra o NO imerso na cena eletro/hip hop novaiorquina e foi a primeira música da banda a ser composta com um parceiro externo e a primeira a ser gravada fora da Inglaterra. Progressão da “eletronização” ouvida em “Blue Monday”, também é notável por ter duas linhas de baixo distintas (uma tocada por Barney, pela primeira e única vez) e… Hook tocando guitarra! (também pela única vez na história do grupo). “The past is your present, the future is mine”, diz a letra… com toda a razão.

25. “Mr. Disco” — A melhor faixa eletrônica de Technique demonstra como o quarteto modernizou seu som e manteve a personalidade. Conta com um arranjo magnífico, cheio de detalhezinhos e firulas (stabs sintetizados, várias camadas de percussão eletrônica combinadas à bateria de Morris). Mas em sua essência, é mais uma daquelas simples, belas e melancólicas melodias tão características da obra do grupo.

24. “Love Vigilantes” — Morris faz POW!POW!POW!POW! na caixa, Barney solta a escaleta (pã-pãa-rã-pã-pã-pã-pã-rã-rã…) e assim começava o terceiro disco do New Order. A abertura de Low-Life é uma eterna favorita popular, apesar de não ter sido lançada como single. A letra é uma das melhores da banda e, como em várias outras canções, contrapõe versos sombrios a uma sonoridade animada. Conta a história de um soldado que retorna para casa vindo da guerra e descobre que tinha sido dado como morto. O cara volta mesmo… ou é apenas seu fantasma?

23. “Your Silent Face” — Ao mesmo tempo em que explorava as possibilidades da eletrônica para fazer música dançante, o quarteto também se interessava por ambiências sintetizadas mais sutis e evocativas. Inspirada pelo Kraftwerk da fase Trans-Europe Express, essa magnífica balada eletrônica prenunciava, em sua aparente simplicidade, faixas mais elaboradas como “All Day Long”.

22. “Age of Consent” — Segundo Hook, esta é a melhor linha de baixo que ele já fez. Escolha difícil, mas 100% justa. Sinalizava, logo na abertura do segundo álbum, que o passado sombrio ficara para trás e que o futuro era mais dinâmico e iluminado. Barney se esbalda nos vocais e Morris assinala uma de suas melhores atuações. O pique da versão original é tão acelerado que, a julgar pelas gravações da música ao vivo, a banda nunca conseguiu reproduzi-lo de novo no palco.

21. “Everything’s Gone Green” — Outro marco histórico: a primeira gravação do New Order a usar sintetizadores “pulsantes” e misturar bateria humana e eletrônica. Os vocais de Barney ainda carregavam a influência de Ian Curtis, mas o som sem dúvida mudara: mais esparso, desconstruído e mais dançante. Primeiro single da “santíssima trindade eletrônica” (o termo é de Hook) que consolidaria o som próprio da banda; seis meses depois, em maio de 1982, eles lançariam “Temptation” e, em março de 1983, viria “Blue Monday”.

20. “Run” — Uma das mais belas criações “acústicas” da banda. Tudo soa magnífico: voz, guitarras, baixo e synths constroem uma detalhada barragem de som que instila uma sensação reconfortante no ouvinte. Só que os advogados do cantor John Denver não se comoveram e processaram o grupo por ter plagiado a canção “Leaving on a Jet Plane” para criar “Run”. Bem, ouvindo a música de Denver, nota-se uma semelhança entre trechos da melodia vocal e o primeiro solinho de guitarra da música do NO. O caso foi resolvido num acordo extrajudicial e Denver virou, aham, “parceiro” do New Order — mesmo sem ter tomado conhecimento sobre o processo.

19. “Regret” — Momento mais iluminado do grupo na década de 1990, o primeiro single de Republic criou uma alta expectativa sobre o álbum, que não se concretizou. É a única música do disco em que tudo funciona como deveria funcionar; em suas memórias, Hook afirma que a considera “a última música ‘pra valer’ do New Order”, criada de forma coletiva e com uma sonoridade digna dos melhores anos da banda.

