Você me adicionou no LinkedIn nos últimos 6 meses? Então… você fez parte de um experimento.

Viviane Delvequio
Time de Experiência Globo
12 min readJan 21, 2018

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“Não me recordo de onde nos conhecemos. Adoraria saber se há algum motivo especial para a conexão”.

Enviei essa mensagem (ou pequenas variações dela) para 113 pessoas das 145 que me adicionaram nos últimos 6 meses e que eu não conhecia previamente. Isso fez com que eu me deparasse com uma avalanche de profissionais que poderiam utilizar melhor o LinkedIn. E claro, fez também com que eu aprendesse com as respostas de quem soube tirar proveito da plataforma.

Entenda, foi por meio do LinkedIn que começaram dois processos seletivos muito relevantes para a minha carreira profissional (Samsung e Globo.com). Por isso trato com muito apreço a plataforma e as pessoas que a utilizam.

No início de 2017, depois de alguns meses notando pedidos de conexão de desconhecidos, e não entendendo o motivo do pedido ou o valor de ter uma conexão com uma pessoa a qual não tenho qualquer conexão (rá!), resolvi responder com a pergunta acima e transformei isso em um "experimento".

O experimento consistiu em anotar no período de julho a dezembro de 2017:

  1. O perfil de quem me adicionou: área de atuação, região do país e gênero;
  2. Dessas pessoas, quem aceitei e respondi com a pergunta do início e;
  3. Dessas que receberam a mensagem, quais retornaram e quais foram os motivos da conexão.

Embora querer entender o motivo de conexão de um desconhecido pareça ser algo óbvio, não foi o que notei ao conversar com colegas e observar o comportamento das pessoas no LinkedIn. Percebi que é uma prática comum adicionar pessoas ou aceitar pedidos de conexão sem um critério claro.

Foto de Timon Studler

Conexão entre pessoas que (já) se conhecem

Veja, o LinkedIn não foi desenhado com o foco primordial voltado para conexão com desconhecidos. Essa ferramenta tem algumas funcionalidades que só fazem sentido se você teve um contato mínimo profissional com as pessoas, por exemplo:

  • Endorsements: como posso dizer que a pessoa é boa em algo se nunca vi nenhum artefato produzido por ela?
  • Recomendações: se não trabalhei com a pessoa, não sei quais são as boas características dela.
  • Pedir referências em vagas: por que eu recomendaria alguém para trabalhar na empresa se não sei como ela é profissionalmente? Será que um eventual bônus por recomendação justificaria a má imagem causada se a pessoa recomendada não for competente para a função?
  • Filtros por proximidade: as buscas trazem prioritariamente quem é seu contato de segundo grau: um contato dos seus contatos. Ou seja, até mesmo para funções de achar desconhecidos, o LinkedIn traz o valor da conexão real como critério de filtro.

"Qual o problema de fazer o uso que eu quiser da ferramenta?" O problema aparece quando o virtual vem para o 'real'. Veja alguns exemplos abaixo pelos quais já passei:

  1. Referências na ferramenta: LinkedIn avisa que tenho conexões na empresa ou em comum com uma pessoa a quem quero ser apresentada, mas, quando abro a lista, descubro que não conheço nenhuma delas ou que elas não possuem conhecimento suficiente a meu respeito para poder ajudar.
  2. Networking: "Oi. Acho que tenho você no LinkedIn há uns 5 anos já" "Hum, legal" e, eu pelo menos, entro naquele estado constrangedor de ficar na minha cara que não sei quem a pessoa é…
  3. Referências no trabalho: “Oi, vi aqui no LinkedIn que você conhece o João. Ele é bom?” “Não sei, nunca vi, nunca troquei uma palavra com ele.” “Ué, porque você tem ele no LinkedIn então?” “…”

Não quero dizer que é proibido fazer conexão com quem você não conhece, mas será que a quantidade é mais importante que a qualidade?

Dado o espaço que o LinkedIn abre para estabelecer uma boa rede de relacionamentos em contraste com o uso que tenho observado, fiz o tal experimento e compartilho a seguir o que notei.

Números para quem gosta de números

Como comentei no início, umas das coisas que fiz foi anotar o perfil de quem me adicionava. Eu queria saber se havia algum padrão ou se isso poderia me dar algum insight.

Foto de Carson Arias

Apresento abaixo o perfil dessas 145 pessoas, ressaltando que os dados foram anonimizados. O objetivo, obviamente, não é expor as pessoas, mas sim entender seu comportamento. Vamos aos dados:

Área de Atuação

Os primeiros dados são relativos à função que as pessoas exercem, de acordo com o LinkedIn.

