Formação Humana para compromisso com a Vida Animal
Autoras: Sofia de Souza P. Gomes e Thais Rosso da Silva
RESUMO
O abandono de animais é frequente e comum em todo o mundo e causa prejuízos nos âmbitos da saúde pública, social, ecológica e do bem-estar animal. Segundo Zygmunt Bauman, os tempos são líquidos, assim como a água, tudo muda muito rapidamente e o interesse pela posse de um animal de estimação segue essa mesma velocidade, passando de um líquido relacionamento para um sólido e duro abandono . Entre as principais causas do abandono de animais estão: a ausência de conhecimento sobre comportamento animal e a tendência da criação de expectativas irrealistas sobre a convivência com o animal. Diante disso, o presente artigo tem como objetivo abordar o impacto da formação humana sobre casos de abandono de animais.Foram realizados revisão bibliográfica e pesquisa de campo a fim de problematizar, conceituar e argumentar características típicas do abandono de animais, proporcionando uma melhor compreensão do ser humano defronte a sua realidade, motivando a uma atuação integral do seu papel de guardião da natureza. Os resultados sugerem que que atitudes contrárias a modernidade líquida contribuem para a redução dos casos de abandono e animais. Sendo assim, uma formação sólida se faz essencial para os bons tratos com os animais.
ABSTRACT
The abandonment of animals is frequent and common all over the world and causes damage in the areas of public, social, ecological and animal welfare. According to Zygmunt Bauman, times are liquid, just like water, everything changes very quickly and interest in owning a pet follows the same speed, going from a liquid relationship to a solid and hard abandonment. Among the main causes of animal abandonment are: the lack of knowledge about animal behavior and the tendency to create unrealistic expectations about living with the animal.. This article aims to address the impact of human training on cases of animal abandonment. Bibliographical review and field research were carried out in order to problematize, conceptualize and argue typical characteristics of animal abandonment, providing a better understanding of the human being in front of his reality, motivating a full performance of his role as guardian of nature. The results suggest that attitudes contrary to liquid modernity contribute to the reduction of cases of abandonment and animals. Therefore, a solid formation is essential for good treatment with animals.
1. INTRODUÇÃO
Para Zygmunt Bauman (2001) antes de haver uma modernidade líquida, teve o surgimento da modernidade sólida, o qual foi caracterizada pelo homem não ser mais dominado pela natureza, e sim, agora o homem ter o poder de conduzir o ambiente para seus interesses (OLIVEIRA,2012). Nesse sentido, o papel da sociedade deveria ser de cuidar e preservar a natureza, visto que o homem tem o papel fundamental como guardião. Contudo, a partir do século XX, a sociedade perdeu a noção do quanto seus atos afetam o meio ambiente, consequentemente, o quanto o meio ambiente afeta a sociedade. Diante desse contexto, e com o entendimento de liquidez de Bauman, esse momento frágil e sem uma sólida formação de caráter humano e ausência de responsabilidade com o meio que o cerca se nomeia como modernidade líquida.
A descrição dessa conjuntura volúvel observada pelo sociólogo polonês é de extrema relevância para entender várias problemáticas presentes no mundo, por exemplo, o abandono de animais nas ruas. Este ato vai além de ser uma mera “ação”, os fatos que levam as pessoas descartarem um ser vivo a mercê nas estradas depois de os tornarem dependentes de seus cuidados e necessitados de atenção, devem derivar de uma liquidez na formação humana, aponto de não manifestar empatia, nem medir as consequências tanto para o animal quanto para sociedade. A superlotação de cães e gatos nas ruas, além de causar acidentes nas estradas e avenidas, são fáceis focos para a disseminação de doenças e zoonoses (doenças que são transmitidas de animais para humanos). Com isso, o artigo busca compreender o que leva as pessoas a abandonarem os animais, o porquê dessa renúncia, e principalmente, informar a sociedade sobre o resultado negativo que essa atitude causa na saúde única.
