TODAS AS 64 MÚSICAS DOS LOS HERMANOS, DA PIOR À MELHOR.
Não vou a qualquer um dos shows da turnê que os Los Hermanos vêm fazendo em 2019. Entretanto, sou o sujeito mais habilitado a criar um ranking completo das músicas do quarteto carioca, da pior à melhor. Seguem-se as evidências que corroboram minha audaciosa afirmação:
a. Acompanhei toda a carreira da banda. Quando digo toda, é toda mesmo. Vi show dos caras no Empório, tocando para meia-dúzia de pessoas, quando eles ainda se apresentavam de chapeuzinho branco. Ouvi, em primeira mão, as duas fitas-demo que causaram frisson na cena carioca. Lembro da época em que o ~grande hit~ da banda era “Bárbara”, e não “Anna Júlia”. Eu estava no Abril Pro Rock de 1999, quando os LH despontaram para o estrelato. Entrevistei Camelo e/ou Amarante mais de uma vez, nos anos subsequentes, e assisti a uma das apresentações da turnê de despedida, em 2007. Cheguei mesmo — vejam vocês, meus amigos — a co-protagonizar uma ~polêmica~com a banda nas páginas da finada revista Rock Press, no ano 2000. (Dei uma trollada nos Hermanos na coluna que eu tinha na revista, e o Camelo retrucou na edição seguinte.)
b. Mesmo sem ser fã da banda, reconheço a inegável importância dos LH para o pop-rock brasileiro dos últimos 20 anos. Desnecessário listar o rosário de artistas influenciados por eles neste terceiro milênio. (Não citarei nomes, para não ferir susceptibilidades.) Mais interessante é lembrar que nenhum nome contemporâneo conquistou uma multidão de seguidores tão fiéis, mesmo distante das paradas populares. Ao abraçar referências de samba, MPB e ritmos latinos, expandiram os limites do experimentalismo “aceitável” para o rock brasileiro atual. Ao abrir o coração para falar de romances frustrados, mostraram a toda uma geração que sim, era possível cantar em português. E, quando se recusaram a seguir o caminho mais fácil (i.e., entregar outra “Anna Júlia”), deram uma importante lição de independência e integridade. Seus quatro álbuns têm, óbvio, altos e baixos. Ainda assim, o talento dos LH e a disposição da banda para correr riscos são evidentes e invejáveis.
O ranking a seguir inclui todas as faixas lançadas oficialmente pelos Los Hermanos. A mais recente canção gravada pela banda também entrou na relação. Com a ajuda desta lista aqui, pincei as poucas músicas que o grupo registrou em coletâneas e gravações ao vivo oficiais.
64) “Máscara Negra” — OK, sempre houve uma associação entre os Hermanos e o carnaval. Entretanto, esta versão para a marchinha de Zé Keti, gravada para servir de vinheta de uma rádio FM carioca, soa forçada e desnecessária.
63) “Hino do Vasco da Gama” — Se o ranking fosse das canções mais inusitadas da obra dos LH, esta aqui estaria nas cabeças. Constante do CD Hinos Placar, trazia o grupo em parceria com Paulinho da Viola. Quer dizer, o grupo não, né: só dá pra ouvir mesmo Camelo. Imagino que ele seja vascaíno…
62) “Eu Vou Tirar Você Desse Lugar” — Os LH nunca tiveram medo de abrir o peito e se expor ao ultrassentimentalismo. A decisão de gravar este clássico de Odair José (para a trilha do filme Casseta & Planeta — A Taça do Mundo É Nossa) seria, a princípio, coerente. Se ao menos Amarante levasse a coisa a sério.
61) “Morena” — Lembro da experiência traumática que foi ouvir esta canção pela primeira vez, em um show no Ceará; a banda tinha acabado de (ou estava prestes a) lançar o quarto disco e Camelo veio ao palco sozinho, munido apenas de um violão de nylon… A versão de estúdio soa menos esquálida, mas não chega a convencer.
60) “Vai Embora” — Letra muito clichê e um arranjo que vai do hardcore ao funk, com uma inexplicável quebrada jazzística entre os extremos. Excessos típicos da imaturidade do primeiro trabalho.
59) “Descoberta” — Veloz ska do primeiro disco, com destacada participação do naipe de metais.
58) “Sem Ter Você” — Esta lembra os Paralamas da fase Bora Bora. Pelo menos até entrar o vocal. A mistureba de ritmos soa nada espontânea, a letra é ridícula, mas a melodia é legal.
