“A Casa do Dragão” investe em diferenças para ser mais do que uma série derivada
Para uma série derivada, simplesmente seguir o caminho traçado pela original não é o suficiente. Repetir uma fórmula e resgatar um universo pode parecer o bastante para conquistar o público e repetir o sucesso, mas não é. O spin-off tem que mostrar como ele agrega, enriquece o legado da antecessora. Na primeira temporada, “A Casa do Dragão”, produto derivado de “Game of Thrones”, não perde tempo e vai logo dizendo a que veio.
O reinado dos Targaryen, 200 anos antes dos acontecimentos da série original, é o foco desse spin-off. Quem comanda Westeros é o rei Viserys (Paddy Considine), que assume a coroa depois que um imbróglio acaba excluindo a princesa Rhaenys (Eve Best) da sucessão ao trono de ferro. Depois de muitas tentativas de ter um filho homem e da morte da esposa, Viserys define que a filha mais velha, Rhaenyra (Milly Alcock), vai receber a tarefa de conduzir os Sete Reinos depois que ele morrer.
Daemon (Matt Smith), o irmão do rei, não esconde a ambição de ascender ao trono e, inicialmente, reage mal à decisão de Viserys, mesmo tendo grande afinidade com a sobrinha. Quem também discorda da sucessão é Otto Hightower (Rhys Ifans), a Mão do Rei, que dá um jeito de casar a filha Alicent (Emily Carey), melhor amiga de Rhaenyra, com Viserys visando contestar a sucessão com o direito à coroa de um filho homem.
Os anos passam e a saúde de Viserys coloca a corte de King´s Landing em alerta. Enquanto uns defendem a ascensão de Rhaenyra (Emma D´Arcy) ao trono, outros passam a considerar interessante que a princesa não tenha esse direito. Pouco antes de morrer, já bastante delirante, Viserys diz algumas palavras que aguçam a ambição de Alicent (Olivia Cooke) e fazem a rainha conspirar para forçar a coroação do filho Aegon (Tom Glynn-Carney).
Rhaenyra e Daemon, casados a essa altura, são avisados da traição dos Hightower e, buscando reunir aliados e os dragões da família, traçam planos para que a rainha e os filhos se rendam. Apesar da tentativa de seguir o exemplo de justiça e ordem do pai, Rhaenyra é atingida em cheio por uma tragédia familiar e isso desperta nela o desejo por vingança e guerra.
“A Casa do Dragão” tem um começo de temporada muito fiel aos moldes de “Game of Thrones”, o que é compreensível. Fazendo essa ligação, a série mostra que preenche a lacuna deixada pela original e resgata o interesse dos “órfãos” da produção anterior. O grande acerto da produção derivada é que ela não demora a deixar claro para o público como pode e deseja ser diferente.
A série sobre os Targaryen se revela menos literal do que “Game of Thrones”. Agora, os episódios têm muitos subtextos e insinuações que surgem da interpretação dos atores. Há muitas questões não ditas e que aparecem através de reações sutis ou falas que guardam segundas intenções. Essa é uma característica que ajuda a capturar a atenção do espectador.
A produção que originou “A Casa do Dragão” já contava com traições, disputas por poder e turbulentas relações familiares, então isso não traz nenhuma novidade. Entendendo isso, os criadores da série derivada enriquecem esse universo com outras questões, sendo que a mais interessante é a discussão sobre o papel feminino nessas tramas. Subestimadas, destituídas de direitos e tratadas como objetos por esse mundo masculino, as mulheres aparecem sempre dominando os conflitos e contrariando as posições reservadas a elas pelos homens.
“A Casa do Dragão” também parece ter absorvido um aprendizado dos erros cometidos pelas últimas temporadas de “Game of Thrones”. A série derivada tem um ritmo acelerado na primeira temporada para poder cobrir todos os acontecimentos, mas ela não faz isso de forma desordenada e com atropelos. Saltos temporais, bem definidos pelo texto ou por mudanças de elenco, e coerência em relação aos acontecimentos que merecem destaque estruturam bem essa passagem de tempo.
É preciso fazer, aqui, elogios ao elenco da produção. O ótimo Paddy Considine faz o público entender os motivos que fizeram dele a primeira escolha dos criadores da série, que já revelaram que não viam o projeto sem a presença do ator. Olivia Cooke é outra que mostra estar à altura da complexidade da personagem. Matt Smith, Emma D´Arcy, Milly Alcock e Eve Best são outros bons nomes do elenco.
“A Casa do Dragão” conclui a primeira temporada deixando cristalino que deseja ser mais do que uma série derivada. A partir das características que tem em comum com “Game of Thrones”, a produção investe nas diferenças com as quais ela quer se destacar para, quem sabe, fazer história como a original. Há potencial para isso. E, que venha a guerra declarada entre os Targaryen.
A CASA DO DRAGÃO (primeira temporada)
ONDE: HBO Max
COTAÇÃO: ★★★★ (ótima)