Perfil de Atuação (63% UX e Design, 13% TI, 11% RH e 12% de outros)

A maior parte das requisições foram feitas por profissionais de UX (63%) e TI (13%). Essa distribuição reflete minha trajetória profissional, já que iniciei como desenvolvedora e migrei para a área de design de experiência do usuário. Dado que essa migração já tem quase 10 anos, foi bom ver que a maior parte das solicitações foram provenientes de profissionais da minha área atual.

Localização

No que diz respeito sobre onde essas pessoas residem hoje, o gráfico abaixo dá um panorama do que observei.

Distribuição por Região e Detalhamento do Sudeste (São Paulo 52%, Rio de Janeiro 15%, Minas Gerais 7%, Espírito Santo 1%, Centro-Oeste 8%, Sul 7%, Nordeste 3%, Fora do Brasil 7%)

O grande número de solicitações de São Paulo chamou minha atenção, especialmente quando vi a distribuição por cidades, onde a capital representou 62% das solicitações, enquanto Campinas foi de 21% e outras cidades 17%. Embora tenha iniciado minha carreira em Campinas, hoje moro no Rio de Janeiro (e quando iniciei o experimento já havia feito a alteração no LinkedIn há mais de um ano). Dessa maneira, imaginei que o número de solicitações de pessoas do Rio seria maior. Fiquei me indagando se esse alto número de solicitações de 'paulistanos' é um reflexo de uma concentração do mercado de UX na cidade de São Paulo ou de alguma outra lógica da plataforma.

Outro ponto que me chamou atenção foi não ter nenhuma requisição da região Norte e um baixo número de requisições da região Nordeste, embora eu saiba que há muitos profissionais e centros fortes de pesquisa da área de UX nessas regiões.

Gênero

O que mais me chamou atenção com relação ao gênero foi que apenas 22% das solicitações foram feitas por mulheres. Foi uma proporção menor que a da minha rede de contatos do LinkedIn (que mescla profissionais de UX, de TI e de RH) cuja proporção de mulheres já é baixa: 27%.

Olhando apenas para UX no meu experimento, essa proporção aumenta: designers mulheres representaram 31% dos pedidos de conexão de profissionais nessa área. Entretanto ainda é uma participação baixa de mulheres, tendo como referencial a pesquisa da Saiba+, que aponta que elas representariam 40% do mercado de UX no Brasil em 2016.

Distribuição por gênero de profissionais de UX de acordo com Panorama do mercado de UX no Brasil, pesquisa e análise realizada pela Saiba+

Comparando esses números (de referência e do experimento) fico imaginando se as mulheres são menos propensas a começar um contato com uma pessoa desconhecida. Ou se isso foi apenas uma coincidência.

Respostas Recebidas

Para finalizar essa sessão sobre números, cabe dizer que os dados anteriores eram referentes às 145 pessoas que me adicionaram e que eu não conhecia pessoalmente. Dessas, achei válido seguir o experimento de entender o porquê da conexão com 113 pessoas, as quais aceitei como conexão e enviei a mensagem perguntando sobre o motivo do contato.

Dessas 113 pessoas para as quais enviei a mensagem, apenas 88 pessoas me responderam até o dia 31 de dezembro de 2017. Isso mesmo: mais de 20% das pessoas não chegaram nem a responder minha mensagem. Mas das 80% que responderam, analiso a seguir o que aprendi.

Como foi a conexão com esses (até então) desconhecidos

Até aqui os dados quantitativos me mostraram o perfil das pessoas e notei que mais me levantou questões do que me trouxe respostas.

A seguir, analiso as respostas recebidas para ter um entendimento qualitativo de alguns desses pedidos de conexão. E acredito que é nessas respostas onde está a parte mais rica desse experimento.

Reações curiosas

Antes de dizer os principais motivos do pedido de conexão, vale fazer uma pausa para algumas reações que eu não esperava:

  • Foi erro: embora pouco comum, algumas pessoas responderam que o pedido de conexão foi um erro. Não sei se há funções no LinkedIn causando confusão, mas fico imaginando quantos contatos "errados" estão na minha lista por eu não ter feito a pergunta sobre o motivo da conexão antes do experimento…
  • Pedidos de desculpa pelo incômodo: Aparentemente, as pessoas percebiam um "espaço invadido" ao serem questionadas sobre os motivos da conexão. Em torno de 15% das respostas vieram com algum pedido de desculpas pelo incômodo ou pontuavam que eu poderia desfazer a conexão. Chamou a atenção dado que a pessoa não pensou nisso antes de me adicionar aos contatos.
  • Discurso X ação: Algumas pessoas demonstraram interesse em vagas na empresa onde trabalho. Mas, ao entrar no perfil da pessoa, a descrição estava desatualizada, sem link de portfólio e nem detalhes do que fez nas empresas anteriores… Entendo que quando se quer novas oportunidades, no mínimo, o LinkedIn tem que refletir o que se tem a oferecer.
  • Opa, você me conhece sim! E não é que tinha gente que de fato eu conhecia, mas não associei nome e rosto? Apesar do leve incômodo, agora eu tenho no histórico de mensagens essa informação, que pode ser útil no futuro.

