Machismo nos eSports

Anna Paula Perci
Tendências Digitais
6 min readNov 21, 2018

O eSport, desde seu surgimento em 1972 tem crescido muito no âmbito mundial. Nos anos 2000, a Coreia do Sul começa a incentivar este meio, promovendo acessibilidade e melhorias para que campeonatos de jogos fossem realizados, e em 2008 é concretizado a profissão Jogador de jogos eletrônicos na Ásia. Não demorou muito para que o termo “pro-player” (jogador profissional) fosse viralizado e se tornado sonho profissional de muitas pessoas. Jogos famosos como Starcraft e Dota se tornaram jogos competitivos, criando um ambiente propício para que o eSport aumentasse, e desde essa época, não se tem relatos de mulheres que participaram de nenhum time competitivo.

Nos dias atuais, há diversos jogos onlines que estão imersos nessa nova cultura competitiva dos eSports. League of Legends e Overwatch são jogos mundialmente famosos que ajudaram a espalhar o crescimento do eSport no ocidente e muitas pessoas tem como objetivo se tornarem jogadores profissionais de tais.

Time profissional de LOL possuindo uma mulher como jogadora

Essa tendência de haver um crescimento de interesse na área profissional de jogos eletrônicos é real e está presente em nosso dia a dia. Porém, ela vem acompanhada de uma cultura antiga e machista, na qual jogos são preferencialmente para homens.

O comportamento machista em jogos, infelizmente, esteve presente na infância de muitas mulheres, quando o estereótipo em que menina brinca de “casinha” e menino joga videogame foi presente. Poucas meninas tiveram o privilégio de crescer podendo jogar videogame, ou até mesmo, poder jogar livremente com os amigos. Muitas pessoas tratam mulheres como incapazes ou sortudas por seus atos dentro dos jogos, apenas por possuírem nicks femininos.

A designer Helena Simões, de 30 anos, jogou por anos o jogo online Ragnarok, um RPG (role-playing game) famoso nos anos 2000, e relata que por ter seu nickname feminino, sofria diversos tipos de machismo e assédio. “Sai daqui”, “vai estragar a equipe”, “não sabe jogar” eram frases comuns que a jogadora lia de outros jogadores a respeito dela. Segundo ela, muitos perguntavam com segundas intenções se ela possuía namorado. Se ela conseguia algum mérito dentro do jogo, era por sorte. O tempo todo eles duvidavam da capacidade dela por jogar bem, simplesmente por ser do sexo feminino.

Screenshoot do chat durante um jogo de League of Legends

O caso de Helena é comum e a G1, no evento Campus Party 2018, fez uma entrevista com diversas mulheres perguntando o que estas fazem para esquivar-se do machismo e sua intolerância dentro dos jogos. Jogadoras de Counter strike (CS), League of Legends (LOL) e outros jogos afirmam que já sofreram machismo e assédio dentro dos jogos e que este comportamento é comum hoje em dia. Segundo elas o comportamento dos homens poderiam ser divididos em dois casos:

  • Duvidar da capacidade dela simplesmente por ser menina, afirmando que lugar de mulher é na cozinha. Vários outros xingamentos também são comuns, e caso a menina estivesse mandando bem no jogo, muitos diziam que era o namorado que estava na conta.
  • Assediar a menina pedindo informações pessoais como redes sociais ou celular. Muitos deles trataram-as como se estas estivesse no jogo para arrumar um namorado, e não apenas para jogar por hobbie.
Casos de machismo no jogo League of Legends

