O mistério das praças flutuantes em São Paulo

Amanda Roldan
Um bom par de sapatos
3 min readFeb 23, 2017

No final de 2015, participei do Seminário Cidades a Pé, um evento bacaníssimo que rolou em São Paulo e que tratava sobre mobilidade a pé, como o próprio nome sugere. Ali estavam urbanistas, ativistas atuantes da causa e eu — jornalista, blogueira, pessoa que escreve sobre a vida de pedestre. Em meio a várias palestras ao longo de dois (ou três) dias, realizamos um passeio pelo bairro de Pinheiros. Sabe qual é a parte legal de caminhar com um monte de urbanista? Eles percebem coisas que você talvez não notaria sozinha. Tipo quando a gente estava passando por uma praça e a ideia nem era ir para a praça, e sim contorná-la, mas aí paramos um pouquinho ali e alguém falou: “nossa, que legal, essa praça é tão bonita que nem colocaram faixa de pedestre pra ninguém acessá-la e ela continuar conservadinha”.

Eu nunca tinha reparado na existência dessas praças flutuantes — praças que são como ilhas no meio do trânsito, e que, na teoria, são inacessíveis para os pedestres porque não tem faixa. Essa em Pinheiros tinha banquinhos e estava em uma região com pouco tráfego, então atravessar até ela não é assim tão difícil. Mas existe uma dessas pela qual eu passo sempre que fica no meio de um trânsito intenso e é até bem grandinha, mas sua serventia é basicamente controlar a passagem dos carros — afinal, a maior prioridade de São Paulo são sempre os carros.

Essa praça fica próxima ao Parque do Povo e passo por ela várias vezes na semana. Ela tem árvores, grama, uma barraquinha de flores e um ponto de táxi, e é a maneira mais rápida de chegar ao parque pelo caminho de onde venho.

Aliás, esse é um parque que, se de um dos lados tem uma ponte que liga direto com a estação de trem, do outro tem um sinal de pedestres que só funciona nos fins de semana. No resto dos dias, você basicamente tem que bancar ao kamikaze e se jogar na frente dos carros (e são muitos, porque a avenida é movimentadíssima) para poder atravessar. Para melhorar, a faixa fica depois de uma curva, então a visibilidade do motorista também não é lá grande coisa. Um sinal de pedestres que funcionasse em tempo integral poderia resolver a nossa vida, é claro, mas na maior parte do tempo ele está lá só como objeto de decoração.

A gente fala que São Paulo é uma cidade difícil para pedestres, é por coisas como essas: um parque com um sinal de pedestres constantemente apagado e praças que, na verdade, não são praças, são desvios do trânsito que calharam de ter um verdinho, ah, como é bom ter verdinho no meio da cidade!, um banquinho, uma calçadinha. Mas que, sem uma faixinha de pedestres, no meio do transitinho caótico da cidade, fica difícil de ser desfrutada.

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