E por que as pessoas me adicionavam?

Embora tenha recebido muitas respostas e bem variadas entre si, os motivos que mais apareceram como justificativa para o pedido de conexão foram os seguintes:

  • Porque viram palestras ou posts meus: Durante o período do experimento, realizei uma apresentação no UX Talks BH em julho, fiz um post no LinkedIn oferecendo sessões de mentoria pelo OfficeHours no final de agosto e apresentei dois cases de mercado no ISA17 em novembro. Essas três ações foram citadas como motivos de conexão. Acabou sendo um feedback positivo sobre o impacto gerado ao devolver à comunidade um pouco do que aprendi.
  • Por interesse na área de UX: Esse ponto apareceu com variações: desde pessoas querendo migrar para UX (vindas de TI ou do Design Gráfico não digital), alguns que dividem tarefas ou projetos com profissionais da área e até quem quer acompanhar o que está acontecendo no nosso mercado. E fiquei feliz: vi nesse interesse um reflexo da importância que UX ganhou nos últimos anos.
  • Para seguir minhas publicações / updates: Achei curioso esse motivo ter aparecido tantas vezes nas respostas dado que para seguir updates existe a funcionalidade de Follow/Seguir. Essa função parece mais conveniente que adicionar à lista de contatos, principalmente por causa das pessoas que se sentiam “invadindo espaço”, como comentei na sessão sobre reações curiosas.
  • Para aumentar a rede de contatos: Esse motivo foi, de longe, o mais comum nas repostas e poucas vezes estavam associadas aos outros motivos aqui listados. Existem ganhos por ter muitos contatos no LinkedIn? Sem dúvidas! Nesse post (em inglês) uma garota, que escreveu o texto sendo ainda estagiária, comenta que começou a ser mais bem ranqueada do que colegas com cargos maiores por ter alcançado mais de 500 conexões. “It makes me laugh to think I am ranked higher is credibility than a CEO of a company, but LinkedIn makes it happen.” (Algo como: Faz me rir pensar que estar mais bem ranqueada dá mais credibilidade do que ser CEO de uma empresa, mas o LinkedIn fez isso acontecer.)
Cena de The Office, seriado que faz piada com quem não entendeu ainda como a vida profissional deveria ser…

Sério… você vai ser só um número?

Abro espaço aqui para um breve relato pessoal: uns cinco anos atrás, reuni todo meu atrevimento e, junto com minha dupla de projeto de conclusão de pós graduação, fomos apresentar nosso projeto para o Don Norman quando ele veio para o Brasil no Interaction South America 2012. O projeto era baseado em um wearable que facilitaria enviar pedido de ajuda e "mensagem de afeto" para pessoas próximas. Sobre a questão do afeto, ele deixou bem claro, em um inglês muito mais educado que o meu PT-BR a seguir: “Cara, se não for algo pessoal e direcionado exclusivamente para a pessoa, não vai transmitir afeto nenhum. Para ser algo significativo tem que ser pessoal, tem que ser algo único das pessoas envolvidas nessa comunicação”.

Voltando para 2017, em um claro contraste com a informação que recebi de Don Norman, vi muitas pessoas que me adicionaram sem nem ver o meu perfil e respondendo com variações mínimas da seguinte mensagem: “(sic) te adicionei para poder aumentar minha rede de contatos. Um bom networking nunca é demais.”

Eu me questiono: o que é um bom networking se você não tem qualquer ligação com a pessoa? E particularmente, não encontrei resposta ainda.

De fato, há ganhos secundários em muitos contatos, como o exemplo da garota acima. Mas será que é possível fazer com que essas conexões não passem em branco? Bom, algumas pessoas conseguiram.

Foto de Paul Dufour

Seja uma história

Algumas respostas que recebi não tinham uma "oferta clara" (como divulgar grupos de discussão ou perguntar se eu tinha interesse em palestrar), mas foram inteligentes e acabaram se destacando das demais. As mensagens que mais me impactaram envolveram cinco tipos de abordagens, a seguir:

1. Pedir referências de conteúdo

Achei uma abordagem simples e inteligente: pedir referências de leitura, sites ou caminhos a seguir para quem está começando ou mudando de área.

