Passagem de ida para onde eu ainda não sei

Carolina Firmino
Todas as estações
2 min readMay 20, 2019

As inspirações nos alcançam se a gente sair do lugar. Os sonhos também.

Durante algum tempo, acreditei que as despedidas só podiam ser ruins. Afinal, o que há de bom em deixar para trás pessoas e lugares que amamos? Por mais que às vezes eles não sejam mais os mesmos de quando os conhecemos, ainda estão ali. E quem fica, merece que a gente fique também, não é? Permaneça.

Não sei de onde tirei essa ideia completamente errada sobre pertencimento, amor e entrega. Com o tempo, comecei a entender por que a minha dificuldade de ir embora e interromper ciclos é tão recorrente. A segurança de já conhecer onde e com quem estou antecipa os riscos e as dores. Eu tenho medo de pisar em falso. Passei quase uma década no mesmo trabalho. Passei quase uma década justificando relacionamentos ruins. Passei quase uma década preocupada em não decepcionar ninguém. Permaneci.

Refazer o destino, repensar os caminhos, reinventar direções

Na verdade, eu não sei o que de fato permaneceu, porque deixei de me reconhecer. Nos últimos cinco meses, tenho tratado uma TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada) com depressão moderada. Sempre escrevi sobre ambas em caráter informativo, mas vivê-las é infinitamente diferente. Por que aceitamos com facilidade o que o outro sente e repreendemos nossos pedidos de ajuda?

Antes do remédio, dormia o dia todo depois do trabalho, não conseguia escrever minha tese, deixei de ouvir músicas, os livros se acumularam e eu só tinha prazer em comer. Que tristeza era essa? Guardava tudo dentro de mim e vestia meu melhor sorriso para esconder o óbvio: algumas despedidas precisavam acontecer, alguns ciclos precisavam se fechar.

“Tome um refrigerante, coma um cachorro-quente/ Sim, já é outra viagem e o meu coração selvagem/ Tem essa pressa de viver”: foi com um recadinho de Belchior que aconteceu a primeira delas, na semana passada. Deixei o único emprego que tive com a sensação de assistir ao último episódio daquela série que me fez rir e chorar na mesma intensidade.

Comecei outra viagem desde então. Quero perder o medo de pisar em falso. Ao coração selvagem com pressa de viver, que compartilho com o rapaz latino-americano, só peço que permaneça em mim.

Ainda estou aqui.

--

--

Carolina Firmino
Todas as estações

Jornalista, capricorniana, adora ler e falar sobre a vida. Combina tudo com cerveja.