Agenda-setting, framing, espiral do silêncio e a manipulação midiática

Clara Gonçalves
teorias-comunicacao
4 min readNov 24, 2019

Para começarmos a falar sobre essas teorias listadas no título, é preciso salientar que elas referem-se a conceitos elaborados na década de 60 e 70. Entretanto, é possível explicar cada uma com exemplos atuais do nosso cotidiano.

A Agenda-setting faz-se através de assuntos que os meios de comunicação pautam para o público. Isto é, em linhas gerais, trata-se da capacidade que a mídia tem de agendar os temas de conversas cotidianas dessas pessoas, ou, em outras palavras, “é uma abordagem que diz à audiência o que pensar, mas não como pensar”. Para McCombs, é uma teoria sobre a transferência das imagens dos meios de comunicação sobre o mundo às imagens da nossa cabeça. Como o autor diz, a Agenda-setting é a compreensão de que grande parte da realidade social é fornecida às pessoas pela mídia, que logo se expõem assim às opiniões formadas por ela.

Dito isso, é possível relacionarmos essa teoria da Agenda-setting com o posicionamento do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) durante e após as eleições de 2018. Desde a posse do atual presidente, Jair Bolsonaro, um ambiente amistoso entre o presidente e Silvio Santos, dono do SBT, vem tomando forma. O telejornalismo da emissora de Silvio direcionou sua linha editorial para uma cobertura branda e amena do Governo Federal.

Com o passar dos meses, o canal de Silvio Santos passou a ocupar o segundo lugar no ranking de audiência, e, segundo balanço divulgado pelo Ibope, essa é a maior audiência do SBT em dez anos. Naturalmente, os familiares e apoiadores do governo de Jair Bolsonaro foram apresentados aos telespectadores, que viram nessa medida uma possibilidade de comunicação com milhares de pessoas.

Vale ressaltar que Agenda-setting é dividida em níveis. O exemplo do SBT e Bolsonaro pode aplicar-se na agenda midiática, que são as questões discutidas na mídia; agenda pública, que são questões discutidas e pessoalmente relevantes para o público e agenda de políticas, que são as questões que gestores públicos consideram importantes.

Jair Bolsonaro e Silvio Santos

O apoio do SBT ao atual presidente traz consigo fortes características do framing, uma vez que há um processo de seleção, exclusão e inclusão do que será transmitido aos telespectadores do canal em relação ao atual governo e, notoriamente, uma construção das histórias noticiosas que serão destaques por parte da emissora. Como Entman (1993) ressalta, o framing é selecionar aspectos da realidade e promovê-lo conforme sua interpretação e moral e, sabendo do posicionamento político de Silvio Santos, isso fica claro a partir do momento em que a emissora opta por realizar uma cobertura sobre o que acontece no Governo Federal dando uma maior ênfase aos aspectos positivos.

Outro ponto importante de ressaltar, quanto o apoio do SBT, se fez em 06 de novembro de 2018, dias após a eleição presidencial, onde a emissora de Silvio exibiu a vinheta “Brasil, ame-o ou deixe-o”, dentre outras coisas com teor nacionalista. Esse era um dos slogans mais comuns no período da ditadura militar.

O fato de um dos maiores canais da televisão aberta transmitir vinhetas que remetem à ditadura militar, uma das épocas mais violentas da história recente do Brasil, reforça em muito outra teoria: a do Espiral do Silêncio. Essa teoria foi estudada na década de 60 (coincidentemente mesma década da ditadura) por Noelle-Neuman. Para a autora, indivíduos devem perceber que há mudanças de opinião no meio em que vivem e segui-las até o estabelecimento de uma opinião que prevaleça, enquanto outras opiniões são evitadas ou rejeitadas.

É possível perceber como a teoria do Espiral do Silêncio enquadra-se tanto no atual governo quanto na relação do SBT com o atual presidente: o importante são as opiniões dominantes, que acabam por refletir nos meios. A opinião individual passa por um processo de fragmentação do coletivo e passa a ganhar força o noticiado para esses indivíduos, o que gera um afastamento social de outros seres quando estes têm opiniões diferentes dos vinculados pela mídia, neste caso também, pelos chamados “bolsonaristas”. A teoria do Espiral do Silêncio ajuda a entender como a mídia funciona em relação à opinião pública e silencia as ideias dos indivíduos.

Conhecer e saber como essas teorias funcionam proporciona um maior entendimento acerca do que é noticiado e comentado no dia a dia das pessoas. Nada é ao acaso, o que está na mídia tem a finalidade de ser comentado e compartilhado. Portanto, fica o questionamento: falamos o que queremos falar ou apenas reproduzimos o que a mídia quer que falemos?

Referências

ROSSETTO, Graça Penha Nasciemento; SILVA, Alberto Marques. Agenda-setting e Framing: detalhes de uma mesma teoria? Intexto, Porto Alegre, UFRGS, n.26, p. 98–114, jul. 2012.

https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/11/com-bolsonaro-sbt-reforca-tradicao-de-agrados-a-politicos.shtml

https://www.dm.com.br/cultura/2019/08/apoio-a-bolsonaro-aumenta-audiencia-do-sbt/

https://teoriasdacomunicacao2.wordpress.com/teoria-espiral-do-silencio/

Autores: Maria Clara Gonçalves e Maria Fernanda Matos

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