O que a Renault tem a ver com a briga entre a Fiat e o governo da Itália?

Jacob Paes
Três e meio
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3 min readFeb 6, 2024
Governo italiano quer mais Fiats produzidos na Itália, já a Stellantis pode estar de olho em outra marca para se fortalecer.

A Stellantis, dona de marcas como Fiat, Alfa Romeo, Lancia e Maserati, e o governo italiano se meteram numa confusão que envolve não só as marcas italianas como também a Renault.

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Tudo começou quando o CEO do grupo, Carlos Tavares, deu uma entrevista à Bloomberg no dia 02 de fevereiro falando sobre a competitividade agressiva dos chineses e os altos custos de produzir carros elétricos na Europa.

Quando esses concorrentes chegam aos nossos mercados com a capacidade de vender os elétricos (EVs) ao mesmo preço que os veículos com motor a combustão, e ao mesmo tempo os governos ocidentais impõem vendas de veículos 100% elétricos, é bastante óbvio que os caras que não conseguem fabricar EVs com custos competitivos enfrentarão um problema existencial.

Ele deu a entender que plantas na região do Oriente Médio e África podem ser uma saída para que as empresas europeias combatam esses rivais.

Também disse que a indústria vai, cada vez mais, ver uma consolidação de empresas e marcas, como fizeram FCA e PSA ao se juntarem.

Tavares ainda disse que observa de perto os movimentos da Renault, uma rival direta que decidiu seguir um caminho diferente: não se fundiu, diminuiu a participação na Nissan e criou uma unidade só para carros elétricos, a Ampere.

Renault optou por seguir sozinha o caminho da eletrificação, mas fechará parcerias pontuais para viabilizar projetos, como o novo Twingo — Geely e Volkswagen são prováveis parceiras. (Renault/Divulgação)

A briga com a Itália

Em janeiro, em visita à planta de Atessa, na Itália, Carlos Tavares culpou o governo italiano pela falta de demanda pelos modelos elétricos no país. É o caso do Fiat 500e, que teve a fabricação pausada em Turim, junto a modelos da Maserati.

Segundo Tavares, a Stellantis insistiu para que a Itália concedesse incentivos a esses carros e, assim, desse suporte à produção de elétricos no país. Ele também disse que “a Itália está gastando muito menos dinheiro do que qualquer outro grande país europeu para incentivar os elétricos”.

Fiat 500e teve produção suspensa durante algumas semanas na Itália em virtude da baixa demanda. (Stellantis/Divulgação)

As declarações chamaram atenção da primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, que disse que, se a Stellantis quer vender seus carros como joias italianas em outros países, então eles deveriam produzir os carros na Itália. Além disso, o governo disse que vai começar a incentivar outras montadoras a produzir elétricos na Itália, acirrando a competição com a Stellantis.

A primeira-ministra disse ainda que acha que a fusão entre a Fiat Chrysler Automobiles (dona das marcas italianas e também de Jeep, Chrysler, Dodge e Ram) e PSA (Peugeot Citroën), concluída em 2021, na verdade foi dominada pela parte francesa e que ela vê os pedidos da França sendo mais atendidos pela Stellantis.

O governo francês de fato tem 6,1% das ações da Stellantis e membros no conselho do grupo. No entanto, o principal acionista da empresa são os italianos, por meio da holding Exor, da família Agnelli. Além disso, o CEO do grupo é português, não francês, e já pegou pesado com o governo da França no passado pelos mesmos motivos. Entenda melhor a fusão de FCA e PSA ouvindo o episódio 19.

Mas, segundo o ministro da indústria da Itália, Adolfo Urso, isso não seria problema: o governo italiano estaria disposto a comprar uma parte da Stellantis e ter papel semelhante ao da França — bastaria a empresa pedir, segundo ele. Mas no ano passado, John Elkann, o herdeiro dos Agnelli, disse que isso não seria necessário.

Em meio a tudo isso, as declarações de Carlos Tavares sobre a Renault começaram a incentivar especulações da imprensa europeia: estaria o grupo ítalo-francês de olho na rival?

Elkann disse que não — e ainda reforçou que a Stellantis está empenhada em unir o governo italiano aos demais acionistas para atingir todas as metas e vencer os desafios da transição para a era elétrica da indústria.

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Jacob Paes
Três e meio

Editor de livros, graduado em Produção Editorial e estudante de Letras/Italiano. No tempo livre, curte séries, filmes, carros e, claro, livros @tresemeiopodcast