Airbnb é bom, mas também não é tão bom assim

Amanda Roldan
Um bom par de sapatos
5 min readFeb 7, 2017

Ou: ele é bom pra quem viaja, mas como pode ser bom, também, para os locais?

O apartamento que ficamos em Bolonha: hashtag viva lá!

Há dez anos, Brian Chesky e Joe Gebbia espalharam colchões infláveis no chão de seu apartamento em São Francisco e, pelo preço de 80 dólares, alugaram aquele espaço para quem procurava hospedagem barata na cidade ou não conseguia hotel — além da cama, eles também dariam café-da-manhã para seus hóspedes. O que seria apenas uma solução para conseguir dinheiro e pagar o aluguel do apartamento transformou-se no Airbed & Breakfast em 2008 e recebeu seu nome definitivo, Airbnb, em 2009.

O negócio foi construído mais ou menos nos moldes de aluguel que Chesky e Gebbia praticavam em 2007: o host que tinha um quarto extra em sua casa o alugava para um viajante e oferecia sua experiência como local. Um fazia um dinheiro extra, o outro podia ter uma experiência que ia além de ser um simples turista. E eu achava aquilo o máximo.

Então o conceito do negócio mudou um pouco. Agora, além de ser apenas um guest na casa de alguém, você poderia alugar uma casa inteira só pra você, o que continua sendo bem legal para quem quer ter uma experiência mais local — mas que, por algum motivo (e podem ser muitos), não quer conviver com gente estranha.

(Mas vale lembrar que essa casa continua pertencendo a um host. O Airbnb é apenas a ponte entre host e guest, um marketplace)

Em 2015, quando estávamos planejando nossa viagem para a Itália, decidimos procurar um apartamento pelo Airbnb para nossa última semana em Bolonha. Achamos uma casa no centro, dentro de um condomínio, e reservamos. Contei todos os detalhes aqui, mas o que mais interessa para esse texto é a experiência. Quando escolhemos alugar o apartamento, um dos principais fatores era o preço — a hospedagem sairia mais barata que um hotel, principalmente porque poderíamos preparar nossas próprias refeições, sem ficar gastando com restaurante. Por conta disso, nossa vivência em Bolonha foi bem diferente do que experimentamos nas outras cidades que visitamos: íamos no Carrefour, aprendemos onde era a vendinha que tinha verduras ali por perto, descobrimos onde comprar massa fresca e pudemos conhecer os doces deliciosos da Paolo Atti & Figli. Certa noite, fizemos um jantar especial para nossos amigos italianos. E quando decidimos passar duas noites fora, em Assis, voltar pra Bolonha foi como voltar pra casa. Aquela era nossa casinha italiana. A tal da #Vivalá, aquela hashtag que eles costumam usar, é realmente verdadeira.

Assim como minha família, outras pessoas do meu círculo também costumam usar o Airbnb para economizar durante as viagens. E, assim como eles, outras pessoas ao redor do mundo também passaram a usar cada vez mais esse tipo de serviço de aluguéis curtos (os tais short-term rentals) por inúmeras razões. E isso acabou causando algum distúrbio na Força.

Um fato é tão óbvio que quase não precisa ser citado: os hotéis não estão muito felizes com essa popularidade. Vez ou outra pipoca por aí alguma notícia sobre a indústria hoteleira fazendo pressão em tal cidade para que serviços como o Airbnb paguem taxas de hospitalidade e quetais. Mas eu quero falar sobre outra coisa: eu quero falar sobre os locais.

Imagina assim: você mora em uma cidade. Você vive de aluguel nessa cidade. De repente, a oferta de imóveis para aluguéis longos cai e, consequentemente, o preço sobe. E aí o dinheiro que você tem não paga mais o aluguel nessa cidade.

Falei de forma bem simplificada, mas processos como esse tem acontecido em várias cidades ao redor do mundo e os serviços de short-term rentals têm muita influência nisso — afinal, alugar os apartamentos em curtos períodos para turistas pode ser mais lucrativo do que fazer longos contratos. Soma-se a isso o fato de que vários proprietários, cientes desse lucro, começaram a colocar na roda propriedades que eles nem usam, propriedades feitas para servirem como lar temporário de visitantes. Adicione a cobertura: muitos locais têm se sentido incomodados com a transformação de lugares tranquilos em sedes de mini-hotéis.

Digite Airbnb + gentrification no Google que você vai ver o tamanho da confusão — ou clique em algum dos links que eu vou deixar aí embaixo para você dar uma lida.

Várias cidades estão EM POLVO ROSA com essa polêmica toda e a solução que eu mais vejo surgir é a regulamentação desses serviços. (As pessoas odeiam essa coisa de regulamentar, né? Falou em regulamentar e já tem gente gritando VOCÊS ESTÃO TOLINDO NOSSOS DIREITOS). Algumas das propostas passam por restringir a quantidade de dias ao longo de um ano em que uma propriedade pode ficar disponível para ser alugada nesse tipo de serviço. Mas a discussão ainda vai longe. Dizem por aí que vários dos hosts engajados em criar uma experiência local para seus hóspedes têm dado seu depoimentos aos conselhos das cidades — mas que isso não tem acontecido com aqueles que vêem nos short-term rentals apenas uma maneira de lucrar com o turismo. No canal do Youtube do Airbnb tem inclusive uma playlist contando a história de vários hosts (os engajados, é claro).

Isso me fez pensar sobre a própria vizinhança do apartamento em que fiquei em Bolonha. Como seria se existisse um boom de turistas naqueles quarteirões? O mercado ali na esquina não daria conta, isso eu tenho certeza. Por quais processos a região passaria para se adequar a essa realidade? Nenhum? Pouco? Muito? Como ficariam os moradores? Isso é bom ou ruim?

Eu vou ficar aqui aguardando cenas dos próximos capítulos. Porque a experiência de alugar uma casa em qualquer parte do mundo é legal pra caramba. Mas, para que nós tenhamos um pouco do gostinho do que é ser local, os verdadeiros locais podem estar pagando um preço alto demais. E isso não é legal, não.

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