É válido ressaltar que a questão de abandono de animais vem ganhando enfoque, pela extensão que a relação homem e animal está tomando. Os animais são vistos por muitas famílias como integrantes destas, com isso estudos sobre esse assunto estão surgindo, com uma abordagem mais social e psicológico. Uma pesquisa em Portugal evidenciou que um dos pontos geradores do abandono é a falta de conhecimento sobre os animais de estimação, e a criação de expectativas sobre eles que no final são frustradas e não correspondidas. assim, deixando-os de lado. (Jacobetty et al. 2019)
Infelizmente, muitos dos casos de abandono não são denunciados, pois já se encontram banalizados na sociedade, devido seu alto índice de ocorrência (Delabary,2012). O que é preocupante, pois, dessa forma, a sociedade está apresentando característica de liquidez, o que dificulta espalhar um conhecimento de maneira sólida para diminuir a quantidade de ocorrências de abandono de animais. Como se pode evidenciar, os indivíduos dessa sociedade fluida não averigua a responsabilidade de adotar um animal, e muito menos as possíveis causas que pode acarretar na saúde pública ao abandoná-lo. Os cães e gatos portam muito patógenos, chegando a ser associados a mais de 60 doenças classificadas como zoonoses, trata-se pois de uma questão de extrema importância de saúde quanto ambiental. (Szwabe e Błaszkowska, 2017)
O estudo sobre abandono de animais correlato ao entendimento da formação humana é de extrema valia para compreender os fatores que impulsionam há ocorrência dessas atitudes, e assim conseguir desenvolver medidas eficazes para diminuir o número de casos de renúncia animal, para isso, foi aplicado um questionário. Portanto, o artigo busca contribuir para o entendimento da sociedade ao seu papel alusivo quanto guardiões da natureza e instruir sobre a relevância para o bem social de haver a percepção do compromisso à vida animal.
2. OBJETIVO
2.1 Objetivo Geral
O artigo visa contribuir para a instalação do ser humano na sua realidade, fazendo com que ele exerça integralmente seu papel de guardião da natureza, bem como esclarecer os principais fatores que levam a renúncia do animal, correlacionando o impacto da formação humana com a falta de compromisso com a vida animal.
2.2 Objetivos Específicos
- Evidenciar mudança da formação humana e o seu impacto nos casos de abandono de animais;
- Determinar a influência da formação do caráter pelas virtudes nos casos de abandono de animais;
- Interpretar os dados relacionados ao aumento do número de animais na ruas;
- Correlacionar a formação humana líquida com o abandono de animais;
- Valorizar a importância de uma formação sólida na redução do número de animais abandonados;
- Elucidar as consequências dos animais abandonados na saúde pública;
3. JUSTIFICATIVA
A reflexão acerca dos casos de abandono de animais é de extrema urgência, visto que dados da OMS (Organização Mundial de Saúde), há cerca de 30 milhões de animais abandonados no Brasil, ou seja, 30 milhões de vidas foram largadas na rua.
Essa realidade decorre de diversos fatores: falta de conhecimento sobre animais de estimação, falta de experiência anterior em cuidar de animais de estimação, mudanças de estilo de vida durante a posse de um animal de estimação e a substituição da ideia de coletividade e de solidariedade pelo individualismo, elucidada por Bauman.
Nesse contexto, a pesquisa é de extrema importância, pois nela se pode evidenciar os pontos mais frágeis na formação humana que junto com outros fatores externos culminam no sentimento de indiferença que esse grupo de pessoas apresentam ao abandonar um animal. Além do mais, se vê necessário o fornecimento de informações mais precisas e de fácil acesso para a população, de maneira que eles consigam compreender a real magnitude da responsabilidade do ato de ter um animal sob seus cuidados. Ademais, é de alta relevância ter consciência das consequências que o abandono animal pode acarretar a saúde pública, por exemplo, na disseminação de zoonoses.
Diante disso, se observa a vulnerabilidade social nesse tema, o qual foi escolhido para ser abordado exatamente para tentar esclarecer essa problemática e buscar mitigar esses altos casos de abandono. Haja visto, que como seres racionais e guardiões da natureza é fundamental para a sociedade compreender a relevância dos problemas do abandono de animais.
4. METODOLOGIA
Para atingir os objetivos propostos e testar as hipóteses experimentais formuladas, realizou-se estudo bibliográfico e pesquisa de levantamento, utilizando metodologia de natureza qualitativa.
A pesquisa bibliográfica sobre o tema foi feito em artigos disponíveis no Google acadêmico e Science, reunindo e observando levantamentos semelhantes e discrepantes entre eles (KULPA; KONIG, 2014). Um dos aspectos avaliados foram os fatores mais frequentes que propiciam a ocorrência de abandono de animais.
