Do Topo ao topo

Bruno Luís Pereira
Underground League
Published in
17 min readJun 12, 2019

No League of Legends, a posição de Topo (ou top) sempre foi considerada quase que um jogo à parte do que acontece no restante do mapa. Os jogadores geralmente ficavam isolados de lutas até os quinze, por vezes vinte minutos de partida, o que ajudou a cimentar que a rota, na verdade, era uma ilha, e só quem jogava lá sabia o que se passava por aquelas bandas.

No Brasil e no mundo demorou um pouco até a posição conquistar mais destaque, ficar mais participativa no jogo e finalmente começar a revelar grandes nomes, comparado às outras posições. Tanto que, no Brasil, por vezes ainda se ouve que “desde o Mylon, não temos um grande jogador na posição”, após o tricampeão brasileiro se aposentar em 2017.

Felipe “Yang” Zhao é um dos que contesta isso. Também tricampeão do CBLoL, o que separa sua jornada daquela de Mylon é o fato de sua história se misturar com a mística em torno do elenco da INTZ de 2016, que venceu tudo o que disputou no Brasil quando esteve junto entre 2015 e 2016.

Pela primeira vez na carreira separado completamente de seus ex-companheiros, Yang finalmente tem a oportunidade de sair da sua ilha e consolidar seu nome no cenário.

“Nossa história começa mesmo na INTZ, que foi formada com a mistura de dois times, a Team United (Djoko, micaO e Jockster) e a AceZone (Yang e tockers)”, diz Yang, sentado em uma das salas da gaming house da paiN Gaming, apenas a sua terceira equipe profissional em cinco anos de carreira. O topo foi a grande contratação da janela de transferências do CBLoL, um achado mesmo para uma paiN que já tinha em Ayel um jogador consolidado na posição e campeão do Circuito Desafiante durante a Primeira Etapa 2019.

“Lembro que naquela época, em 2014, não tivemos muitas dificuldades depois de nos mudarmos para a gaming house da INTZ em São Paulo. Eu também estava relativamente próximo de casa, que fica em São José dos Campos, e falava com os meus pais todos os dias. Talvez no começo tenha sido mais desafiador porque eu sabia que tinha um prazo de validade para fazer aquela experiência valer a pena, cerca de um ano. Caso não funcionasse, teria que voltar para a minha casa, ajudar meus pais no comércio, fazer uma faculdade e viver uma vida ‘normal’”.

A aposta a que Yang se refere é a que a maioria dos cyberatletas têm no começo de sua carreira. Provar para os pais que jogos realmente são uma profissão válida, e que é possível garantir um futuro através de dedicação, remuneração e contratos profissionais.

Pedi um ano para mostrar que tinha um futuro, e se não conseguisse nada seria o fim. Eu não tinha uma opção de me acostumar ou não com a gaming house e os meninos, eu tinha que me acostumar — Yang

Após uma participação curta no CBLoL 2014, a INTZ arriscou a mudança que acabaria por vingar as apostas de todos os jogadores da equipe. Djoko saiu, Revolta entrou. Cinco anos depois, perguntei se Djoko se aposentou ou fora aposentado pelos companheiros. Yang e Djoko (hoje técnico da paiN) riem.

“Complicado dizer”, diz Yang entre risos. “Acho que ele foi aposen… Na verdade, eu…” gagueja o topo. “Ah, vai, nós aposentamos o Djoko”, diz antes de voltar a rir junto com o ex-caçador Djoko.

A entrada de Revolta revolucionou o jogo da INTZ… e do CBLoL (Foto: Riot Games)

“Mas sério, nós conversamos. O Revolta era um cara experiente e que já havia passado por muitos times grandes. Éramos quatro moleques tentando entender algo, precisávamos de um líder, e ele foi esse cara essencial pra gente entender onde se encaixava, o que tínhamos que fazer e como deveríamos nos comportar dentro do jogo. Se a gente ganhou naquele ano, muito foi por causa dele”.

Talvez o Djoko fosse mais um cara experiente de vida, mas naquele momento a equipe precisava de um jogador que fosse experiente dentro de jogo, sugeri, ao qual Yang acatou. “A gente só se preocupava em jogar naquela época. Deixávamos facilmente algumas tretas de lado porque estávamos no começo da carreira e com apostas pessoais muito altas. Era uma época que você conseguia se isolar jogando e viver feliz”.

