Crossing the Chasm.

Martina Scherrer
vírgula mas
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30 min readNov 5, 2020

Notas sobre a leitura de "Cruzando o Abismo", de Geoffrey A. Moore.

Apesar de já ter lido partes desse clássico várias vezes, parei para lê-lo "de cabo a rabo" agora. Como de costume, tenho utilizado o Medium para registrar notas de alguns livros que leio. Dessa forma, talvez outros consigam se beneficiar delas. :)

Abaixo seguem anotações sobre o Crossing the Chasm, uma das referências em estratégia de marketing para produtos — na falta de melhores palavras— disruptivos/inovadores/tech.

Como o próprio autor esclarece, o modelo abaixo é pensado primordialmente para produtos B2B (apesar de que eu acho vários pontos super adaptáveis para B2C). Ao final, ele desenvolve um breve apêndice focado nesse segundo mercado.

Bem, vamos às notas.

PART I — Discovering the Chasm

Introduction — If Mark Zuckerberg Can Be a Billionaire

Todo ano, milhões de dólares e muita energia dos melhores talentos são desperdiçados em tentativas frustradas de ser o próximo “eleito” no mundo das novas tecnologias. Ao comparar as features do que falhou versus o que sucedeu, normalmente o produto que venceu nem é o melhor.

Mais do que especificações técnicas, o produto perde pelo marketing. O livro se propõe a responder duas perguntas: por que não conseguimos aplicar à tecnologia as mesmas skills que temos em termos de marketing para bens de consumo físicos? O que falta para conseguirmos?

O modelo padrão que temos para desenvolver mercados em tecnologia está quase, mas não totalmente certo. Começamos certo, mas encontramos gaps em vendas, e daí é necessário remediar. Às vezes funciona, às vezes não, e às vezes, ainda, o produto fica apenas “se pagando”.

To be specific, the point of greatest peril in the development of a high-tech market lies in making the transition from an early market dominated by a few visionary customers to a mainstream market dominated by a large block of customers who are predominantly pragmatists in orientation. The gap between these two markets, all too frequently ignored, is in fact so significant as to warrant being called a chasm, and crossing this chasm must be the primary focus of any long-term high-tech marketing plan. A successful crossing is how high-tech fortunes are made; failure in the attempt is how they are lost.

O cruzamento do abismo deve ser rápido, pois é um momento de extrema vulnerabilidade. Por isso, o foco para cruzá-lo deve vir de todos da companhia, não só marketing e vendas. É um momento de ser menos arriscado, fazer mais planos, racionar recursos e cometer a menor quantidade de erros possível. Não é um momento de gênios pontuais, mas muitas cabeças pensantes juntas.

One of the most important lessons about crossing the chasm is that the task ultimately requires achieving an unusual degree of company unity during the crossing period.

É sobre passar de uma moda para uma tendência.

O segredo é cruzar o abismo, tomando as atitudes certas para permitir que esse mercado mainstream comece a aparecer.

Every truly innovative high-tech product starts out as a fad — something with no known market value or purpose but with “great properties” that generate a lot of enthusiasm within an “in crowd” of early adopters. That’s the early market. Then comes a period during which the rest of the world watches to see if anything can be made of this; that is the chasm. If in fact something does come out of it — if a value proposition is discovered that can be predictably delivered to a targetable set of customers at a reasonable price — then a new mainstream market segment forms, typically with a rapidity that allows its initial leaders to become very, very successful.

Chapter 1 — High-Tech Marketing Illusion

The Technology Adoption Life Cycle

O autor traça 5 perfis psicográficos dos consumidores:

1- Innovator: querem ser os primeiros a adotar alguma nova tecnologia pelo interesse na tecnologia em si, muitas vezes procurando por ela antes mesmo de algum esforço formal de marketing ter sido feito. São importantes pois a sua aprovação faz os demais grupos acreditarem que a tecnologia em questão funciona.

2- Early adopter: querem ser os primeiros a adotar alguma nova tecnologia, mas estão mais interessados no benefício que a tecnologia pode trazer.

3- Early majority: a middle-of-the-road adopter. Sabem que muitas das novas tecnologias acabam por ser só uma moda passageira, por isso preferem esperar os outros testarem e validarem antes de comprarem por si. Na curva, é o início das oportunidades massivas de ganhar dinheiro.

4- Late majority: the followers — adotam algo apenas quando a maioria já adotou. Além de todas as preocupações do grupo 3, são pessoas menos seguras de sua habilidade de lidar com tecnologias. Por isso, querem coisas muito estabelecidas, vindas de grandes empresas.

5- Laggard (retardatário): a very late adopter of technology. Não querem saber de novas tecnologias, por motivos pessoais e econômicos.

bankofsingapore.com

Essas atitudes são significativas quando nos deparamos com produtos discontinuous ou disruptive innovations, que nos fazem mudar nossos hábitos atuais, mudar produtos e serviços nos quais já confiamos ou que são compatíveis com recursos complementares que temos.

Empresas de tecnologia lançam produtos “disruptivos” toda hora, e por isso precisam de uma forma especial de pensar marketing, com o ciclo de vida de adoção de tecnologias no centro da abordagem.

The High-Tech Marketing Model

Para desenvolver um mercado em tecnologia, a ordem a ser seguida deve ser de 1 a 5 nos perfis descritos, atingindo e crescendo cada um deles. A aprovação de um serve para conquistar a aprovação do próximo. Perdendo o ritmo de passagem de um para outro, a empresa pode perder tanto para outros competidores quanto para possíveis novas tecnologias que surjam no meio.

