A minha empresa é realmente inclusiva?

Vale.jo
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7 min readMay 24, 2021
Arte: Magui

Se você chegou até aqui é porque provavelmente tem algum conhecimento — ainda que vago — sobre as leis que determinam cotas para diversos tipos de inclusões corporativas. Você já deve ter ouvido falar em algumas obrigações, multas e, me atrevo a dizer, que já passou os olhos em estatísticas sobre este assunto.

Mas antes de revelar como ter uma empresa realmente inclusiva, preciso explicar brevemente alguns conceitos fundamentais.

Primeiro: diversidade e Inclusão são duas coisas diferentes.

di·ver·si·da·de (do latim diversitas, -atis)

A diversidade nas empresas significa ter um ambiente com diferentes etnias, gêneros, raças, culturas, classes sociais, etc…

É interessante dizer que existe mais de uma definição sobre o assunto. Vejamos alguns exemplos abaixo:

Diversidade Inerente: são as características de nascença do ser humano, ou seja, seu gênero, raça, orientação sexual, personalidade — enfim — podemos dizer que são atributos vindos do berço.

Diversidade Adquirida: é focada em características adquiridas ao longo da vida , como: cultura, religião, habilidades sociais, conhecimentos, idiomas, hábitos e tudo o que foi agregado ao longo do tempo.

in·clu·são (nome feminino)

Para responder essa e outras perguntas, eu entrevistei Daniele Jesus, uma mulher Preta; Periférica; Ativista; Psicóloga; Psicanalista e Pesquisadora de Black Psychology.

Atualmente, ela atua como líder de People Mission e Social Mission na Ben & Jerry ‘s Brasil.

“Inclusão Social faz parte da minha vida. Cresci numa casa aberta e que servia a comunidade. Minha mãe ainda é a benzedeira do bairro. Eu consegui atravessar a ponte porque as pessoas que vieram antes de mim me deram suporte. É meu dever preparar os caminhos para os que virão depois de mim. O que faço hoje é conectar os currículos ocultos de quem está nas periferias com quem nunca esteve fora do centro.” Relata Daniele.

Mas Daniele, o que significa inclusão social para você ?

Inclusão Social é reparação histórica. Isso deveria ter sido feito antes de 1888. O novo mundo que tem se falado desde que a Covid-19 chegou é tecnologia socióloga, vivências, realidades.

Inclusão Social é a oportunidade de vivermos num mundo mais confortável para todes de verdade.

É pavimentar a estrada para centenas de milhares de pessoas talentosas, mas ilhadas nas periferias do Brasil para atravessarem as pontes.

É sobre isso que os Racionais cantam na música ‘Da ponte pra cá’. É mais do que cruzar as fronteiras geográficas, é atravessar as fronteiras dos preconceitos enrustidos em cada um de nós.

Quando incluímos diversas realidades no ambiente de trabalho somos desnudados, as máscaras caem e temos de reaprender sobre nós mesmos diante do novo, inusitado.

Mais do que uma boa ação

Em 2018 — abordando alguns fatores como gênero, cultura e etnia, por exemplo — foi publicado pela Mckinsey um relatório com pesquisas feitas em mais de mil empresas e 12 países evidenciando que a diversidade e inclusão também são vantagens competitivas de mercado, além de criação de valor.

Atualmente, é muito comum vermos várias empresas com ações que visam apoiar o movimento LGBTQIA+, por exemplo. No entanto, é incomum dentro dessas empresas encontrar uma recepcionista transgênere, já parou para pensar nisso?

Para exemplificar, citei o cargo de recepcionista, pois é a porta de entrada das empresas. É o primeiro contato dos visitantes com aquela companhia, ou seja, quem os representa.

Contudo, não faz sentido ter diversidade no quadro de funcionários geral se a liderança não for diversa e inclusiva do mesmo modo. Afinal, qual foi a última vez que você viu um superior com algum tipo de deficiência, por exemplo? Mesmo que tenha visto, sabe que esse é um dos casos em que pode se contar nos dedos.

“ Há muitas empresas que só surfaram na onda da diversidade, sem entender a importância da inclusão nos resultados da companhia. Estas empresas não estão comprometidas com a sociedade e o planeta e — obviamente — não estruturaram um plano de atração, desenvolvimento e retenção de pessoas LGBTQIA+ porque elas não acreditam na pauta, só querem fazer o Pink money.” Reflete Daniele.

Racismo no mercado de trabalho

Perguntei para Daniele se ela considera que o mercado de trabalho brasileiro está evoluindo para vencer a desigualdade racial, em sua opinião um dos pontos positivos é que começaram a admitir que existe racismo no Brasil.

“Esse passo abre muitas oportunidades: programas de estágio e trainee 100% dedicados à pessoas pretas, aceleração de carreira em grandes empresas, liberdade estética para usarmos nossos símbolos, como tranças. Mas ainda há muito o que ser feito. Não estamos nas cadeiras de diretoria, vice-presidência e presidência. Para haver igualdade o poder tem que ser dividido conosco também.”, explica.