Focados no jogo e com apostas altas de suas respectivas carreiras, Yang, Revolta, tockers, micaO e Jockster tomaram o CBLoL de assalto com um jogo rápido e mortal que ainda não havia sido visto no Brasil. De uma equipe de “segundo escalão”, a INTZ passou para surpresa da Primeira Etapa 2015, e de surpresas para vencedores logo em seu primeiro campeonato juntos. Em Florianópolis, desbancaram a Keyd Stars por 3–0 e, em menos de quatro meses de equipe, já representavam o Brasil pela primeira vez internacionalmente, na disputa do IWCI 2015, o Wildcard Invitational, na Turquia.

“A fase de grupos foi muito tranquila. Jogamos em estúdio sem torcida, e sinceramente não paramos pra pensar muito na pressão de estar representando o Brasil internacionalmente”, diz Yang, com a mesma tranquilidade que dizia estar em 2015. “Pode ser que, por naquela época não termos histórico algum de equipes brasileiras em palco global, ninguém ligava tanto assim, mas prefiro pensar que nossa equipe só funcionava assim. Confiávamos no nosso jogo e entrávamos sabendo que poderíamos vencer”.

“O problema foi a final”.

Jogando contra o representante turco na final, em Md5 valendo vaga no MSI, a INTZ até saiu na frente do placar, mas tomaram a virada da Beşiktaş Esports e sua torcida fanática, iniciando a rivalidade Brasil-Turquia no League of Legends.

“Perdemos aquela final por pura pressão”, relembra Yang. “Éramos muito novos, e apesar de termos vencido o CBLoL, na Turquia a torcida era inteira do time da casa. Quando dominávamos a visão e íamos para o Barão, eu conseguia ver claramente por detrás do meu monitor a torcida gritando loucamente para os jogadores turcos, e do nada aparecia alguém pra contestar o objetivo”.

“Entendemos que sentimos a pressão da torcida turca, e apesar da frustração, conseguimos manter a sanidade”, comenta Yang, antes de fazer um paralelo com os dias atuais. “Estávamos no começo da carreira e não tínhamos tantos seguidores no Twitter. Eu nunca fui um cara que prestou muita atenção nas mídias sociais. Na época a gente nem mexia no Twitter. Se vencêssemos, entrávamos e postávamos algo pra agradecer a torcida, mas tínhamos um pacto de não abrir nada se perdêssemos, porque era só negatividade”.

Hoje em dia os pro players acabam um jogo e vão direto pro Twitter, e eu acho isso muito errado. Ajuda o jogador a se frustrar. Ele pode falar que as críticas não o afetam, mas se realmente fosse assim ele deveria estar focado no jogo, e não na mídia social — Yang

Se a perda da final não abalou a equipe, a saída de Revolta para a Keyd na Segunda Etapa 2015 deixou um ar estranho pela casa da INTZ. Afinal, a equipe havia encaixado muito bem e vencido o CBLoL em sua primeira oportunidade, chegando à final de um campeonato internacional.

“Fiquei um pouco frustrado por termos vencido jogando bem, mas entendo o lado dele. A INTZ era uma organização pequena na época, e a Keyd conseguiria oferecer melhor suporte para o Revolta. Pessoalmente, eu não iria pelo que tínhamos acabado de conquistar na Primeira Etapa, mas entendo o ponto dele. Não chegamos a ter essa conversa, ele só saiu. Gostaria de ter tido, talvez ele ficasse e teríamos vencido a Segunda Etapa também. Mas juro que não carrego mágoas e entendo 100% o lado dele. Continuamos um time muito forte e chegamos na final da Segunda Etapa contra a paiN”.

Com Jockster na selva e a contratação de Alocs para suporte, a equipe disparou no CBLoL até a final para jogar contra a paiN Gaming, que havia eliminado a Keyd do Revolta nas semifinais.