57) “Outro Alguém” — Assim como várias outras faixas esquecidas do disco de estreia, esta aqui investe em mudanças súbitas de andamento e estilo. Seria engraçado ver a banda tentando toca-la 20 anos depois.
56) “Hollywood” — A banda dá vazão a seu lado mais lúdico, em versão da música de Chico Buarque celebrizada no musical Os Saltimbancos. Consta da coletânea Superfantástico — Quando Eu Era Pequeno, que traz roqueiros como Capital Inicial, Biquíni Cavadão e Frejat refazendo clássicos infanto-juvenis dos anos 1970/80.
55) “Pierrot” — Na essência, uma caricatura do som da primeira fase. Leva a fórmula “marchinha de carnaval + hardcore melódico + letra romântica” a seu extremo lógico.
54) “Garota de Ipanema” — Sim, os caras tiveram a pachorra de gravar uma versão do clássico para uma coletânea lançada em 2000. E bilíngue, ainda por cima: Amarante começa cantando em francês, depois Camelo entra em português. É sempre um desafio inovar em um standard tão manjado, mas os LH não chegam a passar vergonha.
53) “Lágrimas Sofridas” — Mais mágoas incontidas casadas com uma performance veloz e feroz. Tem uma passagem quase reggae no meio, que desce um tanto quanto quadrada.
52) “Esquadros” — Quem me conhece sabe que eu não nutro qualquer simpatia em particular por Adriana Calcanhotto. Dito disso, confesso que acho esta canção bem bonita. A versão dos Hermanos, disponível no DVD Luau MTV, é adequadamente singela, mesmo sem alcançar a gravação da autora.
51) “À Palo Seco” — Outro cover gravado no Luau MTV, em 2002. Despachada de modo bem informal, em menos de dois minutos, a versão traz Camelo nos vocais. Teria sido este cover o estopim para a transformação de Belchior em uma figura indie-cult?
50) “Aline” — A outra música-com-nome-de-mulher no primeiro LP começa como hardcore e, mais uma vez, ganha umas quebradinhas reggaeiras ocasionais (e um tanto pentelhas).
49) “Fez-se Mar” — O caldo da MPB entorna de vez sobre esta faixa de 4, um sambinha 99% ortodoxo (o 1% é a guitarra descaralhada que entra no final, cortesia de Fernando Catatau). Vez por outra, a interpretação de Camelo cruza o limite entre o suave e o apenas desafinado.
48) “Cher Antoine” — Neste que é um dos momentos menos memoráveis do segundo disco, Amarante incorpora um rápido Gainsbourg cariocão.
47) “Tão Sozinho” — Recaída hardcore do segundo disco. Percebam como soa mais pesada e contundente que os rocks do álbum de estreia, que ficaram prejudicados pela produção anêmica.
46) “Sapato Novo” — Para quem admira a sincera fragilidade do estilo vocal de Camelo, esta aqui é um prato cheio. Aos menos parciais, parece apenas um rascunho genérico de Caetano Veloso.
45) “Azedume” — Já esta aqui é meio Frankenstein. Um trombone em surdina sublinha o vocal mais desesperado que Camelo já gravou. A levada é hardcore, mas a letra é quase parnasiana. E, sem ter muito o que fazer, Bruno solta mais ruidinhos de teclado perdidos no arranjo.
44) “Horizonte Distante” — Camelo teve uma ligeira recaída roqueira em 4 e saiu-se com esta aqui. Apesar do punch na performance, falta brilho à melodia.
43) “Do Sétimo Andar” — Com uma levada em staccato, traz Amarante exagerando seu estilo vocal arrastado. Passagem dispensável de Ventura.
42) “Lisbela” — Fofa composição feita por Caetano Veloso para o filme Lisbela e o Prisioneiro. Além dos vocais, não sobra quase nada da personalidade da banda na canção — uma moda de viola com letra aludindo aos personagens do longa de Guel Arraes.
41) “Deixa Estar” — Sempre citado por Camelo como grande influência, o som do Acabou La Tequila é o padrão almejado aqui. Funk com toques de ska (ou um ska com toques de funk), a canção ganha um arranjo brincalhão.
40) “O Pouco que Sobrou” — Tem melodia e harmonia meio parecidas com outras tantas músicas da banda, tendo a batida acelerada como diferencial.