18. “True Faith” — Foi um megahit na Inglaterra e também tornou-se o primeiro single deles a entrar no Top 40 nos EUA. A intenção declarada era finalmente romper a barreira do sucesso indie e chegar ao mainstream. Para tanto, convocaram o produtor Stephen Hague, que usou sua expertise acumulada com nomes como Pet Shop Boys e Erasure para criar um som mais polido e moderno— com a ajuda dos mais avançados equipamentos digitais à disposição na Inglaterra em 1987. Como de costume, a vibe do arranjo e da melodia contrasta com a letra deprê.

17. “60 Miles An Hour” — A mais monumental linha de baixo criada pela banda nos últimos 25 anos. Barney deve se arrepender de ter brigado com Hook a cada vez que a ouve. Os caras tinham acabado de retornar com Get Ready, depois de anos sem gravar, e estavam 100% empolgados. Guitarras altas, refrão matador, Morris voltando a bater dicumforça: era o rock de volta.

16. “Don’t Do It” — Mais um caso de lado B que supera o lado A. Este instrumental vinha no flip side do single de “Fine Time” e é outra grande canção que muita gente não conhece. Uma melodia simples e bela valorizada pela produção econômica, sem exageros ou truques. A tabelinha entre baixo e guitarra é incrível.

15. “Dreams Never End” — No decorrer deste texto eu falei bastante sobre a fase de transição JD-NO, que durou uns dois anos e engloba o disco de estreia, Movement. No entanto, desde a primeira faixa de seu primeiro LP, o New Order demonstrava que não ficaria na sombra do Joy Division por muito tempo. “Dreams Never End”, cantada por Hook, já atualizava a estética da banda anterior e apontava para um som mais expansivo e acessível. Por isso mesmo, tornou-se a faixa mais popular de Movement e uma constante nos shows do grupo. Até a saída de Hook, claro.

14. “Hurt” — O som de três caras e uma garota desembrulhando seus brinquedos novos no estúdio, e se divertindo a valer. Gravada nas mesmas sessões de “Temptation”, esta canção (a primeira composta com o uso de sequenciadores) filtra as influências de Kraftwerk e Moroder presentes desde o tempo do Joy Division para criar um acachapante híbrido kraut/disco/pós-punk. Salvo engano, foi a primeira vez que Barney soltou um “WHOOP!” enquanto cantava.

13. “Paradise” — Brotherhood foi dividido, de forma intencional, entre um lado “rock” e um lado “eletrônico”. “Paradise” era a música que abria o disco e, de acordo com a própria banda, foi inspirada em uma canção de Dolly Parton (!). Não que seja possível identificar a influência no resultado final. Hook, usando a zona mais aguda de seu baixo, carrega a canção nas costas, numa tabelinha perfeita com Morris. Já Barney emprega um registro bem incomum, alternando gritos e sussurros.

12. “Angel Dust” — Ainda sobre Brotherhood, nesta canção a banda atinge o equilíbrio ideal entre os malabarismos sintetizados e a sensação “orgânica” dos momentos mais roqueiros. Um mini-épico seccionado em vários trechos distintos, é a faixa mais curta do disco e ainda assim, segundo Hook, foi a que deu mais trabalho no estúdio — com a incorporação de samples de um disco de orações orientais e uma tonelada de efeitos. O solo que fecha a música é o melhor já gravado por Barney.

11.“Way of Life” — Brotherhood, de novo. Esta encerrava o lado A do disco. Poucas canções da banda soam tão genuinamente vivazes e energéticas (ainda que a letra, como de costume, seja meio deprê). Talvez marque o auge do entrosamento dos quatro em estúdio, tocando todos juntos, sem sequenciadores ou outros recursos eletrônicos. A composição começou com uma tentativa de emular “Age of Consent”; Hook apenas inverteu a sequência de notas da música de 1983.

