Não tenha empatia apenas pelo seu cliente!

Mauro Tavares
the product discovery
6 min readJan 24, 2021

Um amigo uma vez citou uma frase que não lembro a autoria que dizia que nós somos reféns do último livro que lemos. Apesar de já ter o tema deste artigo em meu backlog, faz um tempo, depois que comecei a ler o livro de Ben Horowitz, “O lado difícil das situações difíceis”, tive a inspiração necessária para escrever. Este livro, por mais que conte a experiência de uma pessoa no papel de um diretor executivo, traz muitas reflexões sobre estratégia e o pensamento holístico e sistêmico que se deve ter trabalhando em uma empresa, seja pequena, média ou grande. E tudo isso de uma forma muito esclarecedora, mostrando as vulnerabilidades de uma empresa, o que por sua vez gera uma conexão com a história.

Foto do livro “O lado difícil das situações difíceis” de Ben Horowitz em cima de um teclado de computador branco
Livro: O lado difícil das situações difíceis — Ben Horowitz

Você faz parte de um ecossistema

Parafraseando uma definição de ecossistema podemos dizer que é tudo que faz parte de algo que pode afetar a outra parte. Que também pode definir as relações entre os funcionários de uma empresa. Mesmo que uma empresa gigantesca, onde talvez você não consiga ter contato com metade das pessoas que fazem parte, talvez o que você faça pode afetar de forma positiva ou negativa essa pessoa que nem conhece.

Dentro da área de design e produto, temos como um mantra o conceito de User Centered, porém isso nos leva a pensar sempre na pessoa que vai usar o produto e muitas vezes esquecemos que quem está construindo ou trabalhando para manter o produto funcionando também são pessoas.

“Whatever you’re doing, always think of the people.”

— Don Norman

Se tratando de uma grande empresa, é muito comum ter uma divisão em silos, onde cada um está com o foco na área/departamento que trabalha onde cada silo tem um objetivo e uma tarefa. Esse modelo de trabalho acaba influenciando ainda mais a ideia de que devemos focar apenas no usuário e não dar tanta atenção para as pessoas que estão trabalhando ao nosso redor. E isso acaba sendo extremamente prejudicial para a construção de um produto/serviço, pois devemos ter esse pensamento holístico de que outras pessoas além do usuário também utilizarão e se beneficiarão disso. E não apenas isso, no processo de construção também existirão diversas pessoas envolvidas e é necessário saber como tratar cada pessoa, entender suas necessidade e comunicar as suas. Esse processo fica bem mais difícil quando são colocadas fricções desnecessárias nessas relações.

“Service design is not only useful to create value for the “end user” or “customer”. Ir addresses the entire value ecosystem, and might focus on offering aimed at end users, other businesses, internal partners, or colleagues. In other words, service design works for public services, B2C, B2B, and internal services.”

— This is Service Design Doing, Marc Stickdorn | Markus Edgar Hormess | Jakob Schneider

Na edição do Product Camp 2020, Fernanda Sozinho da Hotmart trouxe uma visão de como é trabalhar com produtos internos, aplicando conceitos de discovery que estamos acostumados a fazer com clientes, com funcionários da empresa. Um ponto que podemos tirar de aprendizado aqui de uma maneira mais generalista, é a preocupação com as pessoas à nossa volta, se as coisas também funcionam bem para elas e quais são suas necessidades mais latentes que podemos tentar ajudar gerando uma oportunidade rica de troca.

Você não sabe de tudo

“Mas nenhum cérebro, por mais brilhante que seja, consegue resolver um problema que desconhece.”

— O lado difícil das situações difíceis, Ben Horowitz

Quanto maior uma empresa é, mais complexo se torna seu sistema de comunicação, pois existem muitas variáveis e uma única informação precisa muitas vezes ser dita de diferentes maneiras, algumas vezes para que tenha algum resultado. Isso se dá, por que as pessoas muitas vezes trabalham em contextos diferentes, em áreas que acabam tendo uma micro-cultura diferente da nossa. Logo, você não será capaz de pensar em tudo com todos os pontos de vista existentes em uma empresa. Você pode conversar com as pessoas, entender suas necessidades e motivações, se colocar no lugar dela, mas você nunca será a outra pessoa.

Portanto, devemos ter um ponto sempre em mente de forma muito lúcida:

Nós nunca saberemos tudo. O que sabemos é pedacinho de um todo.

Vamos supor, duas pessoas de contextos diferentes estão olhando para uma parede e nessa parede existe um desenho abstrato. Com certeza, cada uma vai olhar para esse desenho de uma forma e tirar conclusões diferentes, pois seus contextos e backgrounds são diferentes. E nenhuma das duas estará errada.

Duas lições importantes sobre isso:

  1. Devemos ter consciência de que não sabemos de tudo
  2. Quando unimos pessoas diferentes pensamos melhor

Compartilhe os problemas

“A empresa que discute seus problemas com liberdade e abertura é capaz de solucioná-los com maior rapidez”

— O lado difícil das situações difíceis, Ben Horowitz

No livro de Ben Horowitz fala de uma situação de um gerente que não gostava de ouvir sobre problemas, se os funcionários não viessem com uma solução e como isso pode ser prejudicial para um time ou uma empresa toda. Imagine um funcionário que acabou de entrar na empresa, ainda está aprendendo os processos e como tudo funciona, se ele achasse um problema que ninguém mais estava vendo, mas que não soubesse ainda como resolver, você deixaria de ouvi-lo? Pois bem, nem todo mundo tem resposta para tudo, mas todo mundo tem algum problema ou tem consciência de algum.

Atritos são necessários

“Creating something from nothing is a contact sport” — The Messy Middle, Scott Belsky

Este último ponto que trago aqui é para dizer, que sempre tentamos evitar atritos com as pessoas, mas existem alguns momentos que atritos são necessários. A partir do momento que alguém discorda de você e isso te deixa desconfortável, você provavelmente vai tentar contra argumentar para provar seu ponto. E é neste momento que pode acontecer duas coisas:

  1. Você encontrar novos argumentos e pensar em coisas que ainda não tinha pensado;
  2. Você refletir ao ponto de descobrir que você realmente estava falando besteira. E se isso acontecer, não tente se convencer de que está certo, vai ficar feio uma hora.

Quando estamos trabalhando com a criação de produtos, se o que estamos propondo não tiver nenhuma discordância com alguém ou algum time, tem alguma coisa de muito errado, pois é impossível que você saiba de tudo e esteja totalmente certo. Durante o processo de construção de algo novo, quanto mais feedbacks e críticas mais rico é.

Os atritos vão te fazer sair da zona de conforto, mas saiba administrá-los para que não vire tretas fora do controle.

Takeaways

  • As pessoas que vão trabalhar para que o produto que você está construindo também tem necessidades, não se esqueça delas;
  • Você não é a última bolacha do pacote, você faz parte de um ecossistema quando está trabalhando em uma empresa;
  • Se você está vendo o iceberg na frente do Titanic, avise, mesmo que não possa fazer nada a respeito. Alguém saberá o que fazer. (No caso do Titanic não deu tempo mesmo);
  • Tretas controladas te ajudam a pensar pontos que jamais pensaria em situações normais.

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