Quando a potência do tiro se rende à grandeza da bola

A paixão pelo futebol e sua capacidade de interferir em guerras

Joao Pedro Barbalho
Universidade do Esporte
3 min readJun 20, 2022

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Muitos falam que é puro lazer, “pão e circo”, e até “22 homens correndo atrás de uma bola”. Muitos ignoram a tradição e o espetáculo de se acompanhar futebol e, através dele, mudar vidas.

Porém, para o verdadeiro amante do esporte, é muito mais do que apenas uma prática comum, e o reconhecimento e admiração pelo desporto mais praticado do mundo é visto desde os casos mais corriqueiros, como numa mesa de bar, até os casos ímpares e de grande magnitude, como em meio a guerras. E é sobre esse último ponto que focaremos hoje.

Imagem: Velocity Broadband

Certo dia, assistindo um jogo com meu avô, ele me falou que o futebol era bem simples: o time que está com a bola ataca, e o que está sem a bola se defende. Essa frase que ele ouviu de um técnico de futebol de sua época, chamado Neném Prancha, martelou minha cabeça por muito tempo.

Um jogo com infinitas possibilidades de se desenvolver não pode ser definido apenas como “um ataca, outro defende”. E traçando um paralelo com os conflitos armados, se observa que, no futebol e na guerra a ideia principal é a mesma: o melhor e mais organizado toma as rédeas das ações ofensivas, enquanto o menos capacitado compensa a desvantagem com inteligência e estratégia. Mas e quando a bola e a guerra se misturam?

O clássico caso de Pelé em seu auge no Santos “parando” a guerra na África em 1969 não foi único, por mais que se tornasse exemplo da capacidade futebolística de trazer paz a locais habitados por guerra.

Exemplos como o de Didier Drogba, atacante costa-marfinense que exigiu a realização de uma partida de futebol em território inimigo no ano de 2007, além de gerar o primeiro cessar-fogo da guerra civil de seu país pode representar perfeitamente o que eu quero mostrar aqui.

Mas diante de diversos exemplos, a minha análise se desenvolve em torno de um em específico e não tão conhecido: a invasão de Lampião a cidade de Mossoró e a participação do futebol nesse contexto.

Imagem: Reprodução

O ano era 1927. Lampião e seu bando de cangaceiros planejava invadir a cidade de Mossoró e saquear os bancos da cidade. Nessa mesma época se instaurava a primeira rivalidade futebolística da cidade, entre Ypiranga Sport Club e Malta Futebol Clube.

A disputa dividia opiniões e gerava conflitos entre os moradores da cidade. Diante desse cenário e da ameaça de invasão de Lampião a cidade, os torcedores do Malta ignoraram o “toque de recolher” com a justificativa de que a chegada dos cangaceiros estava se aproximando, por desconfiarem de que era apenas um burburinho gerado pela torcida do Ypiranga para a festa de comemoração da vitória acabar mais cedo.

O desenrolar da história é trágico para Lampião e representa a força do futebol, que há tempos extrapola as linhas do campo. Êxito da população mossoroense — com a união do elenco e torcedores dos dois times para auxiliar no confronto — e mais um exemplo de que, para quem entende o real sentido da bola rolando, nunca será apenas futebol.

Imagem: Prefeitura de Mossoró

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