Pode-se pensar que este comportamento é restrito ao público brasileiro, mas infelizmente seria um equívoco. A coreana Gegury, 17 anos, foi alvo de machismo ao começar a crescer no jogo Overwatch (OW), da empresa Blizzard. Assim como outros jogos, há um sistema de ranqueamento em que os jogadores devem jogar para subir seu ranking (posição), rankings podem variar desde iniciantes até profissionais, que no caso deste último estão presentes jogadores que jogam profissionalmente, sendo reconhecidos mundialmente no cenário do jogo. Gegury é uma destas pro-players que começou a crescer no jogo e ser conhecida por jogar muito bem, além de cair em times com jogadores conhecidos mundialmente. Após ela ganhar alguns jogos contra pro-players famosos, estes começaram a duvidar da habilidade da garota, dizendo que ela utilizava programas que a auxiliassem nas partidas, ou seja, que ela usava algum tipo de hack, e por isso ganhava as partidas. Denúncias foram feitas contra ela para a Blizzard Coreana,perguntando sobre tais teorias. Não passado muito tempo, a empresa afirmou que não havia uso de programas ilegais pela garota, e ela, para confirmar o fato, gravou um vídeo jogando para provar de vez que o fato dela ser boa no jogo era totalmente mérito de seu esforço.

Outro caso muito semelhante à pro-player Gegury foi a de outra coreana chamada Yeo Choi Mi, streamer do jogo League of Legends. A garota joga contra pro-players famosos mundialmente, e teve sua habilidade reconhecida por alguns, porém por ser menina ela sofreu machismo ao dizerem que uma menina nunca poderia chegar no nível desafiante do jogo (maior ranking que se pode ter no jogo League of legends). A coreana então decidiu jogar e compartilhar seu jogo ao vivo durante sua stream para mostrar sua vitória que a levaria ao nível desafiante, e feito isso, Yeo Choi mi alcançou o rank máximo do jogo provando que meninas podem sim ser jogadoras profissionais.

O comportamento machista está presente em todos os jogos, e todas as meninas estão sujeitas a passar por isso. Um artigo escrito por Julia Lee em 2017, que é uma jogadora de League of Legends, conta que além deste machismo desenfreado outros casos ramificados do machismo também acontece. No jogo League of Legends há mais de 140 personagens, onde cada um é diferente do outro. Todos possuem visuais alternativos chamados de skins, e muitos desses visuais são considerados fofos e femininos, assim como também há visuais mais sérios para tais. Num resumo, há todos os tipos de visuais possíveis dentro do jogo, porém muitas meninas são taxadas de só jogar com personagens femininas, menosprezando suas habilidades, supondo que estas não conseguiriam jogar com personagens masculinos. A autora cita também que este comportamento machista já foi reproduzido por mulheres. Um ponto importante também para ser discutido é o estereótipo de que mulheres apenas jogam na função suporte, independente dos jogos. Segundo a monografia “Sexismo nos campos da justiça” por Maria Luiza Arantes, em sua pesquisa envolvendo 738 jogadores de League of Legends, 93% das meninas responderam que já sofreram sexismo ou presenciaram práticas sexistas em suas partidas, e que 84% dos homens já presenciaram sexismo, e 21% deles se calou durante a situação. Porém o ponto chave desta pesquisa mostra que existe sim um preferencial na função de suporte, tanto por meninas quanto por meninos, confirmando assim, o machismo que existe por trás deste estereótipo.

Infelizmente este comportamento tem crescido nos últimos anos, e até que as empresas de jogos tomem severas providências a respeito disso, a tendência é que as meninas tentem evitar o machismo trocando seus nicknames para masculinos, assim como diz a pesquisa da G1.

Textos externos de referência:

Coreana Streamer chega ao ranking máximo de LOL ao vivo: https://streamie.com.br/mulher-desafiante/amp/

Coreana profissional no OW prova seu mérito fazendo vide-o, após acusações: https://br.ign.com/overwatch/29271/news/jogadora-de-overwatch-e-acusada-de-trapacear-e-prova-talento

Sexismo no LOL, meninas taxadas de não jogarem e apenas gostarem de coisa fofas: https://www.riftherald.com/2017/10/3/16401740/sexism-league-support-egirls-opinion

Machismo em jogos e discriminação da mulher: https://auniao.pb.gov.br/noticias/caderno_diversidade/machismo-e-discriminacao-afetam-mulheres-nos-jogos-online

Textos no medium de referência:

ESports:

A ascensão do eSport

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