Yang (à direita) enfrenta a paiN na final de 2015 (Foto: Riot Games)

“Se a gente jogasse dez vezes aquela final do Allianz, iríamos perder as dez, por mais que o 3–0 tenha sido um placar que não condiga com o quão equilibrado foi a série”, diz Yang, dando de ombros. “Simplesmente não era pra ser, sério (risos). Teve um lance no Jogo 2 que o Nexus da paiN estava aberto e eu dei Teleporte pra ganhar o jogo, mas quando fui bater no Nexus o Inibidor nasceu e o Kami conseguiu defender”.

Segundo Yang, a dinâmica da INTZ não havia mudado com a saída de Revolta, o seu jogo ainda rodava através da marca daquela equipe, o jogo macro. “Mas tivemos um dia ruim e a paiN estava inspirada, e claro, a pressão da torcida só aumentou o tamanho do nosso problema. Naquela época nós ainda não tínhamos acompanhamento psicológico, era muito difícil perder um jogo daqueles e conseguir resetar a sua mente e se preparar para o próximo”.

tockers, Jockster, Revolta, yang e micaO se reuniram de volta em 2016 (Foto: Riot Games)

Lembrando das atuações juntos na Primeira Etapa, ficou claro para Yang, Revolta, tockers, micaO e Jockster que a melhor oportunidade que tinham de dominar o CBLoL era se atuassem juntos. Por isso, Revolta retornou à INTZ para o ano de 2016, sem ressentimentos.

“Querendo ou não, sabíamos do nosso poder juntos. Então mesmo que estivesse um pouco estranho no começo, era necessário, e se pagou. Com o tempo a situação foi se normalizando e voltamos a conviver normalmente, sem guardar nenhuma mágoa”, diz o Topo, que conquistou com os companheiros o seu segundo título de CBLoL naquela Primeira Etapa 2016, recebendo uma segunda oportunidade de representar o Brasil no exterior.

Yang sabe que o próximo assunto de sua trajetória é o IWCI 2016, no México, e fica claramente desconfortável. Se mexe mais na cadeira e olha para os lados, quase como quem busca o apoio de alguém. Eu, Djoko e a fotógrafa Iwi Onodera desta vez não erguemos qualquer palavra para o topo se apoiar, e ele começa.

“O México foi um episódio difícil e que dói em mim comentar. Estávamos brigados e as condições de treino, principalmente, não ajudaram no campeonato. Era uma lan house pequena, longe do hotel, com setups diferentes do que nós jogávamos no palco… Quando conseguiram uma opção melhor, que era treinar no palco em que jogávamos, eram duas salas para oito equipes, então era uma guerra por horário. Foi muito conturbado. Eu só penso em esquecer, sinceramente”, diz Yang, emendando nos problemas da equipe.

“Costumávamos lavar roupa suja direto, já que nos conhecíamos há bastante tempo. Foi diferente das outras brigas porque todos estavam jogando mal, e quando é assim não tem tanto o que fazer, mas dessa vez era uma questão de atitudes que estavam sendo tomadas por alguns, como birra e corpo-mole. A gente eventualmente se resolveu a tempo de começar a Segunda Etapa, mas aquele campeonato foi o começo de todos os nossos problemas”.

Yang aquece com a INTZ para o jogo contra a Hard Random, no México (Foto: Riot Games)

Apesar de terem vencido a Segunda Etapa 2016 do CBLoL, a INTZ já mostrava um cansaço evidente. Empataram mais partidas do que em qualquer outra Etapa que jogaram juntos, apesar de manter a invencibilidade da equipe na fase de pontos. A equipe então permaneceu no Brasil, que seria sede do IWCQ 2016 classificatório para o Campeonato Mundial 2016. Uma oportunidade de ouro para a equipe conquistar redenção internacionalmente. Mas o começo fraco com duas vitórias magras e duas derrotas pesadas colocou em xeque a equipe mais vitoriosa do cenário brasileiro.

“A situação tava insustentável”, diz Yang. “Decidimos dar um basta e enfiamos todos da equipe em um quarto de hotel pra colocar todas as cartas na mesa e abrir o jogo. Soltei tudo o que tinha dentro de mim naquela conversa, que durou cerca de quatro horas. Mal conversamos sobre os próximos jogos, já estava claro que precisávamos vencer, e que nós mesmos estávamos atrapalhando isso. O Cláudio, psicólogo da INTZ, foi crucial nesse papel de fazer a ponte entre os jogadores que estavam brigados”.

