Agenda-setting, Framing e o Ativi$mo de Tevê

Amanda Prestes
teorias-comunicacao
3 min readNov 12, 2017

Não é de hoje que as marcas e empresas vêm se apropriando das causas em benefício próprio: o programa “Amor & Sexo”, que faz parte da programação da Rede Globo desde 2009, apresentado pela jornalista, modelo e atriz Fernanda Lima, reposicionou-se neste ano, em sua 10ª temporada.

Assuntos referentes à sexualidade da mulher sempre foram pautados, especialmente na mídia, de maneira estereotipada e até caricata, corroborando com o caráter heteronormativo, sexista e machista em consonância com o modelo de sociedade patriarcal.

Para entendermos este reposicionamento, devemos considerar a hipótese do agenda-setting, framing e o contra-agendamento.

Embora já houvessem pesquisas do agenda-setting, Maxwell McCombs e Donald L. Shaw são sempre citados como fundadores, ambos inspirados por Walter Lippmann, autor do livro Public Opinion (1922). Para Lippmann, dependemos dos meios de comunicação para nos informar e experimentar sentimentos de aprovação ou repulsa.

A hipótese do agenda-setting defende que nos informamos por meio da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de comunicação, atribuindo ou não significância. Nesse sentido, a realidade social nos é fornecida por meio da mídia.

Isso significa que muitos dos nossos “papos” no café, no almoço em família e até na mesa de bar são resultados das pautas midiáticas, ainda que, em sua maioria, de maneira imperceptível. Mas, se isso acontece, a ação reversa também é possível ao observarmos nosso potencial enquanto consumidores de informação e conteúdo midiático.

Não foi apenas no programa da Rede Globo que as coisas mudaram, a mudança partiu da sociedade e foi absorvida pelo Amor & Sexo. Esse contra-agendamento, cujo movimento resultou no reposicionamento do programa, marcou a última temporada, que passou de uma abordagem heteronormativa, monogâmica e machista das relações para uma abordagem plural e até disruptiva.

Nesse sentido, o programa valeu-se de uma pauta que já estava sendo discutida nos espaços públicos para ampliar sua visibilidade. A luta pelos direitos das mulheres e dos grupos LGBT+ ganhou espaço na internet, principalmente nas mídias sociais. O ativismo convocado pelas mídias sociais estendeu-se às ruas e vice-versa, transformando assim as causas em relevantes notícias.

Mas a hipótese do agenda-setting não termina aí: estudos mais recentes concluem que a mídia não tem apenas o poder de influenciar nossas conversas e preocupações, ela também condiciona e formata o que pensamos.

Assim, o conceito de framing pondera quem tem a capacidade de disseminar a forma com que pensa para os demais, a maneira com que temos que pensar os temas já estabelecidos pela agenda midiática e a descoberta do poder do texto comunicativo. A partir disso, o framing utilizado por Lima desvincula as temáticas do modo vulgar e escrachado, assumindo um novo perfil e uma nova linguagem — própria, inclusive, das causas.

A inserção das causas têm sido uma estratégia para agregar valor e fortalecimento às empresas e marcas visando o lucro. Por isso, vale ressaltar, além das temáticas abordadas pelo Amor & Sexo, outras temáticas abordadas pela emissora, a exemplo da nova novela “O outro lado do paraíso”, que retratou a violência doméstica em seus primeiros capítulos.

De modo geral, a violência contra a mulher na agenda midiática é notória: lembro-me de quase ter chorado outro dia com tantas notícias acerca de estupro, violência e abuso sexual e feminicídio lidas ao longo da semana. O ponto é: a violência sempre existiu e mesmo com toda essa evidência ainda é pouco comum um olhar interpretativo no que se refere à violência de gênero e feminismos.

Enquanto consumidores, pensemos:

De qual feminismo estamos falando? De quais causas estamos falando? De quais ativismos? Qual o alcance? Por que estamos falando do que estamos falando? Nossas conversas têm dono? A Globo se interessa por Feminismo ou quaisquer movimentos sociais? Quem está lucrando com isso?

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