Plano de introdução dos clássicos da Literatura para crianças de 7 a 13 anos em situação de vulnerabilidade

Karina Braganca
UNIV Inspire Br
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26 min readOct 7, 2020

GABRIELLE BARROS PINTO DE CAMPOS
KARINA ROSA BRAGANÇA
KAYALLA PONTES LINO

Trabalho desenvolvido a partir do tema “Navegar - Buscar uma educação sólida em uma sociedade líquida” a ser apresentado no congresso UNIVispire Brasil 2020.

Orientadora: Profª. Ms. Fabíula Ramalho

NITERÓI
2020

1. RESUMO

O presente trabalho foi desenvolvido tendo em vista a grande problemática da educação moderna, consistente na valorização excessiva do conhecimento para finalidade técnica, em detrimento da aquisição de valores para formação individual, associada à grave realidade da educação das crianças brasileiras em situação de vulnerabilidade, em especial, as do Projeto Jurujuba, que possuem nenhum ou pouquíssimo acesso à educação de qualidade.

Nesse sentido, e entendendo a importância dos clássicos para formação individual, que ultrapassa qualquer fim utilitarista, foi elaborado um estudo sobre o tema, para que fossem encontradas formas eficientes de introduzir a literatura na vida das crianças em questão, o que culminou na elaboração do plano de introdução dos clássicos da literatura para crianças de 07 a 14 anos, em situação de vulnerabilidade, especialmente voltado para as crianças contempladas pelo Projeto Jurujuba, mas que pode ser aplicado em qualquer outro contexto, para crianças nas mesmas condições, realizando-se as adaptações que forem necessárias.

Para realizar tal objetivo, foram estudadas as obras de Ana Maria Machado, escritora e professora brasileira, Northrop Frye, crítico literário canadense, e do especialista em educação e professor Rafael Falcón.

Palavras-chave: educação infantil, clássicos da literatura, ensino, formação literária.

ÍNDICE

  1. RESUMO
  2. INTRODUÇÃO
  3. OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS
  4. METODOLOGIA
  5. DESENVOLVIMENTO

CAPÍTULO 1 — POR QUE LER OS CLÁSSICOS UNIVERSAIS DESDE CEDO.
1.1. INSTRUMENTALIZAÇÃO DO ENSINO NO MUNDO PÓS-MODERNO.
1.2. OS CLÁSSICOS NA FORMAÇÃO INDIVIDUAL — UMA PERSPECTIVA DE ANA MARIA MACHADO.
1.3. CLÁSSICOS NA FORMAÇÃO INFANTIL.
CAPÍTULO 2 — O PROJETO JURUJUBA E AS DIFICULDADES ENCONTRADAS
CAPÍTULO 3 — AS DIFICULDADES DE APRENDIZADO E SUAS CAUSAS
3.1. OS GRAUS DO LETRAMENTO — UM ESTUDO DO PROF. RAFAEL FALCÓN
4. PROPOSTA DE AÇÃO: PLANO DE INTRODUÇÃO DOS CLÁSSICOS DA LITERATURA.
4.1. ORDEM E MÉTODO
4.2. FASE 01 — POESIA. ALUNAS DE 07 A 08 ANOS.
4.4. FASE 02 — PROSA. ALUNAS DE 09 A 12 ANOS
4.5. FASE 03 — PROSA AVANÇADA. ALUNAS DE 12 A 14 ANOS
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

2. INTRODUÇÃO

O mundo moderno, tomado pelo imediatismo e impulsionado pelo desenvolvimento acelerado da tecnologia, tem por consequência o fenômeno que o filósofo Zygmunt Bauman chama de “modernidade líquida”, que consiste na perda de valores, senso de responsabilidade e aquisição de uma visão utilitarista de mundo.

Nesse contexto, os meios educacionais são especialmente impactados, passando a ser um mero meio de aquisição de habilidades para o exercício profissional e deixando de lado a formação pessoal de valores e de caráter.

Somado a isto, tem-se ainda a triste realidade da educação brasileira, principalmente entre as crianças mais pobres, em que, segundos dados oficiais, o país ocupa os últimos lugares nos rankings mundiais de avaliação da educação.

Dessa maneira, pergunta-se como seria possível fornecer uma educação sólida para as crianças brasileiras quando muitas delas têm dificuldades de assimilação, ou sequer sabem ler, ou escrever. Seria possível, ao menos em pequena escala, estabelecer um método em que tais dificuldades fossem ultrapassadas para que pudessem ser ensinados valores humanos universais? Há um elemento que, condensando toda tradição humana acumulada ao longo dos séculos, seja capaz de interromper o processo de instrumentalização do ensino?

Após a leitura da obra de Ana Maria Machado, foi possível perceber que os clássicos têm um papel fundamental na formação do indivíduo, principalmente, se conhecidos desde a infância e, por isso, devem ser a peça principal no ensino infantil.

Assim sendo, o presente trabalho apresentará com detalhes os efeitos que o contato precoce com os clássicos, não necessariamente através da leitura, produzem no desenvolvimento das crianças, demonstrará o problema do analfabetismo e da dificuldade de aprendizado, apontando os meios mais eficazes de superá-los e, ao final, será apresentada uma proposta de plano de introdução dos clássicos, organizada por idade e segundo a capacidade cognitiva de cada criança, a fim de conferir melhor aproveitamento de cada obra.

3. OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS

Este trabalho tem como objetivo apresentar uma proposta de plano de introdução dos clássicos da literatura, organizada por idade e segundo a capacidade cognitiva de cada criança, com sugestões de leitura e método de apresentação de cada obra.

O interesse pela educação de crianças em situação de vulnerabilidade surgiu através do serviço voluntário exercido no Projeto Jurujuba, sediado em Niterói, no Rio de Janeiro, que atende meninas de 07 a 14 anos, oriundas de família de baixa renda e em situação de vulnerabilidade social.

Ao observar cada criança em particular, foi possível perceber que a maioria delas possuía um problema em comum: uma grande dificuldade de assimilação do que era ensinado, ou até mesmo dificuldade em realizar tarefas intelectuais básicas, como ler, escrever ou memorizar, o que demonstra a urgente necessidade de criação de um mecanismo que possa impulsionar seu processo de aprendizagem.

À vista disso, os clássicos da literatura são o instrumento perfeito para educação individual, pois são o depósito de toda a bagagem cultural acumulada ao longo dos séculos e são capazes de agregar valores a quem lê, sendo formadores de caráter fundamentais para qualquer pessoa, de qualquer idade, lugar ou classe social, mas, principalmente, na educação infantil, para a formação de futuros indivíduos pensantes e inteligentes.

Deste modo, o plano de introdução dos clássicos foi criado tendo por objetivo apresentar os clássicos para as alunas do projeto jurujuba, a fim de oportunizar o acesso ao conhecimento a essas crianças, transformando sua realidade e ampliando novos horizontes diante de suas condições sociais.

4. METODOLOGIA

A elaboração do presente trabalho foi inspirada no livro “Como E Por Que Ler Os Clássicos Universais Desde Cedo”, da Ana Maria Machado, que apresenta inúmeros argumentos em defesa da utilização dos clássicos na educação infantil e dá, também, sugestões de obras e meios de ensiná-las.

Entretanto, os mecanismos práticos sugeridos pela autora não são plenamente adequados à finalidade pretendida que é a formação de alunas com déficit de aprendizagem, como é o caso das crianças do Projeto, pois as sugestões dadas pela autora são voltadas para alunos que estariam suficientemente educados para sua idade.

Por este motivo, foram colhidos e reunidos relatos das voluntárias do projeto, por meio de entrevista, a fim de saber, com maior precisão, quais eram as dificuldades mais latentes das crianças e, em seguida, foi feita uma pesquisa acerca do tema educação infantil a fim de compreender melhor os problemas encontrados e para adequar a proposta da Ana Maria Machado à realidade das alunas em questão.

Dessa forma, foi estudada a obra do professor Rafael Falcón, que mostrou-se ideal para compreender a questão, uma vez que, ao explicar o processo de aprendizado, o educador estabelece uma divisão que ele chama de “graus de letramento”. Em cada “grau”, ele explica quais são suas características específicas e indica o que deve ser feito para que o aluno ascenda para o próximo nível.

Além disso, a análise de Falcón parte da compreensão e da assimilação que o indivíduo tem do discurso, o que ele chama de “relação passiva”, e não da sua capacidade ativa (escrita ou articulação oral), ou seja, seu estudo centra na capacidade absorver e entender. Sendo certo que não se pretende, com a aplicação do plano, a alfabetização das crianças (dada as limitações de tempo e recurso de que se dispõe), mas ensinar os valores e conhecimento de mundo contidos nos clássicos.

Foi usada também a obra do crítico literário Northrop Frye que em seu livro, “A Imaginação Educada”, apresenta um estudo sobre a evolução literária ocidental, chegando à conclusão de que o processo de produção literária segue a seguinte ordem: poesia, teatro e prosa e, por fim, romance. A partir disso, Frye sugere que o processo de letramento deve acontecer na mesma sequência: poesia seguida da prosa e de textos complexos.

Desta maneira, o plano foi elaborado a partir da união das ideias desses dois autores, sendo a estrutura — ordem e procedimento de aplicação — será apoiada pela proposta de Frye, enquanto que a metodologia (forma de execução e prática), na de Falcón.

5. DESENVOLVIMENTO

CAPÍTULO 1 — POR QUE LER OS CLÁSSICOS UNIVERSAIS DESDE CEDO.

1.1. INSTRUMENTALIZAÇÃO DO ENSINO NO MUNDO PÓS-MODERNO.

O acelerado avanço tecnológico, característico do mundo moderno, tem produzido impactos significativos na educação. Bastam alguns cliques e qualquer informação pode ser acessada através das telas dos smartphones ou notebooks. Contudo, tamanha facilidade traz consigo um malefício em especial: na mesma velocidade com que a informação chega, ela se perde, sem ser devidamente assimilada pelo receptor.