O levantamento de artigos na literatura foram fundamentais para a realização das perguntas do questionário no Anexo 1., pois se teve como embasamento na criação das questões depois de analisar os tópicos mais relevantes que se observou nos artigos bibliográficos estudados.
Foi realizado um questionário online , pelo aplicativo “Google docs formulário”, resultando em 14 perguntas. O questionário foi aplicado para um grupo 166 pessoas durante o período de 15 de Setembro de 2020 a 23 de Setembro de 2020.
De modo que os dados da pesquisa fiquem efetivamente abordados na amostra selecionada, ou seja, entre homens e mulheres acima de 18 anos de idade, as três primeiras perguntas se referia a idade, sexo e localidade do participante. É válido ressaltar que o formulário foi aplicado por meio da internet e redes sociais, principalmente, WhatsApp, sob o compartilhamento do link de uma pessoas para a outra alcançando várias proporções do Brasil.
O abandono de animais é algo que vai além de uma atitude cruel, ela afeta diretamente na formação humana do indivíduo que realiza essa atitude. Diante disso, na pesquisa, se teve a preocupação de averiguar o comprometimento que os participantes apresentavam com as coisas simples. Essa análise foi tratado nas questões 4, 5 e 6, os quais refletiam sobre quebra de expectativa, ocorrência de situações inesperadas e de circunstância que exige responsabilidade,respectivamente.
No questionário incluiu também 5 questões que tem o objetivo de identificar o posicionamento dos pesquisados sobre a tolerância que os donos dos animais têm quando são encontrados em situações com problemas comportamentais.elas estão destacadas como questões 7,8,9,10 e 11 (Baquero, Chiozzotto, Garcia, Amaku, & Ferreira, 2017)
As três últimas questões têm por finalidades diversas, cada uma proporciona uma interpretação diferente. A questão 12 busca identificar se o tutor tem consciência que a posse de um animal pode levar a gastos inusitados, pois a emoção de ter um animal faz com que as pessoas não reflitam na consequência financeira que pode ser acarretado.
A atitude de abandonar um animal é extremamente repudiada por muitas pessoas e pela mídia também, dessa forma, grande parte dos abandonadores não gostam de revelar seus atos e muitas vezes tendem a contar como se fosse caso de um “conhecido”. Essa conjuntura mostra o quanto líquida a formação da sociedade se encontra, e para se encaixar nesse meio acaba não assumindo seus atos, assim, abalando sua formação humana. Com fito de compreender os fatores do abandono animal, foi formulado a questão 13 e 14, está sendo a questão unicamente aberta.
O questionário infelizmente teve como limitação a questão pessoal de cada participante referente às respostas dadas com franqueza nas que diz respeito ao abandono, logo após a observação dos dados correlacionados com os estudos de revisão de literatura, entendemos o real efeito da formação humana nessa questão.
5. DESENVOLVIMENTO
5.1 Formação do caráter pelas virtudes
A humanidade cresceu imensamente no seu sentido técnico e científico, e deixou para trás as questões morais que a qualificava como humana. Ao dar valor exacerbado às questões materiais, o homem flexível da modernidade abandonou a verdadeira razão que esclarece e abre caminho para as “luzes”. Dessa forma, ficou preso aos limites do espaço e do tempo, transgrediu o valor da sua subjetividade e permitiu assim uma sequência de acontecimentos que inseriu vida cotidiana em uma espécie de cesta vazia, em que os fatores econômicos e tecnológicos determinam os conteúdos, isto é, os acontecimentos, as causalidades, os instrumentos e as paixões, tornando as relações cada vez mais frágeis e afirmando a instalação do homem na modernidade líquida de Bauman. Essa modernidade evidencia um antropocentrismo desordenado, que ao colocar quando o ser humano no centro, este acaba por dar prioridade absoluta aos seus interesses contingentes, e tudo o mais se torna relativo, gerando um estilo de vida que também é desordenado. A cultura do relativismo é a mesma patologia que impele uma pessoa aproveitar-se da natureza como um mero objeto, ignorando o fato de que um crime contra a natureza é um crime contra a nós mesmos (Francisco, 2013).