Illusion and Disillusion: Cracks in the Bell Curve

Mas há “algo errado” com essa curva entre o 1 e o 5. Uma quantidade significativa de novos negócios frustrados mostra que há um abismo entre cada grupo, pois dificilmente um grupo vai aceitar um novo produto se ele for apresentado da mesma forma como foi para o grupo anterior.

nufi.io

The First Crack

Tem dois gaps entre os perfis que são menores.

Primeiro, dos innovators para os early adopters. Acontece quando uma nova tecnologia bombástica não consegue ser traduzida rapidamente em um novo benefício para as pessoas.

The key to getting beyond the enthusiasts and winning over a visionary is to show that the new technology enables some strategic leap forward, something never before possible, which has an intrinsic value and appeal to the nontechnologists.

O marketing, aqui, precisa ser capaz de comunicar uma aplicação atraente do produto para esse público, provando seu poder e valor a essas pessoas.

The Other Crack

O segundo é entre a early majority e a late majority. Apesar do mercado já ter sido bem desenvolvido, e o produto já ter ganhado o público mainstream, o público da late majority ainda não se sente confortável em adotar a nova tecnologia. É o momento de tornar o produto cada vez mais fácil de usar para que possa ser adotado por essa segunda parcela de usuários mainstream.

Discovering the Chasm

Já o maior gap existente na curva é entre os early adopters e a early majority. É muito comum não perceber a diferença entre os dois públicos, pois se parecem muito em termos de perfil de compra, mas a promessa que cada um compra é muito diferente. O early adopter busca um agente de mudança na sua vida ou, no caso de empresas, algo que mude os processos de forma a trazer uma vantagem competitiva significativa — estando disposto a lidar com possíveis bugs e falhas para isso. Já a early majority busca uma melhoria de produtividade em operações já existentes; algo que melhore, mas que se integre à tecnologia já utilizada.

They [early majority] want evolution, not revolution. And they don’t want to debug somebody else’s product.

Por essas razões, consumidores early adopters não são uma boa referência pra early majority. Só um early majority é uma boa referência para ele mesmo. E a dificuldade está aí: o consumidor early majority quer várias referências para comprar algo, e a única referência que faz sentido é ele mesmo.

When promoters of high-tech products try to make the transition from a market base made up of visionary early adopters to penetrate the next adoption segment, the pragmatist early majority, they are effectively operating without a reference base and without a support base within a market that is highly reference oriented and highly support oriented.

Bodies in the Chasm

Mesmo que os produtos que já fizeram sucesso entre os early adopters tenham ganhado muita publicidade, mostrando que funcionam razoavelmente bem, as empresas (e consumidores) do próximo segmento da curva não os adotam pois eles acreditam que as novas soluções quebram muito com os processos aos quais já estão acostumados — e a queda nesse abismo tem muito a ver com o marketing não conseguir fazer com que mudem essa ideia.

Muitas empresas de tecnologia falham por não conseguir reconhecer a enorme diferença entre uma venda para um early adopter e uma venda para a early majority. E, também, por ser o momento em que “entram no abismo” o momento em que os líderes colocam as expectativas mais para o alto, e gastam mais em projetos de expansão, em vez de economizar recursos.

Tudo isso ocorre em função da "ilusão" comentada acima: a crença construída pelo High-Tech Marketing Model de que novos mercados vão se revelando de forma suave e fácil, um puxando o outro automaticamente.

Para evitar o perigo de cair no abismo, a empresa deve se aprofundar na dinâmica do Technology Adoption Life Cycle, corrigindo suas falhas para desenvolver uma estratégia de marketing segura: é o que o autor chama de High-Tech Marketing Enlightenment.

Chapter 2 — High-Tech Marketing Enlightenment

Primeiro, há um mercado…

De innovators e early adopters, cheios de entusiasmo.

Depois, não tem mais…

É o abismo, quando o mercado inicial ainda está tentando digerir o projeto ambicioso de tecnologia, e o mercado mainstream está avaliando e esperando pra ver se isso “vai dar bom”.

E depois, tem de novo…

Se tudo der certo, e a empresa conseguir passar pelo abismo, um mercado mainstream emerge (early e late majority). É com eles que surgem as oportunidades reais de ganhar muito dinheiro e crescer.

Para chegar lá, a estratégia de marketing da empresa deve responder de forma satisfatória a esses três estágios. Em cada um dos casos, a chave do sucesso é focar no perfil dominante de adoção da tecnologia de cada etapa, entender a fundo o perfil psicográfico dessas pessoas, e adaptar a estratégia de marketing de acordo.

Mas como?

First Principles

Antes de mais nada, o autor estabelece uma definição para “marketing”: tomar ações para criar, crescer, manter ou defender mercados.

Para alta tecnologia, mercado é:

(1) Um conjunto de clientes (atuais ou potenciais) (2) para um determinado produto/serviço (3) que têm um conjunto de necessidades ou desejos em comum e (4) que consultam uns aos outros para tomar decisões de compra.

Esse ponto 4, tão negligenciado por muitos profissionais, é chave para um marketing bem sucedido em alta tecnologia — muito mais barato que pagar por isso é conseguir criar uma reação em cadeia, onde as pessoas espalham a novidade para as outras. É, também, a forma natural de passar de um segmento ao outro da curva: a aprovação de um vai levar à aprovação do próximo.

As 3 fases do marketing em alta tecnologia

1. Early Markets

É composto dos innovators (entusiastas de tecnologia) e dos early adopters (visionários).

Os visionários dominam as decisões de compra desse mercado, mas são os innovators quem primeiro percebem o potencial do novo produto. Ou seja, é com eles que começa o marketing de produtos de alta tecnologia.

