Não é um dia comum esse que surge no céu.

revista toró
toroeditorial
Published in
3 min readJun 2, 2020

--

Como em um quadro de René Magritte, há uma espécie de véu que obscurece o significado das coisas. Do lado de dentro, um vírus nos conserva entre paredes. Sentados em casa, com as mãos e os pés descalços, é cada vez mais difícil saber se é dia ou se é noite. Do lado de fora, a arrogância de um homem que vê, mas não enxerga, ceifa as vidas de tantas pessoas queridas. Sobre a curva que escala silenciosa, gravam-se em caneta invisível os nomes de pais, mães, filhos, tias, sobrinhos, primos, amigas, irmãos. E sobre seus corpos se estende um véu. Véu esse que, pouco a pouco, toma conta de nossos trabalhos, de nossos estudos, de nossos abraços, de nosso país. Véu que nos massacra, que nos sufoca, que nos impede de ver, de ouvir, de amar. Por baixo das marcas que deixa sobre nossos corpos, um fantasma começa a se erguer. Um fantasma do passado, que mais uma vez volta para nos assombrar.

Não podemos deixar que ele passe despercebido.

Do latim fascio, a origem da palavra fascismo significa “feixe”. Na Roma antiga, fazia referência a um machado feito com diversas varas de madeira amarradas. Muito usado para a punição e para a tortura, era carregado pelos lictores, guarda-costas dos magistrados poderosos do império. Para os antigos, assim como para os fascistas do início do século XX, o fascio era um símbolo importante de união. Afinal, um único graveto é fácil de quebrar, mas um feixe é difícil de arrebentar. No entanto, o que eles raramente costumavam dizer é que, para formar um feixe, é preciso que todos os gravetos sejam iguais. Não há espaço para diferenças. Não por acaso, a repulsa de tais pessoas a tudo o que consideram dessemelhante. Foi por conta de ideias como essa que muitos negros, judeus, ciganos, homossexuais e comunistas foram perseguidos ao longo da história.

Por isso, nós, da Revista Toró, nos unimos a todos os que se colocam contra o fascismo. É verdade que, desde a era Mussolini, eles trocaram as fardas e as medalhas pelos ternos e pelas gravatas; os olhares carrancudos pelas bravatas; as mentiras impressas pelas virtuais; os campos de concentração pelas fronteiras sociais. Mesmo assim, não podemos nos enganar: eles estão por aí e querem nos pegar. Na calada da noite ou mesmo à luz do dia. Evaldo Rosa foi pego por 80 tiros. João Pedro, por 64. Marielle Franco, por 4. Rodrigo Alexandre da Silva Serrano, por 3. E em Hélio Barreira Ribeiro, bastou apenas 1.

Enquanto dizem que nossa bandeira nunca será vermelha, pisam nas gotas de sangue que caem sobre ela. Com tochas nas mãos e ódio nos olhos, clamam por um país onde todos devem ser como eles. São corretos, ordeiros, únicos e totais. Acreditam em um mundo que não inclui a potente diversidade que a natureza nos dá. Bradam, violentamente, por um lugar que não inclua a beleza fundamental da amizade e do amor que temos por nossa gente. Querem matar nossos amigos, nossa família, nossos sonhos e nossos corações.

Pois não deixaremos que o façam!

Estamos unidos em luta e em resistência. Não como um fascio, arma simbólica dos autoritários e dos cruéis, mas como uma tempestade, que se acumula em gotículas no céu e desaba sobre as ruas para lavar os prédios, o ódio, os olhos e a alma.

Fiquemos todos de pé e gritemos

Fora Bolsonaro!

Equipe Toró.

Gostou? Quer receber mais textos como esse? Siga a gente aqui no Medium, deixe quantas palmas quiser e compartilhe nas suas redes sociais!
Instagram | Facebook

Quer publicar na Toró? Acesse nossas diretrizes e saiba como. Temos chamada aberta em fluxo contínuo para artistas de todo país.

--

--