Deu certo. A INTZ bateu os representantes da Turquia, Rússia e Sudeste Asiático nos dias seguintes para se classificar para a final do IWCQ 2016, que seria disputado em Curitiba contra a Dark Passage, campeã turca.

“Estávamos muito pressionados por conta do nosso histórico de já ter perdido dois torneios Wildcard, diz Yang. “Mesmo apoiando, a torcida não acreditava tanto que conseguiríamos vencer os turcos, mas foi a Etapa que nós mais nos esforçamos. Paramos para olhar tudo o que tínhamos feito e conquistado até chegar ali. Os três CBLoL que vencemos, bootcamp na Alemanha, lavamos muita roupa suja entre nós, abrimos mão de vida pessoal, ignoramos mídias sociais e até mesmo a imensa pressão que tinha. Nós nos sacrificamos de verdade pra chegar até aquele ponto”.

“Por isso, a vitória na final por 3–2 foi o momento mais feliz da minha carreira”.

Revolta abraça Yang ao final da série contra a Dark Passage (Foto: Riot Games)

“Mais do que ter vencido aquela Primeira Etapa 2015, que valia praticamente o nosso futuro como jogadores profissionais. Além de valer uma vaga no Mundial, aquela vitória era a redenção para a gente. Todos falavam que dominávamos o CBLoL, mas éramos muito ruins em Wildcards, e isso ficou muito marcado na minha cabeça. Abrimos mão de muita coisa, cara, muita mesmo, pra conseguir aquela vitória”, diz Yang, emocionado.

Eu sentia muito a obrigação de limpar o nome da INTZ e do Brasil em torneios Wildcard, e hoje eu ainda tenho a sensação que conseguimos fazer isso naquela época — Yang

Classificada para o Mundial, a INTZ teria pela frente um grupo fortíssimo com a campeã chinesa EDG, os europeus da H2k e os taiwaneses da ahq e-Sports. A torcida ainda tinha lembranças da vitória da KaBuM em 2014 contra a Alliance, e as duas vitórias da paiN no Mundial 2015. Ao mesmo tempo, tinha um pé atrás pelas atuações inconstantes da INTZ em campeonatos internacionais.

“Nós mesmos havíamos conversado antes do Mundial. Sabíamos que o desafio era muito maior e as equipes eram melhores, então abaixamos as nossas expectativas e trabalhamos duro indo pro campeonato. E tudo voou pela janela quando, na estreia, ganhamos da EDG”.

A INTZ colocou a potencial segunda melhor equipe do mundo no bolso, sem discussão. Com o mesmo jogo rápido e mortal de 2015, Revolta e Yang, principalmente, não deram chance para Clearlove e Mouse, ídolos chineses. Ao final da partida, o mundo aplaudia a INTZ, torcedores, jornalistas, casters, jogadores profissionais de todo o mundo e até o fundador da Riot Games, Marc Merrill.

“Não estávamos preparado para aquilo”, confessa Yang. “Com certeza a vitória subiu à nossa cabeça, a partida foi muito significativa pra conseguirmos conter o nosso próprio êxtase e de todos ao nosso redor. Nem mesmo o Cláudio conseguiu fazer algo”. A INTZ sucumbia por conta própria. Após a vitória contra a EDG, sofreram cinco derrotas pesadas consecutivamente, e foram eliminados do Mundial.

“Foi um erro nosso. Estávamos totalmente divididos. Um dos problemas que acentuava isso era irmos muito bem nos treinos, mas isso não batia com o que mostrávamos no palco. Isso dividiu ainda mais a equipe e criou panelinhas: eu ficava com o Revolta, o Jockster com o micaO e o tockers na dele, e por questões de orgulho ninguém colocou o pé na frente para lavar roupa suja como antes. Hoje vemos que deveríamos ter tentado, mas depois de vencer a EDG e ganhar treinos de times como Samsung Galaxy e RNG, era difícil pra gente parar e perceber que tinha algo muito errado acontecendo ali”.