Esse tipo de abordagem permitiu conhecer melhor a situação da pessoa que está escrevendo, passou a imagem de que ela quer crescer profissionalmente e abriu espaço para um diálogo mais significativo. Essa abordagem fez com que as pessoas não passassem em branco.

2. Pedir feedback de portfólio

Acabou sendo uma maneira sutil de mostrar o que a pessoa tem a oferecer como profissional e demonstrar que valoriza a minha experiência. É gostoso ser valorizado e ver que temos como ajudar outros profissionais.

Assim como o assunto anterior, também conta uma história e mostra que a pessoa não está acomodada.

3. Perguntar sobre a empresa onde trabalho

É parecido com as anteriores, mas mostra interesse mais claro em movimento de carreira. Caso eu tenha uma vaga e a pessoa tenha um perfil legal, ela já se diferenciou de muitas outras. Se eu fosse a pessoa que escolhe os candidatos então, imagine quantos passos já teriam sido ultrapassados.

Um recrutador de Londres comenta sobre esse acesso direto que o LinkedIn abre às pessoas neste post (em inglês) e ressalta o quanto a plataforma pode ser mais eficiente do que caminhos tradicionais de busca de emprego.

Alguns contatos não indicavam intenção de movimentação, mas responderam com questões sobre processos de UX, com foco em compreender quais as práticas dentro do mercado brasileiro. Muitos mostraram um bom conhecimento prático ou teórico só pela formulação das perguntas e, assim, chamaram minha atenção para a experiência deles.

4. Expor pontos de relação entre as experiências

Outra ótima abordagem foi pontuar fatos ou momento da carreira que de alguma forma tinha relação com a minha. Pense comigo: normalmente o que mais nos cativa em histórias? É quando nos vemos refletidos nelas, seja por algo que passou na nossa vida ou por algo que desejamos viver.

“Comecei na área de UX no início do ano e quando vejo mulheres que trabalham com isso / divulgam links aqui pelo LinkedIn, adiciono pra ter mais fontes de informação”

Algumas pessoas retornaram comentando que viram projetos meus de áreas com as quais trabalharam e gostariam de saber mais. Outras pontuaram a questão de trajetória similar, seja por trabalhar na mesma empresa, região ou início de carreira similar.

"pelo fato de ter experiências próximas do local onde estou hoje aqui em Campinas … e vendo que chegou até a Globo, achei interessante pegar como referência "

As pessoas que pontuaram essa relação entre nossas trajetórias e ainda expressaram algum tipo de paixão pela área ou desejo de crescimento profissional, foram as que mais me marcaram positivamente.

5. Propor que essa conexão virtual se torne conexão real

Bem raro, mas aconteceu de alguns contatos proporem tomar um café ou mesmo aproveitar eventos da área para nos conhecermos pessoalmente. Pode parecer meio intrusivo mas, se há algo claro de troca de experiências que pode ser de valor para ambos, vale o convite.

Das respostas que recebi, quando notei que a pessoa poderia ter interesse em trocas de ideias ou fazer mais perguntas, dei o link da minha agenda no OfficeHours, por onde ela poderia marcar uma conversa por voz comigo.

Como comenta Elizabeth Alterman, neste post (em inglês), conseguir ter um contato mais pessoal faz com que você vire uma 'pessoa de verdade'.

E agora que o experimento acabou?

Eu vou continuar perguntando o motivo da conexão, porque foi muito rico e aprendi muito com as respostas. Mas vou parar de registrar tudo porque deu muito trabalho. ;)

Ainda quero entender os impactos a longo prazo desse desafio de não ser apenas uma conexão superficial. Mas vou precisar de muito mais do que 6 meses e não pretendo fazer disso um novo experimento.

Acredito que estamos todos tentando entender as melhores maneiras de lidar com as novas dinâmicas de trabalho relacionadas ao uso de redes sociais virtuais, e esse experimento foi uma dessas tentativas.

O que levo de mais valioso desse experimento é o reforço de uma crença bem antiga, sobre o valor de tratar o outro como você gostaria de ser tratado. Não como um número, mas como uma pessoa. Uma pessoa que tem uma história, que pode ter uma necessidade que você pode ajudar, que você pode fazer diferença na vida dela e ela na sua.

Mais do que entender como usar essas novas ferramentas e dinâmicas para o benefício profissional, fica o desafio de como usá-las de maneira positiva e criar conexões capazes de impactar vidas. Se quiser trocar ideia sobre esse assunto, ficam essas várias portas abertas. ;)

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Viviane Delvequio
Time de Experiência Globo

Brazilian UX professional with 20 years of experience, including 5 in managerial roles. Writing about stuff I am in the mood. More info: www.viviane.work