Zazen em Curitiba: meditação para iniciantes

Uma Questão de Fé
Uma questão de fé
7 min readJun 13, 2017
Estátua do Buda na Praça do Japão, onde está a Comunidade Zen-Budista. (Foto: Karine Sales)

Por Karine Sales

O frio que tomou Curitiba no sábado à noite não assustou a mim e a outras cerca de dez pessoas que trocaram festejos do fim de semana pelo aprendizado do Zazen, método de meditação de origem Budista, ensinado aqui na capital na Praça do Japão, dentro de uma casinha de dois andares, com arquitetura japonesa, onde fica a Comunidade Zen-Budista de Curitiba.

A “aula” de meditação tem início pontualmente às 19h30, e aos sábados é realizada especialmente para iniciantes. A princípio, todos vão chegando, tímidos, e sentando em silêncio numa sala de espera. Na hora de começar, uma moça de cabelos cacheados, e estatura mediana orienta aos participantes que desliguem os celulares e retirem os sapatos. Após guardar os pertences nos fundos da sala, podemos subir uns degraus e aguardar em um corredor de frente para o pequeno templo, que abriga o altar com a presença de Buda, característica marcante em quase todas vertentes do Budismo. Quando todos entram, descalços ou de meias, a moça se apresenta e inicia as orientações para a meditação.

Ela inicia contando um pouco sobre a Comunidade Zen-Budista de Curitiba, sobre o Zazen, que como disse anteriormente, trata-se de uma técnica de meditação do Budismo, que vem da doutrina Soto Zen, uma escola japonesa da religião. A técnica promove a meditação sentado, praticada em dois momentos, e intercalada por uma meditação em pé.

A não-dualidade é acreditar que não existe separação entre corpo e mente.

De acordo com a instrutora, a não-dualidade é acreditar que não existe separação entre corpo e mente; a partir deste conceito, ela pede que tudo que esteja sendo feito naquele momento seja feito por inteiro, e que possamos sempre nos entregar totalmente a cada tarefa a ser feita. Um tanto quanto uma lição à era atual, onde tentamos fazer de tudo um pouco, ao mesmo tempo.

Quando os participantes já estão inteirados sobre o Zazen, a instrutora ensina as posições que serão usadas durante a meditação e no templo, antes mesmo de entrar na sala onde fica o altar. A primeira posição ensinada é o Gassho, feita juntando as duas mãos, abertas, palma com palma, o polegar fica na altura do queijo, e o antebraço deve ficar reto. O Gassho representa a não-dualidade das coisas. Todas as ações feitas durante o Zazen devem ser feitas usando as duas mãos, demonstrando a atenção e comprometimento com o momento.

Gassho, primeira posição ensinada na meditação. (Imagem: Comunidade Zen-Budista de Curitiba)

A segunda posição é o Shashu. O polegar da mão esquerda fica no meio da palma, e os dedos fecham cobrindo-o. Com a mão direita, envolvemos a mão esquerda. As mãos devem ficar posicionadas na frente do peito, como na imagem abaixo, e os braços alinhados. Essa posição é usada sempre, durante uma conversa ou em qualquer outro momento que não esteja sendo realizada outra posição.

Shashu é a segunda posição ensinada. (Imagem: Comunidade Zen-Budista de Curitiba)

Após aprendermos as duas posições, podemos enfim entrar no templo, mediante algumas regras. É proibido passar na frente do altar com a estátua de Buda, que fica posicionado quase no centro de uma sala, coberta por tapetes de palha, e envolta com tatames e pequenas almofadas de meditação. Quando houver a necessidade de atravessar para o outro lado, é necessário que faça a volta por trás do altar. Outra regra é que, para entrar no templo, deve-se sempre entrar com o pé esquerdo primeiro, e fazer uma referência à Buda, em Gassho. Para sair, saímos com o pé direito, mas não é necessário fazer referências.

Quando todos se acomodam em seus lugares, a instrutora apresenta opções de como deixar as pernas durante a meditação, pois depende da capacidade elástica do corpo de cada um, mas a grande maioria acaba sentando de pernas de índio. Ela também ensina a forma como os olhos devem ficar, pois não podem ser nem abertos, nem fechados, e sim em um ângulo de 45°, voltado para o chão. A respiração, o que considerei o mais importante de toda a técnica, é feita somente pelo nariz. A boca permanece fechada durante toda a meditação, com a língua fazendo leve pressão no céu da boca, a fim de diminuir a produção de saliva e retirar a necessidade que temos de ficar “engolindo” algo. A coluna deve ficar ereta, e para isso, sentamos nas almofadas do meio para fora, algo que faz como se as suas pernas sustentassem o peso. As mãos ficam na posição Hokkai-join, em que, na altura da virilha, e com os braços apoiados nas pernas, a mão esquerda com a palma voltada para cima e os dedos juntos deita-se sobre a mão direita na mesma posição, encostando dedos com dedos. Os dedos polegares unem-se, em cima, fazendo uma leve pressão entre eles.

