Comecei a descurtir páginas do Facebook e não consigo mais parar

Leonardo Pereira
Uma Pera
Published in
3 min readMar 29, 2016

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No finalzinho de fevereiro comecei uma onda de descurtição. Rodaram, de uma só vez, "DCM", "Revista Fórum", "Iconoclastia Incendiária" e "Isso é culpa do PT". Depois foi o "Movimento Passe Livre SP" e não parei por aí: "Socialista Morena", "Apesar da crise," e "Quebrando o Tabu" se foram também, e eu ainda não tirei o dedo do gatilho da minha metralhadora de dislike.

Eu comecei a descurtição por querer um Facebook menos raivoso e tendencioso, por isso também deixei de seguir colunistas e uma série de outros comentadores de Facebook. Mas acabei dando continuidade por ver como as páginas foram se desvirtuando com o passar do tempo e agora não consigo mais parar.

O "MPL-SP", por exemplo, rodou depois de postar um link sugerindo que o vírus zika foi criado e patenteado pela família Rockefeller; o "Apesar da crise," que tem uma proposta bem clara, se transformou em plataforma de defesa ao PT; e o "Quebrando o Tabu", página oficial de um documentário sobre maconha, passa mais tempo abordando outros temas da esquerda do que a própria plantinha.

Mas aí outra coisa me deu força pra continuar a limpeza: o caso da Tay, robô tuiteira que a Microsoft criou pra aprender como os adolescentes americanos se comunicam. Você já sabe o que aconteceu, a Tay ganhou uma personalidade horrível, porque ela aprendia na base da repetição e muito do que lhe diziam era lixo.

Ao refletir sobre o assunto, um rapaz que eu não conheço, chamado Roberto Vitorino, lembrou que tem um bocado de acadêmicos que discorda da ideia geral de que a internet deu voz a uma legião de imbecis. Pode ser que as bolhas da internet estejam, na verdade, criando um novo tipo de personalidade humana.

“Existe uma possibilidade real de que seres humanos confinados em bolhas artificiais de algoritmos e trending topics (onde pessoas tendem a ler e conviver muito mais com pessoas que pensam e concordam com elas sobre os mais diversos assuntos) estejam de fato sendo levados a uma radicalização forçada do pensamento, levados a uma atrofia da faculdade de percepção da realidade.”

Isso aí me assustou, pensa bem no que está acontecendo com o Brasil e você vai notar que faz muito sentido.

Veja, eu continuo tendo muito mais amigos de esquerda e continuo concordando com as pautas de esquerda, mas também tenho uma porrada de amigos e parentes que se alinham mais com quem quer a cabeça da Dilma e do PT. E eu quero ouvir essas pessoas, não fingir que elas não existem. Esse monte de páginas que eu curtia escondia o que pra mim é o mais importante do Facebook: as pessoas.

Morando fora do Brasil, me importa mais o que as pessoas têm a dizer do que o que páginas alinhadas com o meu pensamento estão compartilhando — até porque só curte página de esquerda quem é de esquerda, então o serviço que elas prestam é bem limitado, acabam só contribuindo pro acirramento.

Tenho familiares que passam o dia todo compartilhando coisas com as quais eu discordo. Entre esses posts, porém, estão fotos das crianças da família e notícias sobre o que está acontecendo com cada um deles. É isso que eu não quero mais perder. Essa divisão maluca do Brasil não pode fazer com que a gente se afaste do nosso lado humano, mesmo que as bolhas ideológicas nas quais a gente se meteu insistam em nos posicionar uns contra os outros.

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