Os prós e os contras da faculdade (em TI ou não): meu relato de experiência
AVISO: este texto não tem o objetivo de ser imperativo para falar que você deve fazer uma faculdade na área de TI e nem cunhar que é preciso de faculdade para ser um bom profissional na área. O artigo tem o intuito de ser elucidativo para quem pode ter dúvidas sobre fazer ou não a faculdade, onde compartilho a minha experiência e perspectiva pessoal.
Sempre que alguém pergunta em algum grupo de TI se deveria fazer ou não faculdade, atiça um rebuliço nos comentários, devido à polêmica do tema. Muitas pessoas defendendo ferrenhamente que é perda de tempo, alguns falando que depende, outros falando que precisa e assim por diante.
Como alguns sabem, eu fiz cinco anos de ciência da computação, mais dois anos de especialização e três anos de mestrado. Fiz toda essa carreira acadêmica trabalhando em tempo integral e costumo defender a importância do curso superior em conversas informais, mas nunca parei para esmiuçar este tema, até este tweet do William Oliveira que deu uma discussão muito interessante sobre o assunto:
Então, aqui estou para explorar um pouco mais deste assunto e mostrar os possíveis prós e contras de um curso superior. A intenção não é contar uma vivência positiva a partir da minha experiência pessoal e tentar derrubar alguns mitos e equívocos, já que muitas vezes pode-se encontrar muitas opiniões negativas sobre essa questão.
Não tenho pretensão de falar que você precisa fazer faculdade pra ser bem sucedido(a) na área de TI. Isso é muito subjetivo e tem muitas pessoas que manjam muito e não são formadas. Afinal, como o William falou: isso depende de vários fatores.
Equívocos comuns
Faculdade não é curso técnico
Vejo muitas pessoas comentarem que “a faculdade não me ensinou o que precisava para o mercado, eu aprendi tudo no trabalho”, “não aprendi nada útil na faculdade, só teoria”, “eu não sei isso, não vi na faculdade”, “tudo o que ensinaram, eu já sabia”.
Um curso superior de faculdade/universidade visa te formar em uma área de conhecimento e não te dar uma formação técnica de mercado, embora também englobe essa faceta no currículo.
Essa formação envolve fornecer as bases teóricas e práticas daquela área que você escolheu, para que você instancie esse conhecimento em diferentes contextos. É como o alicerce de uma casa. Você pode usar esse conhecimento para atuar no mercado, fazer pesquisa e assim por diante.
O objetivo da faculdade de TI não é te ensinar a fazer websites, aplicativos, nem ensinar as tecnologias mais modernas. Isto você pode aprender em um curso técnico ou até mesmo em cursos online, de fato. O curso superior vai mais além e te explica conceitos que estão por trás dos panos, de assembly (❤) a redes neurais artificiais.
Este é um problema de expectativa: as pessoas esperam entrar na faculdade, em qualquer tipo de curso, para entender o “como fazer” passo-a-passo, quando a mesma tem o intuito de ensinar o “o que” e o “porque”. E isso cai no próximo equívoco.
Faculdade não é ensino médio
Até o final do ensino médio, a gente tem professor explicando passo-a-passo como cada atividade tem que ser feita, validando tudo o que o aluno faz (“professor(a), tá certo? é assim?”) e “pegando na mão” pra ensinar.
O(a) professor(a) da faculdade não está lá para te explicar um conteúdo pronto e mastigado. O objetivo é te passar o conhecimento base como se fosse a ponta de um novelo, que é para te ajudar a puxar o restante do novelo enrolado, ou seja, correr atrás para desdobrar o conhecimento. Um bom professor é um mentor para te ajudar a estudar e desenvolver o conhecimento.
O que você vai aprender em cada disciplina vai além do que é passado em lousas, xerox e slides. É preciso fazer trabalhos, experimentos, estudos de caso, leituras, exposições das ideias. E nem sempre existe a resposta certa para as coisas.
Tem faculdade nesse esquema de que, se você responder uma vírgula diferente do que o professor ensinou, você tá errado? Tem! Mas dessas você tem que fugir, porque isso não é curso superior de verdade.