A mudança da formação humana fez com que as virtudes, que podem ser definidas como hábitos estáveis, ou seja, que não são tendências instintivas ou espontâneas, como os traços de temperamento, mas devem ser adquiridas com empenho e esforço constante, dessem espaço para a “moralidade líquida”, na qual é tolerável se deixar guiar pelas emoções. Dessa forma, a sociedade atual tornou –se um imenso redemoinho de egoísmo, que devora as pessoas, as afunda no seu funil assassino e as cospe depois, deprimidas e inúteis, para fora. Quando só existem “apetites” e “ambições”, não existe um caráter que possa ser firme ou alicerçar qualquer coisa. Todas as virtudes humanas, que são muitas, giram em volta de quatro virtudes cardeais (“virtudes-eixo”): — prudência, justiça, fortaleza e temperança. Essas forjam o caráter e perfilam cada vez mais a personalidade ( Faus, 2014).
Nesse sentido, as perguntas ,4, 5 e 6, cujos resultados se encontram nas tabelas 1, 2 e 3 respectivamente, buscavam evidenciar aspectos da modernidade líquida na atitudes humanas, ou seja, a ausência ou presença das virtudes. Essas três perguntas apontam para possíveis existência de dificuldades ao lidar com problemas no relacionamento cotidiano do participante, e, se uma pessoa experimentou dificuldades na relação humana, elas são mais propensas a simpatizar com as circunstâncias que podem levar à renúncia do animal. Diante das respostas dos participantes foi possível perceber que eles se afastam das relações líquidas, já que conseguem exercer as virtudes da fortaleza, prudência e temperança diante de situações que opõem-se ao esperado ou não corresponde com as expectativas, bem como ponderam as consequências antes tomarem decisões. Sendo assim, se distanciam do abandono que é um ato egoísta e não há virtude alguma que possa fomentar o egoísmo; cada uma redunda necessariamente no bem da nossa alma e das almas dos que nos rodeiam (S. Josemaria “Amigos de Deus”).
Dessa forma, as virtudes são fundamentais para o bons tratos com os animais, porque elas regulam os nossos atos e vontades. Sendo que, a vontade — que está na raiz do caráter — é uma potência, uma energia da alma, que pode estar abafada ou liberada. Na situação concreta das nossas vidas, ninguém tem a vontade suficientemente “livre”. Tem que travar-se, em cada um de nós, uma batalha para conseguir desatrelar a vontade das fraquezas, egoísmos, miragens, paixões, maus hábitos e enganos, e torná-la no que deve ser: a grande força serena, a “executiva” racional da conduta humana (Faus, 2014).
Tabela 1 — Nº de respostas por alternativa e porcentagens para a pergunta nº 4 do questionário: “Quando você compra um produto e ele não corresponde com suas expectativas, você”
Tabela 2 — Nº de respostas por alternativa total e porcentagens para a pergunta nº 5 do questionário: “Quando você idealiza uma situação e ela não ocorre como esperado, você”
Tabela 3 — Nº de respostas por alternativa total e porcentagens para a pergunta nº 6 do questionário “Diante de uma situação que exige responsabilidade, você”
5.2 O animal e as causas do abandono
Os seres não humanos são chamados de animais, e são conhecidos como irracionais, no entanto, é de pouco conhecimento, mas de extrema importância saber que eles são seres sencientes, ou seja, sentem saudade, ansiedade, prazer, alegria, gratidão e dor. Principalmente animais domésticos, que são aqueles que estão acostumados a viver com o ser humano, que se adaptam e se moldam de acordo com a necessidade do dono. Eles apresentam atributos como sociabilidade e mansidão que o homem idealiza para se ter como companhia. Os animais de estimação, especialmente cão e gato se apegam e se tornam dependentes de seus tutores facilmente, sobretudo que a maioria das vezes eles são adotados quando filhotes. A problemática desta questão está na frágil formação humana, pois segundo Zygmunt Bauman “Vivemos tempos líquidos. Nada é pra durar”, e infelizmente muitas pessoas associam o contexto dessa frase não só aos meios materiais, mas também aos animais, visto que adotam os bichinhos quando filhotes por fetiche, status ou até mesmo pela “flor da emoção” sem medir a responsabilidade, e quando não mais satisfeito tanto pelo comportamento, custo ou pela necessidade do momento os abandonam nas ruas.