Era difícil parar pra pensar o que tinha de errado quando, em treinos, a gente via o micaO e o Jockster colocando jogadores como Uzi e Mata pra jogarem debaixo da torre no Mundial 2016 — Yang

“Nós sacrificamos aquela equipe para ir para o Mundial”, decreta Yang. “Acumulamos brigas internas e rusgas até chegarmos no campeonato, e por mais que conversássemos a respeito, não surtiu mais efeito por estarmos em um momento de imensa pressão misturado com o hype incrível que se formou depois da estreia, e o preço acabou sendo cobrado. Aquele Mundial 2016 custou o time”.

INTZ, já eliminada do Mundial 2016, parte para seu último jogo (Foto: Riot Games)

“Acredito que até conseguíamos ter continuado juntos, no final daquele ano sentamos com mais calma e descansados e passamos as coisas a limpo, sem ficar qualquer ressentimento. Sabíamos que ainda seriamos uma equipe mais forte do que as outras se ficássemos juntos, mas no final, por discordâncias com a organização, acabamos nos separando, e foi o fim daquela INTZ 2016”.

Contra a parede

A INTZ se separou em três grupos. Yang e Revolta foram para a Vivo Keyd, tockers para a Red Canids, e micaO permaneceu com Jockster na INTZ. O conhecimento e a experiência daquele grupo se espalharam pelo cenário brasileiro de League of Legends. Por muito tempo, ainda era estranho vê-los separados depois de tantos anos juntos, tantas conquistas e, claro, a mística de terem permanecido invictos em séries durante dois anos. Naquele 2016, tirando tockers que venceu a Primeira Etapa 2017, nenhum outro título foi conquistado pelos jogadores. E o mais curioso: nenhum deles chegou à final da Segunda Etapa 2017, quando começou a surgir o apelido de “Exodia” para indicar o grupo formado por Yang, Revolta, tockers, micaO e Jockster. Pensando nisso, pergunto para o Yang:

- Quando falamos de qualquer um de vocês, é impossível separar a imagem dos jogadores daquela equipe da INTZ, e quando falamos nela, é praticamente impossível destacar uma peça como sendo mais importante do que a outra. Era verdadeiramente um coletivo vencedor. Mas quando vocês se separaram em três partes, surgiu o desafio de mostrar qual que era também a força individual de cada um de vocês. Você sentia essa pressão de se destacar, ou de quando o pessoal lembrasse de você, te lembrasse por ser o Yang, e não parte da INTZ 2016?

Yang não pensa muito para responder, nem muda de postura.

- Eu acho que sempre tive isso dentro de mim. Mesmo na INTZ eu já pensava em fazer um bom jogo independente de a equipe vencer ou perder. Se estava em uma fase ruim, parava pra pensar e eventualmente pedir ajuda. Acho que isso vem desde o começo da minha carreira, sempre quis ser lembrado como o Yang, não o Yang da INTZ, ou Yang da Keyd, ou da paiN. Queria ser lembrado como um cara muito bom independente da camisa que visto, como o Mylon é, por exemplo.

A resposta do Yang não me convence.

Não é que eu duvide de suas palavras, ou que penso que ele já tinha aquele discurso pronto de alguma entrevista passada, é que eu não sinto aquilo. Estamos falando de uma época pós-INTZ que aconteceu em 2016 e se estende até hoje, quando dois anos e meio já se passaram e eu ainda não vi esse Yang que quer ser lembrado por ser Yang, e não por ser INTZ 2016. Decido ser honesto com ele:

- Eu vou te pressionar pra uma resposta mais conclusiva, e te explico o porquê. Eu te vejo sendo essa pessoa extremamente competitiva e individual que você está me dizendo que é, mas ainda não vi ele aparecendo acima do coletivo. E isso não é ruim, pelo contrário, é natural. Você é um jogador de grupo, mas que também quer o seu brilho, isso é ser audacioso, ambicioso, humano. A comunidade e os especialistas te veem como um dos melhores topos brasileiros mesmo com o desempenho da Keyd no CBLoL, então eu ligo a sua contratação pela paiN agora como algo único no nosso cenário. Aqui está, no mercado, um dos melhores jogadores brasileiros. Isso é imperdível. Então o que quero entender de você é exatamente isso. É o olhar da paiN de saber que está contratando um jogador que, sim, atua muito bem em equipe, mas o que eles olharam principalmente foi a qualidade de jogador que você tem. Então eu penso que isso é uma oportunidade de ouro pra você mostrar quem verdadeiramente é o Yang. Eles não estão te contratando porque você era do Exodia da INTZ 2016, e sim pela habilidade e na vontade que você demonstra todo dia que joga uma partida.