A este processo de “aprendizagem e esquecimento” o filósofo polonês Zygmunt Bauman chama de educação “líquida”, o termo “líquido” é usado por ele para descrever o mundo pós-moderno. Bauman explica a expressão da seguinte forma:

A modernidade “sólida” era verdadeiramente a era dos princípios duradouros e concernia, sobretudo, aos princípios duráveis que eram conduzidos e vigiados com grande atenção. No mundo líquido moderno, a solidez das coisas vem sendo interpretada como uma ameaça: qualquer juramento de fidelidade, compromissos a longo prazo, prenunciam um futuro sobrecarregado de vínculos que limitam a liberdade de movimento e reduzem a capacidade de agarrar no vôo as novas e ainda desconhecidas oportunidades. (Porcheddu, 2019. pp 661–684)

Assim, na visão de Bauman, a pós-modernidade é avessa a tudo o que é durável e não oferece recompensas imediatas. Quando esse problema atinge a cultura e os sistemas pedagógicos, o resultado é uma política de ensino utilitarista, em que a relação entre professores e alunos é mercadológica, e a escola passa a ser um simples meio de aquisição de conhecimentos para o exercício profissional. Contudo, como na “modernidade líquida” nada é durável, o conhecimento profissional também está em constante renovação para se adaptar às últimas necessidades dos consumidores. Assim, o aluno terá que reiniciar o processo de aprendizagem à custa do descarte do que foi anteriormente aprendido e que, agora, está obsoleto.

A este sistema de ensino Bauman chama de aprendizagem terciária. Em suas palavras:

. . . a aprendizagem terciária, que promove a formação de competências de modo a desmantelar os esquemas cognitivos aprendidos antes, não deixa um sedimento duradouro, uma base sólida sobre a qual se pode construir, tampouco conhecimentos que podem sedimentar-se e crescer durante o curso dos estudos. . . . É uma sucessão infinita de novos inícios, devida antes de tudo ao rápido cancelamento dos conhecimentos pregressos, mais que à aquisição de novos conhecimentos; . . . A aprendizagem terciária poderia, assim, ser definida como um dispositivo anti-memória. (Porcheddu, 2019. pp 661–684)

Em contrapartida, a literatura clássica é o completo oposto desses sistema, pois possui todas as características que a pós-modernidade despreza: conserva o saber adquirido com o passar dos séculos e não possui utilidade imediata, quer sejam vantagens econômicas ou sociais, e, justamente por isso, ela é o meio ideal para superar a superficialidade de valores que predomina no mundo atual.

1.2. OS CLÁSSICOS NA FORMAÇÃO INDIVIDUAL — UMA PERSPECTIVA DE ANA MARIA MACHADO.

Uma das possíveis raízes etimológicas da palavra clássico é classe, significando sala de aula, mas também pode ser classos, embarcação para longos trajetos, dando a ideia de viagem. Com essas duas prováveis origens, Ana Maria Machado em “Como e Por Que Ler os Clássicos Universais desde cedo” pontua dois grandes aspectos dos clássicos: por um lado, são livros que ensinam por si só, agregando valores que vão muito além dos interesses imediatos e, por outro, têm o poder de carregar o leitor para outros mundos, realidades, questionamentos, modos de pensar, como uma verdadeira expedição, levando-nos a lugares nunca antes explorados.

A Literatura Clássica é um dos bens mais preciosos que a humanidade possui. “Temos de herança o imenso patrimônio da leitura de obras valiosíssimas que vêm se acumulando pelos séculos afora”, afirma Machado (2002, p. 18). Em contraste com muito do que vemos atualmente — informação volátil, aversão ao duradouro, coisas que vêm e passam de forma cada vez mais rápida — os livros considerados clássicos são aqueles que permanecem por gerações, reunindo e conservando o conhecimento adquirido ao longo do tempo. Entretanto nunca ficam velhos, são eternos e sempre têm algo novo a ensinar: “não têm prazo de validade nem perdem a garantia” (Machado, 2002, p. 22).

Da mesma maneira, Ítalo Calvino explica que:

Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes)” (Calvino, 2007, p. 11)

Por serem tal riqueza, são livros que geram grande aprendizado. Machado é precisa ao dizer que “é bom ler os clássicos porque eles ampliam nossa vida” (Machado, 2002, p 22), citando Harold Bloom, crítico literário americano. Bons livros de literatura exercitam a formação do imaginário, levando o leitor a viajar, viver experiências totalmente diferentes das suas, abrindo janelas dentro de si para olhar para fora e enxergar milhares de outras realidades, desde situações totalmente peculiares e extremas até simples vidas cotidianas que podem ser completamente distintas, apesar de ordinárias.

Em contrapartida, o leitor também encontra diversas situações em que se identifica com o personagem, com algum ambiente em que está inserido ou com a realidade apresentada:

Lendo uma história, de repente descobrimos nela umas pessoas que, de alguma forma, são tão idênticas a nós mesmos, que nos parecem uma espécie de espelho. Como estão, porém, em outro contexto e são fictícias, nos permitem um certo distanciamento e acabam nos ajudando a entender melhor o sentido de nossas próprias experiências. (Machado, 2002, p 20)

A leitura do clássico acaba por ser, dessa forma, benéfica em ambos os sentidos, já que das duas formas o leitor é convidado a sair da sua “zona de conforto” para conhecer um universo de possibilidades que talvez nunca pudesse observar se permanecesse onde estava. Tudo isso amplia a percepção de mundo, ensina a se colocar no lugar de outra pessoa, a compreender outras formas de pensar, ajudando o leitor a formar opiniões e a usar a lógica de diversas maneiras, tanto para encontrar soluções quanto para formular ideias geniais. Estimula a curiosidade, a criatividade e o desejo de aprender. Machado ainda acrescenta, ao referenciar Ítalo Calvino, que “um bom livro acende em quem o lê um permanente desejo de seguir sempre adiante, em busca da construção do sentido, vivido ao final como um grande momento de gozo e distensão” (Machado, 2002, p. 21), reafirmando o prazer que esses livros trazem que vai muito além do simples ato de ler.