39) “Pois É” — Balada do quarto álbum, indecisa entre a leveza do vocal e os espasmos de uma guitarra distorcida.
38) “Primeiro Andar” — Conta com um arranjo delicado e suave. Entretanto, carece de uma melodia vocal mais marcante e de uma letra menos vaga.
37) “Um Par” — A letra é bacana, mas apesar de um solo de guitarra marcante, o resultado final é um tanto genérico dentro da fase do terceiro disco.
36) “Corre Corre” — Popinho agradável que marcou a volta do quarteto aos estúdios, 15 anos depois do lançamento de 4. Lembra um pouco a MPB de sabor mais pop do início da década de 1980. Soa familiar e reconhecível e ao mesmo tempo não se encaixa 100% na sonoridade de qualquer um dos quatro álbuns. Será que vem mais por aí na mesma onda?
35) “Paquetá” — Uma composição-padrão de Amarante valorizada pelo inusitado clima latino/caribenho do arranjo. A letra tem algumas imagens bonitas (“E desse engodo eu vi luzir / De longe o teu farol / Minha ilha perdida é aí / O meu pôr do sol”).
34) “Dois Barcos” — O flerte com a MPB se consumava de vez logo na faixa de abertura de 4. Lembra Ivan Lins, pelo pianinho e os vocais em falsete? Ou Clube da Esquina, pela harmonia complexa? Talvez Caymmi, nas referências marítimas na letra? A canção prenunciava o início de uma fase de transição… que não se concluiu, já que o grupo entrou em hiato por tempo indeterminado menos de dois anos depois, sem gravar um quinto álbum. Por enquanto.
33) “Deixa o Verão” — Um ska tardio e brincalhão. Amarante conta a história de um casal que desiste de sair para curtir o sol e se deixa ficar em casa. E se o caso for de ir à praia?
32) “Mais uma Canção” — Valsinha romântica (“Você é meu grande amor” etc.) do segundo disco. O arranjo, com metais proeminentes, empresta um tom quase galhofeiro à canção e contrasta com a interpretação delicada de Camelo.
31) “Do Lado de Dentro” — Com uma marcante levada de baixo & bateria e um interlúdio de timbres circenses (lá em “Eu que lavei os teus lençóis” etc.), esta canção de Camelo narra o fim de um romance. Mais um, aliás.
30) “Tenha Dó” — A faixa de abertura do disco de estreia é uma boa síntese da fase inicial dos LH. Uma intro pseudo-latina logo cedia espaço para um skazinho acelerado — que evoluía para um quase-hardcore no refrão. Porém, o grande diferencial (negativo, diriam alguns) era mesmo a sofrência da letra, um romantismo desabrido sem medo de resvalar no pós-brega.
29) “Tá Bom” — A fossa amorosa aqui não é do narrador, e sim de um amigo (ou irmão?) que vive “Achando que sofrer é amar demais”. Pode ser vista como uma continuação mais tristonha da temática de “O Vencedor” (“Não há ninguém capaz / De ser isso que você quer / Vencer a luta vã / E ser o campeão”).
28) “Quem Sabe” — Hardcore romântico composto por Amarante, que ganha contornos caribenhos com o arranjo de metais. O final é meio esquisito, com incongruentes barulhinhos sintetizados.
27) “Os Pássaros” — É o mais perto que a banda chegou de uma incursão psicodélica. A interpretação letárgica de Amarante reforça a ambiência viajandona, engrossada com os fantasmagóricos efeitos aplicado à guitarra e aos synths.
26) “Adeus Você” — Balada com tons latinos, refletidos no naipe de percussão. Cordas encorpam o arranjo. Encerra de forma (mais uma vez) melancólica o segundo álbum.
25) “O Velho e o Moço” — Uma delicada criação de Amarante, em compasso de valsa. Os detalhes do arranjo ajudam a elevar o conjunto da obra.
24) “É de Lágrima” — A faixa final de 4 também soa um tanto lisérgica. Começa como uma balada tristíssima e evolui para uma coda na qual se sente (mais que) um passageiro toque pinkfloydiano.
23) “Conversa de Botas Batidas” — Um quase-samba, no qual os timbres do piano e o coro no final se aproximam da MPB setentista. A letra é inspirada na história real de um casal de amantes que morreu no desabamento do hotelzinho barato onde se encontravam regularmente, no centro do Rio. Camelo reimagina o caso e supõe que os amantes, fartos da clandestinidade de sua relação, resolvem morrer juntos (“Deixa o moço bater / Que eu cansei da nossa fuga”). É triste, mas o tom é leve e, na medida do possível, esperançoso.
