Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/d/d5/Ponte_da_amizade.jpg

O Idioma como ponte para a cultura: curso de português para estrangeiros.

Ramon Fernandes Lourenço
Histórias da Extensão
8 min readJun 28, 2017

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Você certamente já se imaginou vivendo em um país diferente, não? Com referências tão distintas daquelas com as quais você já se acostumou. Nada daquele almoço familiar de domingo, ou de andar de mãos dadas na rua com as pessoas que amamos, ou até mesmo alguma demonstração de afeto em público, dependendo do país, é claro. Um desafio e tanto de se acostumar não é? E a questão do idioma então? Talvez o maior impasse na construção de relações no novo país.

A questão linguística é, sem dúvidas, um dos maiores desafios ao se pensar em viver em outro país. Como criar vínculos sem conseguir se comunicar? Como encontrar onde morar e trabalhar sem conseguir ler ou conversar? Este é o desafio enfrentado diariamente por aqueles que deixam seu país de origem para se aventurar em terras desconhecidas, com o objetivo de melhorar de vida, de acompanhar algum familiar ou mesmo de explorar uma nova cultura.

Neste mundo tão imenso, há ao menos 7.102 idiomas conhecidos atualmente, sendo que apenas 23 deles são a língua materna de mais da metade de toda população na Terra (57%).

Os 6 idiomas mais falados no mundo (em milhões de pessoas):

- Chinês — 1,197

- Espanhol — 399

- Inglês — 335

- Hindi — 260

- Árabe — 242

- Português — 203

É interessante notar que entre as 6 línguas mais faladas atualmente, temos vivência com ao menos 5 delas aqui na região de Foz do Iguaçu: o Português e o Espanhol típicos da fronteira, o Árabe da maior comunidade Islâmica do país, o Inglês do grande fluxo de turistas da região e o Chinês, talvez o menos comum, mas também vindo do turismo e da relação com o Paraguai.

Curso de Português para Estrangeiros

Em um contexto tão dinâmico como a região da fronteira entre Foz do Iguaçu/BR, Puerto Iguassu/AR e Ciudad del Este/PY, a adaptação de um morador estrangeiro nestas terras pode ser um tanto complexa. Para auxiliar nesta questão, a coordenadora Profa. Dra. Francisca Paula Soares Maia assumiu, em 2014, o projeto de extensão Curso de Português para Estrangeiros dando-lhe nova configuração, com um método dinâmico e interativo, cujo objetivo é:

[…] favorecer a integração/inclusão linguístico-cultural, uma boa convivência com a língua-cultura do deslocar-se e conviver nesse espaço geográfico fronteiriço, por meio de curso de Língua Portuguesa (trecho do texto do projeto de extensão).

Neste sentido, o projeto vem desenvolvendo anualmente cursos voltados para o atendimento a estrangeiros aqui em Foz do Iguaçu, com públicos muito diversificados, vindos da própria Unila, como reforço aos estudantes vindos de outros países, do Consulado do Paraguai em Foz do Iguaçu, da Sociedade Beneficente Islâmica e também por procura direta da comunidade. Por ter esta grande diversidade de públicos, tanto de nacionalidade quanto de conhecimento prévio sobre o Português, o projeto necessita de alto grau de personalização. As necessidades de um aluno estrangeiro de mestrado da UNILA ou da UNIOESTE, que necessitam compreender aspectos formais do português voltados para academia, são diferentes daquelas apresentadas por membros da comunidade, que buscam desenvolver a fala e escrita para questões cotidianas, de relacionamentos de amizade ou no trabalho, por exemplo.

Uma característica interessante do projeto é sua abordagem sociolinguística, que entende que os idiomas devem ser pensados a partir do contexto no qual é praticado. Isto quer dizer que o projeto analisa o local de uso do idioma, especialmente nestas terras de fronteira em que temos contato com diferentes sotaques, do carioca, paranaense, gaúcho e também da fala carregada dos próprios estrangeiros falando o português.