O bom curso vai ser aquele que vai te nortear na busca de conhecimento trazendo provocações para te fazer buscar as respostas.
Para mais informações sobre esse aprendizado guiado, sugiro ler sobre a maiêutica de Sócrates, algo que procuro aplicar na minha conduta como professora:
Curso superior não se restringe à sala de aula
Você conhece a biblioteca da faculdade? Já ouviu falar de projetos de extensão? Cogitou uma iniciação científica? Participou de alguma competição, jornada de informática? A faculdade é muito mais que as aulas. Tem várias coisas acontecendo por lá e muitas são de graça!
Na biblioteca, você pode achar livros, revistas, artigos, TCCs e outros materiais que nem sempre estão disponíveis em meios digitais. Dá para encontrar várias raridades. E você não precisa pegar livros só da sua área. Eu já peguei até livro da área de artes, rsrs. Tem clássicos da computação que são caríssimos se você fosse comprar e você pode pegar para estudar, como livros de inteligência artificial ou compiladores.
Projetos de extensão são uma boa forma de aplicar o conhecimento da faculdade para algo com apelo social, mas é preciso ter disponibilidade de tempo, o que nem sempre acontece pra quem já trabalha em tempo integral.
Eu participei de um projeto de extensão no primeiro ano de curso em que montávamos computadores com peças cedidas à universidade e depois doávamos esses computadores. Aprendi muito sobre arquitetura de hardware nesse projeto e vi uma placa pegando fogo pela primeira vez. Daora.
Tem projetos de extensão que é possível fazer fora do horário da faculdade e são uma boa forma de fazer algo extra e que tenha a ver com uma atividade que você tenha interesse. E muitos desses projetos podem ser para construir uma solução ou um app e isso te ajuda a criar um portfólio.
A iniciação científica (IC) é muito interessante para se ter contato com pesquisa. Você não precisa necessariamente fazer IC pensando no TCC ou no mestrado. Pense que é possível usar essa vivência caso vá trabalhar no departamento de Pesquisa em uma empresa.
Fiz a IC de forma voluntária (sem receber bolsa, porque trabalhava) junto com o TCC. Foi uma loucura, mas tive a oportunidade de colocar em prática uma ideia que tinha e aprendi melhor como fazer pesquisa e escrever artigos científicos.
Jornadas de informática ou ciclos de palestras são uma forma de ter contato com profissionais do mercado, aprender novos conteúdos e fazer minicursos. Muitas vezes eles acabam sendo de graça ou com valores simbólicos para quem é estudante. As competições de programação também ajudam a gente a se desafiar e a procurar como aplicar conceitos de várias disciplinas para resolver problemas complexos.
Porém, tenho plena consciência de que estas atividades envolvem disponibilidade de tempo e não são a realidade para todo mundo! Mesmo trabalhando em tempo integral, fiz a faculdade no interior, cidade em que já morava. Sei que a realidade é muito diferente para quem está em capitais ou viaja para estudar em outra cidade.
Prós da faculdade
Aprender a defender suas ideias
No começo da faculdade, eu achava terrível ter que fazer seminários para apresentar trabalhos. Além de ser tímida para falar em público, eu pensava que aquilo era perda de tempo, porque estava falando de algo que o professor deveria falar, vide a parte dos equívocos no início do texto.
Mas essas apresentações fazem com que a gente aprenda a organizar nossas ideias, resuma o que aprendemos sobre o assunto e, o mais importante, nos faz aprender a defender nossos argumentos.
No trabalho, precisamos explicar porque fizemos aquela solução técnica. Compartilhamos conhecimento com colegas em workshops internos. Participamos de meetups. Temos que defender a adoção de uma nova ferramenta, linguagem ou metodologia perante nossos superiores. Usamos muito a comunicação. Essa habilidade é tão importante quando as habilidades técnicas.
Apresentar muitos seminários me ajudou a apresentar, expor e defender minhas ideias. E também foi um grande aprendizado que me ajudou no momento em que eu comecei a dar palestras e minicursos.