Um dos principais motivos que levam a esse ato de renúncia é a falta de experiência de cuidar de animais, a ausência de conhecimento comportamental sobre os animais de estimação e muitas vezes também o tutor tende a criar expectativas irrealistas que não são correspondidas e não lidam da melhor madeira com a frustração chegando a maltratá-los ou até abandoná-los. (Jacobetty, Lopes, Fatjo, Bowen, Rodrigues; 2019).
Dessa maneira, vale ressaltar que na conjuntura filosófica inglesa do contratualista Thomas Hobbes “O homem é o lobo do homem” se refere a natureza do ser humano em ser selvagem, porém o Estado entra no contexto com a finalidade de impor leis que regulam essa relação de desejo e moralidade em busca da harmonia social. Contudo, não adianta ter a lei sem haver aplicabilidade dela, e essa branda fiscalização é uma das razões de ter ocorrido o aumento de casos de abandono de animais, a pessoa que abandona o animal na rua ou em frente de ONGs vê comodismo em praticar esse ato ao invés de procurar outra alternativa, pois não há eficácia na penalidade. Além do mais, a líquida formação humana, sem convicções de princípios estabelecidos leva ao abominável aumento de casos também, pois mesmo ciente que o abandono de animais é crime, se mostra ético na presença de outros, porém faz quando ninguém vê para não ser repreendido pela conduta. (Nascimento, 2019)
É importante saber que há algo a mais a ser compreendido na relação homem-animal, o qual resulta o abandono. Os casos citados no parágrafo passado são momentos e situações sociais que proporcionam o crescimento de números de animais nas ruas. Segundo Jaume Fatjó et al (2015), houve um aumento de cerca de 30% no número de animais abandonados na Espanha, entre os anos de 1998 e 2013. Diante disso, em busca de entender melhor a razão principal dessa elevação de casos, o nosso questionário destacou um bloco de perguntas que analisou a tolerância do tutor diante alguns comportamentos do animal de estimação, essas estão representadas nas questões 7,8,9,10 e 11. Os resultados estão exibidos na tabela 4.
Tabela 4- Total e percentual do bloco de perguntas referentes a tolerância ao comportamento animal.
Analisando os resultados se observa se uma porcentagem baixa dos que optariam em abandonar ou dar o animal, no grupo de questões sobre tolerância ao comportamento animal, mas esses números podem ter sofrido influência na ausência de franqueza em parte dos voluntários na hora de responder o questionário com medo de haver repreensão pela atitude, como já foi comentado e outros fatores que limitaram a pesquisa. Todavia, é de extrema relevância dar destaque a esses números, pois eles não fogem do resultados achados na literatura internacional, que retrata uma pesquisa feita em Taiwan que com um amostral de mais de 1000 participantes 5,3 % dos atuais ou ex tutores admitiram ter soltado ou abandonado animal na rua, e quando eles foram questionados sobre o que havia acontecido com os últimos animais de estimação 2,6 % relataram ter soltado ou abandonado.
Na alternativa de “Outros” que quando era escolhida pelo participante se tornava uma questão aberta para que, dessa forma a pessoa desse sua opinião, assim, teve uma predominância desse item de mais de 10% nas 5 questões sobre como lidar com o comportamento animal, vale ressaltar que os relatos mais citados foram: o ato correto seria ter paciência e ensinar o bichinho de estimação (3,6%) e buscar adestrar o animal (3,0%).
Portanto, embasado no estudo do nosso questionário e revisões de literaturas do assunto animal fundamentado na liquidez da formação humana, é indubitável que o número de animais nas ruas aumentaram, e lamentavelmente esses casos tendem a crescer se nenhuma medida for tomada. Porque além das várias ocorrências de abandono de animais de estimação, há a reprodução destes que se dá de maneira desorganizada crescendo a quantidade de cão e gato nas ruas de forma acelerada.