1.1 Innovators: os entusiastas da tecnologia

São aqueles que primeiro vão apreciar a arquitetura do produto e ver nela vantagens competitivas sobre o que já existe no mercado. Vão comprar o produto só pra ver se funciona. Estarão dispostos a gastar horas tentando fazer o produto funcionar, e vão perdoar as falhas inerentes ao lançamento, tudo em prol de evoluir a tecnologia. São ótimos para trazer insights pois eles realmente se importam, e darão feedbacks valiosos (bom para testes e iterações de MVPs). Por tudo isso (e por serem tanto compradores quanto influenciadores de tecnologia), eles são a primeira peça chave para qualquer esforço de marketing em alta tecnologia.

Por mais que eles sejam os menos exigentes em termos de comprar uma ideia do que qualquer outro grupo no ciclo de adoção, não se deve ignorar as questões importantes para eles. Primeiro, eles querem saber a verdade, sem truques. Segundo, a qualquer momento, eles querem poder ter acesso a alguém tecnicamente apto a responder dúvidas que tenham. Terceiro, eles querem ser os primeiros a ter acesso às novidades. Por fim, eles querem pagar pouco pelos produtos, por terem uma crença que a tecnologia deveria ser gratuita ou a preço de custo.

Para atingi-los, a melhor forma é online, claro. Marketing de resposta direta funciona muito bem com eles pois são o tipo de público que vai se inscrever em um webinar, pedir uma free demo, etc. São um público mais interessado em conteúdo do que forma, então não é necessário investir muito, aqui, em layout.

Em empresas, nem sempre esses entusiastas são as pessoas que têm poder de decisão. Então, idealmente, a campanha de marketing deve buscar atingir os entusiastas que têm acesso aos tomadores de decisão.

1.2 Early adopters: os visionários

São pessoas que têm o insight de combinar uma nova tecnologia emergente a uma oportunidade estratégica, a atitude de traduzir esse insight em um projeto de grande risco e visibilidade, e o carisma para fazer o resto da empresa comprar a ideia.

Tendem a ser pessoas entrando em cargos executivos, extremamente motivados e orientados por um sonho (ligado a um objetivo da empresa). Entenda o sonho deles e você entenderá como vender pra eles.

Eles assumem riscos altos com tecnologias ainda não estabelecidas buscando inovar em termos de produtividade e experiência do cliente. Eles não querem apenas uma “melhoria”, eles querem algo realmente inovador.

A tecnologia por si não é o foco desse grupo (como era para o anterior), mas sim a forma como ela vai ajudar a atingir esse sonho e possibilitar esse salto estratégico. Eles veem com clareza o potencial de retorno desse investimento em tecnologia, e por isso estão dispostos a assumir esse risco em busca do seu objetivo. Também por isso são o grupo menos sensível a preço no ciclo de adoção de tecnologia. Normalmente eles trabalham com orçamentos grandes, podendo inclusive ser fonte de capital para o desenvolvimento de tecnologias.

Esse é um grupo para quem é fácil de vender, porém difícil de agradar, em função da grandiosidade e ousadia desses “sonhos” que eles buscam realizar.

Os dois princípios chave para obter sucesso ao vender para eles são:

a) Esse público gosta de trabalhar por projeto, começando com um piloto para testar a tecnologia, dando andamento ao projeto em fases. A estratégia vencedora, aqui, é conseguir produtizar cada entregável de cada fase do projeto piloto: o que para um cliente pode ser só uma milestone, para outro (com metas menos ambiciosas) pode ser um produto completo.

b) Eles têm pressa, por isso cumprir prazos e alinhar expectativas é muito importante.

Em resumo, o objetivo é realizar cada fase de forma que:

  • Seja realizável dentro do prazo estipulado;
  • Forneça um produto que o time de vendas possa vender de forma autônoma para outros clientes;
  • Possibilite retorno do investimento do cliente, e represente um avanço em tecnologia.

No ciclo de venda com esse grupo, primeiro é importante entender bem os objetivos desses visionários, e passar a confiança de que o produto consegue ajudar a atingi-los. No meio do ciclo de vendas, é importante ser flexível e se adaptar às necessidades do cliente, e no final, ser bastante cuidadoso nas negociações, não prometendo prazos impossíveis.

Normalmente não é você quem os encontra, mas eles encontram você. Eles conhecem empresas assim por manterem relações com entusiastas da tecnologia (e é por isso que é tão importante capturar eles primeiro).

Os visionários dão visibilidade aos novos produtos, e também geram receita enquanto eles não atingem o “grande público”.

1.3 The Dynamics of Early Markets

Para iniciar um early market, é necessário ter um produto com uma tecnologia disruptiva, um entusiasta da tecnologia para avaliar e indicar essa tecnologia, e um visionário para apostar nela, e tudo vai dando certo. Mas às vezes algumas coisas dão errado, e é importante atentar aos seguintes problemas em potencial:

  • Problema 1: a empresa não tem experiência em go-to-market. Nesse caso, para remediar, é necessário manter em mente que, boa parte das vezes, para vencer no marketing, é importante ser “o maior peixe da lagoa”. Se você não é, deve procurar “uma lagoa menor”, até poder escalar para outras maiores.
  • Problema 2: a empresa vende para o visionário antes de ter o produto de fato. Nesse caso, o melhor a se fazer é admitir o erro para os investidores, parar com esforços de marketing e focar toda energia em fazer o piloto sair direito para entregar valor para o cliente.
  • Problema 3: a empresa cai no gap entre os innovators e os early adopters, por não conseguir traduzir a tecnologia em um benefício concreto pra empresa early adopter. A solução aqui é conseguir avaliar o produto que se tem: se o que temos de fato não é um produto disruptivos, nunca iremos criar um early market. Talvez, então, ele possa ser um complemento em um mercado mainstream. Se é, mas não está indo pra frente, talvez a solução seja focar em um único visionário que vai dar suporte para o crescimento inicial, para depois expandir mercados.