22) “A Outra” — Uma das mais chicobuarqueanas da obra de Camelo, combina synths analógicos a uma levada tropical, com metais de sabor mariachi. A letra, triste, é narrada do ponto de vista de uma mulher traída.
21) “Cadê Teu Suín-?” — Esperta brincadeira poética de Camelo, valorizada por um rico e solene arranjo de sopros. Demonstrava que o compositor tinha um portfólio temático mais amplo que apenas as dores de amores do primeiro disco, e ainda incluía um brado de independência (“Eu que controlo o meu guidom!”)
20) “Onze Dias” — Exemplo prematuro do talento de Amarante, dava um ar mais sutil e trabalhado ao frenesi do repertório do primeiro disco.
19) “Veja Bem Meu Bem” — Delicada composição de Camelo que se aproxima da MPB mas não abdica do punch roqueiro. (Note as guitarras distorcidas em segundo plano.) Foi regravada por Maria Rita.
18) “Casa Pré-Fabricada” — Weezer purinho. Quer dizer, não tão purinho. A ponte (“Canta que é no canto que eu vou chegar…”) introduz um balanço mais tropical no indie rock de guitarras distorcidas + melodia levada no Moog.
17) “Samba a Dois” — Injetada de um clima samba-jazz, explicitava, já na abertura de Ventura, a incorporação de mais e mais elementos brasileiros na mistura. No final, pega um embalo que transporta o arranjo do Beco das Garrafas para a Gafieira Elite.
16) “Assim Será” — Linha de baixo marcante conduz essa canção com sutil (mas marcada) influência sambística. A harmonia e a melodia vocal são surpreendentemente refinadas. Deve ser uma das favoritas da galera do Mombojó.
15) “Anna Júlia” — O improvável megahit do primeiro LP subverteu as expectativas que todos tinham sobre a banda. E, no fim das contas, nem era tão improvável assim. “Anna Júlia” é um power pop despretensioso, de talhe clássico. Exibia o potencial comercial de Camelo como compositor, sem abrir mão da personalidade do grupo — apesar de não ser característica do som do disco de estreia. Único real sucesso radiofônico dos Hermanos, sempre foi amada pelos fãs (e por George Harrison)… e nem tanto pela banda. Assustados com a superexposição, os caras passaram um tempo sem executá-la ao vivo, no começo dos anos 2000. Depois desencanaram.
14) “Retrato Pra Iaiá” — Um skazinho manemolente, faceiro, de sotaque bem brasileiro, que deságua em um dos refrões mais emblemáticos da banda (“Deixa ser / Como será…”). É outra que me lembra um pouco os Paralamas, agora na fase Nove Luas. Ajudou a consolidar o estilo vocal característico de Amarante.
13) “Bárbara” — Este clássico da primeira fase fechava o álbum de estreia. Sem as misturebas rítmicas que atrapalham boa parte do resto do disco, “Bárbara” é pau puro, de cabo a rabo. O refrão catártico costumava ser a apoteose dos shows da época pré-“Anna Júlia”.
12) “De Onde Vem a Calma” — Outra das mais amadas pelo séquito de fãs, talvez pelo apelo direto que Camelo faz a eles (“Não vão embora daqui / Eu sou o que vocês são / Não solta da minha mão”). Muito delicada e doce, dispensa a fanfarra tonitruante e a substitui por etéreos sons sintetizados.
11) “O Vencedor” — O que Camelo pretendia dizer com os versos “Eu que já não quero mais / Ser um vencedor”? Era o reconhecimento de que a banda dava as coisas à popularidade massiva da fase “Anna Júlia”, trocando-a pela integridade artística e a (relativa) independência da indústria (“Faço o melhor que sou capaz / Só pra viver em paz”)? Enfim, seja qual for a mensagem, trata-se de um dos rocks mais cativantes da banda, com direito a uma triunfante coda conduzida pelos metais.
10) “Sentimental” — Aqui, Amarante deixava de uma vez o posto de coadjuvante e assumia seu lugar de direito como co-autor principal na banda. A referência é mais Radiohead (fase The Bends) que Weezer. O vocal é um dos mais viscerais na discografia do grupo, carregado de — ora, bolas — sentimento.