Aprender a aprender
Como falei no início do texto, os professores da faculdade não estão lá para te ensinar passo-a-passo de tudo o que você precisa aprender sobre o assunto abordado na disciplina.
Fazendo uma analogia com orientação a objetos: é como se o conteúdo que os professores passassem fosse as interfaces e o que a gente vai desenvolvendo e aprendendo fossem as classes que implementam essas interfaces.
O problema é que pouco se fala sobre o “aprender a aprender”. Os professores passam os conceitos, mas você é quem tem que se dedicar para estudar em que situações você vai usar aquilo, para que serve, que contextos se aplica, como aplicar, como utilizar na prática. Não é decorar, é entender. É aprender a ter autonomia no seu aprendizado, ainda que não seja autodidata.
E, para aprender, cada pessoa desenvolve uma técnica. Eu sou muito visual. E também não tenho memória boa, então tenho que anotar ou desenhar para lembrar. Nas disciplinas de Estruturas de Dados, Teoria dos Grafos e Aspectos Formais da Computação, o que me ajudou a entender os conceitos foram os desenhos que eu fazia no papel sobre o funcionamento das listas, pilhas, filas, árvores, grafos, autômatos e etc.
Outra técnica que ajuda muito a aprender: ensinar! Sempre que estudava com meus colegas e alguém tinha dificuldade em algo que eu estava entendendo um pouco melhor, explicar aquele conceito me ajudava ainda mais a entender sobre aquilo e me fazia não esquecer das partes importantes.
Para saber mais sobre o “aprender a aprender”:
Expadir o horizonte de conhecimento
Quando estudamos por conta, procuramos focar só no que temos interesse. Isso pode acabar nos limitando e criando uma “bolha”. E, assim, entendemos da tecnologia de uma forma rasa acreditando que nos aprofundamos.
“Eu quero desenvolver aplicações web, quero aprender programação e não administração”, você pensa. Mas o conhecimento sobre a área de tecnologia não pode ser restrito somente à questões técnicas do nosso interesse.
Se eu trabalho com internet, entender arquiteturas e protocolos de redes para ter noção de como as informações são trafegadas, como as máquinas se comunicam é importante.
Se eu desenvolvo aplicações nativas, entender sobre sistemas operacionais me ajuda a entender o ecossistema em que minha aplicação irá rodar. Eu preciso entender de gerenciamento de memória para não fazer um código com baixa performance.
Considerando que a tecnologia está a serviço da sociedade, eu preciso entender como a TI se integra nos processos gerenciais de uma empresa. Preciso entender de aspectos éticos, políticas de segurança. Isso tudo expande o modo como percebemos o impacto do nosso trabalho e ampliamos a nossa visão do mundo para além da tela do computador.
Poder construir uma base conceitual forte (e isso é importante em TI)
Ferramentas mudam muito mais rápido do que conceitos na área de TI. Hoje está em alta um framework, amanhã já surge outro que domina o mercado.
Mas os conceitos-base têm uma curva de obsolência muito mais lenta. O que você aprende de orientação a objetos, por exemplo, pode ser válido para Java, PHP e até para JavaScript!
Conceitos sobre paradigmas de programação, algoritmos, engenharia de software e requisitos, design pattern, testes de software, redes neurais artificiais, entre outros, continuarão a ser válidos por mais tempo do que muitas das ferramentas e linguagens que utilizamos. E as novas ferramentas irão aplicar estes conceitos.
Inclusive, o ideal seria que essa base conceitual fosse abordada nos cursos livres que fazemos online. Antes de entender sobre JavaScript, precisamos entender algoritmos e paradigmas de programação. Entender arquitetura de software é importantes antes de começar a abrir um SDK de desenvolvimento de app mobile. Os conceitos também te fazem entender melhor como utilizar as novas ferramentas.
Algumas disciplinas/cadeiras serão chatas, mas é possível reverter isso em benefício próprio
Claro que tem disciplinas que parecem não agregar nada. Por que estou vendo Administração? Só desenvolvo para a web, o que estou fazendo vendo Delphi?