2. Mainstream Markets

É composto pela early majority (pragmáticos) e pela late majority (conservadores).

2.1 Early majority: os pragmáticos

Representam o maior volume de mercado (e dinheiro) para produtos de tecnologia. São mais prudentes, não querendo assumir o risco de serem pioneiros e não estando abertos a ficar “debugando” o produto dos outros.

O objetivo deles não é comprar uma tecnologia que represente uma grande disrupção, mas sim uma melhoria incremental. Por mais que sejam mais difíceis de “ganhar”, depois se tornam clientes fieis, e ficam com a empresa por muito tempo.

Quando eles compram, se importam com:

  • A empresa da qual eles estão comprando;
  • A qualidade e confiabilidade do produto;
  • Infraestrutura de outros produtos para dar suporte ao principal.

A melhor forma de vender pra eles é através de referências e uma construção de relacionamento: alguém que ele possa ligar sempre que der algum problema. Procure encontrá-los em feiras e eventos da indústria a qual pertencem, e aparecer em mídias que eles consomem. Criar alianças/parecerias com vendedores de outros produtos para a indústria deles também é uma boa estratégia.

Eles gostam de competição no mercado: para ter preços mais baixos, para ter alternativas caso dê problema com o fornecedor escolhido, e para terem certeza de que estão comprando de um líder de mercado (ponto crucial para esse público). São sensíveis a preço, uma vez que seu trabalho será avaliado na empresa em termos de investimento vs. retorno.

2.2 Late majority: os conservadores

Ficam presos ao que já funciona para eles, tendo um certo medo de novas tecnologias. Por isso, investem nelas só quando seu funcionamento e benefícios já estão testados e comprovados, e os preços ficam mais baixos.

Funciona bem para eles vender as coisas “em pacotes” preestabelecidos, a um preço menor.

Elementos de sucesso:

  • Pensar esses pacotes como soluções completas para o cliente, que espera resolver seu problema inteiro com essa solução;
  • Optar por um canal de vendas simples e efetivo, como por exemplo a venda online desses pacotes.

São sensíveis a preço, uma vez que o valor que tiram do produto é muito básico. O importante é focar em conveniência mais que performance, e experiência do usuário mais que features inovadoras. São muitas vezes vistos mais como incômodo do que como oportunidade, mas são um segmento grande e com dinheiro, a ser ganho por aqueles que estiverem dispostos a entendê-los.

2.3 The Dynamics of Mainstream Markets

Para ter sucesso nesse mercado, não é necessário ser o líder em tecnologia ou ter o melhor produto de todos: o produto precisa ser bom suficiente para atender as necessidades do mercado, e a empresa precisa acompanhar a concorrência (respondendo quando melhorias surgem). Precisa manter mais que inovar.

O segredo para migrar do mercado inicial para o tradicional é manter o primeiro com acesso a novidades, enquanto dá ao segundo valor por meio das coisas tradicionais/consolidadas.

3. Laggards: os céticos

Não participam no mercado de alta tecnologia, a não ser para bloquear vendas. Por isso, o papel do marketing aqui é neutralizar a influência deles, e tentar aprender com os argumentos negativos deles.

Não é que eles pensam que a tecnologia não entrega valor, mas que não entrega o valor que promete no momento da venda. Essa reflexão ajuda as empresas a alinhar o discurso de venda com o que o produto realmente entrega no final. Se realmente existe essa discrepância, ela irá prejudicar muito o marketing boca a boca.

Voltando ao abismo

Mesmo os grupos tendo diferenças entre si, os visionários ficam próximos dos entusiastas pois precisam deles para “avaliarem” as novas tecnologias, e da mesma forma os conservadores buscam nos pragmáticos referências para compras em tecnologia. No entanto, o gap entre os early adopters e a early majority é maior, em função de faltar essa ligação:

  • Os visionário tendem a guardar as informações para si, para garantir vantagem competitiva por meio da nova tecnologia adquirida.
  • Visionários não estão tão preocupados com os detalhes da indústria onde atuam, querem mais é saber de tecnologias de ponta. Por outro lado, os pragmáticos estão extremamente interessados na sua indústria. Essa divergência faz com que frequentem eventos e fóruns diferentes, desencontrando-se.
  • Os visionários não estão nem um pouco preocupados em conectar as novas tecnologias com padrões já estabelecidos, o que é meio absurdo para os pragmáticos.
  • Os pragmáticos têm um pouco de ressalvas com os visionários por serem muito dinâmicos, irem de uma tecnologia a outra, de uma empresa a outra, enquanto os pragmáticos são mais fiéis às suas posições.

PART II — Crossing the Chasm

Chapter 3 — The D-Day Analogy

Alguns dos principais perigos do abismo:

1- Falta de novos consumidores: o mercado de inovadores já está saturado, e o mercado mainstream ainda não está confortável para comprar.

2- Os esforços de marketing são determinados por investidores (obviamente ansiosos por crescimento extremo). O abismo não é o momento para isso. Também acontece de os investidores se aproveitarem do momento de fragilidade do abismo para descreditar a empresa, diminuindo seu valuation e tomando o seu controle.

Lutando para entrar no mercado mainstream

Entrar em um mercado é uma invasão: os clientes que estão lá vão ficar desconfiados dessa nova tecnologia, e os players que já estão lá vão querer fazer de tudo para você não entrar. Ou seja, deve-se adotar uma postura firme.

