A garota que odeia homens

Leonardo Pereira
Uma Pera
Published in
3 min readNov 27, 2013

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Eu levei um susto quando, em junho, vi um texto da Cynara Menezes na CartaCapital sobre feministas que lutam “pelo direito de não serem tão bem tratadas”. São mulheres que interpretam certos atos de cavalheirismo como forma de reafirmação da dominação masculina. Na época achei aquilo ridículo, mas hoje começo a entender a existência de uma vertente tão radical dentro do movimento feminista. Pois hoje eu conheci a garota que odeia homens.

O bullying

Fabiane Lima é uma infografista de 26 anos que usa seu mestrado de Tecnologia e Sociedade, em andamento na UTFPR, para estudar as relações de gênero na computação. Quando abri o Twitter hoje pela manhã eu topei com seu nome em meio a uma zoação e resolvi acompanhar. O que vi foi um massacre e eu nem conseguia entender como aquilo começou.

Pelo que Fabiane me disse, um blogueiro ficou "revoltado" ao vê-la apontar as desvantagens da mulher na sociedade, "porque segundo ele, é só trabalhar bastante que você sai da merda". A partir daí espalharam seus tweets entre blogueiros e vlogueiros — a coisa foi pro ventilador: “Quando vi, tinha MILHARES de replies ofensivos a mim, entre um ou outro de amigos. Esse pessoal tem uma força assustadora!”

A garota passou o dia sendo achincalhada, teve até endereço e telefone divulgados. Tudo porque não gosta do meu gênero, um crime gravíssimo.

O que ela disse, afinal?

Fabiane repetiu várias vezes hoje que odeia homens e, claro, a internet não perdoa, ela não lê, não interpreta (Leonardo Sakamoto tem algo bom a dizer sobre isso).

“Meu ódio a homens funciona da seguinte maneira: homens dominam nossa sociedade desde pelo menos uns cinco mil anos atrás. Homens são como uma instituição, controlam a igreja, o congresso, as empresas públicas e privadas”, explicou ela.

Tem mais:

“Homens controlam a minha vida, de cabo a rabo. E isso só considerando em macro escala. E os homens que não têm poder político ou econômico ainda assediam e abusam de mulheres na rua ou nas suas relações pessoais o tempo todo, porque pelo modo como nos tratam e nos trataram durante toda a história escrita, somos menos que humanos. Somos propriedades, somos buracos pra meter a rola dentro. Somos aquela coisa chata que tem em volta da vagina.”

Ela está tão errada assim? Não há coincidência no fato de que a enxurrada de tumblrs sobre “501 mulheres pra se fazer isso ou aquilo” incomode menos a sociedade que um aplicativo em que elas podem julgar o desempenho dos homens. Afinal, nós mandamos na porra toda, ninguém pode nos contrariar. A mulher é o negro, o gay, o deficiente… o não-dominante. E qualquer homem pode enxergar isso.

“Quando digo que odeio homem, odeio alguns homens específicos, outros aleatórios que encontro todo dia na rua, e odeio principalmente esse sistema que escraviza um sexo em função do outro.Existem exceções? Mas é claro! Que continuem fazendo seu bom trabalho, mas não esperem ser parabenizados por não fazer mais que a obrigação de ser uma pessoa decente.”

É bem o que as mães costumam nos dizer quando somos crianças. Deveríamos ter aprendido.

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