Quando pegava essas disciplinas, sempre procurava ver como poderia fazer trabalhos da disciplina dentro do que eu tinha interesse. Em Linguagens de Programação I (Delphi), eu estava perdida porque sempre programei só para a web, desktop era um bicho de sete cabeças.
Então aproveitei para aprender mais sobre banco de dados, como desenvolver instaladores e customizar a interface para não ficar com aquela cara de Windows default. Nisso, consegui aplicar conceitos de design que estava aprendendo e fazer uma interface com melhor UX e tendo até botões customizados com hover e active.
Em Teoria dos Grafos, eu fiz uma aplicação desktop em Java simulando um Google Maps, usando um arquivo XML com algumas rotas mapeadas para usar o algoritmo de Dijkstra para gerar o melhor caminho a partir dos dados advindos desse XML. Aproveitei para aprender melhor como trabalhar com XML e ferramentas de desenho em Java, para mostrar visualmente as rotas na tela e conectar os nós.
Eu tive até Teologia na faculdade, porque estudei em universidade católica. Em Teologia II, o professor sugeriu temas de trabalho e nenhum me interessou. Então sugeri fazer uma pesquisa sobre influência da internet na religiosidade de jovens brasileiros, como a internet tinha impacto nessa questão. O professor aceitou, gostou dos resultados e até publicamos depois.
Então é isso: aproveite uma disciplina que pode ser chata para ver o que você pode aprender com ela dentro dos seus interesses de aprendizado.
Aprender a lidar com a diversidade de pessoas, ter disciplina e trabalhar com prazos e metas
O aprendizado autodidata às vezes é muito solitário. Ele também exige disciplina, é algo que você tem que fazer por você mesmo e não são todos que conseguem por N motivos. Há muitas pessoas que precisam de um norte. Por onde começar, o que fazer, em quanto tempo? E aprender sozinho tem o custo de nem sempre termos com quem interagir para trabalhar junto o conhecimento que está sendo aprendido.
Algo interessante da faculdade, presencial ou EaD, é ter um direcionamento do que estudar, em que momento e também conviver com pessoas diferenciadas, formar grupos de estudos pra ensinar e aprender com colegas e fazer os famigerados trabalhos em grupos.
Trabalho em grupo emula muito do que a gente vai enfrentar no mercado e que não é técnico: trabalhar em time, dividir tarefas, ter seu trabalho todo atrasado porque o colega folgado não entregou a parte dele, criar resiliência e exercitar a paciência (principalmente para segurar a vontade de dar na cara de colega folgado, desculpem o desabafo, rs).
A gente também aprende a ter disciplina para se organizar com as entregas e lidar com prazos (entrega de trabalho) e metas (o que tem que ser entregue). Pra quem já está no mercado, pode não parecer nada de novo, mas você pode refinar essas soft skills.
Para quem ainda não está no mercado, pode ser uma boa porta de entrada
Faculdades são vitrines para recrutadores e são uma boa oportunidade de networking. Muitas pessoas encontram futuros sócios e colegas de trabalho na faculdade.
As soft skills que você desenvolve durante o curso também chamam a atenção de professores que podem te indicar para uma vaga de estágio ou de emprego.
As experiências desenvolvidas em projetos de disciplinas, projetos de extensão e iniciação científica geral portfólio e podem ser de onde você irá construir sua empresa ou startup. Muitas empresas surgem de projetos conjuntos entre colegas de faculdade.
Algumas faculdades têm empresas juniores também. É uma oportunidade de trabalhar estando dentro da faculdade, adquirir experiência tanto na parte técnica quanto na gestão de uma empresa.
Empresa Júnior é uma associação civil sem fins lucrativos, formada e gerida por alunos de um curso superior, cujos principais objetivos são: Fomentar o aprendizado prático do universitário em sua área de atuação; Aproximar o mercado de trabalho das academias e os próprios acadêmicos; Gerir com autonomia em relação à direção da faculdade ou centro acadêmico; Elaborar projetos de consultoria na área de formação dos alunos.
Fonte: SEBRAE
Contras
Você pode (e vai) cair nas mãos de professores ruins
Sempre tem aquele professor que só fala groselha, que não tem um pingo de interesse em ensinar ou pegou uma disciplina/cadeira da qual não entende nada. Não tem como fugir disso.