Os livros clássicos também têm uma característica muito particular e significativa: cada releitura é uma redescoberta. Calvino fala sobre o fato de que o contato com os clássicos é sempre uma nova experiência, não importando quantas vezes se lê o mesmo livro: “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”(Calvino, 2007, p. 11). Em uma perfeita analogia com o mar, Machado diz posteriormente:

Parece-me que o mar é uma excelente metáfora para a literatura, para os prazeres e desafios que ela nos traz, sua imensidão, sua variedade, sua profundidade, sua beleza sempre nova e mutante, sua capacidade de nos alimentar de forma quase infinita. Mar e histórias sempre estiveram associados na mente humana. (Machado, 2002, p. 83)

Desse modo, compreendemos a profunda importância de se conhecer a Literatura Clássica não somente pela leitura em si, mas por toda a bagagem cultural que traz e por todos os valores que agrega a quem a lê, sendo formadora de caráter fundamentais para qualquer pessoa, de qualquer idade, lugar ou classe social. “. . . é um legado riquíssimo, . . . um tesouro inestimável que nós herdamos e ao qual temos direito”. (Machado, 2002, p. 18)

1.3. CLÁSSICOS NA FORMAÇÃO INFANTIL.

Dada a importância da Literatura Clássica na formação humana, não menor importância terá na educação infantil. Sendo imprescindível para a formação pessoal, uni-la ao desenvolvimento infantil é ainda mais proveitoso para a formação de futuros indivíduos pensantes e inteligentes. Machado diz que não há razão para não ler os clássicos desde cedo:

Em suma, são livros que conseguem ser eternos e sempre novos. Mas que, ao serem lidos no começo da vida, são fruídos de uma maneira muito especial, porque “a juventude comunica ao ato de ler, como a qualquer outra experiência, um sabor e uma importância particulares”. (Machado, 2002, p. 24)

As crianças têm um poder de imaginação imensurável e estimular este poder é essencial para que cresçam saudáveis, tão importante quanto exercícios físicos, boa alimentação e educação. Crianças que têm a oportunidade de exercitar a imaginação, a criatividade e o pensamento crítico desde cedo se tornam pessoas muito mais inteligentes, adaptáveis e criativas. Portanto, a leitura dos clássicos é um grande aliado da educação infantil em muitos aspectos, dois dos quais são nossos focos e razão de escolhermos essas obras.

O primeiro é a própria formação de caráter, como mencionado antes, mas em escala muito maior, devido à grande capacidade de aprendizagem e a imaginação que as crianças têm e, no caso dos adolescentes, alia-se o fato de estarem em transição, em momento de absorver o máximo de informação, começando a tomar responsabilidades, como tomadas de decisão e escolhas individuais. A segunda é justamente o prazer e diversão que trazem. Ao ler histórias de diversas épocas e costumes, aventuras das mais variadas criaturas, monstros e heróis, o livro torna-se um brinquedo muito querido. Umberto Eco afirma:

. . . qualquer passeio pelos mundos ficcionais tem a mesma função de um brinquedo infantil. As crianças brincam com boneca, cavalinho de madeira ou pipa a fim de se familiarizar com as leis físicas do universo e com os atos que realizarão um dia. Da mesma forma, ler ficção significa jogar um jogo através do qual damos sentido à infinidade de coisas que aconteceram, estão acontecendo ou vão acontecer no mundo real. Ao lermos uma narrativa, fugimos da ansiedade que nos assalta quando tentamos dizer algo de verdadeiro a respeito do mundo. (Umberto Eco, 1994, p. 93)

Além disso, formam-se crianças sensatas e cientes, mesmo com toda a diversão, crianças que se preocupam não somente consigo, mas com todos à sua volta. Se tornam mais capazes de resolver problemas e enfrentar obstáculos, se relacionam melhor e aprendem rápido. As histórias as ajudam a superar medos, a entender que tudo ficará bem no final mesmo se as coisas não acontecerem da maneira que desejam. Aprendem a se expressar melhor, a nomear suas emoções e a se comunicarem sem muita dificuldade.

Para a introdução desses livros na educação infantil, Machado ensina que não necessariamente devem ser entregues em seu formato original. Antigamente, era costume que as crianças lessem livros enormes desde cedo. Mas o sistema de ensino mudou muito, desde então, e hoje esta é uma realidade distante. Por esse motivo, para um primeiro contato, podemos utilizar versões mais curtas, desde que sejam boas adaptações, além de recursos artísticos como música e teatro, e recursos de mídia, como imagens e vídeos. Esse primeiro contato, se bem aproveitado, pode levar o pequeno leitor mais tarde a procurar a obra completa.

. . . creio que o que se deve procurar propiciar é a oportunidade de um primeiro encontro. Na esperança de que possa ser sedutor, atraente, tentador. E que possa redundar na construção de uma lembrança (mesmo vaga) que fique por toda a vida. . . . na torcida para que, dessa forma, possa equivaler a um convite para a posterior exploração de um território muito rico, já então na fase das leituras por conta própria. (Machado, 2002, pp. 12–13)

Assim, ainda que o encontro posterior da criança com a obra original possa não ocorrer, os valores, o enriquecimento intelectual e o conhecimento de mundo permanecerão enraizados nela. “Navegar pelos clássicos não significa apenas leitura de livros.” (Machado, 2002, p. 65), pois dessa forma o efeito será o contrário do esperado: “só serve para vacinar o sujeito para sempre contra a leitura” (Machado, 2002, p. 14). Deve-se, na verdade, estimular para que o interesse surja na própria criança e ela mesma tenha autonomia para explorar este vasto universo.