5.3 Impacto dos animais na saúde pública
É indubitável que o agravante de ter vários animais soltos nas ruas não se limitava somente no seu mal-estar, infelizmente, a ignorância da sociedade é de grande magnitude que mesmo conhecendo as proporções que esses atos podem tomar continuam largando cães e gatos nas ruas achando que resolveu um problema. No entanto, o reflexo dessa problemática é afetada na saúde pública, pois os animais são principais reservatórios e transmissores de zoonose, ou seja, doenças que são facilmente passadas de animal para o ser humano, tendo. .( Souza e Pignata)
Como agentes etiológicos micro organismo dentre eles bactérias, fungos, vírus e helmintos. Haja visto que umas das medidas de prevenção e controle é o cuidado com os animais domésticos, incluindo a ida regular ao veterinário e a aplicação de vacinas em dia. Contudo, é notório que animais de rua não tem acesso a esses benefícios e nem água e comida adequada, sendo dessa forma totalmente expostos aos patógenos, ressaltando que cães são associados a mais de 60 doenças zoonóticas. (Szwabe e Błaszkowska, 2017)
O questionário abordou essa questão da consequência de forma indireta nas questões 11, 12 e 13. A questão 11 perguntou se o cão ou gato ficasse doente e seu tutor não tivesse com arcar com os custos de tratamento, o que ele deveria fazer, 87,3% falou que deveria encontrar uma solução, 0,6% optariam em dar o animal, 1,2% abandonaria o animal e 10,9% quiseram dar sua opinião dando ressalva em fazer uma “vaquinha virtual” para arrecadar dinheiro, buscar atendimento público, cobrar a gestão política para fornecer atendimento gratuito aos animais. Portanto, o que se verifica nesses dados é que apresenta uma boa parcela de indivíduos que sem condições de arcar com a saúde do animal o abandonaria ou o dava, o que pode empecilhar em maior disseminação de zoonoses, mas é de grande valia destacar que a maioria buscaria uma solução. A questão 12 questionava se o participante conhece alguém que abandonou um animal de estimação, e 41% responderam que sim e 59% responderam que não. Na questão 13 era aberta e perguntava se existiria alguma razão pela qual você abandonaria seu animal, e nela 1,8% dos entrevistados relataram que abandonariam seus animais, entre as causas do abandono estavam situações de muita raiva, conforme a necessidade e se o animal mordesse alguém da família.
O que intrigou na pesquisa foi que 1,8% mostraram motivos para abandonar seus animais, sendo que 41% dizem conhecer alguém que abandonou, a discrepância dos dados pode estar envolvido pela limitação do questionário ou também, muitos podem ter escolhido não relatar os motivos que o levaria ao abandono para não ser possivelmente criticados. Essa diferença grande dos números nas questões de “fazer” e “conhecer alguém que fez” foi notada já em outras pesquisas relacionadas com abandono de animais, como foi o caso no estudo feito em Votorantim, São Paulo. Além do mais, a revisão bibliográfica o qual relata a psicologia do que leva as pessoas a abandonarem os animais realça essa ausência de exatidão nas respostas dessas questões com receio de julgamento. (Jacobetty et al., 2019)
Diante disso, os dados evidenciam de forma direta e indiretamente a ocorrência de casos de abandono animais, estes que causarão consequências futuras como já foi comentado, principalmente com surgimento de zoonoses, por exemplo, a raiva que é uma doença viral infecciosa que pode ser transmitido para pessoas por meio de mordidas de morcego ou cachorro infectado, o qual entra na corrente sanguínea e vai até o sistema nervosa levando ao surgimento de sintomas característico da doença. Além do toxoplasmose que é uma doença infecciosa causada pelo Toxoplasma gondii que se hospeda nos felinos podendo ser contaminante pelo contato de fezes do animal ou alimentos e água contaminados por cistos do parasita. Outrossim, a doença de Lyme que é transmitida pelos carrapatos do gênero Ixodes infectado pelo bactéria Borrelia burgdorferi que afeta tanto em gato quanto em cachorro, quando a pessoas é picada é de fácil observação, pois o edema e rubor são bem aparente e caso não for identificado e tratado de maneira correta a bactéria pode se espalhar por vários órgão podendo comprometê-los. Ademais, um estudo feito no centro da cidade de Lodz, na Polônia, sobre parasitas gastrointestinais na população de cão e gato de rua, em suas análises foram encontrados ovos de helmintos tanto nas amostras de solo quanto nas fezes dos animais, ou seja, os parasitas estão no chão do centro, o qual é local de grande circulação de pessoas ao dia, e os animais de rua expostos ao ambiente sem cuidados são usados como meio de disseminação dos helmintos.
Portanto, a nossa pesquisa demonstrou que com a renúncia de animais nas ruas, o que leva ao aumento deles sem vigilância e cuidados adequados, pode acarretar consequências preocupantes na saúde pública, isso porque são mais de 60 doenças parasitários que pode ser passada de animal para o ser humano.