Principalmente no Brasil, as pessoas demonizam jogadores individuais em esportes coletivos, mas contanto que esta pessoa tenha o seu senso de grupo e um equilíbrio na forma de lidar com os dois âmbitos, ser individual forma atletas idolatrados, como Messi, CR7, LeBron, Curry, Faker — Butcher

Yang disputando sua primeira partida oficial pela paiN, em 2019 (Foto: Riot Games)

“Eu não quero mais ser lembrado pelo Exodia”, diz Yang. “Eu quero ser lembrado por sero o Yang. Grande parte de termos recebido esse apelido era porque jogávamos muito bem juntos, mas acredito que eu tenho muito a mostrar individualmente. Apesar de querer esse brilho, eu sou um cara que sempre ajudou o time dentro e fora de jogo, eu me sacrifico muito pra ajudar aqueles que realmente querem. Mas esta é a chance que eu tenho de colocar a minha importância à frente também”.

Será a primeira vez que nós cinco estaremos separados. Eu na paiN, Revolta na Red, tockers na Havan, micaO na INTZ e Jockster na Redemption. É uma oportunidade única de lutar pra conquistar essa nova visão do público — Yang

“No ano passado, quando estávamos no Prêmio CBLoL e eu nem sequer fui indicado… isso bateu muito pesado em mim. Esse ano eu queria muito provar para mim mesmo e para o público que, independente de onde eu estivesse, conseguiria ter um desempenho bom, que eu ainda tenho a mesma habilidade de quando ganhei três Etapas do CBLoL”.

“Essa motivação pesou muito na minha vinda para cá. Além de outras coisas, a proposta da paiN me agradou bastante, o elenco também. Eu sempre achei o time muito forte. No ano passado eu prometi para mim mesmo que eu venceria novamente um CBLoL, ou que seria considerado um dos melhores jogadores do país, e não estaria sendo sincero comigo mesmo se não mudasse o rumo da minha carreira depois da Primeira Etapa”.

“Eu poderia ficar na Keyd, confortável, ajudar a equipe a se reerguer, mas sei que eles precisam de uma renovação completa e eu ficar lá somente atrapalharia. Estava há dois anos e meio na equipe e não vencemos um campeonato, então era claro para mim que eu teria que buscar novos ares. A saída da Keyd também é uma mudança grande da zona de conforto aonde eu me encontrava, e a paiN me pareceu a melhor opção de todas as que se apresentaram”.

A contratação de Yang pela paiN Gaming marca a volta com dois pés da organização bicampeã brasileira à elite do League of Legends brasileiro. Mesmo com uma equipe consolidada, a transferência de um dos melhores topos brasileiros alçou ainda mais a paiN para dividir o favoritismo da Segunda Etapa do CBLoL 2019 — que vale vaga no Mundial — com o Flamengo eSports.

“Eu sempre pensei muito nas outras pessoas. Na INTZ e na Keyd eu sempre tentei ajudar as organizações, e claro que eles me abriram portas importantes, mas este é um momento meu e que tenho as minhas metas pessoais claras na minha cabeça. Talvez seja a primeira vez que eu tomo uma decisão de carreira pensando unicamente em mim, e se tenho como objetivos voltar a ser um dos melhores jogadores brasileiros e vencer o CBLoL, tenho que tomar decisões que me coloquem no caminho de conquistá-los”.

Nickname: Yang (Imagem: Iwi Onodera/Start UOL)

Felipe “Yang” Zhao não é um jogador de muitas palavras. Conhecido por ser brincalhão nos tempos de INTZ, é notável ver a transformação dele através de sua carreira. Das derrotas às vitórias. Da pressão constante da torcida ao incrível senso autocrítico que possui. Da mentalidade coletiva aos, agora sim, objetivos individuais que estão claros em sua cabeça.

Você me convenceu, Yang.

Agora, é a hora de provar para todos que o tempo de sair da sua ilha do topo chegou, e que só vai parar quando estiver no topo do Brasil novamente.

Matéria escrita para o Start UOL. Você pode ler o outro lado da matéria aqui.

--

--