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Metamorfose

Ricardo Rachaus
umvagabundosempalavras
3 min readOct 4, 2023

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Saía com a visão embaçada e com a mente atordoada. A desorientação era grande e não tinha a mínima noção de onde estava. Mal tinha forças para se levantar e se mover. Mas mesmo com seu corpo pesado, se esforçou se apoiando no que sentia à frente para se pôr em pé.

Não sabia onde estava e muito menos o que havia acontecido.

A sensação de estranheza era grande. Seu corpo não parecia mais seu e seu cérebro tentava inútilmente normalizar cada sentido, porém sem efeito.

Ânsia. Náusea. Dor de cabeça. Visão borrada.

Sabia que sua cabeça estava lutando contra tudo para se adaptar ao que tinha acontecido e voltar ao mundo real. Ao que parecia o mundo real.

A sensação não era de desespero nem de medo, ansiedade, ou qualquer outra. Era apenas de desconexão com seu corpo e o mundo em que estava.

Colocou a mão na estrutura mais próxima que lhe deu apoio e mesmo sem a nitidez da visão completa, viu que sua mão não tinha as mesmas proporções nem o mesmo tamanho que sempre teve.

Mesmo assim, não conseguia desesperar nem reagir.

Apenas a estranheza acompanhava. A sensação de não pertencimento.

Dedos longos e finos. Grandes. Pontiagudos. Cinzentos.

Nada como seus dedos eram antes.

Desajeitadamente foi se levantando. Sentindo sua altura muito maior do que antes. Suas proporções corporais incorretas.

O ambiente era escuro e com sua visão turva apenas conseguia enxergar pontos de luzes de cores diferentes em várias direções e movimentos de vultos em direções diversas sem poder distinguir quem ou o que eram.

Estava em pé nesse lugar alienígena.

Viu borrões se aproximarem enquanto sua visão aos poucos retornava a nitidez. Nada que pudesse distinguir mais do que algumas formas a mais do que a poucos segundos atrás.

Com a falta de sustentação que ainda sentia, tentou agarrar-se em um dos vultos em sua volta para apenas perceber que suas mãos deslizavam através da figura como se fosse uma forma fantasmagórica à sua frente. Uma forma que deixava um vão com o passar de sua mão e que logo era preenchida por um líquido vívido de cor avermelhada.

Em poucos instantes todos os vultos moviam-se irracionalmente e freneticamente.

Apenas viu clarões surgindo e o que pareciam flashes de luz em sua direção.

Luzes piscantes em intervalos rápidos. Muito curtos. Porém não sentia nada diferente.

Sons abafados começaram a surgir de todas as direções. Sons agudos, sons graves. Sons desesperados e sons bagunçados.

Uma sinfonia desafinada.

Sentiu uma onda de calor subir por sua espinha e até seu pescoço.

Uma sensação estranha.

Uma sensação estranha que fazia seu corpo parecer suspenso no ar e anestesiado.

Sentia apenas o calor em parte de seu corpo.

Sentia o calor e viu os borrões se tornarem menos nítidos e mais frenéticos.

Apenas alguns segundos e tudo havia parado.

Alguns pontos de luz visível, porém sem vultos. Sem borrões ambulantes. Apenas luzes estáticas.

Sua visão foi lentamente se tornando mais nítida. Cada forma ao seu redor tomava contorno e os detalhes lhe apareciam a cada instante.

Era uma sala escura, exceto por algumas cores de alguns objetos. Era complementante cabeada, vindo de todos os lugares.

E bastante líquido no chão.

Líquidos rubros. Em cor semelhante a vinho neste ambiente escuro.

Olhou para trás e viu uma cama de onde parecia que havia recobrado a consciência antes de se levantar.

No chão havia vários corpos espalhados de diversas maneiras.

Levantou suas mãos para dentro de seu campo de visão.

Longas, grandes e metálicas. Pareciam garras. Dedos de navalha e extremamente afiados.

Seus braços todos estavam metálicos.

Suas pernas.

Todo seu corpo havia se transformado.

Tudo havia se transformado em membros pontudos e afiados.

A sensação de que já havia visto o mesmo em animais de pele grossa e sangue frio.

A sensação de que havia sido só um experimento.

Só mais um brinquedo para algumas pessoas.

A sensação de que não era mais humano e nunca mais voltaria a ser.

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Ricardo Rachaus
umvagabundosempalavras

Gosto de escrever estórias e pretendo começar a escrever artigos relacionados a programação.