Uma viagem sobre medo e controle

Thais Mello
Pela Metade
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3 min readJul 21, 2018
Gigantic — animação da Disney baseada no conto "João e o Pé de Feijão"

Desde criança sempre gostei muito de viajar. Entrar em um avião nunca tinha sido um desafio muito grande, exceto por um desconforto "natural", digamos assim.

De uns dois anos pra cá, porém, algo mudou. Passei a considerar o avião um cano de metal que voa a milhares de quilômetros de distância do chão e sacoleja de acordo com as intempéries da natureza, controlado por alguém que eu não conheço. (o que no fundo no fundo, não deixa de ser verdade, né? rsrs).

Já perdi a conta da quantidade de vezes que chorei dentro de um avião (com muita vergonha das pessoas ao redor me olhando, confesso) e apelei para uma série de artifícios na tentativa de aliviar minha tensão: música, calmante, livro, pintura, álbum de figurinhas… Mas nada resolvia muito… Rezar e cantar todas as músicas religiosas que lembrasse (colégio católico feelings): essas eram das poucas coisas que me acalmavam um pouco, fora apertar com toda a força do mundo a mão do conhecido que estivesse ao lado, e muitas vezes pedir para cantar/rezar junto.

Nesse meio tempo, peguei alguns voos daqueles com tv a cabo, séries, filmes… Não conseguia ver absolutamente nada! A única coisa que meus olhos conseguiam acompanhar, sem piscar e quase procurando o "F5" do monitorzinho, era o mapa de voo. Acompanhar aquele aviãozinho se deslocando me dava um pouco de alívio, mas ao mesmo tempo um nervoso enorme, pois, obviamente, o tempo não passava…

Tá… Mas o que isso a ver com controle?

Com a ajuda de uma psicóloga passei a ter uma outra perspectiva do medo. No meu caso, olhando um pouco mais para dentro, comecei a reparar que muito desse comportamento de quase pavor que eu desenvolvi estava ligado ao fato de não "estar no volante", não poder pedir para encostar, fazer uma pausa… Lá no avião você simplesmente vai. E verdade seja dita, nem mesmo o piloto tem controle total da situação(obrigada aos cursos e horas de pilotagem que garantem 99% do controle!).

E de certa forma, comecei a acreditar, inconscientemente, que ações que me dessem uma sensação de controle (ainda que falsa), como ficar grudada no monitor do mapa de voo ou fazer milhares de pesquisas no Google sobre aviação, me ajudariam a solucionar a questão… (não que essas coisas não tenham valor e não possam ser feitas.. mas eu não estava sabendo como!).

Mas, na real, eram outros tipos de atividades que me controlavam melhor emocionalmente como, por exemplo, fazer uma oração, fazer de alguém querido um amuleto ou dividir a angústia (ou simplesmente puxar assunto com algum desconhecido — comissários de bordo, principalmente) na tentativa de desanuviar a mente. Comportamentos que normalmente eu não tenho…

Sobre este fato em uma sessão de terapia ouvi algumas coisas que me marcaram profundamente e gostaria de deixar aqui como reflexão final:

"o avião é o mesmo, o voo é o mesmo, o piloto é o mesmo… algo em você, que você nem se deu conta, mudou…"

"tente resgatar em determinados aspectos a Thais que você liberta quando sente medo. Aquela que supera o comportamento naturalmente mais introspectivo e reservado e vai falar com estranhos, aquela que tem amuletos "irracionais" que lhe dão mais paz e conforto."

"e por fim, se nada disso der certo, apenas aceite que você não tem o controle..."

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