Post-Horror

Débora V
Tendências Digitais
4 min readNov 25, 2018

O gênero de Terror no cinema vêm sofrendo alterações significativas nos últimos anos. Depois de seu surgimento a partir da literatura e música, seu reconhecimento começou nos anos 30 e 40 com a popularização de filmes B, realizados com baixo orçamento e exibidos juntos à filmes com grandes estrelas e muita produção.

Fonte: Boca do Inferno

O auge do gênero veio, no entanto, em meados dos anos 1970, com a grande disseminação de filmes Slasher. Por contar quase sempre com a representação caricata de um grupo de jovens, atraía muito esse público mais despretensioso, o que estabeleceu um estigma negativo em cima do gênero e principalmente do sub-gênero pela massa.

Atualmente, ainda persiste esse estigma, mas com menor potência. A maior viabilidade e amadurecimento de técnicas de montagem no cinema possibilitou o desenvolvimento de uma nova linguagem dentro do Terror: o Post-Horror. Esse sub-gênero abraça novas oportunidades na forma de contar histórias, e é capaz de causar um tipo de desconforto explorado na sensação de incapacidade.

Fonte: Talk Film Society

O que Get Out! (2017), A Ghost Story (2017), The Witch (2016), Raw (2016), Under The Skin (2014), It Follows (2014) e muitos outros filmes do sub-gênero têm em comum é essa sensação de inércia por parte do espectador, presente em toda a narrativa. E é essa nova sensação que pode ser um marco no que os filmes do gênero de Horror hoje representam.

Criar um ponto de mudança que mexe com toda uma linguagem já estruturada é, no mínimo, desafiador. Especialmente quando a desconstrução é indireta e não têm a intenção de subverter as convenções estabelecidas, mas sim, reconhecê-las. O que antes era considerado pelo grande público como vazio de conteúdo, e usado apenas como uma desculpa para satisfazer a natureza sádica e até erótica dos espectadores, hoje é tido para alguns como socialmente consciente sobre medos e inseguranças humanas.

Mas o que realmente mudou desde os filmes de 1970 e 1980 para os atuais? Autoconsciência. A grande diferença entre os Slashers de antigamente e o que hoje é considerado Post-Horror foi o entendimento da estruturação da linguagem usada para transmitir as narrativas pelas próprias pessoas envolvidas na produção do filme. Esse entendimento traz um certo sentimento de nostalgia atrelado à nova era do terror, exatamente por não ter a intenção de revolucionar a indústria, mas sim reafirmar a mesma.

Fonte: Youtube

A franquia Halloween é um grande exemplo disso; em seu primeiro filme de 1978, é usado de vários artifícios para transmitir a narrativa pela perspectiva do assassino, como a simulação de olhos na câmera. O filme não perde tempo humanizando Michael Myers, e nem justificando seus feitos, porque o objetivo não é representar uma pessoa. Não faria sentido atribuir uma identidade ou humanizar aquilo que representa o “mal puro”, uma espécie de crueldade compartilhada coletivamente.

A sequência homônima do filme, lançada em 2018, consegue transmitir a mesma energia e tensão, mas agora pela perspectiva de uma das vítimas mais diretas que sofreram as consequências das atitudes de Michael. O filme então, compreende a vulnerabilidade e ao mesmo tempo a obsessão da personagem afetada pelo medo, transmitindo essa sensação de imobilidade e muita ansiedade, onde não se pode fazer nada além de esperar que algo aconteça.

O espectador, então, se encontra paralisado narrativamente dentro do filme, já que é submisso ao que a tela lhe transmite. O novo terror está nessa sensação de manipulação e impossibilidade de resistência que Rafaela Aparecida (2018) expõe em seu texto Controle da Mente:

Parece muito conveniente poder modificar a forma como outra pessoa pensa e age, mas ao passo que isso é interessante, é também assustador. Talvez seja por isso que essa ideia seja tão fascinante quando representadas pela ficção.

Fonte: Under the Skin, Seven Days

O novo gênero do terror carrega um certo peso ao tentar trazer para um formato que estava tão saturado um toque de autoconsciência, renovando totalmente a experiência, mas certamente caminha para sua reafirmação na indústria do entretenimento, abrindo espaço para ainda novos gêneros e meios de contar histórias.

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