O autor utiliza a analogia ao Dia-D da Batalha da Normandia para explicar a melhor estratégia para cruzar o abismo: focar um nicho específico no mercado que se quer entrar, dominá-lo, tirando os competidores de lá, para depois ir dominando os mercados adjacentes (por meio das referências desse nicho que se conquistou). Do contrário, se tentarmos dominar de cara todo o novo mercado, os recursos já escassos não serão suficientes, e a mensagem perde a força.

How to start a fire

Tentar entrar em um novo mercado mainstream sem começar por um nicho menor é como tentar fazer uma fogueira sem gravetos: o fogo não vai pegar nas toras maiores direto.

O erro cometido é de ser um empresa voltada a vendas, quando nesse momento deveria ser uma empresa voltada a mercados.

Atira-se para todos os lados, e não se acerta nenhum. Deve-se entregar a esse nicho a solução completa para o seu problema, para depois expandir.

Em tecnologia, o boca a boca é a estratégia que mais funciona. No entanto, se tentarmos espalhar nossa nova tecnologia em 2 ou 3 pessoas de cada nicho, esse efeito não será criado. É necessário concentrar em poucas pessoas conectadas entre si para o “assunto pegar”.

Por fim, há mais uma razão para adotar essa estratégia de nicho: os pragmáticos querem comprar de líderes de mercado. Obviamente, é mais fácil de se tornar o líder quando o nicho/mercado é menor. E melhor: os pragmáticos gostam que o líder permaneça o mesmo, pois dá maior segurança a eles, facilita seu trabalho. Ou seja, eles vão demandar sua atenção, mas estarão “do seu lado”, defendendo para que você permaneça lá.

Ao escolher o nicho, não se preocupe necessariamente com a quantidade de pessoas que está nele, mas sim com a intensidade da dor que elas sentem e que o seu produto resolve, e a sua urgência em resolvê-la.

Escolha um nicho que seja (1) grande o suficiente para atingir seus objetivos, (2) pequeno o suficiente para conquistar e (3) que tenha fit com o que você tem a oferecer.

Big enough to matter, small enough to lead, and a good fit with your crown jewels.

Beyond Niches

Obviamente, existe vida após o nicho: para obter grandes lucros, é preciso dominar mais e mais segmentos até se ter o todo. Para conseguir mover do primeiro para outros nichos, é importante selecionar um primeiro nicho estratégico. Ou seja, bem conectado com outros.

Chapter 4— Target the Point of Attack

O fundamento básico para cruzar o abismo é mirar em um único nicho específico de mercado como o ponto de "ataque" inicial, e focar todos os seus recursos para alcançar a posição de liderança dominante naquele segmento o mais rápido possível. Lembrando que os pragmáticos gostam de comprar de líderes de mercado. Parece fácil:

  • Divida o universo de possíveis clientes em segmentos de mercado;
  • Avalie cada segmento de acordo com a sua atratividade e escolha "os finalistas";
  • Estime os tamanhos desses nichos e o quão bem eles estão servidos por outras soluções;
  • Escolha um e vá em frente.

A High-Risk, Low-Data Decision

O que torna essa atividade complexa é não apenas a pressão por acertar na escolha desse nicho (pela delicadeza do momento), como também a falta de dados para ajudar: é um mercado onde não temos experiência, e que nunca usou nossa tecnologia antes.

Por isso, ao invés de tentar achar dados de qualquer maneira para ajudar na decisão, o autor defende usar uma "informed intuition" no lugar de "analytical reason".

Informed Intuition

Unlike numerical analysis, it does not rely on processing a statistically significant sample of data in order to achieve a given level of confidence. Rather, it involves conclusions based on isolating a few high-quality images — really, data fragments — that it takes to be archetypes of a broader and more complex reality.

Para tornar esses arquétipos mais concretos, usamos o "target customer characterization".

Target Customer Characterization: The Use of Scenarios

Não é sobre caracterizar mercados, mas sobre caracterizar realmente pessoas.

Como não temos clientes ainda, ou muito pouco, montamos personas/cenários para os diferentes perfis de clientes que podemos ter, e para as diferentes aplicações do produto. Conte com a ajuda de pessoas na empresa que trabalham em contato direto com o cliente para isso. É com essa "biblioteca" de potenciais perfis alvo que poderemos aplicar, posteriormente, técnicas para priorizar a lista de oportunidades de segmentos de mercado.

Estrutura de cada cenário:

  1. Cabeçalho: informações sobre (1) o usuário final, (2) o "comprador técnico" e (3) o "comprador econômico". Para B2B — indústria, localização geográfica, departamento e cargo. Para B2C — idade, gênero e classe social.
  2. A day in the life (before): descrever uma situação de frustração desses usuários. (1) Situação: o que ocorre no momento de frustração do usuário? O que ele estava tentando fazer? (2) Qual o resultado esperado pelo usuário? Por que isso é importante pra ele? (3) Sem o seu produto, como o usuário tenta resolver? (4) O que não dá certo nessa tentativa e por que? (5) Qual o impacto para o usuário dessa falha em atingir seu objetivo?
  3. A day in the life (after): descrever a mesma situação, considerando a nova tecnologia do seu produto. (1) Novo approach: com o novo produto, como o usuário final faz a sua tarefa? (2) Facilitadores: o que na nova solução faz com que o usuário seja mais produtivo na sua tarefa? (3) Recompensas econômicas: quais são os custos evitados ou vantagens econômicas envolvidas?

Processing the Scenario: The Market Development Strategy Checklist

Agora, é hora de processar esses cenários, em duas etapas. Eleja um pequeno comitê para as votações a seguir.