6. CONCLUSÃO
Portanto, o trabalho buscou evidenciar os fatores dentro da formação humana atual que, infelizmente, lida de forma líquida com as suas responsabilidades, assim, não sendo diferente quanto a questão animal, quando este não é mais favorável ao tutor é largado à mercê nas ruas.
Sendo assim, uma formação sólida se mostra essencial e os médicos veterinários devem atuar como propulsores dessa formação informando e educando a população a respeito da guarda de animais. Quem adota um animal, deve ser orientado sobre a responsabilidade associada a sua aquisição, já que o animal terá um período longo de vida e, sendo assim, vai requerer cuidados básicos custosos em longo prazo. Os médicos veterinários podem e devem promover a guarda responsável e informar a respeito da prevenção das zoonoses. Alterações comportamentais como já citadas anteriormente são as principais causas de abandono. Em algumas faculdades de Medicina Veterinária, esse tema é pouco abordado e deve-se refletir sobre o fato de que o conhecimento nesta área pode minimizar os efeitos comportamentais não desejáveis (os que são passíveis de modificações) e com isso, diminuir eventuais abandonos por este motivo.
Diante disso, seria de grande valia a formação de uma cartilha, a qual abordaria tópicos importantes referente ao comportamento e necessidades dos animais para que os futuros tutores tenham conhecimentos sólidos e possam tomar atitudes conscientes e responsáveis. Bem como, é fundamental a interação do serviço público com os médicos veterinários intensificando as ações de controle da população de animais abandonados nas ruas, por meio de uma parceria com as Universidades, utilizando de uma estruturação operacional com recursos tecnológicos para prevenção de zoonoses.
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8. ANEXOS
Anexo 1: QUESTIONÁRIO SOBRE AS CAUSAS DE ABANDONO DE ANIMAIS
1) Cidade — UF
2) Idade
3) Sexo
4) Quando você compra um produto e ele não corresponde com suas expectativas, você:
a) Descartar o produto
b) Doa para alguém que queira
c) Utiliza da melhor forma possível
d) Outros:
5) Quando você idealiza uma situação e ela não ocorre como esperado, você:
a) Fica decepcionado e desiste
b) Fica nervoso e desconta nas pessoas em sua volta
c) Busca entender o que está acontecendo e resolve
d) Outros:
6) Diante de uma situação que exige responsabilidade, você:
a) Analisa as consequência antes de se comprometer
b) Se compromete sem pensar nas consequências
c) Não se compromete em hipótese alguma
d) Outros:
7) Se um cão ou gato destruir algo barato, o que você acha que o tutor deve fazer?
a) Deve abandonar o animal
b) Deve dar o animal para outra pessoa
c) Deve tentar encontrar uma solução
d) Outros:
8) Se um cão ou gato morder alguém da família, o que você acha que o tutor deve fazer?
a) Deve abandonar o animal
b) Deve dar o animal para outra pessoa
c) Deve tentar encontrar uma solução
d) Outros:
9) Se um cão ou gato fizer xixi ou cocô de forma consciente em casa, o que você acha que o tutor deve fazer?
a) Deve abandonar o animal
b) Deve dar o animal para outra pessoa
c) Deve tentar encontrar uma solução
d) Outros:
10) Se um cão ou gato for muito desobediente, o que você acha que o tutor deve fazer?
a) Deve abandonar o animal
b) Deve dar o animal para outra pessoa
c) Deve tentar encontrar uma solução
d) Outros:
11) Se o cão ou gato destruir algo caro, o que você acha que o tutor deve fazer?
a) Deve abandonar o animal
b) Deve dar o animal para outra pessoa
c) Deve tentar encontrar uma solução
d) Outros:
12) Se um cão ou gato ficar doente e o seu tutor não tiver como arcar com os custos do tratamento, o que você acha que ele deve fazer?
a) Deve deixar o animal na porta de uma clínica veterinária
b) Deve dar o animal
c) Deve criar uma “vaquinha” para arrecadar dinheiro
d) Outros:
13) Você conhece alguém que abandonou uma animal de estimação?
a) Sim
b) Não
14) Existe alguma razão pela qual você abandonaria um animal de estimação?