Por favor, não seja profissional

Guilherme Prisco
um a zero
Published in
4 min readDec 17, 2020

É sempre positivo o incentivo a busca de conhecimento, certo? Mas não é estranho ouvir por aí que quando alguém estuda demais, essa pessoa acaba ficando um tanto que biruta. Já ouviu isso?

Apesar de soar engraçado, é possível sentir gotas de sabedoria nessa afirmação.

A busca por conhecimento pode acarretar em arrogância, assim como o seu resultado pode cair na compreensão das incertezas, o que pode deixar qualquer um sem chão.

Estádio Hudson Buck Ferreira, fevereiro de 2001.

Imagem de Edilson Oliveira Moura, no Pinterest

Não era sua primeira vez num ambiente como esse, mas o garoto que começava a pegar gosto pelo jogo, estava ansioso pelo início da partida entre Matonense e Palmeiras, pelo Campeonato Paulista.

A expectativa era grande do pequeno torcedor, já que não era sempre que podia ver seu time em campo, pois era do interior do Estado, muito longe da Capital. Aliás, a criança ainda não tinha muito tempo que havia se mudado para cidade onde ocorreu o jogo.

Talvez por ainda não estar muito familiarizado com o novo lar, estava torcendo muito contra o time da casa.

No concreto, devidamente fardado, ao lado de seu pai, que estava junto de um amigo com nome Arquimedes, começa a avistar os jogadores entrando em campo e uma pergunta é feita: quem é o melhor jogador do time?

A resposta é firme e vinda dos dois:

— Alex, o nosso camisa 10.

Apesar do entusiasmo, o jogo começa e não demora muito para o time de azul e branco abrir o placar. O espírito insatisfeito palestrino surge com naturalidade.

Quando avista e ouve os torcedores adversários rindo, tirando uma com os que estavam trajados de verde, a raiva sobre o seu próprio time vem a tona com sucessivas reclamações.

Seu pai apenas diz:

— Calma, filho.

Mas o seu olhar, na verdade, traduzia aquelas palavras para: bem-vindo.

O empate não demorou a vir, assim como o segundo gol do time da casa e assim terminava o primeiro tempo. E assim transcorria até mais da metade do segundo tempo, quando o garoto já se via sentado e só reclamando de seu time.

Então, com um jogo um tanto que parado, vem um golaço! Era o empate já com o jogo terminando e era a vez dele rir e comemorar olhando para os torcedores da Matonense.

Quando ainda estava pulando, outro golaço! Virada, meus amigos. Êxtase, elevação, gritaria, abraço, risada e tudo o que você quiser. Tanto faz…

Engraçado que, ainda em clima de comemoração, a pergunta do menino foi: foi do Alex, pai?

— Sim!

Disse, sem hesitar.

Aquilo viria a repercutir muito ainda na vida do menino.

A sua saída do time; o gol de letra contra o Flamengo, na final da Copa do Brasil; doeram bastante.

Dá pra ver que ele já sabia o estrago que tinha feito. A propósito, que baita foto… (Fonte: Arquivo/Estado de Minas, infelizmente sem créditos ao artista)

Também pôde se deleitar com os vídeos alternativos na internet que mostravam os lances dos jogos do Fenerbahçe e torcer muito pelo clube na Champions League.

Chegou até a enviar e-mail endereçado para a ESPN Brasil, mais especificamente para o programa Futebol no Mundo, que daria para a frase mais criativa uma camisa do time turco, com a assinatura do capitão.

O menino foi crescendo, contudo. Então, não era só mais bola que encantava o agora rapaz, que passou a admirar a forma de pensar do jogador de nome com grafia diferenciada.

O que fez com que a sua escolha pelo Coritiba, quando da volta ao Brasil, o deixasse ainda mais feliz, por perceber que Alex, além de craque (palavra que deve ser proferida a poucos), tinha ideais que de fato seguia.

As contradições da vida parecem nos deixar sem respostas, sem caminho. Mas é justamente o contrário: quando duas afirmações são colocadas em xeque, porque não estão corretas, mas também estão certas, é porque há um caminho do meio a ser seguido, uma terceira via.

Quando vemos um cara como o Alex, que se fez grande por vias não ditas tradicionais, e continua sua caminhada baseada numa paixão pelo esporte, aliando sua experiência com estudo e preparação, acho que vemos um pouco disso dentro dessa perspectiva.

O inevitável treinador será, também, inevitavelmente grande.

A compreensão de funcionamento da imprensa, da realidade dos clubes, e da vida pessoal dos jogadores, fazem de suas críticas e elogios diferentes do que se costuma ver.

O que se espera não ser inevitável é que Alex se torne Alexsandro de Souza.

Aliás, caso queira saber um pouco mais, essa entrevista dada ao Léo Miranda é espetacular.

Mas voltemos ao problema de quem costuma estudar demais: talvez esse seja o do menino citado anteriormente. Vendo entrevistas em que foi dito que maior parte de sua família é de orientação corintiana; outras em que ele não quer dizer qual o time que ele gostaria de ter jogado; além de sua postura sempre muito profissional.

Ao buscar o vídeo do jogo em que ele o viu pela primeira vez, pôde constatar todos os fatos que sua memória lhe diziam ter sido reais. Mas, o último gol não foi de Alex…

Maus indícios são por ele sentidos. Coisas das quais não queria ter buscado conhecimento.

Informações privilegiadas aqui podem ser ditas a respeito daquele menino, que só tem um pedido:

O meio termo, o caminho não óbvio. Alex, por favor, não seja profissional.

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