Primeiro, todos cenários são avaliados em termos de:

  • Target customers: existe um "comprador econômico" para essa oferta, acessível para o canal de venda que usaremos, e que pague pelo preço do produto?
  • Compelling reasons to buy: as consequências de não conseguir resolver o problema são suficientes para fazê-lo adotar uma solução se ela existisse?
  • Whole product: a empresa consegue entregar uma solução completa para esse problema em 3 meses?
  • Competition: o problema já foi resolvido por outra empresa satisfatoriamente? Se sim, não escolha esse nicho para cruzar o abismo.

Dê notas de 1 a 5 para cada ponto acima.

Notas baixas em qualquer um desses tópicos geralmente desclassificam um cenário de sequer continuar para a etapa dois da escolha do nicho certo para cruzar o abismo. Na dúvida, foque no que tiver maiores notas no quesito "motivação para a compra". E não esqueça: é normal ter notas baixas para "whole product" — se fosse fácil, alguém já teria feito.

Pontos avaliados na etapa 2 ("nice to have"):

  • Distribution: há um canal de vendas e equipe qualificada para tanto?
  • Pricing: o preço é compatível com o orçamento do prospect e com o valor que ele obtém do produto?
  • Partners and allies: as parcerias necessárias para construir um produto completo já estão estabelecidas?
  • Positioning: a empresa tem credibilidade com esse nicho? É possível adquiri-la caso consigamos resolver o problema dele?
  • Next target customer: esse nicho tem potencial de facilitar a entrada em outros posteriormente?

Agora, é só escolher o vencedor.

Commiting to the Point of Attack

Não caia na tentação de escolher qualquer nicho e depois "ajustar no caminho". Escolha um e vá firme em sua direção. Uma vez escolhido o cenário, faça pesquisas de mercado mais aprofundadas nele para evitar ter de mudar de curso depois, mas sem esperar isso para seguir em frente. O tempo é sempre o maior inimigo do processo de cruzar o abismo.

Chapter 5 — Assemble the Invasion Force

Muitos executivos imaginam que o marketing consiste em traçar uma estratégia de longo prazo e depois dar suporte às vendas. O autor defende que a maior contribuição do marketing acontece no meio desses dois pontos, no que ele chama de "whole product marketing".

The Whole Product Concept

Existe um gap entre a promessa de marketing feita para o cliente (proposta de valor) e a capacidade do produto de cumprir essa promessa. Para superar esse gap, o produto precisa ser "aumentado", na forma de serviços e produtos auxiliares, para se tornar o "whole product". Existem 4 níveis no modelo:

medium.com/@yoursproductly

1- Generic product: o que "vem na caixa" e está no contrato.

2- Expected product: o que o cliente pensou que estava comprando quando comprou o produto genérico. É o mínimo necessário para que o cliente atinja o objetivo que tinha quando comprou o produto.

3- Augmented product: produto completo para que o cliente tenha chances máximas de atingir o objetivo que tinha ao comprar o produto.

4- Potential product: espaço que o produto deixa para crescimento com produtos auxiliares.

Para conquistar "early markets", o produto genérico é chave para vencer a batalha. Já quando se tenta conquistar mercados mainstream, a batalha migra para os próximos níveis.

The Whole Product and the Technology Adoption Life Cycle

Os públicos à esquerda do abismo não se importam em ter apenas o produto genérico, ou até em completar por eles o que falta. Já os mercados mainstream esperam produtos por inteiro.

Antes do abismo, os clientes mesmo poderão completar o que falta. Depois dele, talvez alguma outra empresa veja oportunidades em preencher gaps. Mas durante o abismo, ninguém vai te ajudar com isso.

Pragmatists evaluate and buy whole products.

Whole Product Planning

O foco no momento de cruzar o abismo deve ser no que, dentro do modelo de "whole product", é minimamente necessário para que o cliente atinja a razão que tinha de comprar aquele produto. Portanto, existem duas categorias aqui: (1) o produto entregue e (2) o que quer que seja necessário para o cliente realizar a motivação que ele tinha quando comprou o produto.

By solving the whole product equation for any given set of target customers, high tech has overcome its single greatest obstacle to market development.

Em alguns casos, uma aliança/parceria pode ser feita com outra empresa, para que se possa atingir o produto completo necessário para cruzar o abismo.

Whole product definition followed by a strong program of tactical alliances to speed the development of the whole product infrastructure is the essence of assembling an invasion force for crossing the chasm.

Chapter 6— Define the Battle

Agora, é hora de pensar nos concorrentes: precisamos entender quem/o que são nossos competidores, a relação deles com o mercado que almejamos, e a melhor forma de nos posicionarmos para tomar o seu lugar.

Creating the Competition

Como já vimos, os pragmáticos precisam de comparações e competição no mercado. Como, muitas vezes, para produto inovadores ela não existe propriamente dita, frequentemente precisaremos criar nossa concorrência. Para tanto, o autor sugere utilizar a ferramenta abaixo.

The Competitive Positioning Compass

Como mostra o esquema abaixo, cruzar o abismo significa passar de pessoas com valores baseados em produto para pessoas com valores baseados em mercado. Por consequência, o foco do marketing deve fazer o mesmo.

davidtelfer6262.blogspot.com

Ou seja, em vez de focar em um produto legal, fácil de usar e com funcionalidades únicas, deve-se comunicar um produto completo, compatível com o que já há no mercado e que entrega o que as pessoas precisam.

Nessa transição, o autor sugere que encontremos dois competidores existentes para funcionarem como referências, um para ser a "alternativa de mercado" (empresa tradicionalzona, sem muita inovação), e o outro para ser a "alternativa de produto" (empresa que inova, mas não se preocupa com as necessidades de grandes corporações mais quadradas). O seu produto deve se posicionar entre eles (para mostrar que é tecnológico e fácil de usar, mas que também entrega os casos de uso atuais/tradicionais do mercado e merece o investimento). Se você tiver dificuldade de encontrar esses dois competidores, isso pode ser um sinal de que sua empresa não está pronta para cruzar o abismo.

