Alvorada lidera o ranking de cidade mais violenta do RS

Unisinos Investiga
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8 min readJul 8, 2015

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Município está entre os 100 mais violentos do Brasil

Por Bárbara Müller, Joellen Soares e Marcella Lorandi

A incidência de pobreza em Alvorada — que possui cerca de 200 mil habitantes - é de 37,68% (IBGE). O Mapa da Violência 2014 aponta que o município lidera o ranking de homicídios no Rio Grande do Sul. A cidade tem um índice de 70,9 homicídios por 100 mil habitantes, analisando a taxa média de mortes em 2012 e ocupa o 82º lugar no índice de homicídios do país.

Já Porto Alegre encontra-se na 104º posição do ranking brasileiro e o 3º lugar no Estado, com uma população de cerca de 1,4 milhão habitantes, a taxa de homicídios é de 76,5 por 100 mil habitantes. A capital gaúcha possui bem mais que o dobro do número de habitantes em relação a Alvorada e as taxas de homicídios das duas cidades são bem próximas.

Os dados preocupam, o número de homicídios é crescente desde 2010, ano em que se contabilizou 50 mortes, em 2011 foram 66, e no ano de 2012 o número subiu para 140.

De acordo com informações da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio Grande do Sul baseados em informações do Departamento de Gestão Estratégica Operacional (DGEO) e da Divisão Estatística Criminal (DEC) comprovam, em questão de proporcionalidade, que os índices de homicídios dolosos são elevados comparados, por exemplo, a Porto Alegre. O município de Alvorada teve, em 2014, 157 registros de homicídios dolosos. A capital do Estado, com 1.409 milhão de pessoas, contabilizadas pelo mesmo censo de 2010, possui 571 registros de homicídios dolosos.

O delegado da 1ª Delegacia de Homicídios de Alvorada, Cassiano Cabral afirma que são altos os índices de mortes entre jovens e adolescentes e são decorrentes principalmente pelo uso de drogas. “80% das mortes são por tráfico, disputa de pontos, acerto de contas, dívidas com quadrilhas. E os demais entram nas estatísticas de brigas, são crimes passionais”, pontua.

Atualmente, com a delegacia especializada em homicídios, cerca de 70% dos casos são solucionados, e os que não foram encontradas resoluções são por medo das pessoas de falar, ou serem testemunhas. “Muitas pessoas assistem os crimes e não falam por medo de represálias, de fato já houve morte, o que se chama de queima de arquivo”, explica.

Cabral comandou a investigação da chacina na Algarve — bairro que faz divisa com Porto Alegre — onde oito pessoas armadas abriram fogo contra cinco jovens, quatro morreram, e um saiu ferido. A tragédia ocorreu em março deste ano. Ele conta que a maior incidência de mortes vem dos bairros mais pobres, onde não há atenção do governo. Segundo ele, a equipe da 1ª DP atua com força máxima para que, se não for possível diminuir estas estatísticas negativas, os crimes tenham solução.

O jornal Diário Gaúcho, do Grupo RBS, faz um monitoramento de 19 cidades da Região Metropolitana. Conforme o veículo, o primeiro trimestre deste ano revelou que uma pessoa fora assassinada a cada cinco horas nestes municípios. Pelo menos 397 pessoas morreram neste período.
Segundo os levantamentos feitos pelo DG, o número de homicídios aumentou em três cidades, são elas: Porto Alegre (11,1%), Viamão (23%) e Alvorada (23,6%).

Alvorada, Viamão e Porto Alegre são as três cidades mais violentas do RS e fazem divisa entre si. Crédito: reprodução

O vice-prefeito da cidade, Arlindo Slayfer mora em Alvorada desde 1979, quando se mudou de Encantado, no vale do Taquari, no Estado, para o município metropolitano e ali construiu sua família e sua carreira como político preocupado que é. “Conheço o povo, as dificuldades e cada canto de Alvorada, sei que somos carentes de estrutura e esquecidos pelo governo Estadual”, relata. Vereador por cinco mandatos, ele afirma saber dos problemas que a cidade enfrenta e reconhece que houve falta de controle no crescimento de Alvorada em pouco tempo.

Slayfer conta que a Brigada Militar e a Polícia Civil estão trabalhando de forma intensificada nos pontos problemáticos como a Zona do Umbu, Algarve, Aparecida e demais localidade de risco. Mas ressalta que o inimigo a ser combatido é a droga, e há projetos voltados para recuperação toxicológica, que visam recuperar e reintegrar estes jovens a sociedade.

O risco nas ruas

Quando residiam em Alvorada, no bairro Maringá, há 22 anos, o hoje aposentado, Carlos de Freitas, e esposa, dona de casa, Eva de Freitas, sofreram um assalto no mercado que tinham em frente à residência, na época. Cinco homens entraram no estabelecimento como clientes comuns e na hora do acerto do que consumiram anunciaram o assalto. O comércio funcionava na antiga garagem da residência, que tinha entrada para o quintal.

Segundo o casal, o assalto ocorreu no final de tarde, já tinha anoitecido. Três homens entraram no mercado e outros dois ficaram escondidos aguardando o momento para agir. Todos estavam armados.

Eva estava no caixa quando recebeu a notícia do assalto. A nora e a neta da comerciante estavam no local durante o assalto e conseguiram se esconder dentro do banheiro. Carlos estava próximo à entrada do mercado e foram surpreendidos por disparos de arma de fogo dos assaltantes. Após esse episódio, a insegurança tomou conta dos dois, que decidiram se mudar para Gravataí.