10. “Bizarre Love Triangle” — A música mais conhecida da banda no Brasil é uma das complexas construções pop que eles já fizeram. Baseada em uma ideia original de Morris, a faixa passou por várias mutações e experimentos em estúdio até virar o que conhecemos hoje — um método de trabalho infelizmente abandonado pelo grupo nos últimos anos. A acumulação de diferentes timbres e camadas de som é barroca, quase excessiva; a melodia vocal é o que dá coerência à coisa toda, de um modo torto e irresistível.

9. “Blue Monday” — Esta canção de 1983 hoje é considerada um clássico e também o single mais influente do New Order. Não deixe a familiaridade te enganar: “Blue Monday” é um troço esquisito e experimental que NÃO deveria ter feito sucesso… muito menos se transformar no mais vendido single de 12 polegadas da história. (Eu tenho uma cópia.) O conceito inicial era criar um tema instrumental que pudesse ser tocado no palco pelos sequenciadores sem intervenção humana, enquanto a banda se retirava para o camarim sem dar bis. Partindo das ideias testadas em Power, Corruption & Lies, o grupo usou a faixa para empilhar todas as ideias chupadas da cena electro de Nova York e testar seus novos synths e baterias eletrônicas. No topo de tudo, um vocal desapaixonado, sem melodia, entrando e saindo ao longo de quase oito minutos de duração. ~Material ideal~ para um hit, né? Sem querer, o New Order resumiu toda a evolução da eletrônica dançante que ocorrera até então, empacotou-a em uma não-canção, lançou-a em um single de 12'’ com um mínimo de promoção… e viu o troço virar seu maior hit até então.

8. “Elegia” — Composto e gravado em uma única sessão (24 horas!) de estúdio em 1985, este instrumental é um pungente tributo ao finado Ian Curtis. Um crescendo interminável, de dar inveja a qualquer banda de post-rock, eleva a melodia simples a dimensões monumentais. Cada elemento do arranjo é introduzido com delicada deliberação, levando o ouvinte a se perder em novos detalhes a cada audição. A versão editada de Low-Life é só um aperitivo: a apoteose total está na gravação completa (17 minutos e meio) lançada na caixa Retro.

7. “Temptation” — A primeira tentativa da banda de fazer uma canção pop pra valer nasceu como um instrumental composto em 1981. Foi quando a banda percebeu que o uso da eletrônica poderia ajudar na construção de faixas dançantes; que não havia mal algum em tentar criar melodias cativantes, assobiáveis; que a mistura de instrumentação ao vivo e sintetizadores dava uma personalidade única às músicas. Segundo Hook, “Temptation” é “a canção que sempre tentamos copiar depois, mas nunca conseguimos”. Ao vivo, torna-se uma verdadeira festa. Trivia: é a música do New Order favorita da minha mãe.

6. “Sub-culture” — Poucas gravações de synthpop produzidas em 1985 soam tão frescas e belas quanto esta faixa de Low-Life. A luxuosa cobertura eletrônica, que inclui uma linha de synthbass inspirada por “Beat It”, de Michael Jackson, envolve uma canção em tom menor sobre solidão e abandono. A conclusão, depois que (enfim!) deixam Hook entrar na música e os teclados vão sufocando os vocais desolados, será sempre arrepiante. Fique com a versão original: o remix populista de John Robie, lançado como single, é 100% dispensável.

5. “As It Is When It Was” — Minha favorita de Brotherhood. A mais frágil e tocante canção de toda a carreira do grupo. Despida de qualquer pirotecnia eletrônica, só à base de guitarra/violão/baixo/bateria, é a prova cabal de que sim, eles eram grandes compositores e uma grande banda de rock, sem depender de synths, remixes e dubs. A letra nostálgica e agridoce casa à perfeição com a melodia luminosa, que deságua num refrão e um crescendo emocionantes.

4. “1963” — Durante toda sua carreira, o New Order se esforçou para aperfeiçoar uma combinação improvável: músicas essencialmente tristes que também soassem empolgantes, cativantes, dançáveis. Em 1987, eles acertaram na mosca com esta canção, lançada no lado B de “True Faith”. O produtor e co-compositor Stephen Hague a definiu como “a única música dançante já escrita sobre violência doméstica”. O ápice da jornada rumo a uma sonoridade mais pop, mas com classe e talento, sem concessões baratas.