Isso acontece tanto na universidade pública quanto na privada, por motivos de: professor não ter mesmo interesse em ensinar; professor foi obrigado a pegar aquela disciplina, como já fiquei sabendo, mesmo não tendo experiência no assunto; professor que parou no tempo e faz 20 anos que não atualiza o material e nem as provas.
Essa parte é péssima! O único conselho que consigo pensar para sobreviver a isso é procurar não bater de frente, a menos que haja espaço para diálogo, e usar o tempo das aulas para realizar trabalhos sobre o tópico da disciplina dentro do que você já sabe.
Em uma disciplina de Tópicos Especiais (PHP), o professor “ensinou” que a função header() do PHP era para fazer redirecionamento. O pessoal que não sabia nada de PHP não contestou, óbvio. Fora outras coisas erradas que ele passou.
Eu simplesmente parei de prestar atenção às aulas dele e continuei a usar o tempo da aula para desenvolver o projeto da disciplina pra não ter que fazer em casa. Ficou lindão. E ele não curtiu muito que eu fiz mais do que ele mesmo sabia fazer em termos técnicos ¯\_(ツ)_/¯.
Provas!
Costumo dizer que provas não provam nada.
Acredito que, em qualquer curso, a melhor forma de avaliar o conhecimento é de forma prática, principalmente desenvolvendo trabalhos sobre o assunto da disciplina, mesmo um que seja um estudo de caso, vai de cada conteúdo.
O modelo atual de avaliação obrigatório nas universidades brasileiras não é o ideal e acaba colocando mais pressão para decorar do que para mostrar que entendeu algo. Não foca em avaliar pontos de melhoria da turma e de cada aluno individualmente.
Eu dou aulas em pós-graduação e não aplico provas. É preciso avaliar a aprendizagem do aluno, de fato, mas isso pode ser feito de outras formas que não sejam provas escritas, sejam dissertativas ou optativas.
O curso ou a universidade podem ter qualidade duvidosa
Infelizmente, nem todos têm a condição de passar em uma universidade pública ou arcar com as despesas de uma universidade particular tradicional. Isso fez com que se popularizassem universidade particulares de franquias com preços mais acessíveis.
A intenção seria dar possibilidade de acesso ao nível superior a mais pessoas, porém, muitas vezes estas faculdades dão com uma mão e tiram com a outra: o preço é acessível, tem desconto pontualidade, financiamento estudantil, etc, mas a qualidade dos cursos e às vezes até do corpo docente é duvidosa.
É isso que muitas vezes faz com que as pessoas sintam que estão perdendo tempo e dinheiro com a faculdade. As “Uniesquinas” têm um discurso lindo de popularizar o acesso ao curso superior, mas na prática, não é assim que funciona e isso é cruel com quer ter uma formação de qualidade.
Eu já fui convidada para dar aula de Sistemas Operacionais em uma dessas faculdades e essa não é a minha especialidade. A pessoa que me convidou, outro professor, falou que eu não precisava conhecer SO, já tinha os slides prontos e “era só passar”. Declinei o convite porque isso é errado em vários níveis, mas infelizmente, é uma prática comum atribuir aulas a professores que não conhecem o assunto e isso é muito irresponsável.
Projetos legais que desenvolvi na faculdade
Deixo aqui uma visão geral de outros trabalhos interessantes que pude desenvolver em sala de aula e que me fizeram colocar em prática vários conceitos que me moldaram como profissional:
- Língua Portuguesa I: aprendi a fazer resenha de livros e artigos. Aprendi também a estrutura um mapa mental de leitura antes de fazer a resenha. Isso me ajudou a ler e avaliar materiais de forma melhor. Fiz uma resenha do livro “Design para a Internet: Projetando a Experiência Perfeita”;
- Língua Portuguesa II: tivemos que exercitar técnicas para falar em público para apresentar o trabalho desenvolvido durante a disciplina, onde aprendemos como motivar o público, se comunicar e se portar. Eu fiz um trabalho sobre evolução dos meios de comunicação até chegar à internet. Isso foi fundamental para eu adquirir habilidades que uso até hoje para palestrar;
- Compiladores: fiz um simulador das fases de um compilador (análise sintática, semântica, geração de código em assembly). Aprendi um pouco sobre autômatos e muito sobre expressões regulares. Aprendi como linguagens de programação são analisadas e compiladas. Publiquei com dois professores um artigo sobre o projeto (único link que encontrei).