Entender contextos e alusões que surgiram com os clássicos, adquirir a habilidade de ler criticamente, inspirar-se pelos valores e aprender com erros dos personagens, conhecer dialetos provenientes de obras antigas que se estabeleceram em nosso vocabulário e até simplesmente compreender pequenas referências que tornam uma conversa muito mais divertida, entre tantos outros benefícios que podemos apresentar às crianças e adolescentes, mesmo que por outros meios.

Contudo, há inúmeros desafios que atrapalham a execução desta tarefa, principalmente se as crianças cujas obras serão apresentadas possuem graves dificuldades de aprendizado, como é o caso das alunas no Projeto Jurujuba, onde a proposta será aplicada. Isto posto, será exposto, a seguir, um panorama de projeto, bem como dos principais problemas educacionais sofridos pelas alunas.

CAPÍTULO 2 — O PROJETO JURUJUBA E AS DIFICULDADES ENCONTRADAS

O Projeto Jurujuba foi fundado em 1998, na comunidade de Jurujuba, Niterói, como um dos projetos sociais da ADEC — Associação de Desenvolvimento Educativo Cultural — e tem por objetivo oferecer atividades educativas, complementando o ensino da escola regular, especificamente, voltadas para meninas de 7 a 14 anos.

O Projeto atende por volta de 40 alunas, distribuídas em 4 turmas por critério de idade, que são orientadas por 4 voluntárias cada, sem contar as que auxiliam fora da sala de aula, na preparação dos lanches, inspeção dos alunos e organização administrativa.

As atividades são realizadas em dois turnos, de cerca de 60 minutos cada, sendo o primeiro ocupado pelas aulas de ballet e o segundo por aulas de contação de história (literatura), em que será aplicado o plano de introdução dos clássicos. Atualmente, as aulas de contação de história consistem na apresentação de contos variados que são escolhidos pelas voluntárias responsáveis pela turma.

A partir dessa sistemática de ensino e do contato próximo com as crianças, foi possível identificar alguns problemas como a dificuldade extrema para ler, para escrever, para memorizar e para concentrar-se no que é ensinado.

Com efeito, as voluntárias, que concordaram em apresentar seus relatos a respeito das turmas, ressaltaram que quase todas as alunas possuem grande dificuldade de assimilação, que aponta ser provocada pela excessiva exposição à tecnologia (celular e tablets) o que acaba por provocar aversão às aulas de literatura.

Viviane, voluntária da oficina de literatura, cita que a exposição aos meios de informação gera certa preguiça para realização de atividades que exijam um pouco mais de esforço mental. Muitas delas, inclusive, têm dificuldade na leitura de palavras simples, apesar de serem bastantes perspicazes na utilização dos aparelhos eletrônicos. Contudo, em depoimento, ela não descarta a possibilidade de aprendizado, mas menciona a necessidade de reformulação do sistema. Ela diz o seguinte:

Apesar disso, não noto desinteresse no aprendizado, é preciso saber conquistá-las para podermos explicar a maneira correta. Por sermos uma turma pequena é mais fácil fazer isso e poder entrar um pouco na história de cada uma para saber seus interesses e qual a melhor forma de explicação que cada menina vai entender e aceitar. (Viviane, comunicação pessoal, julho de 2020)

Outro ponto muito ressaltado foi a dispersão. A voluntária Laís, responsável pelas aulas da oficina de ballet, destaca a necessidade de ter firmeza na ministração das aulas, pois, muitas vezes, as alunas interrompem as aulas com comentários inconvenientes ou, então, com pedidos frequentes para ir ao banheiro e beber água:

Isso demanda uma especial paciência e capacidade de raciocínio rápido por parte do educador, para auxiliar a tomada de boas decisões e a manter o caráter pedagógico da aula, mantendo todas as atividades no planejamento previamente feito apesar das intercorrências. (Laís, comunicação pessoal, julho de 2020)

Dessa forma, tendo em vista as dificuldades de aprendizado destacadas pelas voluntárias necessário se faz abordar com mais profundidade o tema a fim de demonstrar no que, de fato, ele consiste, bem como apresentar suas razões.

CAPÍTULO 3 — AS DIFICULDADES DE APRENDIZADO E SUAS CAUSAS

Para compreensão do problema do analfabetismo, foi utilizada a pesquisa do professor Rafael Falcón disponível por meio do curso online intitulado “anafabetismo funcional e os graus do letramento”.

O curso do prof. Falcón aborda a questão do analfabetismo, dando destaque principal aos problemas cognitivos que impedem a compreensão eficaz do idioma, do que ao ensino da leitura e da escrita propriamente ditos. O professor ressalta que dificuldades cognitivas e incapacidade de ler e escrever são coisas distintas. O analfabetismo consiste na incapacidade de identificar o idioma na forma de símbolos enquanto que a dificuldade cognitiva é um problema de interpretação e compreensão.

