“Design social” é pleonasmo

Design é pra sociedade. Se não for, não é design.

Gabriel Simões
UX Collective 🇧🇷

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Imagem mostra uma esteira de montagem, com diversas pessoas sentadas de ambos os lados, instalando componentes em objetos com a aparência de globos terrestres.
Utopia. Colagem por Annette von Stahl.

No artigo “UX Writer, se posicione!”, meu papo foi com as pessoas que trabalham na área de design de conteúdo, assim como eu.

Agora, quero falar com todo mundo que faz design. Independente de qual tipo ou área. Independente de como.

Design?

Eita, termo difícil de definir.

Ao longo da minha carreira, escutei muitas explicações sobre o que é design. O engraçado é que a própria palavra, por si só, já pode significar muitas coisas. Tudo vai depender de quem tá falando, pra quem tá sendo falado e em que contexto é usada.

Por isso, quero alinhar que vamos seguir a linha de raciocínio de Alexandre Wollner, um dos principais nomes na formação do design moderno no Brasil: “design é projeto”.

Aliás, já foi ver a definição de “design” no dicionário? O Aurélio diz: “1. Concepção de um projeto ou modelo; planejamento. 2. O produto deste planejamento”.

Também têm Corrêa e Castro que, num artigo publicado pela Universidade Federal de Minas Gerais, afirmam: “o design é uma atividade estratégica, multidisciplinar e complexa” e também que “a noção de estratégia varia de acordo com o âmbito de utilização do termo”.

Pra mim, é isso tudo. Design é projeto, estratégia, contexto e colaboração.

Então, por que o design é sempre social?

“O que seria um design não social? Design comercial? Design comercial que não for dirigido às necessidades da sociedade não é design.”

Joaquim Redig, doutor em Design pela Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Essa é uma questão que também divide opiniões do mundo acadêmico. “Design social” é um termo que existe no mercado e é uma das frentes de atuação no design. Por isso, vamos começar entendendo a definição dessa subárea.

No artigo “Por um design mais social: conceitos introdutórios”, publicado no periódico “Revista D.”, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Oliveira e Curtis dizem que “um projeto de design social não tem necessariamente uma motivação ou finalidade econômica, parte de requisitos de caráter social e não técnicos e/ou mercadológicos, e deve envolver a comunidade e os atores impactados durante o processo criativo, trabalhando de maneira colaborativa.

Eles também deixam um esqueminha bacana explicando a ideia por trás do design social:

Esquema visual ilustrando como o design social atua, envolvendo a comunidade, necessidades, colaboração e, enfim, a solução do problema. Sempre em uma equipe multidisciplinar.
Diagrama Design Social, de Oliveira e Curtis.

Você deve tá pensando: “Hum, ok. De fato, é design e tá envolvendo a sociedade.”

Mas aí também vem aquela pergunta: “Mas se eu faço design pras pessoas, e essas pessoas fazem parte da sociedade, logo…”

Poizé. Não é só quem trabalha com “design social”, exclusivamente falando, que faz design pra sociedade. E é por isso que quero voltar a falar sobre a visão do designer Joaquim Redig sobre esse assunto.

Imagem de uma página de livro com os dizeres: “Design é o equacionamento simultâneo de fatores ergonômicos, perceptivos, antropológicos, tecnológicos, econômicos e ecológicos, no projeto dos elementos e estruturas físicas necessárias à vida, ao bem estar e/ou à cultura do homem.” Apontamentos menores podem ser vistos, onde detalhes são apontados.
Sobre desenho industrial (1977), de Joaquim Redig.

Analisou a imagem aqui de cima da página 32 do livro “Sobre desenho industrial”, de 1977, do Redig? Atenção aos detalhes. Em como ele definiu o termo design — à direita — e ramificou seus conceitos — à esquerda.

“Design é o equacionamento simultâneo de fatores ergonômicos, perceptivos, antropológicos, tecnológicos, econômicos e ecológicos, no projeto dos elementos e estruturas físicas necessárias à vida, ao bem estar e/ou à cultura do homem.”

Em outra página desse mesmo livro, Redig mostra a estrutura “Homem, Forma, Utilidade, Indústria, Custo e Ambiente”.

Página do livro de Joaquim em que ele define a estrutura “Homem, Forma, Utilidade, Indústria, Custo e Ambiente”.
Sobre desenho industrial, de Joaquim Redig.

Aliás, a diagramação do livro chama a atenção, não chama? Segundo o próprio autor, “o projeto do livro, que se confunde com a construção do texto, visa clareza, informação inequívoca, caracterizado como lógica cerebral, espécie de monólogo interno, derramado sobre o mundo. Assim, se organiza como uma espécie de visão esquematizadora, quase manualizando a sua definição de design. Neste sentido, não há brecha possível para a interpretação do texto pelo leitor. Lhe resta acatá-lo e colocá-lo em prática. O todo implica em leitura segundo ritmo ditado pelo autor, por meio da sua unidade diagramática, a página.

Esse livro é design “à beça”, pra não dizer outra coisa.

Mas, voltando pro ponto principal… pra ele, o design se guia através dessas diretrizes:

Imagem mostra uma tabela com os textos em linha: HOMEM: USUÁRIO, NECESSIDADES, SOCIEDADE;
 FORMA: PERCEPÇÃO VISUAL, ESTÉTICA, INFORMAÇÃO;
 UTILIDADE: FUNCIONALIDADE, USO, COMUNICAÇÃO;
 INDÚSTRIA: SERIAÇÃO, MÁQUINA, TECNOLOGIA;
 CUSTO: RACIONALIZAÇÃO, PRODUTIVIDADE, ECONOMIA;
 AMBIENTE: SISTEMA, HARMONIA, RECURSOS NATURAIS.
Feito por João Leite, no artigo “O sentido do design, segundo Joaquim Redig”.

Não à toa que a comunicação e o pensamento estratégico são tão importantes pra quem é designer. Planejar, medir, avaliar riscos, fazer pontes com outras áreas, negociar, cobrar… a lista que prova isso é grande. São muitas variáveis, logo, muito trabalho.

Mas trouxe todas essas informações pra dizer que eu também acredito nesse design “utópico”, sabe? Aquele projeto perfeito em que todos os problemas existentes são encontrados, examinados e solucionados.

Acredito no design como ferramenta de mudança social. E que cada designer pode fazer sua microparte pra que alguma microcoisa no mundo mude.

“O mundo precisa de mudanças graves e urgentes, e os designers têm muito a contribuir para isso. […] Nossa metodologia de trabalho se baseia num enfoque abrangente dos problemas, para que as soluções sejam definitivas, e não paliativas.”

— Joaquim Redig, em “Design: responsabilidade social no horário do expediente”, no livro “O papel social do design gráfico”.

Todo design é projeto, mas nem todo projeto é design.

Mas e aí, você concorda que o design é — ou pelo menos deveria ser — social em sua definição raiz?

Se quiser conversar sobre esse ou outros assuntos, comenta aqui ou me chama! 😁

Aquele abraço!

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Engenheiro e designer. Pós-graduado em UX pela PUCRS. Acredito que o design pode melhorar o mundo.