Por Baixo do Laço

Mariana Rosa Lourenço
Trend-In
Published in
7 min readNov 9, 2018
Imagem: Jojo Bow/ Fonte: Everleigh Soutas (2017)

Faz algum tempo venho notando uma nova coqueluche entre as garotas Tweens (termo derivado da expressão em inglês "in between" usado para designar meninas e meninos entre 6 e 13 anos que ainda não são adolescentes mas que já não apresentam mais tantos comportamentos infantis) que levam junto a si um glorioso "super-ultra-mega-blaster-giga-enorme" laço de fita, conhecido como Jojo Bow (imagem 1).

Essa tendência começou nos Estados Unidos com Jojo Siwa, uma youtuber milionária de 15 anos, que é muito popular entre as Tweens e que usa laços desde criança como sua marca pessoal. Se espalhou como suco em toalha de mesa quando suas amigas tweens também youtubers e outros mini influencers como Ava Foley (imagem 2) e Everleigh Soutas começaram a aderir à moda. Como esse público é extremamente influenciável já era de se esperar que da noite para o dia o produto atingisse o mundo com a força de um tsunami e se tornasse um item mais que necessário no guarda-roupa das garotas, ao lado da tiara de gatinho e a de unicórnio. Mais que uma forma de parecer uma bonequinha, ele também se tornou o símbolo dos ideais do público Tween seguidor da youtuber.

Mas as bonitinhas não usam qualquer laço, tem que ser um Jojo Bow original (“o que tem a tag de coração”), disponível nas lojas Claire’s e Justice com preços geralmente entre 8 e 10 euros.

Imagem: Mini influencer Ava Foley usando o bow/Fonte: Ava Foley (2017).

Mas nem tudo é brilhante como as pedras dos Jojo Bows, os originais se tornaram tickets de entrada para o grupo “legal” da escola, principalmente na Europa e EUA, onde laços não originais (que não tenham a minúscula plaquinha de coração) são quase que perseguidos, gerando bullying social e relacional (imagem 3) com as garotas que não tem condições de comprar. Segundo BEANE (2010), esse tipo de bullying é muito comum entre as meninas, que geralmente agem em grupos e buscam o sofrimento psicológico nas vítimas, tendo como característica a humilhação, constrangimento e rejeição social pela exclusão de crianças que não o possuam. Como a mentalidade de grupo é uma das causas mais comuns de bullying, as tweens acabam pedindo para os pais comprarem (não apenas os laços mas outros brinquedos e FADs) para que não sejam as próximas vítimas. Frases como “se eu não tiver um serei uma perdedora” ou “todas as meninas tem” são muito usadas para conseguir esses objetos na tentativa de adquirir e manter popularidade, voando abaixo do radar dos bullies (que muitas vezes são elas mesmas), querendo estar e ficar dentro da fronteira do grupo no qual pertencem para continuarem se sentindo bonitas e poderosas entre seus pares. Alguns grupos de garotas têm até nomes como “as poderosas” ou “superioras”.

Bons exemplos de como o ostracismo se aplica no dia a dia de uma tween são o filme Meninas Malvadas (que recentemente ganhou um musical na broadway) e o musical (e livro) Wicked , sendo o primeiro um exemplo aplicado à escolas e o segundo de como o bullying se aplica no dia a dia de uma vítima, no caso, Elphaba, a bruxa “má” do oeste. Ele mostra todo o processo de como o bullying a levou a tomar medidas extremas, desde ser ridicularizada, tentar ser “glindafied” e mudar para se tornar popular. Assim, por confiar em seus ideais e ir contra o poderoso Mágico, não trabalhando contra uma minoria, e depois de ser traída pela melhor amiga, ter seu professor favorito, a irmã e o crush sofrendo atentados inusitados, ter que fingir que uma garotinha do Kansas a matou com um pouco de água para se livrar de tudo e se ostracizar da cidade para ter paz.

Imagem: Rejeição Social/Fonte: Dorian Baby Doll (2018)

Segundo BEANE (2010):

“Crianças podem ser rejeitadas, não por causa de seu comportamento ou características, mas porque grupos precisam de um alvo para a rejeição. Essa rejeição ajuda o grupo a definir fronteiras de aceitação e conquistar unidade. (…) Uma das regras para pertencer à uma facção é fazer o que o grupo faz, o que pode incluir maltratar outras pessoas. (…) Embora os membros não como indivíduos possam não querer ferir outras pessoas, sentem que é necessário agir assim para permanecer ao grupo. Sua recompensa é a segurança, o poder e o respeito por pertencer ao grupo.”