Posição de Hokkai-join: a posição das mãos durante a meditação. (Imagem: Comunidade Zen-Budista de Curitiba)

Ao fim das instruções, somos informados de que iremos fazer 20 minutos de meditação sentados, 10 minutos em pé, e mais 30 minutos sentado. Somos orientados a evitar se mexer e, caso algo nos incomode, devemos nos ater ao movimento da respiração. O mais difícil durante a meditação é tentar esquecer do mundo e não nos ater ao barulho do biarticulado passando no envolto da Praça do Japão, ou mesmo das pessoas que se reúnem a noite por ali para tocar músicas em um violão. No entanto, acredita-se que, com a prática do Zazen de forma correta, ou seja, mantendo a postura e atendo-se à respiração, é possível concentrar-se e tranquilizar a mente. A meditação sentado é feita por 20 minutos, onde sentamos virados para a parede e de costas para o centro da sala. O início e fim do tempo é dado pelo soar de um barulho similar ao sino tibetano. Ao levantarmos para fazer a meditação em pé temos que reverenciar, em Gassho, o lugar que sentamos, e também o centro da sala, em agradecimento às pessoas que meditam conosco.

A meditação em pé é orientada de forma que a respiração segue os passos. A cada respiração, damos meio passo, de forma bem devagar, em volta da sala, um atrás de cada um. Neste momento a posição é em Shashu, e esse é o único momento em que podemos passar em frente ao altar. Após a meditação em pé, voltamos para mais 30 minutos de meditação sentado. Confesso que esse momento foi difícil. Devido ao frio que fazia na capital paranaense, os 5°C fizeram meus dedos da mão congelarem, e ficava cada vez mais complicado não se mexer e manter a concentração. E não era só eu. Devido ao silêncio, qualquer movimento é perceptível, e por vezes ouvir alguém ceder e coçar o cabelo ou limpar a garganta. Mas ao final, algumas coisas acontecem que deixam a meditação ainda mais interessante.

O monge Marcelo, que faz parte da comunidade Zen-Budista, conta uma história sobre a sabedoria da religião, enquanto estamos meditando. Após esse momento, ele parece sair do templo, e ir até o lado, recitar uma espécie de oração que diz que a vida é preciosa e que devemos vive-la de forma correta. Depois disso, ouvimos um barulho crescente do que parece um martelo de madeira batendo na madeira. Logo após, a meditação é finalizada, fazemos as referências e lemos uma oração em japonês e em português, cada um com uma folhinha que fica próximo ao tatame. Ao final da oração o monge se apresenta, comenta sobre a religião Budista, e convida todos a um chá com bolachas a ser servido na sala ao lado.

Neste momento do chá, antecedido e precedido por uma oração, todos sentamos e tomamos um chá de camomila, sem açúcar, quente o bastante para esquentar os dedos e o corpo todo. São servidas bolachas de água sal também, um lanche simples, apenas para fomentar a discussão. Isso porque, este momento é destinado àqueles que possuem dúvidas quanto ao Budismo é à meditação. De início todos ficam tímidos para falar sobre, mas logo as pessoas se animam e começam a perguntar sobre a vestimenta, as origens do Budismo, a crença no Zazen, e entre outros temas pertinentes. Quem fica com vergonha de perguntar na frente de todos pode conversar com o monge ao final do lanche. Por fim, é feito o convite para comparecer ao local mais vezes e para seguirmos os canais online da Comunidade.

Considero a experiência muito boa para quem sempre quis saber mais sobre a meditação, e, mesmo sendo dentro de uma religião, a Comunidade Zen-Budista é acolhedora e está acostumada a receber pessoas que já possuem outras religiões.

Comunidade Zen-Budista de Curitiba

Praça do Japão — Bairro Água Verde

Curitiba — Paraná

CEP 80240–180

Telefone: (41) 3232–8032 / (41) 9144–9967

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Horários de prática na Comunidade Zen-Budista de Curitiba. (Foto: Karine Sales)

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