- Computação gráfica: complementei um jogo existente desenvolvido em C# .Net para aplicar funções de aceleração dos objetos do jogo de acordo com o passar das fases do jogo, sendo que o conceito de fases e progressão também foram implementados por mim. Aprendi muito também sobre repaints, desenvolvimento de jogos, performance e a trabalhar com as ferramentas gráficas do Java e bibliotecas como OpenCV;
- Processamento de imagens e sinais: em 2008, o Google ainda não tinha a busca de imagens por upload de imagem. Nesse ano, desenvolvi em C e OpenCV uma busca de imagens usando imagens através da técnica de análise de histograma. Eu tinha imagens associadas a uma palavra-chave. Se digitasse no console “dinossauro”, ele usava a imagem-modelo, gerava o histograma e analisava as outras imagens do banco, via histogramas, para identificar a compatibilidade. Muitos acertos e muitos erros nesse processo, porque a técnica é simples, mas tive um grande aprendizado;
- Inteligência artificial: desenvolvi um sistema especialista que ajuda pessoas não especializadas em usabilidade web a realizar diagnóstico de potenciais problemas de usabilidade. O software desktop, construído com o ExpertSINTA, foi publicado em uma conferência latinoamericana com o tema “USES: sistema especialista de apoio à avaliação heurística de usabilidade em interfaces web”;
- Redes neurais artificiais: eu amei essa disciplina, que é a base de machine learning e deep learning. Dei continuidade ao meu trabalho de TCC na iniciação científica e usei redes neurais para complementar o mecanismo de adaptação da interface às preferências do usuário;
- Tópicos Especiais I: aprendi, por conta, mais sobre PHP, banco de dados e uso de requisições AJAX. Fiz um sistema web completo de locadora de DVDs (ainda existia na época), do design ao back-end e foi a primeira vez que trabalhei com algo mais completo em JavaScript, fora do que já fazia em meu trabalho;
- Tópicos Especiais III: não tinha interesse em ser programadora C# .Net, mas aproveitei a oportunidade para aprender mais sobre desenvolvimento de forma geral, MVC e SharePoint, onde coloquei em prática, junto com um colega, o desenvolvimento de uma rede social para organizações com interesse em sustentabilidade ambiental. Quase aplicamos para o Imagine Cup da Microsoft em 2009.
Considerações Finais
A faculdade não vai ser o único local onde você pode aprender sobre TI, afinal, o conhecimento hoje está cada vez mais democratizado, como disse o próprio Pierre Lévy:
Mas fazer o curso superior não é total perda de tempo como muitos acabam enfatizando. Isso vai muito dos seus objetivos pessoais e profissionais. E sempre tem algo que a faculdade pode sim ensinar. A carreira de TI pode não ser apenas técnica, mas também de pesquisa aplicada. Ou então, você pode ter pretensão de ir para o exterior e muitos países requerem comprovação de titularidade. Empresas também ainda pedem o diploma de um curso formal em processos seletivos.
Enfim, cada caso é um caso, mas não significa que fazer o curso superior te faça melhor do que outros que não o têm. É tudo uma questão de objetivos, possibilidades, momento de vida, escolhas e até mesmo condição financeira.
Fiz esse relato de experiência com carinho para quem ainda não se decidiu sobre uma faculdade ou não teve uma boa experiência por diversos motivos. Espero ter consigo ser didática e esclarecedora em alguns pontos, mas cada um tem uma vivência e perspectiva diferente.
Mais uma dica de texto sobre o assunto:
E aí, o que achou? Concorda, discorda? Certamente você tem uma experiência diferenciada e pode compartilhar nos comentários. Opiniões diversas, desde que respeitosas, são sempre bem-vindas :)