Caminho de Santiago — Day 0

A última dormida — Leon, Espanha

Maria Fernanda Garcia
The way | My way
3 min readApr 25, 2018

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Estou sentada no trem, indo para a cidade de onde vou começar o Caminho e tentando começar esse texto há uns 15 min.

Começo a caminhar amanhã e a ansiedade, o medo, a animação, a vontade tomam conta de mim. A verdade é que não sei o que esperar, então, também não sei o que pensar.

Dizem que quando alguém que deve escrever um texto não sabe o que dizer, cai no clichê de falar sobre a dificuldade do ato de escrever. Vou me render a mais esse clichê e dizer: hoje está impossível.

Impossível colocar em palavras o que o coração agitado quer gritar. Impossível fazer sair daqui de dentro o que motiva tudo isso.

Chegou. Chegou a noite anterior. Chegou o último sono.

Por toda essaa espera, lembrei de quando eu era criança e ficava ansiosa para alguma coisa que ia acontecer, minha vó me ensinava a contar “as dormidas”. Ela dizia que eu só ia ter que dormir mais 3, 4 ou 5… vezes. Na minha ansiedade de criança que espera algo com muita vontade, a noite em que faltava 1 dormida era a mais difícil.

E agora falta 1 só dormida para o dia que guarda o que eu tanto esperei.

Foram 6 meses de planejamento, 7 anos de sonhos sobre o caminho. E chegou. Deus em sua infinita misericórdia providenciou para que o meu dia fosse o 26 de abril de 2018. E assim será.

Venha o que vier, aconteça o que acontecer.

O 25/4

E o dia de hoje já foi cheio de esperas. Sai de Barcelona às 9h da manhã. Cheguei em Bilbao antes das 10h. Chovia e a cidade não tinha tanta graça. Fui para a estação de trem tentar adiantar meu trem, sem sucesso.

Restava esperar. 5h de espera. Quando entrei no trem, acho que relaxei, todo o cansaço acumulado, misturado com a ansiedade se tornou um estômago embrulhado e um sono incontrolável.

Dormi.

E algumas horas depois, estava em Leon. Cheguei já passadas as 21h. A cidade é linda e fervilhava com a ansiedade dos espanhóis pela partida da Champions entre Real Madrid e Bayer. Todos os bares lotados.

Fui direto para o Hostel. E que escolha feliz.

No hostel, conheci o Juan. Um cara com aparência de uns 50 anos de idade que já fez o caminho de Santiago 18 vezes. Ficou muito feliz em saber que eu era uma mulher, católica que estava indo fazer o caminho sozinha. Juan é o que chamamos aqui de Hospedero: pessoas que são apaixonadas pelo Caminho de Santiago e que vivem de tentar prover aos peregrinos alguma ajuda, conforto. São donos de hostels, alguns sao voluntários… de toda forma, vivem para ajudar as pessoas a viverem melhor o caminho.

A primeira pergunta que me fez foi:

Que horas você quer tomar café amanhã?

Eu logo respondi que queria ir a missa 8h30 antes de começar a caminhar. Ele disse que tomaria café comigo 7h30 para me dar todas as dicas sobre o caminho.

Nesse momento, entendi do que é feito isso aqui: experiências. Experiências compartilhadas e vividas plenamente.

Mal sabe ele, mas o Juan já me ensinou mais sobre o Caminho do que pude aprender em muito tempo lendo blogs e pesquisando no google.

Já estou ansiosa pelo nosso café da manhã…

Amanhã conto mais… vamos a última dormida!

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