O fenômeno do trap nacional e a sua relação com a moda

Allana Mercedes
Trend-In
Published in
4 min readNov 6, 2019

Recentemente, o trap tomou conta do cenário atual do hip hop, já que a geração Z trouxe batidas diferenciadas de 1 BPM, graves pesados, autotune, o uso constante de drogas, as letras sobre crimes, sexo e dinheiro, e as facetattoos, tudo isso sem pudor e de forma bem crua.

Muitos dizem que o trap é uma evolução do rap, já outros dizem ser apenas uma tendência da indústria fonográfica, mas esse novo gênero, que já vibra no exterior, cresceu 61% no Brasil, e mais de 1 milhão de fãs o escutam mensalmente — assim, o trap nacional mostra a que veio.

Show do grupo Recayd Mob / Fonte: Instagram

O trap original nasceu em meados dos anos 1990, no gueto de Atlanta no Estados Unidos. A partir da população do subúrbio que foi expulsa de suas moradias e sofreram grande repressão policial, contribuiu para aos poucos começarem a surgir as “trap houses”. Esses locais serviam tanto como boate para consumo de drogas como também para apresentações e experimentações de novos artistas. Grandes nomes atuais como Young Thug, 21 Savage e Gucci Mane vieram de Atlanta.

21 Savage, Plaiboi Carti e Young Thug para Adidas / Fonte: Cassiuslife

Muito influenciado por Atlanta, assim como lá, o trap nacional se inspira em cenários diários de quem vivencia as cidades, o tráfico de drogas, a violência e a criminalidade, estando todos bem presentes em suas letras. De maneira mais metafórica e não tão direta, o trap é a música jovem e a cultura negra no Brasil, potencializando as plataformas de streaming e burlando as rotas tradicionais da indústria musical, com um complemento super diferenciado e exclusivo do resto do mundo incrementando o funk da periferia em suas batidas.

O trap traz a nova onda de ser independente, conseguir fazer um som com os equipamentos que se tem em casa, trazendo mais originalidade as músicas e ao estilo. Em relação ao senso estético, esses novos jovens querem parecer únicos: hoje a carreira se faz nas redes sociais e a aparência e a personalidade têm tanto peso quanto a própria música, se não mais. Chamadas de “facetattoos” ou “tatuagem anti-emprego” é muito comum todo trapper ter pelo menos uma tatuagem no rosto, ou então ter a cara, o pescoço e os braços todos cobertos por elas. Essas tatuagens são um ato de auto motivação, uma forma de incentivo e de dizer que agora não tem mais volta, a música terá que estar presente até o final.

A moda vive uma relação de longa data com o rap. Kanye West, A$AP Rocky e Taylor, The Creator tem suas próprias linhas e marcas de roupa, desenvolvendo até elaborados desfiles de moda. O grande Tupac já literalmente desfilou na passarela da Versace em 1996. E com o trap não seria de maneira diferente, hoje ele está diretamente ligado ao Hypebeast — o desejo exagerado de consumir peças de ofertas mínimas e exclusivas, sempre com uma marca estampada nas roupas usando tudo de mais caro e atual.

Grupo Recayd Mob / Fonte: Last.fm

Mc Caveirinha, o trapper de apenas 11 anos, lançou um hit chamado “Só não pisa no meu boot” que já tem mais de 22 milhões de views no youtube e que fala sobre o fascínio dos Sneakerheadz pelos seus tênis de marca e toda a relação que eles envolvem. O maior grupo de trap brasileiro, a Recayd Mob, que trás toda a estética e som do trap gringo, lançou recentemente a coleção de camisetas “Recayd Mob Official Merchandise 2019” e já teve parceria em coleções com a marca À La Garçonne. O maior trapper no meio mainstream, o cearense Matuê, em suas letras aborda basicamente a moda High End, trazendo as marcas maiores como Louis Vuitton, Prada e Rolex. Em seu último videoclipe “Mantém” ele também encenou um desfile de moda, com carros de luxo e todo carregado no estilo. Esses exemplos não poderiam falar mais da relação moda X trap.

Mc Caveirinha e Matuê no estilo / Fonte: Instagram

O trap nacional também busca fortalecer marcas nacionais, que estão conseguindo chegar a nível mundial com o apoio desses grandes artistas. Marcas como a High, Piet e Class seguem a mesma cadeia de produção e venda como a enorme Supreme, tendo lançamentos por “drops” que se esgotam rapidamente e causam filas enormes e até brigas para conseguir comprar determinado produto. Entretanto, essas marcas brasileiras são mais acessíveis e presentes no cotidiano do jovem, sendo até fácil encontrar com alguém na rua que use esses produtos.

O trap nacional está se reinventando nas mãos de uma nova geração criativa, que está muito focada em que seu produto chegue a todo o tipo de consumidor, com uma moda influente para gerar uma imagem única e nova no mercado — uma juventude voltada em heroísmo, que cresceu com a internet e está muito mais ligada a avanços estéticos e tendências do que grandes e literais declarações políticas — e talvez isso já esteja sendo uma declaração social e política metafórica por si só.

Referências:

https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2018/12/trap-se-estabelece-na-cena-hip-hop-brasileira-com-influencias-de-emo-e-anime.shtml

https://www.youtube.com/watch?v=0n2BCNuyFm8

https://www.vice.com/pt_br/article/ne94wm/rap-soundclod-xanax-moda

https://reverb.com.br/artigo/huminutinho-trap

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