RECEITA PARA QUEM ESTÁ COMEÇANDO EM PROPAGANDA.
Na verdade, isso não é uma receita. Algumas pitadas de dicas, sim. Acrescente também umas doses de leitura obrigatória e xícaras de café para conciliar a rotina da criação de uma agência e o tempo para escrever um artigo para você. Sim, isso é isso.
Antes de sentar na frente do computador e começar a cozinhar o cérebro com essa pressão que é criar para propaganda, você precisa saber que tudo que vou escrever são experiências que provei e você também vai provar se decidir seguir nessa profissão. Algumas serão amargas, outras sem sal, porém muitas delas serão muito saborosas. Só não lamba os dedos, porque teclados e mouses costumam ser muito sujos.
Criar para propaganda exige um bom nível de concentração, dedicação e paciência com você. Diferente de criar para as artes, na propaganda a ideia não vem. É você que vai até ela. Ah, mas não pense que ela vai estar lá esperando você toda pomposa. A ideia é como um peixe escorregadio dentro de um buraco que só cabe os seus dedos. Não é impossível pegar, mas dá muito trabalho.
Quando o assunto é criação publicitária, você precisa saber que nada é por acaso. A ideia não aparece ali sem mais nem menos. Assim como não foi à toa que resolvi associar esse texto à culinária. Vejo gente que passa mais tempo procurando o livro de receita das ideias fáceis do que se empenhando a fazer o trabalho que é muito difícil e, para alguns, indigesto. No entanto, se existisse o tal livro, uma das receitas com certeza seria a Associação de Ideias.
É uma técnica de escrita criativa usada não só por Publicitários, mas por grandes autores como Veríssimo e Millôr. Ambos já nos serviram crônicas e poemas salpicados de Associações de Ideias. Palavras que pertencem a vários universos contextuais com significados ricos que deixam o texto, digamos, mais gostoso. Mas como usar? Comece misturando tudo que você já viu, leu, ouviu, sentiu, pensou.
Agora todas as referências estão fervendo na sua cabeça. Ainda meio sem saber como misturar tudo, você chega para um profissional, pede uma dica e o conselho é: “faz mais 50”. Mas o que dicas como “quanto mais, melhor” querem dizer?
Falar que “é da exaustão que vem a perfeição” não ajuda. “Faz mais, mais, muito mais” isso não diz nada. É pra fazer mais de quê? Fazer mais do que está errado não transforma o errado em certo. Isso é continuar fazendo sempre a mesma coisa esperando resultado diferente. Einstein chamou isso de insanidade.
Na hora de criar para propaganda, você deve enxergar o contexto como um todo: briefing, nome do produto/empresa, o serviço que a empresa oferece, o perfil do público que é cliente dessa empresa, se gostam da marca, se não gostam, quem são os concorrentes, como anunciam, o que já foi feito e deu certo, o que já foi feito e não deu certo, etc, etc, etc.
Percebe que não adianta sentar e esperar a ideia? Olha quanta informação você precisa juntar para depois experimentar misturas e combinações que harmonizem e que, de preferência, sejam originais.
Essas combinações é que precisam ser testadas à exaustão. Se você tem um produto que é uma marca de café, pegue uma folha em branco e comece uma lista de palavras que façam parte desse universo. Por exemplo: bebida, quente, xícara, fumaça, coador, pó, acordado, sono, sonho, piscar, pescar, preto, puro, leite, chantilly, espresso, expresso, rápido, gostoso, sabor, amargo, doce e por aí vai.
Não pare. Continue escrevendo até dar aquela agonia no cérebro. Depois de ter espremido sua cabeça ao máximo, mas ao máximo mesmo, aí sim você vai para o próximo passo.
Pegue uma palavra dessas que você escreveu e comece uma nova lista. Mas agora é de ideias possíveis em cima dessa palavra. Escolheu a palavra “quente”? Liste ideias como: queima a boca pra acordar, um cérebro fervendo na cafeteira, etc. Faça isso com todas as palavras. Entendeu bem? TODAS. E com isso, vai tentando encontrar ideias que estejam dentro do briefing, que tenham a ver com o público da marca, que tenha a ver com todas aquelas informações que a gente já sabe.
Se sua maior dificuldade era sentar na frente do computador e não ter ideia nenhuma, olha só quantas você teve para um único job.
Mas o trabalho ainda não acabou. Depois de ter tido todas essas ideias, chegou a hora de passar pelo coador. Escolha as mais originais, as mais relevantes e as mais criativas. As ideias que se encaixarem bem nesses três pontos você separa, lapida, acha a melhor forma de fazer, veja como elas funcionam em várias mídias. Aí sim, com as que sobreviverem a essa exaustiva cocção, você faz um rough (raf) para cada uma e apresenta para o seu Diretor de Criação.
Calma que ainda não acabou. Porque, se ele aprovar, está na hora de montar o prato. Mas diferente do Master Chef, onde a apresentação do prato é tão importante quanto o sabor, na propaganda essa é a parte mais importante. É a execução que diferencia uma agência da outra.
Viu? Eu disse que não era fácil. Fazer um bom trabalho criativo é demorado, cansativo, exige dedicação e muita paciência para não queimar etapas de um processo que tem tudo pra ser é delicioso.
Veja anuários, leia livros de Redação Publicitária, leia livros de Direção de Arte, livros de Design, livros de ficção, romances. Assista a filmes que você quer ver, filmes que você não quer ver, filmes que sua mãe gosta e lembre-se: Criar para propaganda é mistura coisas que as pessoas gostam e devolver para elas de um jeito que gostem mais ainda.
Bote a mão na massa, porque a única receita é trabalhar.