Para ilustrar a afirmação anterior, o autor dá como exemplo a civilização da Grécia antiga: a tradição literária era transmitida de forma oral entre pessoas analfabetas, mas todas eram letradas, pois compreendiam todo sentido, figurado e literal, das obras.

Isto posto, ressalta-se mais uma vez que o objetivo do presente trabalho não é alfabetizar as crianças, mas dar-lhes formação literária, o que fará com que, no futuro, elas estejam mais predispostas a aprender a ler e a escrever de fato.

Dito isto, passemos a exposição das ideias do referido autor.

3.1. OS GRAUS DO LETRAMENTO — UM ESTUDO DO PROF. RAFAEL FALCÓN

Segundo o prof. Rafael Falcón, existe cinco graus de letramento, sendo eles, começando pelos superiores, o passivo-culto, o passivo-refinado, o passivo-incipiente, passivo-bruto completo e, por fim, o passivo-bruto incompleto.

Os níveis passivo-bruto completo e incompleto diferenciam-se em um único aspecto enquanto, no primeiro, o vocabulário é limitado, o segundo já possui um domínio de palavras mais rebuscadas. Porém, em ambos existe o mesmo problema essencial: incapacidade de memorização. Daí derivam outros problemas, como uso de palavras ou expressões genéricas ou fora de seu significado correto. Da mesmo forma, a falta de concentração se deriva do problema da memória (não o oposto como se costuma pensar), pois como há dificuldade em gravar o que é aprendido, mesmo que o passivo-bruto tente prestar a atenção, nada será retido.

Para Falcón, como o passivo-bruto não memoriza, ele possui apenas um domínio sensorial da linguagem. Sabe repetir frases, mas não entende o princípio linguístico por detrás, ou seja, não consegue interpretar. Pode, às vezes, entender o significado das palavras, mas não consegue distingui-las em outro campo semântico.

O segundo estágio é o passivo-incipiente. Ele está acima do passivo-bruto, pois já é capaz de perceber a estrutura da linguagem. Para Falcón essa diferença consiste, sobretudo, numa capacidade de memorização que o permite entender a estrutura de uma frase e compará-la com outras em um contexto diferente.

O seguinte exemplo, dado pelo prof. Falcón, poderá ajudar o leitor a entender melhor as diferenças entre as classificações anteriormente citadas: um professor lê um texto em uma sala de aula onde há um passivo-bruto e um passivo-incipiente. O texto em questão possui diversos verbos no pretérito imperfeito do subjuntivo, dando ênfase a este tempo verbal. O aluno passivo-incipiente será capaz de perceber que aqueles verbos, escritos daquele modo, seguem um determinado padrão. Ainda que lhe seja apresentado um verbo que não foi lido no texto, ele será capaz de conjugá-lo antes que o professor lhe explique as regras gramaticais. O passivo-bruto, por sua vez, deixará passar despercebido.

Falcón destaca que, em hipóteses ideais, uma criança de 10 anos já pode ser passivo-incipiente, contudo, não é impossível que se chegue até a velhice estagnado no passivo-bruto.

O nível seguinte é o passivo-refinado. Aqui, o aluno já consegue articular as estruturas da linguagem, o que Falcón chama de percepção sintagmática. Assim, caso houvesse, no exemplo anterior, um terceiro aluno passivo-refinado, ele seria capaz de explicar que os verbos do texto se referem a um fato ocorrido no passado, mas que não foi completamente terminado, ainda que não saiba dizer em qual tempo verbal estão. Já o passivo-incipiente não será capaz de explicar esse sentido.

O último nível é o passivo-culto. Nesse estágio, a compreensão da linguagem é plena. Por certo, nenhuma criança contemplada pelo projeto jurujuba está neste nível ou mesmo seria possível fazê-las chegar nele ele, pois, segundo Falcón, tornar-se um passivo-culto exige um esforço elevadíssimo, sendo impossível ser alcançado antes da idade adulta. Todavia, espera-se com criação do plano de introdução dos clássicos é abrir a possibilidade para que essas crianças venham a se interessar pela leitura e, posteriormente, aprofundem o seu conhecimento, tornando-se, de fato, eruditas.

Com efeito, após compreender o tema do analfabetismo foi possível criar estratégias mais eficazes que atuassem diretamente nas causas do problema. Assim, no próximo capítulo será exposta a proposta de ação, que consiste no plano introdução dos clássicos da literatura.

4. PROPOSTA DE AÇÃO: PLANO DE INTRODUÇÃO DOS CLÁSSICOS DA LITERATURA.

4.1. ORDEM E MÉTODO

Para elaboração do plano, foi realizada uma pesquisa no campo da crítica literária, a fim de se estabelecer uma ordem/estrutura eficiente para apresentação dos clássicos. Nesse sentido, foi utilizada a obra de Northrop Frye intitulada “A Imaginação Educada”. Em seu entendimento, a ordem de aprendizado dos clássicos deve seguir a mesma ordem do amadurecimento intelectual, o que se encaixa perfeitamente no objetivo do presente trabalho, visto que tem-se por objetivo superar, de forma gradativa, as dificuldades intelectuais das crianças.

O livro em questão consiste na transcrição de uma série de seis palestras de meia hora cada, em que o autor apresenta seu estudo acerca da produção literária ocidental. O crítico afirma que o processo de formação literária começa oralmente pela poesia, passando, em seguida, para produções com ordem temporal (teatro), até a difusão da escrita, surgindo, assim, os textos em prosa. Nas sociedades mais avançadas, por sua vez, a literatura passa a se compor de textos cuja linguagem usada é mais densa, condensando uma carga cultural adquirida ao longo dos séculos de desenvolvimento civilizacional, dando origem, então, aos textos científicos ou acadêmicos.

