Noite de gala no futebol potiguar

América, ABC, sete gols e uma ode ao futebol na Arena das Dunas

Pedro Henrique Brandão
Universidade do Esporte
5 min readJan 24, 2020

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(Foto: Marcus Arboés / Universidade do Esporte)

Com meia hora de futebol na mais alta intensidade, quatro gols em apenas 20 minutos, sete tentos durante os 90 minutos, toda a insanidade possível de duas viradas, além de uma belíssima festa das torcidas de América e ABC, o primeiro Clássico Rei de 2020 foi decidido somente aos 44 minutos do segundo tempo e terminou com vitória do Alvinegro

Mesmo com a ininteligível data escolhida pela Federação Norte-riograndense de Futebol para o clássico — na sexta rodada e com tudo praticamente resolvido no primeiro turno como era de esperar à essa altura do campeonato— o clima de clássico tomou conta dos torcedores natalenses desde o fim de semana ao término da quinta rodada.

Esse clima resgata, temporada após temporada, o futebol potiguar. Com todo o respeito que merecem as equipes do interior, mas que bom seria se o Campeonato Potiguar inteiro fosse de jogos entre América e ABC.

Numa noite de quarta-feira, mais de 15 mil pessoas estiveram presentes na Arena das Dunas, para assistir à partida que colocou frente a frente o time com melhor campanha, melhor ataque e defesa e o time que, apesar de invicto, estava em dívida com as expectativas de seus torcedores.

Nos treinamentos que encerram as preparações de ABC e América para o clássico, Waguinho Dias e Francisco Diá adotaram tons diferentes.

O treinador americano mostrou confiança e usou uma adaptação de uma velha máxima do futebol para exaltar a boa fase e ânimo de seu time e cravou “clássico não se joga, clássico se ganha”.

Enquanto isso, o comandante alvinegro preferiu fechar seu treino e ao final jogou no ar a dúvida com a frase “o ABC vai apresentar surpresas!”.

As duas frases entraram no gramado da Arena das Dunas, pontualmente às 20 horas do dia 22 de janeiro de 2020.

Logo na escalação inicial, lá estava a surpresa de Diá: Cedric improvisado no meio-campo como homem de criação e uma linha com quatro meias atrás de Wallyson e a frente do volante Felipe Manoel.

Com essa modificação, dois efeitos imediatos foram sentidos no time abecedista. Primeiro a entrada de Pedro Costa, na lateral-direita, e, com a falta de ritmo do jogador, a extrema deficiência do elenco alvinegro que carece de peças.

Em segundo lugar, Diá conseguiu o que não havia conseguido em 5 rodadas, a superioridade numérica no meio e o consequente domínio das ações do jogo. Ponto positivo para o treinador que foi além do normal, encontrou uma forma nova para seu time jogar, aproveitou o valor técnico de Cedric e ainda pressionou a diretoria ao demonstrar que precisa de material humano para trabalhar.

A corajosa e necessária aposta de Diá, possibilitou a Berguinho, uma nova área para atuar e a João Paulo, um espaço para brilhar como o melhor do ABC em campo. Durante o primeiro tempo, o time alvinegro foi muito superior e poderia ter vencido com um placar elástico.

Não que a primeira meia hora de jogo tenha deixado algo a desejar. Pelo contrário, foi uma loucura quando Wallyson abriu o placar aos 4 minutos, Thiago Orobó empatou aos 12 e Daniel Costa virou aos 18 minutos.

Quando alguém imaginou que o jogo daria uma esfriada com a virada do América, o ABC correu atrás do prejuízo e empatou com Marlon, aos 21 minutos. Quatro gols com direito a virada em apenas 21 minutos de bola rolando.

Com o empate, o natural era que os dois times tirassem o pé por medo de entregar o resultado. Qual nada! O gol continuou sendo prioridade para alvinegros e alvirrubros e João Paulo escapou livre, driblou o goleiro Ewerton e balançou as redes do América numa incrível revirada aos 33 minutos de jogo.