9) “Primavera” — ESTE deveria ter sido o hit do primeiro disco: uma canção pop de ares sessentistas, ainda mais arquetípica que “Anna Júlia”. A letra é sofrência clichê, mas a suave interpretação do jovem Camelo é encharcada de sinceridade. O arranjo de metais é meloso (de propósito) e não chega a disfarçar a evidente influência do Weezer.
8) “Além do Que Se Vê” — Mais uma na qual Camelo encaixa harmonias e métricas herdadas da MPB em um contexto roqueiro, com muita habilidade. Começa bem quieta e vai crescendo, com a metaleira num contraponto exuberante às guitarras levemente distorcidas. E ao, vivo, claro, levanta a massa. Assim é que se faz!
7) “Condicional” — Contribuição de Amarante a 4 que eleva em muito a qualidade média do repertório do disco. Toda a banda brilha em uma performance coesa e empolgada. E também surpreendente, no contexto de um álbum quase todo plácido. Talvez tenha sido o aceno final dos Hermanos ao tal do rock’n’roll.
6) “Fingi na Hora Rir” — Um refinamento da fórmula esgotada no primeiro disco. Pesada (mas não rápida), com letra sentimental (mas sem exageros) e mudanças de dinâmica (mas sem as caricatas variações do álbum de estreia). Mais uma vez, o contraste entre a doçura da voz de Camelo e o punch do arranjo eleva a canção a um outro nível.
5) “Todo Carnaval Tem Seu Fim” — As sofridas paixonites do primeiro disco davam lugar a um romantismo mais maduro. O desgastado formato hardcore + ska + melodia chorosa dava lugar a um som mais conciso, nutrido tanto do indie rock quanto de difusas incursões pelo samba e pela MPB. Os metais e os teclados, que antes soavam como meros adornos, se integravam de maneira natural à nova estética. O desespero esganiçado na voz de Camelo foi trocado por um tom doce-amargo, melancólico. A primeira faixa de O Bloco do Eu Sozinho era tudo isso resumido — a ressaca tristonha de um arlequim que foi dormir na terça-feira achando ser Rivers Cuomo e que caiu na real na quarta-feira de Cinzas.
4) “O Vento” — Os momentos menos ~conceituais~ de 4, nos quais os LH se contentam apenas em ser eles mesmos, são os melhores. Amarante pega só uma palinha da brisa emepebística que varre a maior parte do álbum e cria a canção mais memorável do lote. Detalhe pouco comentado: a linha de baixo, quase com certeza a mais suingada da obra da banda (tocada por Camelo!)
3) “Cara Estranho” — O ápice da obsessão dos LH com o Weezer. (Como ninguém teve a ideia de fazer um mash-up com “Hash Pipe”?) A melodia espetacularmente grudenta casa bem com o som pesado e com a letra acusatória que (pela terceira vez no álbum) faz referência a vitórias e derrotas (“É simples desse jeito / Quando se encolhe o peito / E finge não haver competição”).
2) “A Flor” — É o showcase definitivo da dualidade/complementaridade Camelo/Amarante. Rodrigo soa despeitado ao cuspir “Achou ser de um outro rapaz / Foi capaz / De se entregar”; Marcelo exala resignação ao entoar “E eu fiz de tudo pra você / Perceber / Que era eu”. No fim, em uníssono, ambos se entrelaçam, o primeiro sardônico, o segundo desolado, até o “VAAI!” final de Amarante. Rock pesado tingido pelo banzo do samba, a canção é uma eterna favorita nos setlists da banda.
1) “Último Romance” — Qual é a essência dos Los Hermanos? O que os caracteriza, acima de tudo? Uma abordagem melancólica dos relacionamentos amorosos que, aqui e ali, deixa entrever a esperança de um final feliz. Um som que é rock, e que no entanto também é brasileiro demais pra ser apenas rock. A presença dos metais, um dos traços mais marcantes, o diferencial de seus arranjos; quase um coro grego, que sublinha as letras e incorpora o clima dos versos a seus timbres, soando às vezes tristonho, às vezes empolgado. Em “Último Romance”, Amarante costura tudo isso com sensibilidade melódica e poética, narrando a jornada de um cara que já não tinha mais esperança de encontrar o amor, mas encontra — lembrando que o “último” do título não precisa ser o “final”: apenas o definitivo. E ninguém dirá que é tarde demais.
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A playlist segue abaixo. No Spotify só estão disponíveis as músicas dos álbuns oficiais. As outras oito estão no YouTube.