Posicionamento

Primeiro, o básico sobre posicionamento: ele acontece na cabeça do cliente (e não na sua mensagem de comunicação). Também não deve mudar o tempo todo, e é a maior influência em uma decisão de compra.

Dependendo de quem é o público-alvo, o posicionamento deve focar em:

(a) Para entusiastas de tecnologia: descrição técnica exata da tecnologia.

(b) Para visionários: quem vai usar, para que, e os benefícios que entrega nesse caminho.

(c) Para pragmáticos: comparar com o que já existe.

(d) Para conservadores: mostrar que a empresa tem força para perseverar e continuar investindo no segmento.

"Processo de posicionar"

O processo de estabelecer o posicionamento prevê 4 componentes chave:

  • Proposta: explicação sucinta do que é/o que faz o produto (proposta de valor) e para quem.
  • Evidência: provas de liderança de mercado.
  • Comunicação: endereçar a mensagem certa para as pessoas certas.
  • Ajustes: a medida em que os competidores responderem ao posicionamento, ajustar de acordo.

Para construir um posicionamento forte, a ideia é conseguir juntar os quatro pontos do posicionamento acima (a, b, c e d) em duas frases apenas. A fórmula sugerida é:

Para… (público-alvo), que estão insatisfeitos com… (alternativa de mercado atual), nosso produto é… (categoria do produto), que oferece… (razão convincente para comprar).

Diferente de… (alternativa de produto atual), nós desenvolvemos (funcionalidades-chave de diferenciação).

Lembre-se de não tentar abraçar o mundo, mas ser bem específico em cada um dos pontos, escolhendo o que é mais importante. Além disso, essa frase não serve para a divulgação da empresa/publicidade, e sim para guiá-la e garantir que ela vai ficar dentro da estratégia.

Posicionamento: evidências

Ao cruzarmos o abismo e passarmos dos visionários aos pragmáticos, pela primeira vez as evidências desejadas não estão em nosso controle, mas sim em outras figuras do mercado apostando no futuro do produto, ajudando na construção do produto completo e provando que o seu produto pode ser o líder do mercado. Parcerias e alianças são muito importantes aqui.

This is not a matter of having the right features or winning the right benchmark war. It is a matter of other people […] voting to endorse your product not only in word but in deed.

Lançamento

No momento de lançar o produto nessa fase, como vimos, a mensagem nos meios de comunicação de negócios não deve ser "veja esse novo produto", mas sim "veja esse novo mercado", colocando o produto como uma oportunidade nele.

This message typically consists of a description of the emerging new market, anchored by a new approach to a problem stubbornly resistant to conventional solutions, fed by an emerging set of partners and allies, each supplying a part of the whole product puzzle, to the satisfaction of an increasingly visible and growing set of costumers.

Além desses meios de comunicação focados em negócios em geral, ao cruzar o abismo, podemos apostar em mídias dedicadas à indústria em que estamos de forma mais específica: conferências, eventos, associações, publicações, etc.

Chapter 7 — Launch the Invasion

Distribuição e precificação são os últimos elementos do lançamento.

Ao estabelecermos o público que queremos atingir, devemos selecionar um canal de vendas orientado a ele. Seguem os "compradores de tecnologia" e os melhores canais de distribuição para cada um deles:

1- Executivos de grandes companhias: vendas diretas e marketing de relacionamento, pois é um comprador com um ticket alto, e que espera uma venda com consultoria, com alguém que identifique suas necessidades e adapte o produto/venda a elas.

2- Cliente final: vendas online self-service (após um período de teste gratuito) e marketing promocional, pois o ticket médio é mais baixo, e são pessoas que tendem a gostar de se virarem sozinhas.

3- Gerentes de um departamento em uma empresa: vendas 2.0 (similar ao item acima, mas com um vendedor atuando após o clique da persona em uma forma de comunicação digital), pois é um caso intermediário entre os pontos 1 e 2.

4- Profissionais da engenharia (buscando tecnologias para incluir em seus produtos): vendas através de representantes, que auxiliam na demonstração do produto uma vez que a persona já fez sua pesquisa inicial online.

5- Donos de pequenos negócios: revenda com valor agregado, pois são clientes que precisam de mais auxílio para incorporar uma nova tecnologia, porém não contam com um orçamento grande para isso.

Precificação durante o abismo

Para pensar a precificação, algumas perspectivas devem ser levadas em conta.

1- Precificação orientada ao consumidor: como vimos, mirando nos pragmáticos, devemos trabalhar a concorrência entre dois players como pontos de referência. O mesmo acontece com o preço: deve-se cobrar um pouco acima da alternativa de mercado, pois temos uma tecnologia melhor, mas um pouco abaixo da alternativa de produto, pois o produto completo é focado em um segmento específico.

2- Precificação orientada ao vendedor: deve ser evitada ao cruzar o abismo, momento de "olhar para fora" e enxergar as necessidade do novo mercado almejado e construir relacionamentos com esses consumidores.

3- Precificação orientada ao distribuidor: o preço deve fazer valer a pena para um canal revender o produto.

Juntando as três perspectivas, a ideia é partir do preço do líder de mercado, e incluir no preço recompensas interessantes a oferecer aos canais de venda.

Conclusion — Leaving the Chasm Behind

Nesse processo de cruzar o abismo, é necessário que a empresa tome cuidado para não assumir compromissos que, posteriormente ao cruzamento desse abismo, não serão sustentáveis para a companhia. Ela precisa se reinventar, passando da empresa que teve sucesso no early market, para a empresa que terá sucesso no mercado mainstream. Vamos olhar para algumas heranças do período pré-abismo e como fazer a transição para o pós-abismo.