Em 2017, no Reino Unido os laços foram banidos em algumas escolas na tentativa de diminuir o bullying e a competição de quem tem o maior e mais bonito Big Bow Bow, causando distrações e, muitas vezes, por não serem das cores do colégio. Em uma reportagem a BBC trouxe o exemplo de uma menina de 10 anos que gastou todo o dinheiro que ganhou no aniversário e Natal (um pouco mais que 100 euros) em Jojo Bows (imagem 4), sua mãe diz estar cheia dessa modinha e estar tentada à cortá-los em pedacinhos durante a noite. Fenômenos craze como esse são super comuns nessa idade, já que a ideia de valor e preço ainda está em construção, muitas meninas estão começando a lidar com o dinheiro e as mesadas, não sabendo ainda como gastá-lo de forma consciente, sendo constantemente bombardeadas por propagandas, vídeos de pessoas abrindo coisas, tendo ou comprando mais coisas, as levando a pensar que é mais importante a pessoa ter algo do que ser, “tudo bem ela ser uma chata e ‘nojentinha’ se tiver o celular mais caro, as melhores roupas e as melhores coisas”. Além de o senso de grupo ser mais importante que o de indivíduo, fazendo com que a tween dependa mais dele, causando certo medo de se desgarrar ou ficar sozinha, que muitas vezes leva a menina a ser o bullie ou a vítima.

Imagem: Jojo Bow/ Fonte: Claire’s (2018).

Devido à sua raridade, no Brasil se tornou símbolo de poder e privilégio já que essas lojas não possuem filiais no território sendo trazidos geralmente como presentes de viagem ou encomendas. Mas isso não impede que as meninas façam a competição de quem tem o laço mais “estratosféricamente lindão”. Mas não se engane! A competição é um pouco diferente por aqui, mas vai firme e forte! Elas competem pelos bows comprados ou feitos pelas mães, sem ter que ser “tipo necessariamente” um original. O que acaba abrindo a estrada de tijolos amarelos para a criatividade das mães que arrasam na criação de laços mirabolantes que podem ser temáticos (imagem 5), coloridos, festivos ou super adornados, se tornando objetos de coleção e uma ótima oportunidade de negócio. Um exemplo é a empresa Menina do Laço onde as empresárias Clarice Rebouças e Clarissa Ornellas faturaram mais de 2 milhões de reais só com a venda do acessório. Com o laço vem a sensação de pertencimento ao grupo e de proximidade com Jojo, que é basicamente um fenômeno de branding ambulante. A menina dança canta e é youtuber de sucesso, dispõe até de um grande contrato com a emissora Nickelodeon. A forma que ela se comunica em seus vlogs mais energéticos que dinamite, faz com que as tweens se identifiquem e se liguem a ela, sentindo a necessidade de comprar mais e mais laços.

Imagem: Laço da Minnie/ Fonte: Val Art Creative Studio

As tweens estão em uma fase muito delicada, onde não se sentem confortáveis com seus corpos em desenvolvimento tendo problemas de autoestima e a necessidade de serem aceitas pelo grupo, passam diariamente por uma montanha-russa de sentimentos e estão em constante dúvida, sendo bombardeadas por informações e comerciais. É uma etapa muito vulnerável o que faz com que sejam alvos fáceis para o bullying e o consumo impulsivo e exagerado. No caso dos Bows, diria que acabaram se tornando uma ferramenta para a instalação do bullying e não sua causa principal, já que as meninas são levadas pelo grupo à consumirem outras marcas e grifes ainda na busca de inclusão. Os Jojo Bows são uma mania bonitinha e simpática mas, como todas as outras, deve ser observada atentamente pelos pais, que devem manter uma boa comunicação com os filhos e mais que nunca cercá-los de bons exemplos, por ser a etapa onde estão mais vulneráveis e influenciáveis. Apesar de os laços terem se tornado uma causa de bullying e exclusão é engraçado ver que foram originalmente usados como forma de luta e união contra esse ato. Mas como todo fenômeno craze, este acabará passando em algum tempo, sendo substituído por outro e depois mais outro.

Referências

BBC. JoJo bows: The tween craze being banned from a classroom near you. Disponivel em: <https://www.bbc.com/news/uk-39140210>. Acesso em: 2 de novembro de 2018.

BEANE, Allan L. Proteja Seu Filho do Bullying. São Paulo: Best Seller, 2010.

ECONOMIA UOL. Amigas faturam 23 milhões vendendo só tiara presilha e laço de cabelo. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/empreendedorismo/noticias/redacao/2017/06/06/amigas-faturam-r-23-milhoes-vendendo-so-tiara-presilha-e-laco-de-cabelo.htm>. Acesso em: 2 de novembro de 2018

TELEGRAPH. Mums angered Jojo Bows banned schools across country. Disponível em: <https://www.telegraph.co.uk/news/2017/03/06/mums-angered-jojo-bows-banned-schools-across-country/>. Acesso em: 3 de novembro de 2018.

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