A partir disso, Frye sugere que o processo de letramento deve ser baseado nesta mesma sequência. O primeiro contato com a literatura, portanto, deve acontecer oralmente na primeira infância, através da poesia. para, em seguida, serem introduzidos os textos em prosa. Somente ao final, após a aquisição de um grau de erudição suficiente, será apresentada a literatura mais complexa (textos técnicos).

Associando essa ideia à tese de Falcón, o resultado será que a aplicação de cada gênero literário irá acompanhar duas variáveis: a idade da criança e o nível de letramento. Assim, as crianças mais novas (passivo-bruto) aprenderão a poesia e as intermediárias e as mais velhas (passivo-incipiente e passivo-refinado) a prosa.

Contudo, caso o plano seja aplicado pela primeira vez em classes cujas alunas possuem grande déficit educacional, como é o caso, a ordem de idade deverá ser preterida em favor da capacidade intelectual. Assim, ainda que a aluna esteja na faixa de idade para introdução dos romances, caso ela não tenha tido nenhum contato anterior com a literatura deverá ser introduzida, primeiramente, a poesia.

Dito isto, passemos à explicação da primeira fase, a poesia.

4.2. FASE 01 — POESIA. ALUNAS DE 07 A 08 ANOS.

No primeiro estágio do letramento (passivo-bruto) é importante que a memória da criança seja estimulada. Conforme aponta Falcón, a melhor forma de treinar a memória é por meio da repetição exaustiva. Assim, ao ser posta em prática a primeira fase do plano de introdução, não é necessário que a aluna compreenda integralmente o que foi lido. O que deve ser buscado, na verdade, é a memorização de cada verso por meio da repetição. É importante, também, que seja enfatizada a entonação e a clareza da dicção, no momento da recitação, para estimular a percepção fonética do aluno.

Desse modo, serão apresentadas, a seguir, algumas sugestões de poesia. Destaca-se que a lista abaixo não precisa ser estritamente seguida, podendo ser incluídas outras obras, com maior ou menor grau de dificuldade, na medida da capacidade de cada turma.

Passivo-bruto — 7 a 8 anos:

· A cesta da Dona Maricota, de Tatiana Belinky
· A grande aventura de Maria Fumaça, de Ana Maria Machado
. O Menino Azul, de Cecília Meireles
. Pontinho de Vista, de Pedro Bandeira
. A porta, de Vinicius de Moraes
. A Lua foi ao Cinema, de Paulo Leminski
. Guarda-chuvas, de Rosana Rios

4.4. FASE 02 — PROSA. ALUNAS DE 09 A 12 ANOS

Nesta fase, o educador poderá avançar para o segundo gênero, a prosa, pois estará lidando com crianças que já possuem uma certa familiaridade com a literatura e, pelo mesmo motivo, poderá exigir delas um esforço maior do que a simples memorização, como na fase anterior. Desse modo, Falcón destaca que para sair do nível passivo-bruto e ingressar no passivo-incipiente, após o treino da memória, é preciso exercitar a percepção da linguagem e isso só irá ocorrer caso seja estimulada a capacidade interpretativa e comparativa.

Sendo assim, o educador deve apresentar, em sequência, histórias que possuam a mesma espécie narrativa (por exemplo, crônicas ou contos de fadas) e pedir que, ao final de cada uma delas, o aluno explique, com a maior quantidade de detalhes possíveis, a história como um todo e o sentido de cada frase.

É importante que sejam dadas, em sequência, histórias que possuam o mesmo estilo, para que o aluno possa compará-las e, assim, exercitar a percepção da linguagem, entendendo que cada tipo de história será contada de uma forma e que cada uma dessas formas utilizam as palavras de uma forma diferente.

Assim, podem ser apresentadas entre 3 ou 5 histórias, uma em cada aula, e, em seguida, pedir que as os alunos expliquem as semelhanças e as diferenças entre elas, com enfoque nas nuances do estilo da escrita e da narrativa, e, depois, mudar o tipo textual e repetir o mesmo processo. A intenção é fazer com que o aluno perceba e entenda que as regras gramaticais, bem como as narrativas de cada gênero textual seguem um determinado padrão.

Abaixo serão apresentadas a seguir algumas sugestões de obras literárias. Ressalta-se que os materiais a serem apresentados não precisam, necessariamente, ser de tipo escrito. É plenamente possível fazer uso de vídeos ou canções desde que sejam clássicos da literatura ou, então, uma adaptação.

Passivo incipiente — 9 a 12 anos

1º bloco:

Instruções: Por serem livros de mais de 100 páginas, o professor pode compactar a história, para que seja apresentada em uma única aula ou pode fragmentá-las para apresentar em aulas seguidas.