Dos alunos que já participaram do projeto há algumas histórias bem interessantes, como por exemplo da solicitação do Cônsul do Paraguai em Foz do Iguaçu que pediu apoio para a formação dele e dos funcionários do consulado. Há também a realização de turmas de estudantes paraguaios da Itaipu, no lado brasileiro, que por conta de sua característica binacional, seus funcionários precisam ter contato com o português e o espanhol cotidianamente. Ou então da parceria com a Sociedade Beneficente Islâmica, em que o público foram as professoras da escola árabe em Foz do Iguaçu.

Nacionalidades atendidas pelo projeto.

Outra história interessante é a relacionada com a atuação com outro projeto de extensão que relaciona o canto e a fonética, chamado “O canto como ferramenta no aprendizado da pronúncia do português falado no Brasil”, coordenador pela Profa. Jeanne Maria Gomes da Rocha. Nesta oportunidade ocorreu o caso de um casal argentino, muito envolvido com ações de Direitos Humanos, alunos de um programa de pós-graduação na Unioeste, que procuraram o projeto para perder o sotaque em sua fala no português. O casal já estava no Brasil há muito tempo, tendo bastante domínio da língua, mas tinham a necessidade de perder o sotaque.

Mas há dificuldades também quando se trata de realizar ações voltadas para estrangeiros aqui na Fronteira, pois muitos estão envolvidos em situações complexas,como o caso de refugiados que buscam um novo país como uma saída para construir uma vida melhor, fugindo de situações complicadas em seus países de origem.

Diferenças de perfil dos alunos em região de fronteira

Estes desafios de se trabalhar com ensino de línguas para pessoas de outros países pode ser analisado a partir das experiências vivenciadas anteriormente pela coordenadora do projeto, Profa. Paula. Comparando as diferenças no perfil dos alunos entre Belo Horizonte/MG e Foz do Iguaçu/PR, há alguns pontos interessantes que podem ser observados.

Paula observa que em uma região não fronteiriça, como Belo Horizonte, os alunos que participavam dos cursos tem maior estabilidade em razão de vínculos relacionados a estudo e trabalho no Brasil, como estudantes vinculados à programas de intercâmbios, membros de missões diplomáticas entre outros. São pessoas com uma situação mais estável com o país.

Já aqui na região de fronteira a relação destes alunos é de maior mobilidade, refletindo nos trânsitos e fluxos característicos das fronteiras. Aqui os alunos se estabelecem vindos por motivos relacionados às famílias, em busca de novas oportunidades. Como no exemplo dos alunos que estavam em Foz do Iguaçu, mas tentando abrir um negócio no Paraguai, que caso não desse certo procurariam outra oportunidade fora da cidade. Esta é uma característica comum da cidade na fronteira, ser um território de fluxos, de passagem, que cria a possibilidade de novas mudanças.

Para seguir as atualizações do projeto, ou mesmo para tirar dúvidas, siga a página no Facebook:

https://www.facebook.com/Portugu%C3%AAs-para-estrangeiros-Extens%C3%A3oUNILA-1115034481881858/

Depoimentos de alguns dos participantes:

Participar desse projeto tem me feito enxergar outros horizontes, ter o real contato com os estrangeiros, observar eles, trocar ideias, trocar culturas e trocar dificuldades em ambas línguas é maravilhoso. A gente sente que realmente está ali de corpo e alma se dedicando a ter essa integração quando a hora passa e nem percebemos, aprendemos que todos somos irmãos de mães diferentes! (Tayla Cardoso — discente de Letras Português Espanhol como línguas estrangeiras — bolsista do projeto)