Ainda houve emoção no primeiro tempo, os times poderiam ter marcado mais gols e o ABC poderia ter ampliado sua vantagem, mas os primeiros 45 minutos terminaram com a vitória parcial do Alvinegro e o segundo tempo reservou outras reviravoltas.

Na volta a campo para a etapa complementar, os dois treinadores mantiveram os times que fizeram o eletrizante primeiro tempo. Sem mudanças a expectativa era que muito mais arritmia seria proporcionada aos torcedores.

Porém, Francisco Diá, para o bem e para mal, alterou o ritmo da partida. Com apenas 7 minutos jogados na etapa final, o comandante alvinegro tirou Berguinho para colocar Igor Goularte. Se mantivesse a formação perderia em técnica com a saída de Berguinho, mas a entrada de Goularte foi a preparação do terreno para voltar Cedric para a lateral.

O meio-campo improdutivo do ABC estava de volta e, com a ida de Igor Goularte para a linha ofensiva, o time alvinegro passou a ter menos homens nesse setor do que o América.

Condição perfeita para a equipe de Waguinho Dias colocar a bola no chão e praticar seu jogo de troca de passes. O domínio alvirrubro foi evidente na segunda etapa, mas demorou a se converter em gol. Apenas aos 23 minutos, Thiago Orobó se aproveitou de mais uma falha da defesa abecedista em bolas aéreas e empatou o placar.

Apesar da boa partida, as duas defesas cometeram erros que deram as oportunidades para os gols.

Pelo lado americano, o erro crasso foi o posicionamento alto da defesa, principalmente, do zagueiro Geninho e a demora para fazer a recomposição nos contra-ataques alvinegros. Assim nasceram os quatro gols do ABC, dois em lançamentos nas costas dos zagueiros, um numa falta originada numa descida depois de mais um desses lançamentos e o gol que garantiu a vitória, depois de um apagão generalizado do setor defensivo que com cinco marcadores não conseguiu parar os três atacantes do ABC.

Os gols do América surgiram principalmente pelo lado de Pedro Costa, o lateral que ocupou o lugar de Cedric. Sem ritmo o estreante ficou fora de posição várias vezes e possibilitou as chegadas pelo lado esquerdo do ataque alvirrubro, além do gol de Orobó depois do escanteio, que reeditou a persistente falha aérea abcedista.

Se a emoção foi a tônica do primeiro tempo, não deixou de ser na etapa final e foi eletrizante até o último minuto. Quando tudo indicava para o sensacional empate em 3 a 3, a apoteose alvinegra aconteceu na Arena das Dunas.

Wallyson partiu pela direita e de canhota atravessou um passe — há quem diga que foi um passe errado — por toda a extensão da área americana. Igor Goularte dominou e teve paciência para levantar a cabeça e esperar a movimentação de João Paulo, a louvável contratação abecedista dominou com dificuldade por conta de uma lesão e bateu com de perna direita para vencer Ewerton e decretar a vitória do ABC.

Improvável triunfo pela campanha que deu o favoritismo ao arquirival que estava invicto, dono do melhor ataque e da melhor defesa e jogava o futebol mais vistoso do campeonato, mas também pelo o que não estava jogando o ABC, que apesar de invicto, não encantou em nenhum dos seus jogos.

Como a vitória num clássico tem o poder de mudar a situação dos clubes é a lição que fica desse Clássico Rei. O ABC saiu fortalecido, manteve a invencibilidade e agarrou a liderança. Enquanto isso, o América tocou o solo depois de flutuar em nuvens de paz e encantamento nas primeiras rodadas.

A garantia da decisão do turno entre os rivais é a garantia de mais uma noite de gala para o futebol potiguar que ainda respira em razão da existência de um Clássico Rei, o dérbi de Natal.

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Pedro Henrique Brandão
Universidade do Esporte

Não sou especialista, escrevo do que é especial pra mim. Futebol além das quatro linhas e um pitaco disso ou daquilo. Minha alucinação é suportar o dia a dia.