Precisamos falar sobre o capacitismo

Em 2020 foi publicado pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, o Caged, uma pesquisa que constatou que, aproximadamente 23.069 pessoas com deficiências foram demitidas entre janeiro e setembro do mesmo ano.

Em contrapartida, foi publicada uma matéria, no site Olhar Digital em que surpreendentemente é possível visualizar que as vagas de empregos estilo Home Office cresceram cerca de 309% em 2020.

A justificativa mais comum das empresas para não admitirem pessoas com deficiências diversas é a necessidade de estrutura e diferentes suportes para a inclusão no ambiente.

Se esse é realmente o maior problema, como explicar o número absurdo de demissões de pessoas com deficiência mesmo quando as vagas para trabalhos remotos aumentaram? As residências de pessoas com deficiência ou não são adaptadas para suas necessidades, portanto elas conseguiriam exercer tais vagas.

Sim, senhoras e senhores, é inegável que boa parte dessas demissões se devem ao capacitismo, já que muitas empresas contratam pessoas com deficiência apenas para cumprir cotas e isentar-se de multas.

O mapa da mina

Ao “juntar” em nossas mentes tantas estatísticas, estimativas de custos, leis, advertências de multas, opiniões diferentes de diversos especialistas — e sabe-se lá mais o que — parece difícil encontrar um meio de começar de forma correta a inclusão dentro de uma empresa.

Isso também colabora para que os empresários tenham certo “receio” em começar a agir em suas companhias. Pensando nisso, elaborei 5 dicas para guiar seus primeiros passos para o caminho à evolução social em seu negócio:

Quebre seus estereótipos e evidencie isso

Profissionais não são formades em uma linha de montagem para cargos específicos. São pessoas diferentes no qual as experiências de vida, conhecimentos acadêmicos e conquistas em todas as áreas os levaram até a entrevista para fazer o seu melhor e explicarem o porquê de serem a escolha ideal para a vaga. Independente de gênero, raça, etnia, deficiência e instituição de formação.

Deixe claro ao divulgar as vagas da sua empresa que elas estão abertas a qualquer profissional que se sinta preparede para preencher aquela posição.

Uma questão de Cultura

Não basta apenas dizer à equipe de RH que o time de sua empresa deve ser diverso e inclusivo, este princípio deve estar no DNA da companhia para que todes os profissionais contratades estejam conectades entre si de forma igual e saibam que a inclusão não é uma boa ação, mas o direito de realmente ocupar os cargos por seus esforços e reconhecimentos.

Tenha indicadores constantes

Fazer pesquisas para saber como estão as divisões de cargos, salários e oportunidades de crescimento dentro da empresa são vitais.

Não adianta incluir em seu time pessoas com deficiência ou da população LGBTQIA+ se esses profissionais não têm cargos de liderança e oportunidades de crescimento.

Também é necessário fiscalizar se realmente essas ações estão ocorrendo de forma clara e justa na organização. Afinal, já diz o ditado “Não se gerencia o que não se mede.”

Pesquise, converse e ouça

Todas as áreas de seu negócio devem ser bem analisadas. Com diversidade e inclusão não deve ser diferente.

Além das burocracias e números, busque histórias de corporações e profissionais que apliquem a diversidade e inclusão para entender de fato as mudanças reais que devem ser feitas e os fatores limitantes.

Pré-julgar pessoas ou situações sem fazer uma pesquisa completa sobre qualquer assunto é o maior erro que você pode cometer.

Vá devagar

Roma não foi construída em um dia.

Comece aos poucos, inclua sua equipe em palestras sobre diversidade e como ela atua na cultura da empresa; reforme ou escolha o ambiente de trabalho conforme for possível — no caso de pessoas com deficiência — avalie as condições de trabalho tanto no ambiente corporativo, quanto a possibilidade do home office.

E lembre-se: pequenas, mas constantes atitudes farão uma grande diferença ao longo do tempo.

Bônus: um conselho da Daniele

Há várias listas de requisitos feitas por pessoas super competentes no assunto. Então, quero tocar num ponto, que talvez seja o mais difícil, mas é o que eu acredito que mudará a consciência coletiva, que é o se sentir inconformade por injustiças.

Arte: Magui

Se para você não faz sentido homens ganharem mais do que mulheres, quando executam o mesmo ofício: lute para mudar isso!

Se para você não faz sentido uma pessoa preta ser agredida por ter aquela cor: lute para mudar isso!

Se para você não faz sentido uma pessoa morrer porque ama alguém do mesmo sexo que ela: lute para mudar isso!

Questione, provoque o espaço que você está inserido.

Não precisa abraçar todas as causas, escolha a que conecta com seu coração e GO!

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Conheça mais sobre diversidade e inclusão acessando o site da Valejo, um negócio que nasceu com este propósito.

Escrito por: Rafaela Fernandes

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