Como a quarentena reduziu a vibração da Terra

Alberto Akel
Unidades Imaginárias
4 min readApr 10, 2020

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A pandemia de coronavírus trouxe o caos à vidas (e economias) em todo o mundo. Tais esforços para conter a propagação do vírus já mostram que o planeta “está menos vibrante”.

Geofísicos de vários observatórios sismológicos apontam uma redução no ruído sísmico, micro-vibrações na crosta do planeta. Tal observação é resultado da drástica redução de atividades humanas.

A redução desses ruídos permitem que os pesquisadores observem melhor terremotos menores e intensifiquem os esforços para monitorar atividades sísmicas intensas, como erupções vulcânicas e terremotos.

A redução de ruído dessa magnitude normalmente ocorre apenas brevemente no Natal, diz Thomas Lecocq, um sismólogo do Observatório Real da Bélgica em Bruxelas, onde a queda foi observada.

Assim como os eventos naturais, como terremotos, fazem com que a crosta terrestre vibre, o mesmo ocorre devido a veículos em movimento e máquinas industriais, estações de trem e metrô, mas em escala menor. Embora os efeitos de fontes individuais possam ser pequenos, juntos eles produzem o que chamamos de ruído de fundo, que reduz a capacidade dos sismólogos de detectar outros sinais que ocorrem na mesma frequência.

Figura 1 -Fonte : Nature/Royal Observatory of Belgium

Dados de um sismômetro do Observatório Real da Bélgica (Figura 1) mostram que medidas para conter a propagação do COVID-19 em Bruxelas fizeram com que o ruído sísmico induzido pelo homem caísse cerca de um terço (de 60 nm para 40 nm), diz Lecocq. As medidas incluíram o fechamento de escolas, restaurantes e outros locais públicos a partir de 14 de março, e a proibição de todas as viagens não essenciais a partir de 18 de março.

A queda atual aumentou a sensibilidade do equipamento do observatório, melhorando sua capacidade de detectar ondas na mesma faixa de alta frequência do ruído. O sismômetro de superfície da instalação agora é quase tão sensível a pequenos terremotos e explosões de pedreiras quanto um detector de contrapartida enterrado em um poço de 100 metros, acrescenta Lecocq.

Aumento da informação

Se os bloqueios continuarem nos próximos meses, os detectores das cidades de todo o globo podem ser melhores do que o normal para detectar os locais dos tremores secundários do terremoto, diz Andy Frassetto, sismólogo das Instituições de Pesquisa Incorporadas para Sismologia em Washington ,DC.

Imagine ouvi música em volume baixo nos centros das cidades em dias normais. Provavelmente você não conseguirá ouvir nada. Há muitos sons chegando ao seu ouvido do trânsito, pessoas conversando, lojas e etc. De maneira parecida, é assim que os sismógrafos observam tudo, com muitas fontes de vibrações de todos os cantos. Depois do Lockdown mundial, os equipamentos conseguem ver (ou ouvir) o que antes era impossível.

A queda no ruído também pode beneficiar sismólogos que usam vibrações de fontes naturais, como as provocadas pelas ondas do mar para sondar a crosta terrestre. Além disso, os cientistas podem estudar esses eventos monitorando quanto tempo uma onda leva para alcançar um determinado detector. Essa queda no ruído induzido por humanos permitiu aumentar a sensibilidade dos detectores de ondas naturais em frequências semelhantes ao ruído.

Os sismólogos belgas não são os únicos a notar os efeitos do bloqueio. Celeste Labedz, estudante de geofísica no Instituto de Tecnologia da Califórnia em Pasadena, twittou que uma queda semelhante no ruído foi detectada por uma estação em Los Angeles. “A queda é seriamente selvagem”, disse ela.

Figura 2 — Tweet de Celeste Labedz em 26/-3/2020

No entanto, nem todas as estações de monitoramento sísmico terão um efeito tão pronunciado quanto o observado em Bruxelas, diz Emily Wolin, geóloga do US Geological Survey em Albuquerque, Novo México. Muitas estações estão localizadas propositadamente em áreas remotas ou furos profundos para evitar ruídos humanos. Elas devem ter uma diminuição menor, ou nenhuma mudança, no nível de ruído de alta frequência que registram, diz ela.

Figura 3 — Movimento médio do chão registrado na estação CNLB (Canela, RS) entre março e abril de 2020. As oscilações diárias mostram o ruído mais alto de dia e menor de noite.

Aqui no Brasil, conseguimos observar bem essa redução do ruído na estação sismográfica da cidade de Canela, RS. Na Figura 3, observamos que os níveis do ruído caem após o decreto da quarentena, ocorrido no dia 20/03/2020. Essa queda chega a quase 50% em relação aos valores das semanas anteriores, e é um número significativo, principalmente para os estudos científicos.

Não que seja a melhor forma de monitorar a atividade humana durante a quarentena, ou mesmo, a mais barata. Porém, os dados só mostram o quanto nos fazemos presentes de diferentes formas no planeta. Dados de satélites já mostram o quanto o ar ficou mais limpo neste período, mas essa é uma conversa para outro texto.

Até!

Fontes:

Coronavirus lockdowns have changed the way Earth moves

RSBR registra efeito do confinamento, e pode até monitorar a adesão da população!

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Alberto Akel
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Apenas um cientista latino americano sem dinheiro no bolso (sem parentes importantes e vindo do interior) Unidades Imaginarias | Eureka Brasil | Pint of Science