O mês do orgulho acabou, mas e as políticas públicas LGBTI+?

A evasão de dados sobre a população LGBTI+ a nível federal impossibilita a discussão de políticas públicas por parte do poder público que contemplem a comunidade e suas demandas

TODXS
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4 min readJul 27, 2021

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Por Letícia Hora

André Borges/Metrópoles

O mês de Junho é inteiro contemplado pelas campanhas de visibilidade LGBTI+ por grandes marcas, porém ao se olhar no campo das políticas públicas, a lacuna informacional sobre a formulação de agenda de políticas LGBTI+ é escassa.

Isso não significa que não haja instituições e pessoas engajadas na produção desses dados. Muito pelo contrário. Basicamente toda a produção de conhecimento da comunidade LGBTI+ parte de organizações da sociedade, militantes e a própria comunidade.

Essa ação em prol da comunidade é responsável por pressionar agentes governamentais para implementação de políticas, produzindo diversos documentos, dados e relatórios, que são responsáveis pela magnitude de entendimento da pauta LGBTI+ no estudos de políticas públicas que temos hoje disponíveis.

Organizações como a TODXS, ANTRA, #VoteLGBT, AllOut, Grupo Gay da Bahia e muitas outras iniciativas, são responsáveis por trazer a discussão e debate das lacunas de políticas públicas LGBTI+ de uma forma geral, e também visando a discussão de demandas específicas dentro da comunidade que são invisibilizadas.

O que constata-se, portanto, é um ciclo estrutural no qual de um lado não há política pública e por isso não há dados, e, de outro, não há dados, porque não existem políticas públicas.

Qual é o nosso cenário nacional atual?

Diante da ausência de dados e políticas públicas voltadas às populações LGBTI+, o Estudo “LGBTQIA+ em Pauta” da EACH-USP identificou a existência de dados públicos e lacunas informacionais nas áreas da Educação, Saúde, Segurança Pública e Trabalho & Assistência Social na esfera federal.

Nesse mapeamento, quase não foi possível encontrar políticas públicas que fossem estruturadas a nível intersetorial, e que inserisse tais populações LGBTI+ como público central.

Pensando ainda nesse contexto, em 2019 o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou a LGBTfobia ao crime de racismo, viabilizada pela Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26.

Essa foi uma grande vitória para a viabilização e visibilidade da discussão de agenda LGBTI+, decisão que foi resultado de muita luta e pressão. Porém, o caminho para consolidação políticas seja na formulação, implementação e/ou avaliação destas, é longo.

Como exemplo, desde 2016, a Conferência Nacional de Políticas Públicas de Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais não acontece, o que ressalta mais uma vez a falta de comprometimento e vontade política do Governo Federal e outras esferas de poder com a agenda LGBTI+ e a promoção do debate da pauta.

Como imaginar um futuro positivo para as políticas públicas LGBTI+?

Mesmo com muita pressão por parte de militantes, coletivos e organizações LGBTI+, o Censo Demográfico (IBGE) ainda não inclui em sua pesquisa perguntas sobre a população LGBTI+.

Dessa forma é impossibilitada a criação de perfis socioeconômicos e geográficos em esfera nacional, o que dificulta visualizar as realidades, dificuldades, impasses e lacunas existentes de forma oficial e contempladora sobre essa população.

A pressão política faz um papel extremamente importante na luta pela garantia de nossos direitos sociais, econômicos, cívicos e políticos.

Existem políticas municipais e estaduais específicas que procuram atender demandas da comunidade LGBTI+. O Estudo “LGBTQIA+ em Pauta” da EACH-USP, mostra como algumas dessas políticas foram mapeadas dentro dos grupos temáticos de análise, como é o caso do Transcidadania, da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania do Município de São Paulo, que promove a reintegração social e cidadania de travestis, mulheres transexuais e homens trans em situação de vulnerabilidade.

Essas políticas são importantes para ajudar a pensar em contexto federal, políticas que contemplem a população LGBTI+ em todo território brasileiro.

O caminho que devemos seguir hoje, é de muita luta e resistência, para poder continuar a ocupar lugares, criar conhecimento e gerar debates que viabilizem a garantia dos nossos direitos.

Nossa pauta deve ser conhecida, pressionando politicamente instituições em todo o território nacional, para que as agendas entrem em discussão e, cada vez mais, tenhamos a visibilidade devida.

Dessa forma podemos garantir que a comunidade tenha suas demandas gerais e específicas atendidas, já que o problema vai além da retórica e leva diariamente muitas vidas inocentes, vítimas do preconceito e da violência.

Letícia S. M. Hora — Analista de Pesquisa Qualitativa na área de Pesquisa & Desenvolvimento na TODXS. Graduanda em Gestão de Políticas Públicas e pesquisadora voluntária no “LGBTQIA+ em Pauta” pelo Observatório Interdisciplinar de Políticas Públicas Professor Doutor José Renato de Campos Araújo (OIPP) da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH USP)

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