. Pé de Milão, de Mário Quintana
. A terra dos Meninos Pelados, de Graciliano Ramos
. O menino no espelho, de Fernando Sabino

2º Bloco:

Instruções: O professor deve escolher um dos contos presente nos livros

. As Aventuras de Sherlock Holmes, de Arthur Conan Doyle
. A Inocência do Padre Brown e A Sabedoria do Padre Brown, de Chesterton
. Eu, Robô, de Isaac Asimov (apesar de ser ficção científica, parecendo destoar da temática dos livros anteriores, é importante lembrar que, nesse estágio, o enfoque deve ser dado a narrativa, não ao enredo em si. Nesse sentido, as obras acima citadas possuem a mesma característica: suspense, com revelação do mistério ao final. Portanto, é plenamente possível serem aplicadas em sequência para o fim pretendido).

3º Bloco:

. A Noviça Rebelde, de Charles Möeller & Claudio Botelho (Versão Teatro Casa Grande, 2008)
. Os Miseráveis, de Tom Hooper. (adaptado para cinema)
. O Mágico de Oz, de Victor Fleming.
. Mary Poppins, de Robert Stevenson.

4.5. FASE 03 — PROSA AVANÇADA. ALUNAS DE 12 A 14 ANOS

Esta é a última fase. Aqui, o professor deverá levar o aluno ao estágio passivo-refinado, fazendo com que ele desenvolva percepção sintagmática, ou seja, perceber as unidades sintáticas que formam as orações. Nesse sentido, o professor deverá, juntamente com a leitura do livro, dissecar o texto com o aluno, utilizando as frases do, ou as transcrições das obras audiovisuais, como objeto de análise. Veja que abordagem feita nesta fase será diferente das anteriores. A aula diminuirá o enfoque da história para o texto em si.

Para tal, é preferível que o professor utilize os textos já trabalhados anteriormente. Isso irá ajudar o aluno a absorver melhor a obra, adquirindo uma visão ampla, em diferentes perspectivas, e também a compreender o estilo de escrita de cada autor.

Abaixo serão apresentadas algumas sugestões de leitura complementar, lembrando que será mais frutuoso se só forem aplicadas caso o professor já tenha utilizado todas ou a maioria das obras já trabalhadas.

Passivo-refinado:

11 a 12 anos

. 20 mil léguas submarinas, de Jules Verne (versão adaptada)
. Um caldeirão de poemas, de Tatiana Belinky

13 a 14 anos

. A rainha Margot, de Alexandre Duma (versão adaptada)
. O segredo, de Lygia Fagundes Telles
. A lua no cinema e outros poemas, de vários autores brasileiros e portugueses

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O plano de introdução dos clássicos da literatura, como proposta de ação para combater o grave problema da educação moderna e do déficit educacional de crianças em situação de vulnerabilidade social, pode parecer uma ideia muito pretensiosa diante de um problema com raízes tão complexas. Deveras, se forem levadas em conta as estatística acerca do analfabetismo funcional em crianças no Brasil, a reação imediata talvez tenda para a criação de um plano de intervenção global, portanto, amplo.

Contudo, como sabiamente salienta o filósofo brasileiro Olavo de Carvalho:

Ampliar a escala de um problema jamais pode ser um bom meio de enfrentá-lo. Em vez de ampliar, é preciso diminuir a escala, subdividir o poder, e enfrentar os males na dimensão do contato direto e local em vez de deixar-se embriagar pela grandeza das ambições globais. (Carvalho, 2009)

O plano de introdução dos clássicos será, portanto, o enfrentamento local do problema generalizado da falta de acesso à educação de qualidade e, na medida de sua proporção, permitir que crianças sem perspectivas de crescimento intelectual possam, enfim, receber uma educação sólida.

NOTAS:

[1] Pisa: Brasil fica entre piores, mas à frente da Argentina; veja ranking. (03 de dezembro de 2019). Recuperado em 28 agosto, 2020, de UOL : https://educacao.uol.com.br/noticias/2019/12/03/pisa-brasil-fica-entre-piores-mas-a-frente-da-argentina-veja-ranking.htm?cmpid=copiaecola.

[2] Não será utilizada a última fase da literatura, segundo Frye (textos técnicos), porque está relacionada com a última fase do processo de alfabetização (passivo-culto), sendo extremamente avançado para crianças.

[3] O referido trecho foi extraído do artigo “A revolução globalista”, publicado no site olavodecarvalho.org, sem numeração de páginas.

6. BIBLIOGRAFIA

Bauman, Zygmunt. (2001). Modernidade Líquida (1a Ed.). Rio de Janeiro: Zahar.

Calvino, Italo. (2007). Por que ler os clássicos (1a Ed.). Rio de Janeiro: Companhia de Bolso.

Carvalho, Olavo. (2009). A revolução globalista. Recuperado em 03 outubro, 2020, de https://olavodecarvalho.org/a-revolucao-globalista/

Eco, Umberto (1994). Seis passeios pelos bosques da ficção (9a Ed.) São Paulo: Companhia das Letras.

Falcón, Rafael. (2020). Analfabetismo funcional e os graus de letramento. Curso ministrado online, disponível em: https://rafaelfalcon.com.br/analfabetismo/.

Frye, Northrop. (2017). A Imaginação Educada (1a Ed.). São Paulo: Vide Editorial.

Machado, Ana Maria. (2002). Como e por que ler os clássicos universais desde cedo (1a. Ed.). Rio de Janeiro: Objetiva.

Porcheddu, Alba. (2009). Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. pedagógicos e modernidade líquida. Cadernos de Pesquisa. vol.39, n.137, pp. 661–684. 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/v39n137/v39n137a16.pdf. Acesso em 30 de março de 2019.

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