A sombra da derrota

Victor Allenspach
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Published in
3 min readNov 1, 2018
photo by Matteo Vistocco

Não existe razão nas eleições, as pessoas querem alguém para idolatrar, que tenha respostas tão simples para os seus problemas quanto a visão limitada que têm do mundo, e por isso trocam o salvador Lula pelo messias Bolsonaro. Ninguém pensou em dar uma chance para a democracia, e o segundo turno foi definido pelo medo.

Nos cabe fazer desse, mais um mal necessário. Sim, como o PT, que era de esquerda, mas não a esquerda que precisamos. A direita extrema tem agora a oportunidade de provar na prática, que governar para as elites não é a solução. Lula não foi o santo que livraria o país da miséria, e Bolsonaro, ainda não é um ditador.

Eu digo “ainda”, porque ele tem tudo para ser. Não apenas pelos seus discursos de ódio às minorias, relembrando com nostalgia os tempos da Ditadura (quando, eu não me canso de lembrar, “pessoas de bem” assassinaram 434 presos políticos, 1,2 mil camponeses e 8,3 mil indígenas, sem contar milhares de Soldados da Borracha), mas pelas massas apaixonadas que o cultuam pelas ruas, de onde vem o seu verdadeiro poder.

A eleição de Bolsonaro é o resultado de um efeito de manada, crescendo em popularidade como nem mesmo Lula jamais conseguiu (perdeu 3 eleições antes de ser eleito presidente). Isso o torna mais perigoso também, já que um crescimento meteórico, necessariamente se dá através da cegueira seletiva do fanatismo.

Um quadro assustadoramente semelhante ao de 1989, quando o PSDB declarou apoio oficial ao PT (com direito a Mário Covas subindo nos palanques ao lado de Lula), na tentativa de derrotar Collor, o caçador de marajás (que tinha apoio dos empresários). O resultado foi o mesmo de 2018 e, quem sabe, o fim também será.

Em sua guerra do bem (nós) contra o mal (eles), Bolsonaro pode conquistar super-poderes antidemocráticos, autorizando a tortura e o assassinato, atacando a liberdade de imprensa e perseguindo minorias. Poderes que as redes sociais já lhe deram a muito tempo, basta ver o que dirá o Congresso e as ruas.

Se fizer um bom trabalho para os empresários que o elegeram, Bolsonaro pode se manter no poder por muito tempo, ou até de forma hereditária, elegendo qualquer um dos seus muitos filhos envolvidos com a política, no chamado “Bolso-família”. Se tivermos sorte, os filhos brigarão entre si pelo trono.

O desafio dos brasileiros é não deixar que o país se torne uma Venezuela ou uma Turquia, protegendo a democracia, como já não parecia necessário. Combater os novos excessos que se somarão aos antigos, fortalecer a oposição (não custa seguir um ou dois deputados nas redes sociais e saber o que estão fazendo) e as minorias (também é bom seguir alguns líderes populares), e unir os moderados de esquerda e de direita, em prol da Social Democracia.

Esses não precisam ser anos perdidos, e espero muito que não sejam. Com uma forte oposição, podemos proteger as conquistas passadas, gerar bons empregos e sair da crise, afinal, sempre resta a esperança de que todos os absurdos que elegeram Bolsonaro, tenham sido apenas promessas eleitoreiras. A luta se dará no Congresso, que sofreu a maior mudança da sua história, e isso já é um bom sinal.

Que o clamor político não se perca e, que a partir de agora, comecemos a valorizar e fortalecer os candidatos que desejamos para as prefeituras em 2020, e as campanhas que podem nos colocar de volta aos trilhos democráticos, em 2022.

Que a eleição de Bolsonaro seja o último suspiro autoritário de nossa república das bananas, para que possamos voltar a nos preocupar, apenas, com a corrupção.

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