Carteira de Ações: Uma análise da estratégia 130/30.

Thomas Freud
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Por mais que possa não ser consensual, acredita-se que nas dificuldades jazem as oportunidades, ou pelo menos muitas delas. Em dezembro de 2019, qualquer um que quisesse comprar ações na bolsa de valores de São Paulo encontraria pouquíssimas ações descontadas, ou bem dizer “baratas”. Vira o ano, vêm a covid-19 e meses depois, cai o índice bovespa. Depois disso, em uma breve análise nas cotações é possível enxergar ativos com preços em níveis tais que seria difícil imaginar três meses antes. E são companhias grandes, sólidas e com saúde suficiente pra atravessar essa situação presente com bastante tranquilidade.

Posto isso, é possível que essa seja a melhor oportunidade, em anos, para se construir um portfólio com expectativas reais de obter altas rentabilidades. É, mas existe toda uma ciência por trás da construção de carteiras de ações e títulos, quanto valor aplicar em renda fixa e quanto em renda variável, etc. O investidor pode, é claro, começar pelo caminho mais simples, comprar ações — operar comprado ou long — de empresas grandes e esperar (afinal o mercado de ações é investimento de longo prazo), caso não possa seguir com uma gestão mais ativa de seus investimentos. Para aqueles que podem dedicar mais tempo à gestão de seus recursos, e estejam dispostos a estudar para entender melhor o mercado, a literatura é vasta.

Esse texto resolve abordar um desses tópicos pertencentes a tão vasta literatura, qual seja, a estratégia 130/30. Para compreensão da 130/30 é preciso antes entender o que é uma operação vendida no mercado de ações. Operar vendido (short) é, por definição, apostar contra algo, ou seja, apostar que um ativo vai apresentar desempenho ruim, trocando em miúdos, que sua cotação vai cair. É possível operar vendido por meio de opções ou diretamente com os ativos. Na prática, o investidor vai vender uma ação que não possui.

Para viabilizar isso ele toma emprestado a ação de alguém que a tem, pagando um aluguel. Uma vez em posse delas, ele as vende e o dinheiro da venda entra em seu caixa. Se a ação cair, ele vai recomprá-la, com o dinheiro que entrou na venda anterior, em um nível de preço mais baixo, devolvendo as ações ao detentor que as emprestou e embolsando os lucros.

O risco da operação é o de a ação não cair, pior ainda, subir indefinidamente, levando o investidor à ruína. Note que existe um limite para a queda de uma ação: ela cai até zero. Todavia, não existe limite-teórico para o movimento de alta de uma ação.

A estratégia 130/30 portanto combina as operações de operar comprado e vendido no mercado. Por simplicidade, vamos supor um investidor operando apenas com dois ativos — comprado em um e vendido no outro — . Futuramente abordar-se-á o princípio da diversificação e porque ele é tão importante na construção de uma carteira de ações. Supõe-se que ele opera comprado em PETR4 e vendido em PRIO3. Inicialmente ele compra 100% de seu capital em PETR4, pois ele fez uma série de análises e identificou o potencial de valor dessa ação. Depois disso, ele resolve operar vendido contra PRIO3, digamos com o equivalente a 30% de seu capital, com isso entra em seu caixa o valor da venda, somando (caixa + investimento) 130% de investimento. Então ele investe os 30% da venda de PRIO3 em mais ações PETR4 — dai porque o nome 130/30 — permanecendo 130% comprado e 30% vendido. Observe agora que, caso as análises do investidor estejam coerentes, e supondo uma taxa de rentabilidade média r, a expectativa de retorno do investidor será agora de r*(130+30), já que ele irá lucrar tanto na subida de PETR4 com 130% de seu capital, quanto na queda de PRIO3 com 30% de seu capital. Ou seja, o investidor espera rentabilizar sobre um total equivalente a 160% de seu capital invistido.

Observe a figura que emoldura o título desse texto, suponha que a linha azul represente PETR4 e a linha vermelha seja PRIO3. Dado que o investidor tenha aberto as posições na interseção dos gráficos, o cenário futuro seria o melhor possível para o investidor, a ação comprada subindo e a vendida caindo, em contrapartida o oposto disso seria uma situação ruim.

Essa operação é comum quando se deseja proteger carteiras. Sabendo que ambas as ações escolhidas são do setor petrolífero, imagine uma crise no setor acarretando uma queda generalizada nas cotações das empresas. Se o investidor estivesse 100% comprado ele seguiria sofrendo as perdas, mas com a estratégia 130/30 ele diminuiria suas perdas, lucrando com a queda na operação vendida.

Cabe dizer que o ponto crítico dessa estratégia seria a escolha dos ativos. Mesmo em uma situação hipotética, com dois únicos ativos, exigir-se-ia um certo grau de cuidado e critério na escolha de ativos. Montar um portfólio com uma dezena de ativos, escolher cada ativo usando análise quantitativa ou fundamentalista, fazer analise de setor e de mercados, definir indicadores relevantes, averiguar a qualidade dos dados obtidos para análise, etc., são tarefas complexas que exigem cuidado e diligência, sob o preço de inviabilizar qualquer ganho que pudesse ser obtido com a aplicação adequada da estratégia.

Para quem estiver interessado em ler um artigo bastante acessível sobre a estratégia 130/30 com uma análise de desempenho recomenda-se a leitura de :

An Empirical Analysis of 130/30 Strategies: Domestic and International 130/30 Strategies Add Value Over Long-Only Strategies GORDON JOHNSON, SHANNON ERICSON, AND VIKRAM SRIMURTHY

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Thomas Freud
thomasfreud

PhD Student, Actuary and master in statistics and probability | Accounting bachelor's degree.