Bibiane Engroff tem 25 anos, é moradora do bairro Jardim Algarve, em Alvorada. Ela conta nunca ter sofrido violência, mas presenciou casos por diversas vezes. “Ando na rua com medo da minha própria sombra”, revela e diz ter cuidado redobrado ao andar sozinha ou à noite.

Contudo, Bibiane afirma que apesar de a Brigada Militar fazer a sua parte e trabalhar muito para proteger o cidadão, sempre vai haver focos de violência em algum lugar, não somente em Alvorada. “O policiamento é diário, mas a Brigada não consegue estar em todas as zonas perigosas sempre, alguém vai acabar sofrendo com a violência da cidade”, opina.

R. F., fonte que preferiu ser identificada apenas com as inicias, possui negócio próprio no bairro Jardim Algarve, há quase 10 anos. Neste período, a vítima passou por diversos momentos de insegurança e pavor. A fonte preferiu não identificar o nome de seu estabelecimento por questões de segurança, mas relata que já foi assaltada muitas vezes.

O estabelecimento é bem movimentado e frequentado por jovens, pois possui produtos de lazer que são requisitados pelo público dessa idade. E por diversas vezes o assalto era cometido por menores, ela conta. “Eles buscam dinheiro, nunca reagi, pois tenho muito medo e zelo pela minha vida” desabafa com a voz embargada, e completa dizendo que se sente insegura quando seus dois filhos estão no local. “Temo que algo aconteça e eles queiram me defender”, justifica.

Mesmo assim, R.F. segue com o negócio e é firme ao dizer que “eles não vão vencer”.

Projetos sociais são alternativas

O secretário adjunto da Secretaria de Assistência Social e do Trabalho, Alexandre da Silva Rodrigues afirma que há, sim, diversas ações para diminuir e sanar os problemas do município, e o que pode ser feito pela cidade a Assistência Social realiza. No entanto, ele rebate que alguns problemas são de responsabilidade do Governo do Estado.

O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), que visa promover a integração social, contribui para o desenvolvimento e aprendizado de crianças e adolescentes, e para a melhoria de vida das famílias.

Segundo Rodrigues, “as crianças e os adolescentes frequentam o CRAS no turno inverso ao da escola, ali há monitores que destinam atividades, como oficinas de dança, de música, esportes, artesanatos, que visam ajudar na formação destes alunos”, explica.

Ele relata que há convênios com entidades preocupadas em fortalecer e resgatar vínculos, seja com famílias ou amigos. “Alguns jovens se perdem, pois antes disso já perderam seus vínculos”, desabafa. Essas entidades em sua maioria são igrejas e centros franciscanos que também se sentem responsáveis pelas instruções dadas a estes jovens.

Rodrigues também revela que quando um menor é retirado de sua família é porque está em situação de risco, isso significa que já sofreram violência física ou moral, abuso sexual ou possuem pais usuários de drogas.

“Estes jovens são destinados a rede municipal de ensino e passam a morar em casas lares ou abrigos. Alguns ainda são ‘devolvidos’ a um parente na condição de proteção deste menor”, pontua.

Ele afirma que a estrutura oferecida nestes abrigos e casas lares são a mais próxima possível a de uma família. “Os abrigos comportam até 14 crianças e, além de frequentarem a escola, são oferecidos monitores, psicólogas, nutricionistas, cozinheiras, idas regulares a médicos, pessoas responsáveis pela cozinha, limpeza e segurança”, explica, e completa: “e nas casas lares, é permitido até oito crianças que possuem um casal de “pais sociais”, o mais semelhante a um lar, onde elas frequentam a escola e possuem atividades complementares”.

Em 2013, o município criou A Casa da Cidadania, um espaço que abriga diversos projetos sociais. A Casa da Cidadania também abriga um projeto chamado Loja Social. Pessoas cadastradas nos Centros de Referência de Assistência Social e beneficiárias de programas sociais escolhem para elas, e seus familiares, roupas e itens arrecadados durante a Campanha do Agasalho e demais ações beneficentes da prefeitura. O espaço funciona como uma loja de roupas convencional, com provador e tudo.

Crédito: Divulgação

O Ônibus da Cidadania funciona como uma extensão da Loja Social, buscando expandir o atendimento das comunidades mais necessitadas do município em ações de inserção a serviços de saúde, direitos humanos, educação, cultura, meio ambiente, esportes, assistência social. Em 2013, o ônibus teve um papel fundamental durante a enchente que atingiu — nos meses de agosto e setembro daquele ano — o município de Alvorada, sendo deslocado para as regiões mais atingidas.

A ONG Amar é Cuidar vive de doações e conta com o trabalho voluntário de cerca de 20 pessoas, e completará sete anos em novembro deste ano. O local atende mais de 200 crianças entre as atividades de dança, do grupo de teatro, da escolinha de futebol, entre outros trabalhos.

O objetivo é manter crianças e jovens longe das drogas. A instituição promove integração também das famílias, para evitar o contato de pais, filhos e irmãos com os vícios e a violência local.

Zanir Santos, mais conhecida por Nika, é a presidente da Amar é Cuidar fala sobre a iniciativa: “É possível, sim, manter crianças e jovens, de vulnerabilidade social, afastadas do perigo de ir para o mundo das drogas, mesmo com tantas dificuldades que enfrentamos todos os dias”.
O secretário adjunto conta que permitir que todos estes jovens tenham um futuro melhor, gera um gasto de cerca de 2 milhões de reais por mês, mas explica que “é melhor gastar precavendo do que remediando”.

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Reportagens produzidas em aula pelos alunos de Jornalismo da Unisinos/RS para a disciplina de Jornalismo Investigativo