3. “Ceremony” — Ian McCullouch disse certa vez sobre esta canção: “É a melhor música de todos os tempos! Por que o New Order a fez, e não o Echo & The Bunnymen?” Single de estreia da banda, lançado pouco menos de 10 meses depois do suicídio de Ian Curtis, fazia parte da última safra de composições do JD. Por mais vezes que eu a ouça, por mais vezes que eu a toque na guitarra, sempre vai intrigar e me encantar. É formalmente simples: só dois acordes. A magia é que, à melhor maneira pós-punk, Barney, Hook e Morris (e Gillian) sabiam como fazer um “todo” maior que a soma de suas (rudimentares, até) partes. Martin Hannett merece um aplauso especial pela produção, que separa cada um dos instrumentos como num vácuo e permite-nos ouvi-los com um brilho e uma clareza sobrenaturais; compare com as rudimentares versões gravadas pelo Joy Division e perceba.

2. “The Perfect Kiss” — Esqueça a versão editada de Low-Life. Para desfrutar de toda a glória do épico definitivo do quarteto de Manchester, você precisa ter o single de 12 polegadas ou o vinil do Substance; todas as outras versões desta canção tem ligeiros cortes, são um pouquinho mais curtas. Esta música é como uma peça de teatro, no qual cada um dos elementos do arranjo é um “personagem” que entra e sai do palco pouco a pouco: primeiro a percussão eletrônica, depois os synths, o baixo, o vocal… No desfecho, convergem numa “cena final” , com todos os personagens bailando em um turbilhão de som que dura cronometrados 2 minutos e 35 segundos — mas que, por mim, poderia durar para sempre.

1. “Sooner than You Think” — A caixa Retro, lançada em 2002, buscava resumir a obra do New Order em quatro discos, cada um devotado a um aspecto: “pop” (com os hits), “fan” (músicas menos conhecidas), “club” (remixes) e “live” (faixas ao vivo). O jornalista John McCready, encarregado de selecionar as faixas do CD “fan”, tascou “Sooner than You Think” na lista, em meio a canções mais populares como “Dreams Never End”, “Your Silent Face” e “Elegia”. Daqui do Brasil, esbocei um sorriso silencioso: afinal, alguém reconhecera o valor da maior canção de uma das minhas bandas favoritas. A segunda faixa do lado B de Low-Life é, sem dúvida, a pérola mais subestimada de todo o repertório do NO. Atinge um equilíbrio irrepetível entre a instrumentação humana e as texturas eletrônicas, com a interpretação frágil e tocante de Barney e uma linda melodia em tom menor costurada pelo baixão de Hook. É o ápice de uma era em que os quatro ainda trabalhavam em conjunto, desobrigados a fazer sucesso, livres de influências externas; em que os sintetizadores era uma ferramenta, não um grilhão; e em que ainda era possível empregar a essência do-it-yourself do punk/pós-punk para criar canções sofisticadas e atemporais.

Pensou que não iria ter playlist? Pensou errado, otário! Infelizmente, o set a seguir só inclui 111 das 140 músicas ranqueadas acima. O Spotify não oferece qualquer b-side dos singles, nem qualquer uma das faixas que não entraram nos álbuns oficiais. Nem mesmo a coletânea bestseller Substance está à disposição. No YouTube tem tudo.

A formação atual: à esquerda, Phil Cunningham; à direita, Tom Chapman (o baixista que errou miseravelmente o encerramento de “The Perfect Kiss” no show de 2014)

Leia também o post sobre o papo que bati com Peter Hook em 2015:

Q&A: UMA CONVERSA COM PETER HOOK

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Marco Antonio Barbosa
Telhado de Vidro

Dono do medium.com/telhado-de-vidro. Escrevo coisas que ninguém lê, desde 1996 (Jornal do Brasil, Extra, Rock Press, Cliquemusic, Gula, Scream & Yell, Veja Rio)