Sexualidade é o que?

mai bilenki
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6 min readOct 22, 2019

Quando pensamos em sexualidade, as confusões são muitas. Por ignorância e por má fé, os discursos sobre esse tema quase sempre estão enviesados e cheios de teorizações que não condizem com a realidade.

A primeira importante questão é: quando falamos em sexualidade, boa parte das pessoas imediatamente entende que o tema é sexo, transa, trepada. Quando na verdade a sexualidade humana envolve um mundo de vivências e sensações e as relações sexuais são só uma pequenininha parte desse universo.

Eu já estava há mais de um ano inteirinho na especialização em sexualidade humana quando fui levada a pensar sério, pela primeira vez, qual seria a definição correta de sexualidade. Isso porque “sexualidade”, assim como “amor” e “cultura”, são coisas que a gente sabe que estão ali, mas que tem uma difícil conceituação.

Mas por que precisamos conceituar? Simples. Porque a gente pode estar se propondo a falar de uma mesma coisa (a sexualidade), mas estar partindo de lugares completamente diferentes. Para algumas pessoas o interesse na temática vem da vontade de compreender as orientações sexuais, identidades de gênero e suas expressões na sociedade. Um segundo grupo busca no estudo da sexualidade uma forma de solucionar o problema de casais que estão juntos há 5, 10, 30 anos e que mesmo se amando não transam mais (acredite, é mais comum do que você imagina).

Há também quem tenha interesse em compreender como a sexualidade está intimamente ligada com diversas questões psicológicas e existenciais, além daquelas pessoas que só pensam nessa temática para buscar uma forma de controlá-la.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem uma definição de sexualidade que é beeeem abrangente, mas que está de acordo com tudo aquilo que damos o nome de sexualidade em diferentes espaços sociais:

“A sexualidade é uma energia que nos motiva a procurar amor, contato, ternura e intimidade, que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados, é ser sensual e ao mesmo tempo sexual; ela influencia pensamentos, sentimentos, ações e interações e, por isso, influencia também a nossa saúde física e mental”

(OMS, 1997)

A sexualidade, então, está presente da vida todas as pessoas, em todas as fases da vida. Há pelo menos quatro esferas da sexualidade humana que são as principais, ao meu ver, para compreender a complexidade do assunto:

Sexo biológico

Sexo biológico está relacionado ao corpo físico com que nascemos, já nos primeiros segundos de vida (ou até antes, por conta dos exames de ultrassom realizados a partir do quarto mês de gravidez) todas as pessoas são definidas como machos ou fêmeas. Neste primeiro momento, essa diferenciação parte exclusivamente do órgão genital. Mas essa diferenciação também está na carga genética e nas características secundárias relacionadas a cada sexo, como o aparecimento de barca e o crescimento de seios.

A grande questão do sexo biológico é que ele não é tão definidor quanto se acreditou por muitos e muitos anos. Entre os machos e fêmeas existe uma imensa possibilidade de variações, às pessoas que nascem neste meio, damos o nome de intersexuais.

A Organização das Nações Unidas (ONU), estima que as pessoas interexuais somam entre 0.05% e 1.7% da população mundial. Isso quer dizer que as chances de você conhecer (ou ser, quem sabe?) uma pessoa intersexual é alta. Muito mais provável do que você ter contato com uma pessoa albina, por exemplo, já que elas somam em média 0,001% da população.

A intersexualidade é impossível de identificar socialmente na maior parte dos casos. Por isso, existem pessoas que passam a vida inteira sem se reconhecer como intersexo. Para a medicina existem pelo menos 40 tipos de intersexualidade. A incompatibilidade entre órgãos e cromossomos sexuais (XX, XY) são as principais delas, junto com as alterações hormonais. Só em casos mais raros as crianças nascem com ambiguidade sexual, ou seja, características de macho e fêmea no próprio órgão genital.

Identidade de gênero

O gênero é uma construção social que ajuda a determinar e controlar o que é feminino e o que é masculino na sociedade, ele ajuda as pessoas a se considerarem pertencentes ou divergentes do padrão para homens e mulheres. A identidade de gênero está relacionada com a forma como cada pessoa se sente e se identifica.

As identidades de gênero estão divididas entre cisgêneros e transgêneros, sendo as primeiras, pessoas que são designadas como macho ao nascer e se identificam socialmente como homens e pessoas que são designadas como fêmeas ao nascer e se identificam como mulheres.