Atuar em classes de PLE tem sido uma experiência e tanto! Além de transpassar meus conhecimentos para o outro, obtenho novas aprendizagens. Há, nas aulas, uma exposição intercultural (tanto por parte do docente, quanto por parte do discente) a qual possibilita uma aprendizagem livre de diversos preconceitos. Ao ensinar o Português Brasileiro para estrangeiros termino por aprender mais da língua também. Sempre há mais! Sempre há o que estudar, sempre há o que aprender. Nas aulas, não como detentora de todo o conhecimento, mas como orientadora deste, busco explanar o tema e ouvir as experiências dos estudantes. Dessa maneira, nossa produtividade caminha coletivamente. (Milena Lima — bolsista do projeto)

Até o momento, a partir do projeto pude perceber que dar aulas não trata-se apenas de chegar em uma sala de aulas e “despejar” todo seu conhecimento referente a um determinado assunto nos alunos. Para exercer tal tarefa é necessário embasamento teórico e uma noção ao menos básica do público que vamos atender. Tratando-se de português para estrangeiros, ou do ensino de idiomas é necessário além de embasamento teórico ter em mente quais os melhores métodos que podemos usar para ministrar tais aulas. Lidar com um estrangeiro pode ir bem mais além do que imaginamos, não trata-se apenas de darmos aula a eles e lhes ensinarmos uma nova língua, muitas vezes os escutamos, partilhamos algumas experiências juntos entre outras coisas, pois além dessa troca ser importante muitos deles estão em um novo lugar, por variados motivos (trabalhos, estudos etc) e passar um pouco de acolhimento a eles é muito importante, pois para qualquer um de nós não é fácil sair do seu país de origem e começar a vida praticamente do zero em outro país. (Milena Melo — voluntária do projeto)

Enxergo o projeto como necessário e, de fato, efetivo. Por meio das aulas de português, os alunos, além de aprenderem a nossa língua, são apresentados a questões culturas e políticas do Brasil. Não só isso, lhes é, também, proporcionado o sentimento de pertencimento. Muitos vêm de terras muitos distantes, com línguas, culturas e ideologias distantes da nossa, dessa forma, o ensino da língua portuguesa é uma forma de fazê-los integrar à comunidade e estimular a convívio social. (Caio Korol — voluntário do projeto)

Para mi el aula del proyecto de portugés es un espacio de aprendizaje del idioma y aproximacion a la cultura y vida académica en la UNILA y Brasil. Donde además reconozco la diversidad cultural y de saberes que existe en la triple frontera y la universidad. Pedagogicamente aprendo desde el uso de la lengua a partir de las necesidades de comunicación y linguisticas que tengo y van surgiendo. (Luz Angela — aluna do projeto— estudante do Mestrado de Literatura Comparada)

El curso de portugués que inicio el primer semestre de 2017, para los Estudiantes de Mestrado, es una herramienta sociolingüística que coadyuva y establece un vinculo interdisciplinar con los cursos de Mestrado. Igualmente la metodología utilizada por la Profesora Francisca Paula Soares, Coordinadora, integra gramática, conversación y práctica a partir de discusiones y puntos de reflexión en temas coherentes con el nivel de Mestrado, facilitando el aprendizaje y la pronunciación de la lengua portuguesa al diferenciar y codificar sonidos. Es un proyecto que merece ser conocido y apoyado por los Estudiantes extranjeros de los diferentes cursos de Mestrado, mismo que nos amplia las posibilidades de comprensión, desempeño académico, conocimiento de la cultura y oportunidades laborales a nivel profesional. Aprender otro idioma activa las conexiones cerebrales al cambiar de un idioma a otro, fortalece la concentración y desarrolla habilidades comunicativas. (Jacqueline Méndez — Profesora e Estudiante de Mestrado Interdisciplinar em Estudios Latinoamericanos IELA)

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Ramon Fernandes Lourenço
Histórias da Extensão

Relações públicas na UNILA, mestre em Ciência da Informação e curioso sobre as formas como estabelecemos relacionamentos mediados pelas tecnologias.