Decisões financeiras

O propósito da empresa pré-abismo não é primordialmente ganhar dinheiro e ser lucrativa (aqui, o foco está em reduzir o risco para o investidor). O da empresa pós-abismo, sim. Ou seja, as decisões tomadas antes do abismo não devem comprometer esse objetivo pós-abismo.

É muito comum as empresas prometerem para os investidores um crescimento de receita que começa em zero por um tempo, e depois cresce vertiginosamente, quando na verdade, geralmente a realidade é um gráfico com crescimento inicial (fase de early market), um período sem receita (abismo), e depois a volta do crescimento acelerado (pós-abismo).

Por tudo isso, os investidores deveriam pedir para que todos esses pontos da "teoria do abismo" — nicho escolhido para entrar no mercado mainstream, proposta de valor, definição do produto completo e parcerias/alianças para atingi-lo, etc — fossem incorporados ao plano de negócios. Do lado da empresa, é importante planejar o uso do investimento após atingir a liderança no early market, e não gastá-lo todo na fase de cruzar o abismo.

Decisões de pessoas

Assim como, ao cruzar o abismo, passamos de clientes visionários a pragmáticos, da mesma forma as pessoas dentro da empresa também funcionam assim. As pessoas com perfil de fazerem grandes feitos de forma rápida funcionam bem no período inicial. No entanto, ao penetrar em mercados de pragmáticos, começa a necessidade de pensar em infraestrutura, documentação, etc. Passamos da necessidade de inovação à necessidade de administração. Tanto no time de produto quanto no time de vendas. Para esse último, é o momento de parar de vender customizações e sim, produtos completos que atendam ao mercado (ou segmento dele) como um todo.

It is critical […] that as the enterprise shifts from the product-centric world of the early market to the market-centric world of the mainstream, pioneer technologists be transferred elsewhere — either to another, more futuristic project within the enterprise, or if that is not an option, to another company where their talents can be better utilized.

O autor sugere, para essa transição, a introdução de dois novos papeis: o/a target market segment manager (1) e o/a whole product manager (2). São papeis temporários, que posteriormente se transformarão, respectivamente, em um/a industry marketing manager e um/a product marketing manager.

A primeira pessoa (1) estará focada em transformar um cliente visionário em uma oportunidade para penetrar no mercado mainstream no segmento dele.

Enquanto isso, a segunda (2) irá garantir que as decisões de priorização em produto foquem nos interesses do público mainstream (e não mais dos visionários). Ele sugere uma transição de product managers para product marketing managers através desse papel intermediário. Ou, pelo menos, uma transição do poder de decisão entre esses papeis.

(Uma crítica minha aqui, de alguém que é meio suspeita para falar, mas tudo bem: o autor sugere que o whole product manager "tome o lugar" do PM no momento pós-abismo, pois o PM estaria focado demais nos problemas do cliente visionário. No entanto, acredito que uma boa PM é perfeitamente capaz de entender os diferentes momentos da empresa, e diferentes personas atendidas neles, para mudar as prioridades e visões de produto de acordo. Considero a visão que ele traz a respeito de product managers um pouco ultrapassada, como alguém extremamente focado em processos e prazos, olhando apenas para dentro da empresa e versado em gestão de projetos).

Decisões de produto

Como já vimos, a estratégia principal para cruzar o abismo é passar do mindset de construir um produto, para o de construir um produto completo.

Whole product R&D is driven not by the laboratory but by the marketplace. It begins not with creative technology but with creative market segmentation. It penetrates not into protons and processes but rather into habits and behaviors.

Recapitulando tudo…

  • Uma das grandes falhas das empresas é achar que, por estar obtendo sucesso e crescimento em um early market, isso vai automaticamente continuar em um mercado mainstream. Entre eles, vai haver um período de crescimento baixo ou nulo, pelo qual a empresa precisa passar o mais rápido possível.
  • A chave para passar por esse abismo e começara a conquistar um mercado mainstream é focar em um segmento de mercado altamente específico dentro dele. Para isso: (1) caracterizamos as pessoas desse nicho e a razão delas para comprar o produto, (2) construimos um "produto completo", por meio de parcerias e alianças necessárias para isso, (3) "criamos" a concorrência e nos posicionamos utilizando-a como referência e (4) estabelecemos o canal de distribuição e a estratégia de precificação adequada para ele.
  • Ao ter ciência sobre essa transição, devemos atentar às decisões e comprometimentos feitos no pré-abismo, para não prejudicar o sucesso no pós-abismo.

Apêndice — The Four Gears Model for Digital Consumer Adoption

Para mercados B2C, o autor coloca a adoção e escala de produtos digitais em 4 atividades ("engrenagens"):

1- Aquisição de tráfego

2- Engajamento dos usuários

3- Monetização desse engajamento

4- Recrutamento de evangelizadores

No entanto, a ordem em que as coisas ocorrem não é essa. O primeiro a ocorrer é o engajamento: seu produto entrega uma experiência capaz de formar um hábito, pelo menos para alguns usuários? Uma vez que o engajamento engrena, é o momento de ativar a aquisição e escalar.

Scaling always requires modifying the offer, and modifying the offer always has an impact on scaling […].

Depois, é o momento de identificar uma minoria dentro da base que seja evangelizadora e esteja disposta a converter outros usuários, gerando um marketing viral e aumentando a retenção/diminuindo churn.

Só então pensamos em monetização, pois ela tende a desacelerar as outras 3 engrenagens se introduzida muito cedo no processo.

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Martina Scherrer
vírgula mas

São 7,6 bilhões de opiniões no mundo. Essa é só a minha.