Quaisquer outras pessoas estão no que entendemos como guarda-chuva transgênero. Aí se incluem homens trans, mulheres trans, travestis, pessoas não-binárias, gênero fluido, agênero, genderqueer, entre outras diversas identidades. Veja algumas:

imagem retirada do site culturaegenero.com.br

Expressão de gênero

Diferente da identidade de gênero, a expressão de gênero é como a pessoa se mostra para o mundo. Geralmente servem para externar a identidade de gênero (como a pessoa se sente), mas nem sempre. Algumas mulheres lésbicas, por exemplo, têm uma expressão de gênero mais masculinizada, mas ainda assim se consideram mulheres cisgêneras.

As expressões de gênero podem ser: feminina, masculina, neutra ou andrógena.

Expressão feminina: algumas das características feminilizantes da aparência são o cabelo e unhas compridas, maquiagem, saias, vestidos e salto alto

Expressão masculina: a expressão masculina está ligada aos cortes de cabelo mais curtos, utilização de roupas mais retas, como camisetas e calças jeans, tênis, gravatas e blusas de gola polo etc.

Expressão neutra: algumas pessoas preferem passar uma expressão neutra, utilizando de cores que chamam pouca atenção na vestimenta e usando referências de gênero o mínimo possível.

Expressão andrógena: já as pessoas andróginas costumam usar muitas referências de ambos os gêneros. Barba e batom, gravata e saia, salto alto e jaquetão.

Outras formas de expressão de gênero são os cortes de cabelo mais diferentões, os cabelos coloridos, o nome e apelido pelo qual as pessoas escolhem ser chamadas e principalmente a forma como interagem com outras pessoas.

Orientação sexual e romântica

A orientação sexual está relacionada ao desejo sexual que sentimos por outras pessoas. E a orientação romântica (essa é novidade?!) está relacionada à nossa disposição para afetividade com certas pessoas. As orientações sexuais mais comuns são: heterossexualidade, homossexualidade (lésbicas e gays), bissexualidade, pansexualidade, polissexualidade e assexualidade.

Pessoas heterossexuais são aquelas que sentem atração pelo gênero oposto e as homossexuais que sentem atração pelo mesmo gênero que se identifica. A bissexualidade presume um interesse sexual por duas identidades (bi), que são lidas socialmente como homens cisgêneros e mulheres cisgêneras. O que fez surgir uma nova orientação, a pansexualidade.

A pansexualidade é o popular “gosto de pessoas e não de gêneros/sexos” porque afirma que o indivíduo sente atração por todas as identidades de gênero existentes. Já a polissexualidade é mais limitada, por exemplo, uma mulher cisgênera que sente atração por homens trans e mulheres trans, mas não por homens cisgêneros e mulheres cisgêneras pode se considerar polissexual. Mas a polissexualidade tem também outras diversas possibilidades.

A assexualidade, então, é caracterizada pela falta de interesse sexual. É importante ressaltar que a assexualidade, assim como todas as outras orientações sexuais, não é considerada uma problema ou uma questão médica. Existem pessoas que tem uma baixa libido por questões hormonais ou psicológicas, mas as pessoas assexuais não fazem parte desse grupo.

O termo certo é pessoa assexual, não assexuada.

O termo assexualidade também serve como um guarda-chuva e dentro dele existem diversos tipos de assexualidade (falaremos sobre isso outra hora), desde pessoas que não tem interesse sexual algum, até as que sentem interesse sexual em ocasiões específicas.

Todas essas definições de orientação sexual valem também para a orientação romântica, essas duas orientações podem coincidir, mas nem sempre acontece. Exemplos:

1) Uma pessoa pode ser panssexual (sentir atração sexual por todas as pessoas) e aromântica (não sentir vontade/desejo de se relacionar emocionalmente com nenhuma pessoa).

2) Uma pessoa pode ser bissexual (sentir atração por homens e mulheres cisgêneros) e homoromântica (só sentir vontade se relacionar afetivamente com pessoas do mesmo gênero que ela).

Tá, ok. Já deu para entender que o tema sexualidade é de explodir a cabeça, não é?! Mas para o bem, eu prometo. E você, em contrapartida, me promete que a confusão inicial não vai te fazer desistir de entender tudo isso! ❤

Se você ficou com dúvidas ou tem alguma correção a fazer, pode comentar aqui ou entrar em contato comigo direto, eu vou amar.

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mai bilenki
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quero falar de gênero, sexualidade, não monogamia, política, feminismo e amor - seja lá o que ele for.